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Media & Jornalismo

versão impressa ISSN 1645-5681versão On-line ISSN 2183-5462

Media & Jornalismo vol.18 no.33 Lisboa nov. 2018

 

ARTIGO

 

“No, you cannot”: O cartaz contrapropagandístico e estratégias de persuasão nas eleições legislativas e presidenciais portuguesas de 2001 a 2016

 

“No, you cannot”: The counterpropaganda poster and persuasion strategies in the Portuguese legislative and presidential elections from 2001 to 2016

 

“No, you cannot”: El cartel con contrapropaganda y estrategias de persuasión en las elecciones legislativas y presidenciales portuguesas de 2001 a 2016

 

 

Célim BelimI; Raphaël BaptistaII

I Universidade de Lisboa, Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP-ULisboa) 1300 - 663, Lisboa, Portugal. E-mail: cbelim@iscsp.ulisboa.pt
II Universidade de Lisboa, Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP-ULisboa) 1300 - 663, Lisboa, Portugal. E-mail: raphael.baptista1@gmail.com

 

 


RESUMO

Este artigo foca-se no cartaz com feição de contrapropaganda e na sua estratégia persuasiva nas eleições legislativas e presidenciais portuguesas de 2001 a 2016. Visa apurar a estratégia e especificidades dos cartazes e perceber a sua capacidade persuasiva sobre o eleitorado. A abordagem metodológica é mista, compondo-se da análise de conteúdo e semiológica e do inquérito por questionário online aplicado aos lisboetas. Os resultados indicam que o cartaz contrapropagandístico tende a usar políticos concorrentes como protagonistas, o excesso de tempo governativo como assunto e a regra “referência a medidas políticas dos adversários”. Os inquiridos avaliam a regra “colocação da propaganda do adversário em contradição com os factos” como a mais eficaz. Apura-se quatro relações estatisticamente significativas.

Palavras-chave: Contrapropaganda; cartazes políticos; estratégia persuasiva; eleições legislativas e presidenciais portuguesas


ABSTRACT

This article focuses on the counterpropaganda poster and its persuasive strategy in the Portuguese parliamentary and presidential elections from 2001 to 2016. It aims to ascertain the strategy and specificities of the posters and to perceive their persuasive potential on the electorate. The methodological approach is mixed, consisting of the content analysis, the semiotic analysis, and the online survey applied to the Lisbon residents. The results indicate that the counterpropaganda poster tends to use political opponents as protagonists, the excess of governmental period of the adversary as subject and the rule “reference to political measures of the adversaries”. Respondents evaluate the rule “placing adversarial propaganda against the facts” as the most effective. There are four statistically significant relationships.

Keywords: Counterpropaganda; political posters; persuasive strategy; portuguese parliamentary and presidential elections


RESUMEN

Este artículo se centra en el cartel con cariz de contrapropaganda y su estrategia persuasiva en las elecciones legislativas y presidenciales portuguesa de 2001 a 2016. Visa determinar la estrategia y los detalles de los carteles y percibir su capacidad persuasiva sobre el electorado. El enfoque metodológico es mixto, compuesto por el análisis de contenido, el análisis semiológico y la encuesta en línea aplicada a los lisboetas. Los resultados indican que el cartel con contrapropaganda tiende a usar a políticos concurrentes como protagonistas, el exceso de tiempo gobernante como asunto y la regla “referencia a medidas políticas de los adversários”. Los encuestados evalúan la regla “colocación de la propaganda del adversario en contradicción con los hechos” como la más eficaz. Se averigua cuatro relaciones estadísticamente significativas.

Palabras-clave: Contrapropaganda; carteles políticos; estrategia persuasiva; elecciones legislativas y presidenciales portuguesas


 

 

Introdução

Optar por uma estratégia contrapropagandística é optar pelo foco no adversário político. Sun Tzu (séc. IV a.C./2006), uma referência no estudo da estratégia, advertiu que quem conhece o inimigo e a si mesmo não precisa de temer o resultado de cem batalhas, que quem se conhece mas não o inimigo sofrerá uma derrota para cada vitória e que quem não conhece o inimigo nem a si perderá todas as batalhas. Portanto, conhecer o adversário e neutralizar ou mitigar o seu potencial de persuasão podem constituir um modus operandi eficaz.

O “eterno” instrumento da comunicação ou da persuasão política – o cartaz político – assume-se como uma força partidária e facilita a mobilização dos apoiantes, “a participação individual e o voto” (Dumitrescu, 2011, p. 942). A sua capacidade de persuasão reflete-se na sua permeabilidade em “cerca de 80% da população entre 10 a 11 dias” (Johansson, 2014, p. 67).

