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Media & Jornalismo

versão impressa ISSN 1645-5681versão On-line ISSN 2183-5462

Media & Jornalismo vol.20 no.36 Lisboa jun. 2020

 

APRESENTAÇÃO

Inovação nos media e nas indústrias criativas limítrofes - uma introdução

António Granado*,
https://orcid.org/0000-0002-7990-6176

Dora Santos Silva*,
https://orcid.org/0000-0003-1611-8858

Paulo Nuno Vicente*
https://orcid.org/0000-0002-1952-6016

* NOVA FCSH, Av. de Berna, 26-C - Lisboa 1069-061, Portugal


 

A palavra “inovação” faz parte da espinha dorsal das indústrias criativas - conceito criado em finais no século XX, no Reino Unido, para englobar setores que aliam a criatividade às tecnologias de reprodução e disseminação de forma a criar valor económico e social. Só por esta nova combinação - criatividade e tecnologia - já podemos falar de inovação.

Os media fazem parte destas indústrias criativas, que englobam também as artes performativas, as artes visuais, a música, o cinema e vídeo, o design, a publicidade ou o software de lazer. Reagiram, nos últimos anos, às oportunidades e aos constrangimentos de um ecossistema digital que alargou a mais utilizadores a oportunidade de criar e partilhar conteúdos.

As tentativas de inovação nos media e noutras indústrias criativas - mais ou menos bem-sucedidas - integram-se em tipologias já propostas e atualizadas por várias linhas de investigação (Storsul and Krumsvik, 2013; Dogruel, 2014; Bleyen et al., 2014; García-Avilés et al. (2018) com base nos 4Ps de Francis e Bessant (2005): introduzir ou melhorar produtos, introduzir ou melhorar processos, definir ou redefinir o posicionamento, definir ou redefinir o paradigma de uma organização (p.172). No contexto dos media e das indústrias criativas, isso pode significar desenvolver uma app, apostar noutras estratégias de storytelling, como a gamificação, a realidade aumentada ou memes, redefinir o posicionamento da organização (focando-se nos conteúdos digitais, por exemplo) ou o seu modelo de negócio. Recentemente, os estudos sobre inovação nos media alargaram-se aos géneros e formatos jornalísticos (Krumsvik et al., 2018), à sua relação com a crise (Konow-Lund, Hagvar & Olsson, 2019), à inovação social (Podkalicka e Rennie, 2018) ou ao papel da inovação aberta (Klaβ, 2020).

Inovar nos media não é uma prática recente - aliás, tem séculos - embora os estudos sobre inovação só tenham tido um impulso no século XX a partir do economista australiano Joseph Schumpeter que a definiu como “novas combinações de algo existente” (1934, p.78). Mas a própria evolução das tecnologias digitais e a crescente convergência permitiu que esta inovação pudesse ser, nos primeiros 20 anos do século XXI, disruptiva, isto é, tivesse a capacidade de reinventar toda a indústria e não apenas envolver pequenas mudanças. Este é o argumento que leva Pavlik et al. (2018) a afirmarem que estamos num momento de disrupção nos media, “um desafio multifacetado, enraizado ele próprio na mudança” (p.11).

Embora os investigadores estejam a aludir especificamente à realidade dos dispositivos móveis, as qualidades deste desafio estendem-se a todas as indústrias criativas. Compreender e analisar todas estas transformações é, por si só, um grande desafio, tendo em conta que o ritmo a que a inovação ocorre nem sempre é acompanhado pela devida reflexão académica. Esta edição da revista Media & Jornalismo dá um contributo para compreender algumas destas transformações, alocadas a várias linhas de investigação que precisam de ser reforçadas, ao mesmo tempo que cria memória de tempos que rapidamente darão lugar a outros.

Esta edição implica também a premissa de que as instituições de Ensino Superior - universidades e politécnicos - não devem ser entidades passivas perante o imperativo de inovação e de renovação das indústrias criativas. Implica igualmente lembrar que as indústrias criativas representam um ativo significativo para o valor económico da cultura europeia. Contudo, a interpenetração entre atividades culturais, criativas, de investigação e de desenvolvimento permanece muito baixa no contexto português. Os principais desafios continuam a ser os baixos níveis de colaboração entre instituições de ensino superior e empresas - particularmente, a fraca participação de empresas em projetos de pesquisa com universidades e a incompatibilidade entre as competências geradas no sistema educacional e as necessidades das empresas - a eficiência reduzida na transferência de tecnologia e conhecimento, bem como na difícil articulação entre os setores público e privado (Portugal 2020).

Neste contexto, é importante sublinhar que as mais disruptivas tecnologias do século XXI - algumas das quais alvo da atenção dos artigos deste número da Media & Jornalismo - nasceram (e desenvolvem-se) em laboratórios de investigação e de desenvolvimento: inteligência artificial, realidade aumentada e virtual, Internet das Coisas. No nosso tempo, assistimos à sua transformação - de tecnologia para media - desenvolvendo linguagens e códigos simbólicos específicos, encontrando lugar nas nossas vidas diárias, gerando impactos económicos e políticos, porque “uma tecnologia (…) é apenas uma máquina. Um media é o ambiente social e intelectual que uma máquina cria” (Postman, 1985, p.84).

Este número da Media & Jornalismo é composto por nove artigos que refletem sobre a inovação nos media e nas indústrias criativas, analisando várias tecnologias, estratégias e ferramentas recentes, que melhoram a eficácia da comunicação e contribuem para um maior envolvimento das audiências.

Em muitos dos casos analisados, os autores propõem novas abordagens ao uso das tecnologias nas indústrias criativas, levando importantes pistas de investigação futura no campo da inovação, que vale a pena ler com muita atenção.

O primeiro artigo, da autoria de Manuel Damásio, Paulo Ferreira e Eduardo Leal Leal, debruça-se sobre a introdução de uma nova solução tecnológica no processo de produção de telenovelas em Portugal. Os autores concluem que, no caso analisado, a resistência à mudança por parte da organização se constituiu como um obstáculo à criatividade e à evolução da própria indústria.

Em seguida, Bárbara Janiques de Carvalho, Lídia Marôpo e Sara Pereira propõem-nos analisar a forma como uma famosa youtuber portuguesa concilia conteúdos de natureza pessoal e comercial no seu canal. As autoras concluem que a estratégia de hibridismo utilizada tem como objetivo dissipar os limites entre os dois tipos de conteúdo, fazendo um apelo subtil ao consumo.

No terceiro artigo, Carolina Dalla Chiesa e Patrícia Scalabrin Muller analisam 172 projetos que foram apoiados na plataforma de crowdfunding Kicktstarter entre 2010 e 2019 e considerados bem-sucedidos. Os resultados lançam algumas pistas sobre o presente e o futuro do jornalismo, bem como interessantes hipóteses para investigações posteriores.

Eliane Pawlowski de Oliveira Araújo e os seus colegas da Universidade Federal de Minas Gerais assinam o artigo seguinte, que explora o uso do meme como estratégia de marketing institucional em redes sociais digitais. Partindo do exemplo dessa utilização na divulgação do seu próprio grupo de investigação, os autores concluem que a estratégia é bastante eficaz, tendo levado ao crescimento exponencial dos seguidores das páginas analisadas.

Numa altura em que se discute o uso da inteligência artificial (IA) nas mais variadas tarefas e profissões, Sónia Pedro Sebastião explora os dados do European Communication Monitor 2019, para concluir que existe um grande desconhecimento dos profissionais de comunicação e relações públicas inquiridos sobre a IA e as suas consequências. A autora sugere algumas alterações ao inquérito que permitam, no futuro, obter dados mais aprofundados sobre este importante tema.

No sexto artigo, Ricardo Aoki explorou o uso de um newsgame no treino de escrita de redação de alunos de jornalismo de duas universidades brasileiras. Com uma amostra de 32 participantes, esta investigação sugere que o uso de newsgames se pode revelar uma interessante estratégia para o ensino do jornalismo a nível universitário.

Ana Sofia Paiva e Ricardo Morais exploram, de seguida, alguns dos trabalhos no campo da rádio que, a nível nacional e internacional, têm recorrido à tecnologia de som binaural. Os autores destacam a revitalização da importância do áudio e ao despertar de novas experiências sonoras que esta tecnologia inovadora tem vindo a proporcionar.

Ainda dentro do campo do jornalismo radiofónico e da inovação, Luís Bonixe analisa algumas práticas recentes da Rádio Renascença, TSF e Antena 1 na cobertura das últimas visitas papais a Portugal, concluindo que as mais recentes geraram novas narrativas e produtos jornalísticos que configuram modelos e práticas inovadoras na rádio portuguesa.