O presente artigo foca-se no cartaz com apontamentos de contrapropaganda e na sua estratégia persuasiva em contexto eleitoral, concretamente nas eleições portuguesas, legislativas e presidenciais, entre 2001 e 2016. Convocando pressupostos de abordagens teóricas da Comunicação (e.g. teoria da persuasão, abordagem da estratégia da mensagem e teoria da receção, especificamente o binómio encoding-decoding), esta investigação visa compreender, num contexto de eficácia intencionada – a persuasão –, a produção e efeitos – no sentido dicionarístico de contributos, impressões e sensações – do cartaz contrapropagandístico. Por outras palavras, visa perceber a estratégia subjacente, comprometendo-se a apurar “um padrão numa sucessão de decisões” (Mintzberg, 1978, p. 934). Neste encalço, a pergunta de partida Como é que os cartazes contrapropagandísticos das eleições legislativas e presidenciais portuguesas de 2001 a 2016 persuadem o eleitorado? serve de norte à investigação.

Os objetivos que se intenta cumprir são: a) apurar a estratégia e especificidades (elementos textuais, icónicos, plásticos e simbólicos) presentes nos cartazes; e b) perceber a capacidade persuasiva dos cartazes contrapropagandísticos sobre o eleitorado e a relação entre as características sociodemográficas deste e os efeitos daqueles. O caminho trilhado para os concretizar assenta em técnicas de análise, como a análise de conteúdo e a análise semiológica (objetivo a), e de recolha, como o inquérito por questionário (objetivo b).

Sendo uma “arma subtil”, a contrapropaganda tem atraído atenção com a entrada de atores, como Vladimir Putin e o Estado Islâmico (Pomerantsev, 2015). Assume-se que, só a partir da contínua investigação da propaganda e contrapropaganda, ser-se-á capaz de as “perceber, acabando não só a lutar contra o inimigo, como a melhorar a sociedade” (Pomerantsev, 2015, p. 2). Este foco temático de estudo é uma “forma de se compreender melhor o presente, o funcionamento e as características do tempo contemporâneo” (Monteiro, 2013, p. 15).

 

O admirável mundo da persuasão e da estratégia: Estratégias de persuasão

Se onde há significado há persuasão (Burke, 1969, p. 72), toda a comunicação – que põe em comum significados – é persuasiva. Este pressuposto é particularmente contundente na comunicação política, que se sustenta num sistema de persuasão (McNair, 2011, p. 10).

A persuasão é o resultado de um processo positivo pelo qual se convence outro que a opinião ou avaliação de alguém sobre certa situação é credível e aceitável (Vella, 2013, p. 11). Neste processo, a experiência e a integridade do persuasor desencadeiam o respeito e a estima, “ingredientes essenciais” para gerar confiança (p. 11). No contexto político, a persuasão pode ser compreendida como o conjunto de ações políticas, onde se integram as de propaganda, que são empreendidas pelo poder político (ou pelos que pretendem ocupar a sua sede) relativamente à sociedade civil (Espírito Santo, 1997, p. 16). A persuasão pode tentar influenciar as crenças, atitudes, intenções, motivações ou comportamentos (Gass & Seiter, 2010, p. 33). A influência é a habilidade para afetar outros – vista apenas no seu efeito – sem esforço da força ou da autoridade formal (Zuker, 2014).

No caminho persuasivo, Aristóteles (séc. IV a.C./2005) aponta três meios de persuasão: os derivados do caráter do comunicador (a credibilidade, o ethos), os derivados da emoção despertada nos públicos (a emoção, pathos) e os derivados de argumentos verdadeiros ou prováveis (a razão, o logos) (2005, p. 37). Também Mills (2000, p. 215) refere os “ponteiros da persuasão”, que se sintonizam com a contrapropaganda: (1) usar o modelo de intensificação e diminuição para planear a sua estratégia ou analisar a estratégia de um oponente; (2) intensificar as suas forças; (3) intensificar as fraquezas do oponente; (4) diminuir as suas fraquezas; e (5) diminuir as forças do oponente.