No último artigo deste número, Susanna Berra, Cláudia Pernencar e Flávio Almeida analisam a forma como a realidade aumentada pode proporcionar uma comunicação inclusiva e ser aplicada na integração de surdos e deficientes auditivos.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Bleyen, V., Lindmark, S., Ranaivoson, H., Ballon, P. (2014). A typology of media innovations: Insights from an exploratory study. The Journal of Media Innovations, 1(1), 28-51. DOI: 10.5617/jmi.v1i1.800.         [ Links ]

Dogruel, L. (2014). What is so Special about Media Innovations? A Characterization of the Field. The Journal of Media Innovations, 1(1), 52-69. DOI: 10.5617/jmi.v1i1.665.         [ Links ]

Ercan, E. E. (2017). The present and the future of journalism education. Quality & Quantity: International Journal of Methodology 52(1), 361-366. DOI: 10.1007/s11135-017-0616-2.         [ Links ]

Francis, D., & Bessant, J. (2005). Targeting innovation and implications for capability development. Technovation, 25(3), 171-183. DOI: 10.1016/j.technovation.2004.03.004.         [ Links ]

Ferrucci, P. (2017). “We’ve Lost the Basics”: Perceptions of Journalism Education From Veterans in the Field. Journalism & Mass Communication Educator, 73(4), 410-420. DOI: 10.1177/1077695817731870.         [ Links ]

García-Avilés, J. A., Carvajal-Prieto, M., Arias, F., & Lara-González, A. De. (2018). How journalists innovate in the newsroom. Proposing a model of the diffusion of innovations in media outlets. The Journal of Media Innovations, 5(1), 1-16. DOI: 10.5617/JOMI.V5I1.3968.         [ Links ]

Konow-Lund, M., Hågvar, Y. & Olsson, E. (2019). Digital Innovation During Terror and Crises. Digital Journalism, 7 (7), 952-971. DOI: 10.1080/21670811.2018.1493937.         [ Links ]

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Pavlik, J. V., Dennis, E. E., Mersey, R. D. & Gengler, J. (2018). Innovation and media disruption. In Mobile Disruptions in the Middle East (pp. 10-22). Routledge. DOI: 10.4324/9781315169118-2.         [ Links ]

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Storsul, T., & Krumsvik, A. H. (2013). What is Media Innovation? In Media Innovations. A Multidisciplinary Study of Change (pp. 13-26). Gothenburg: Nordicom. DOI: 10.13140/2.1.1328.9284.         [ Links ]

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Notas biográficas

António Granado é Professor Auxiliar na NOVA FCSH, onde coordena o mestrado em Jornalismo e co-coordena o mestrado em Comunicação de Ciência. Leciona na área das Ciências da Comunicação a nível universitário desde 1996. Foi jornalista profissional durante mais de 26 anos, tendo-se especializado na área do jornalismo de ciência. As suas áreas de investigação incluem o jornalismo e o ciberjornalismo, a comunicação de ciência e as redes sociais.

Ciência ID: 7112-8A9D-C0D0 Scopus Author ID: 50261653300 E-mail: agranado@fcsh.unl.pt

Morada: NOVA FCSH, Av. de Berna, 26-C - Lisboa 1069-061, Portugal

Dora Santos Silva é Professora Auxiliar da NOVA FCSH e investigadora integrada no ICNOVA. Leciona na licenciatura em Ciências da Comunicação, no mestrado em Jornalismo e na pós-gra duação em Comunicação de Cultura e Indústrias Criativas. As suas áreas de investigação incluem a inovação nos media, o jornalismo digital e a comunicação de cultura em ambiente digital.

Ciência ID: 9617-EF5E-113F Scopus Author Id: 55382579500 E-mail: dorasantossilva@fcsh.unl.pt

Morada: NOVA FCSH, Av. de Berna, 26-C - Lisboa 1069-061, Portugal

Paulo Nuno Vicente é Professor Auxiliar na NOVA FCSH. Fundador e coordenador do iNOVA Media Lab, laboratório de I&D no domínio dos media imersivos e interativos, métodos digitais, visualização de informação, comunicação humano-máquina, literacias digitais e comunicação de ciência. Coordena o Doutoramento interuniversitário em Media Digitais (Universidade Nova de Lisboa e Universidade do Porto).

Ciência ID: 2811-17AC-D593 Scopus Author ID: 55749055000 Email: inovamedialab@fcsh.nl.pt

Morada: NOVA FCSH, Av. de Berna, 26-C - Lisboa 1069-061, Portugal

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