Estudos da Universidade de Yale mostraram que as características da fonte, da mensagem e do recetor influem na persuasão (Hovland, Janis & Kelley, 1953). Existe, pela primeira vez, o estudo dos processos psicológicos intervenientes (Wolf, 2012, p. 35), tais como: o interesse, a exposição seletiva, a perceção seletiva e a memorização seletiva do recetor. O público passa a ser encarado de homogéneo a diferenciado, e admite-se interpretações diferentes para o mesmo conteúdo (p. 40) – a polissemia. Também a inclusão do estudo do emissor e da mensagem representa um salto qualitativo nesta teoria, em relação à hipodérmica, admitindo o aparecimento de fatores, como a credibilidade do emissor, a ordem da argumentação, a integralidade das argumentações, a explicitação das conclusões (Wolf, 2012, pp. 42-45).

A persuasão, para ter efeitos otimizados, carece de uma estratégia. O conceito de estratégia tem génese em contexto militar, tendo o significado etimológico de arte de liderar uma tropa, comandar. “Objectivos a longo prazo, prioridades, acções, escolha de meios, planeamento, investimento, tomadas de decisão” e “métodos escolhidos para alcançar determinado objectivo, tendo em consideração todas as possíveis respostas e reacções dos adversários” são algumas definições possíveis (Simões e outros, 2009, p. 61). Há nas definições uma convergência para algumas ideias: a inseparabilidade entre o estratega e o seu meio envolvente, a contemplação da concorrência e um conjunto consciente e deliberado de diretrizes que determina decisões para o futuro. Migrando para o ecossistema político, a estratégia pode ser entendida como “o modo como o agente político se apresenta ao eleitorado, desde o seu manifesto, o programa eleitoral, as acções de rua, os cartazes, a presença na Internet” (Simões e outros, 2009, p. 61). Na presente investigação, são os cartazes contrapropagandísticos os instrumentos estratégicos de persuasão política analisados.

Nesta moldura teórica, importa salientar a abordagem da estratégia da mensagem. Esta abordagem refere-se a) ao que é partilhado – os candidatos devem identificar um conjunto selecionado de assuntos de campanha como seus e concentrar os seus esforços comunicacionais naqueles (Roberts & Golan, 2005, p. 250) –, b) “e à execução da mensagem ou táticas constitutivas a partir das quais o conteúdo principal é comunicado” (Holtzhausen, 2010, p. 94). Assume-se que esta abordagem se centra nos objetivos da mensagem e nos métodos como esta será acionada (Holtzhausen, 2010, p. 94).

A linguagem persuasiva ajuda a ativar os efeitos sociais dos discursos (Higgins & Walker, 2012). Numa dimensão micro, os indivíduos podem ser afetados ao nível de: cognições, crenças, atitudes, afetos, fisiologia e comportamentos (Carroll, 2016).

 

Contrapropaganda: A “arma subtil”1 da propaganda

A contrapropaganda estabelece com a propaganda uma relação de dependência ou de sequência, pois foca-se em esforços da propaganda adversária, funcionando como uma reação e desconstrução.

A palavra “propaganda” originou-se no seio da Igreja Católica (1622) e a sua etimologia (“propagar”, semear para germinar, associando-se ao contexto agrícola) penetrou a religião, sendo usada com o propósito de “converter” pessoas (Kim, 2014, p. 176). A propaganda pode ser entendida como a tentativa deliberada e sistemática de moldar perceções, cognições e comportamentos para alcançar uma resposta que promova a intenção desejada do comunicador (Jowett & O’Donnell, 2006, pp. 167, 289). São os esforços pedagógicos e informativos de grupos organizados junto de uma audiência selecionada com o propósito de esta tomar um curso de ação particular ou uma atitude condizente com a vontade do grupo organizado (Evans, 1992, p. 1). É um termo que ganhou destaque durante as duas grandes guerras e que, por isso, ainda hoje “continua a ter uma forte conotação pejorativa” (Huckin, 2016, p. 122). Similarmente, a contrapropaganda assume-se como uma intenção de moldagem percetiva, cognitiva e comportamental, almejando uma resposta prevista, e auferiu uma versão semântica negativa pelo seu uso nas duas guerras mundiais. Refere-se ao combate político entre atores a partir do uso de argumentos ou ferramentas que desacreditam e descredibilizam o adversário (Cull, 2015).

A contrapropaganda pode ser decomposta em duas dimensões: a) a resposta à mensagem adversária; e b) os efeitos sobre o emissor e o recetor.

 

Resposta à mensagem adversária

A contrapropaganda “é uma mensagem ou um conjunto de mensagens ou atividades desenhadas para desacreditar um adversário específico” (Cull, 2015, p. 3). Também Garrison (1999), por exemplo, faculta uma aceção idêntica: ações para desacreditar o oponente, influenciando as opiniões, emoções, atitudes ou comportamentos do público nacional e amigável (p. 6). Nesta linha interpretativa, é também definida como “respostas cuidadosamente preparadas para enfrentar a propaganda falsa com o propósito de refutar a desinformação e minar o propagandista” (Romerstein, 2008, p. 137) e uma estratégia que visa “amenizar ou anular o efeito persuasivo das mensagens opostas às ideologias defendidas” (Torrezam, 2007, p. 6). Outros investigadores (e.g. Golobovante & Nakagawa, 2012; Waller, 2008, p. 27) concordam com esta descrição da contrapropaganda como uma estratégia da comunicação política que anula, contraria ou diminui a propaganda adversária.

A contrapropaganda pode ser tipificada em a) tática: um conjunto de mensagens ou atividades “construídas para repelir uma mensagem específica do adversário” (Cull, 2015, p. 3); e b) estratégica: serve de “resposta a uma atividade propagandística do adversário” (Cull, 2015, p. 3), tratando-se de um plano de comunicação por inteiro (Cull, 2015).

 

Efeitos sobre o emissor e o recetor

A adoção da contrapropaganda permite ao candidato político o predomínio da sua força e credibilização e, por outro lado, a descredibilização dos adversários (Domenach, 1975).

Para Desposato (2013), a contrapropaganda é recomendada “por ser mais informativa” e uma “importante componente de prestação de contas” (p. 282). A sua ausência pode prejudicar a qualidade da democracia, visto que é a contrapropaganda que vai assegurar a accountability (“prestação de contas”) e lembrar os eleitores dos erros cometidos no passado pelos candidatos. Desposato (2013) explica que, sem a contrapropaganda, “só ficaremos a saber das vantagens de uma estratégia ou candidato – não receberemos informações sobre [as] suas desvantagens ou os possíveis prejuízos” (p. 286).

Há outros efeitos da mensagem negativa. O efeito “sleeper” é mais provável em mensagens negativas do que em positivas: “quando o eleitor está a tomar a sua decisão de voto, algo na sua mente lembra a informação negativa. Provavelmente esqueceu-se quando e onde ou de quem a ouviu, mas o conteúdo negativo ficou preso na memória” (Lariscy, 2012). Há algumas evidências de que as mensagens negativas tendem mais a registar-se passivamente no cérebro do que as positivas (Lariscy, 2012).

Os líderes políticos não gostam de fazer campanhas negativas, pois apreciam pensar que as pessoas votam neles por puro entusiasmo, não por um desgosto em relação à oposição (Delaney, 2015). Há dois possíveis efeitos positivos da contrapropaganda para o seu emissor: (1) aumentar a perceção negativa em relação a um adversário e (2) permitir a prestação de contas, incrementando o esclarecimento e a transparência. O backlash effect (“efeito de retrocesso”), “que resulta numa perceção negativa em relação ao atacante” (Cavazza, 2016, p. 168), é desvantajoso para o emissor. O ataque e o atacante colhem o olhar condenatório do eleitorado. A Tabela 1 sistematiza a operacionalização de “contrapropaganda”.

 

 

A literatura (e.g. Domenach, 1975; Espírito Santo, 1997) apresenta regras para a concretização da “propaganda de combate às teses do adversário” (Domenach, 1975, p. 92), compondo um possível modelo. É um contributo para a abordagem da estratégia da mensagem e da persuasão neste domínio.

    1. Destaque dos temas dos adversários;
    2. Ataque aos pontos fracos do adversário;
    3. Evitamento de ataque frontal à propaganda adversária quando for poderosa;
    4. Ataque e desconsideração dos adversários;
    5. Colocação da propaganda do adversário em contradição com os factos;
    6. Ridicularização do adversário;
    7. Predomínio do “clima de força”: “impedir que o adversário se mantenha na primeira linha, criando, em proveito próprio, a impressão de unanimidade” (Domenach, 1975, p. 97);
    8. Antecipação dos ataques dos adversários;
    9. Silêncio;
    10. Curto-circuito: “criar descontentamento dentro da força política” (Espírito Santo, 1997, p. 128).

 

Cartaz político: O “eterno” instrumento da persuasão política

O cartaz político é uma resposta “à sociedade de consumo, [que] pretende comunicar ideias de origem política, integrando-se, por sua vez, num sistema mais lato, que, vulgarmente, é apelidado por propaganda” (Santos, 2006, p. 19).

Os cartazes são uma “ferramenta eficaz e barata para as campanhas eleitorais” (Dezelan & Maksuti, 2012, p. 143). Apresentam dois componentes: os verbais e os não verbais. Os primeiros são, essencialmente, slogans, “promessas dos candidatos ou as suas posições numa questão em particular” (Dezelan & Maksuti, 2012, p. 143). Os segundos transmitem informações sobre qualidades individuais dos candidatos (Dezelan & Maksuti, 2012, p. 143), concentrando a sua ação persuasiva (p. 143) em elementos, como fotografias, cores, símbolos ideológicos e políticos (p. 155).

Os cartazes políticos, “quase omnipresentes nas campanhas eleitorais em vários países de todo o mundo” (Lee & Campbell, 2016, p. 3), têm viajado para o contexto online.

O objetivo de apurar os efeitos persuasivos dos cartazes contrapropagandísticos conjuga-se com a teoria da receção, que assume a audiência como ativa e a descodificação da mensagem como dependente de variáveis, entre elas a história pessoal do descodificador (Hall, 1973).

 

Nota metodológica

Optou-se por um período de tempo (de 2001 a 2016) e não por um único estudo de caso para que, com o adensamento dos casos ou unidades de análise, se possa robustecer os resultados.

Metodologicamente, recorre-se à análise de conteúdo e à análise semiológica, para tratar os cartazes contrapropagandísticos (54 de 286), e ao inquérito por questionário.

A análise de conteúdo é quantitativa, temática, por tentar captar “as representações sociais ou os juízos dos interlocutores” (Quivy & Campenhoudt, 2005, p. 228) e categorial, pelo cálculo e comparação das frequências (p. 228).

A análise semiológica comprometeu-se a descobrir sentidos latentes nos cartazes, mergulhar na significação potenciada e analisá-los sob um ponto de vista variado – icónico, linguístico, plástico e simbólico. A fim de se perceber, sob o ângulo de vários tipos de signo, a construção, o potencial, a estratégia e a eficácia persuasivos da comunicação ofensiva, aplicou-se os quatro níveis de interpretação/ transferência de Joly (2002): a transferência indiciária, referente aos vestígios da realidade, a cultural, que procura a produção do significado sob uma moldura cultural, a icónica, que convoca uma analogia a partir dos ícones dos cartazes, e a do motivo, que objetiva a fixação do tema ou assunto predominante (Joly, 2002, pp. 97-101).

Optou-se pelo inquérito online, colmatando constrangimentos financeiros e logísticos que advêm da recolha presencial dos dados e tendo em conta a taxa de penetração da internet em Lisboa (acima de 75% – INE, 2016). A escolha do concelho de Lisboa reside no argumento de que é a localização portuguesa com o maior número de eleitores (Lusa, 2015). Para assegurar alguma representatividade, visto que não se conhece o universo digital, atendeu-se: a) ao cálculo do tamanho da amostra necessária para um nível de confiança de 95% a partir dos Censos de 2011, o que perfez o total de 400 inquiridos (Pocinho, 2009, pp. 16-17), e b) à representatividade do género e da faixa etária (ver ficha técnica na Tab. 2). A amostra por quotas apresenta “maior rigor” quando comparada às demais amostras não aleatórias (Fávero & Fávero, 2017, p. 49) e é uma das amostras mais usadas em opinião eleitoral e em pesquisas de mercado (Martins & Domingues, 2011). Em termos procedimentais, fixa-se as quotas com base num critério pertinente: no presente caso, com base no género e na idade, atendendo a que há estudos (e.g. Orji, Mandryk & Vassileva, 2015) que mostram que há diferenças nas respostas de homens e mulheres e de faixas etárias às estratégias persuasivas.

O questionário foi formulado para atender à dimensão do recetor no contexto da teoria da persuasão, com as componentes: a) interesse em adquirir informação; b) exposição e c) perceção.

 

 

Com recurso ao SPSS, efetuou-se uma análise estatística descritiva, univariada e bivariada, e inferencial, com o teste do qui-quadrado. Atendendo à escassez de estudos acerca da influência do cartaz contrapropagandístico sobre o eleitorado e numa intenção exploratória, seguiu-se as diretrizes metodológicas e formulou-se questões de investigação no quadro de um caminho indutivo. Para apuramento das relações entre variáveis dotadas de significância estatística, delineou-se a questão:  que variáveis influenciam outras?, ou quais as relações de variáveis dotadas de significância estatística?. Conciliou-se, assim, o modelo dedutivo, que intenta o teste a teorias encontradas na literatura, e o modelo indutivo, que espera gerar teoria (Bryman, 2012, p. 36).

 

Apresentação dos resultados

Estratégia e especificidades presentes nos cartazes contrapropagandísticos

Nas legislativas, observa-se diacronicamente oscilações no número de cartazes contrapropagandísticos usados. Contudo, atendendo somente aos picos (4-14-25), há uma tendência de aumento. Existem momentos em que a contrapropaganda é mais e menos utilizada: respetivamente em 2015 (25 cartazes) e em 2005 (3 cartazes) – (Fig. 1).

 

 

A contrapropaganda, no contexto de eleições presidenciais, é praticamente nula – só em 2001 e 2006 são encontrados exemplos.

No cômputo de todos os momentos eleitorais, a referência a medidas políticas dos adversários (40 presenças) e o ataque e desconsideração dos adversários (34) são as regras de contrapropaganda mais presentes.

Os resultados da análise de conteúdo (Tabela 3) evidenciam que todos os cartazes (54) usam elementos verbais, 31 usam elementos icónicos e 24 destacam protagonistas. O texto, na maioria dos cartazes (38), surge centrado e em grandes dimensões (34). O ícone tende a constar nas laterais (20) e a ostentar um tamanho médio (19).

 

 

Nas legislativas de 2002, os quatro cartazes coloridos apresentam elementos icónicos e textuais. Na sua maioria, a fotografia enfatiza um protagonista: uma figura não política. O enquadramento é horizontal e o ângulo é normal (Fig. 2).

 

 

Em 2005, os três cartazes, compostos por elementos icónicos dispostos na lateral, utilizam a cor, em detrimento do preto e branco (PB). Retratam figuras políticas de espectros partidários que não o do emissor. O enquadramento é horizontal e o ângulo normal (Fig. 3).

 

 

O padrão do cartaz contrapropagandístico muda significativamente nas legislativas de 2009. Apenas cinco dos 14 cartazes integram, na sua composição, o elemento icónico. Os ícones nem sempre são atores humanos. O texto e a cor são comuns a todos os cartazes. O enquadramento tende a ser horizontal e o ângulo normal (Fig. 4, 5 e 6).

 

 

 

 

 

 

Nas legislativas de 2011, a iconicidade regressa em metade dos cartazes – três de seis. O texto e a cor são constantes na composição do cartaz, mas, pela primeira vez, o enquadramento mais utilizado é o vertical. O protagonista é, na maioria, uma metáfora às forças políticas concorrentes do partido emissor do cartaz (Fig. 7).

 

 

As legislativas de 2015 são marcadas pelo emprego da fotografia e da palavra, esta centrada e em tamanho grande, e pelo político concorrente como protagonista na maioria dos 25 cartazes analisados. A aplicação da cor é comum à maioria dos cartazes, assim como a adoção do enquadramento vertical e do ângulo normal (Fig. 8 e 9).

 

 

 

 

A Figura 10 sintetiza as tendências

 

 

No caso das presidenciais (Fig. 11), a presença de texto e protagonista é comum em ambos os cartazes. De resto, são encontradas mais dissemelhanças que similitudes: apenas um tem protagonista icónico e o enquadramento e a paleta de cores são diferentes.

 

 

 

Resultados gerais da análise semiológica

Legislativas 2002

Três dos quatro cartazes estão divididos horizontalmente demarcando uma parte superior e inferior, valendo cada uma por si (Tab. 4). A horizontalidade acompanha uma tendência de escrita esquerda-direita em vez da tradicional cima-baixo e a mudança de foco de “qual é o estado das coisas?” e “onde estamos?” para “para onde vamos?” e “progredimos ou regredimos?” (Kress & van Leeuwen, 2005, p. 106). Existe, na maioria, um protagonista: uma personagem não política, que funciona como testemunha da ideia que o cartaz quer transmitir. As cores mais utilizadas são o vermelho e o verde, que configuram a bandeira portuguesa, e o laranja, cor oficial do partido emissor (PSD).

 

 

Legislativas 2005

A cor é transversal aos cartazes deste momento eleitoral, injetando-lhes vivacidade (Tab. 5). Em dois deles, a cor é combinada com o PB, criando contraste. O dualismo PB é, muitas vezes, associado à perda e ao fascismo (Santos, 2013). O uso de uma figura política adversária como protagonista, personificando a autoria dos problemas, é outra das tendências.

 

 

Legislativas 2009

Neste momento eleitoral (Tab. 6), o azul é a cor mais presente, estando associado à verdade (Lexikon, 1990) e ao conservadorismo (Santos, 2013). Na maioria dos cartazes não existe protagonista: apenas o logótipo, presente no canto inferior direito que, situado no desfecho ótico, tem o efeito de ficar a retinir na memória. A ausência do elemento icónico, no grosso dos cartazes, exige ao (e)leitor a reflexão sobre o texto. O motivo temático tende a prender-se ao excesso de tempo governativo.

 

 

Legislativas 2011

O elemento icónico está presente em três dos cartazes, mas em nenhum deles são encontrados protagonistas diretos mas sim metaforizados (Tab. 7). O azul, a cor mais utilizada, é a cor da verdade (Lexikon, 1990) e do conservadorismo (Santos, 2013). O amarelo é utilizado para centrar a atenção do espetador e, normalmente, sinaliza uma apreensão (Evonline, 2017). O branco, “maioritariamente usado em texto” (Santos, 2013, p. 80), arrecada destaque sobre o tom escuro do fundo e transporta os espetadores para a ideia de pureza, paz e limpeza (Significados, 2017). O enquadramento vertical convida a um diagnóstico: “qual o estado das coisas?”. O excesso de tempo governativo e a entrada do FMI, evocando o contexto, são os motivos temáticos mais presentes.

 

 

Legislativas 2015

As cores mais utilizadas são o verde e o PB (Tab. 8). Simbolicamente, o verde está associado a paz, liberdade e esperança (Santos, 2013). O PB conota a ideia de solidão, depressão e perda (Significados, 2017). A presença da figura política de um partido adversário cumpre a função de atribuir um rosto ao responsável pelo problema. O ângulo normal “naturaliza” a ideia projetada pelo cartaz, cultiva realismo e cria um envolvimento mais estreito com o eleitor. A entrada do FMI e o excesso de tempo governativo voltam a ser motivos temáticos.

 

 

Presidenciais

Em 2001 (Fig. 12), o cartaz isotópico, em virtude da presença do queijo nos planos icónico e linguístico, apresenta um apontamento em cor (nome do candidato), deixando o restante a PB. Existe, a partir do ícone, uma referência a um adversário político. A letra está, maioritariamente, em caixa baixa e a preto, destacando-se do fundo branco num enquadramento vertical.

 

 

O cartaz de 2006 (Fig. 13) é colorido e usa um enquadramento e uma divisão horizontais. Não mostra elementos icónicos, canalizando a atenção para o texto, que sugere um protagonista – uma figura política adversária – e explora o sentido polissémico de “cavaco”.

 

 

Potencial persuasivo dos cartazes contrapropagandísticos

A maioria do eleitorado lisboeta (66,3%) costuma prestar atenção aos cartazes políticos.

A categoria de resposta “Pouco importante” é escolhida por mais de um quarto (36%). “Nada importante” é marginalizada e 64% da amostra reconhece o contributo dos cartazes contrapropagandísticos no contexto eleitoral.

A contrapropaganda é avaliada como importante (46%) e muito importante (28%). A maioria dos inquiridos diz já ter reparado nos cartazes com traços contrapropagandísticos (79,5% vs. 20,5%). “Algumas vezes” (35,8%), “Muitas vezes” (31,3%) são as categorias de regularidade mais expressivas (Tab. 9).

 

 

A maioria dos inquiridos pretere a contrapropaganda em favor da propaganda (66% vs. 34% que a preferem).

“São mais engraçados” é a resposta mais escolhida para justificar a preferência pelos cartazes contrapropagandísticos (26%), seguindo-se as opções “mais criativos” (26%), “mais honestos” (24%) e “mais convincentes” (21%) (Fig. 14).

 

 

Nas razões para rejeitar os cartazes contrapropagandísticos, elencam-se “não dizem nada sobre o partido que o promove” (41%), “geram conflito” (26%) e “procuram o ataque” (21%) (Fig. 15).

 

 

Entre os objetivos que acionam a contrapropaganda, “chamar a atenção” é a opção mais escolhida (41%), acima de “humilhar” (29%) e de “responsabilizar o visado” (28%).

O cartaz contrapropagandístico é o que chama mais a atenção dos lisboetas, em detrimento do cartaz propagandístico (Fig. 16).

 

 

Esta preferência assenta na criatividade do cartaz (22%), na honestidade e no convencimento (16,8% cada), no ataque (15%) e no conflito (13,8%).

O cartaz “D” (PS, legislativas de 2015), com 40,3% das preferências e personificando um problema, é o cartaz contrapropagandístico mais convincente. Seguem-se: o cartaz “B” (16,5%), que lança uma pergunta e dá rosto aos adversários, o “A” (16,3%), que é isotópico ao ser coerente no texto (“divirtiram-se”) e na sua representação icónica e dá rosto ao “eles”, o “C” (14,5%), que espicaça com uma pergunta e tenta desmitificar o que é “normal”, e o “E” (12,5%), um dos únicos cartazes presidenciais (Tab. 10).

 

 

A justificar a preferência pelo cartaz, realçam-se os motivos: “pela questão que levanta” (28%), “por mostrar a verdade” (20%), “pelo uso do nome ou da imagem do adversário” (17%) e “pelos números que são apresentados” (15%).

A “colocação da propaganda do adversário em contradição com os factos” (29,8%) é o elemento mais eficaz de um cartaz contrapropagandístico, seguindo-se do “ataque aos pontos fracos” (12%) e do “ataque e desconsideração do adversário” (11,3%). As opções de resposta com a menor expressividade são o “silêncio” e “a referência ao nome ou slogan do adversário” (cada uma com 2,3%).

 

Relação entre as características sociodemográficas e de participação política do eleitorado e os efeitos dos cartazes contrapropagandísticos

Os inquiridos lisboetas que dizem estar informados sobre política costumam prestar atenção aos cartazes políticos e mais as mulheres do que os homens. Os que votam sempre, ou quase sempre, e dizem estar informados e ter interesse na política tendem a rejeitar o cartaz contrapropagandístico, justificando a sua recusa por o cartaz não dizer nada sobre o partido que o promove e gerar conflito. 71,2% dos homens rejeitam-no. Preferem este género de cartaz, as mulheres (98,5%) – por ser engraçado e criativo –, a faixa etária 55-64 e os licenciados.

O teste de independência do qui-quadrado revelou a significância estatística entre: (1) atenção aos cartazes e nível de escolaridade; (2) preferência pelo cartaz contrapropagandístico e género; (3) como o cartaz chama a atenção e género; (4) motivo por que chama a atenção e género. Assim, o nível de escolaridade de um participante influencia a atenção que reserva aos cartazes políticos. O género influencia a preferência pelo cartaz contrapropagandístico, a maneira como cada cartaz chama a atenção e o motivo por que chama a atenção. O género feminino prefere os cartazes contrapropagandísticos, entendendo que estes chamam mais a atenção por serem “mais engraçados”.

 

Discussão dos resultados

A contrapropaganda, como técnica estratégica a constar dos cartazes políticos, aumentou (25 cartazes) nas eleições legislativas de 2015, denotando um maior investimento partidário ao contrário das ilações de Vliegenthart (2012, p. 146). A colocação no cartaz de figuras adversárias, dando rosto ao problema enunciado; as cores da bandeira portuguesa, evocando o patriotismo, e o PB em contraste com a cor, compondo um chamariz; o ângulo normal, atribuindo realismo ao que é mostrado; a combinação de elementos icónicos, textuais, plásticos e simbólicos, numa conceção de estratégia de comunicação integrada para otimizar efeitos; elementos de transferência icónica familiares (e.g. sorriso) e que fazem parte da paisagem citadina (e.g. cartaz imobiliário, sinal de trânsito); um dos motivos temáticos tendenciais como o excesso de tempo governativo, aludindo à constância de forças partidárias no governo em Portugal e que, mesmo assim, são ineficazes na resolução de problemas; e a regra “referência a medidas políticas dos adversários” compõem tendências nas estratégias da mensagem persuasiva dos cartazes contrapropagandísticos.

O BE, partido da oposição em todas as legislativas analisadas, é a força política com o maior uso dos cartazes contrapropagandístico (13), cumprindo uma tradição dos partidos de origem trotskista. O PSD e o PS, que estiveram mais vezes no poder, distribuíram apenas três e quatro destes cartazes, respetivamente. Estes resultados entendem-se, pois a oposição, ao não exercer funções governamentais, tem mais pretextos para criticar e atacar o governo incumbente e confirmam o que já tinha sido apurado em investigações anteriores: as forças partidárias que se encontram na oposição dedicam-se mais à negatividade (Dolezal, Ennser-Jedenastik & Müller, 2015; Paskhalis & Müller, 2017; Russmann, 2012). Para os partidos da oposição, “focar as suas próprias qualificações governamentais, o seu histórico ou as suas capacidades de liderança pode não ser eficaz ao tentar convencer o eleitorado” (Russmann, 2012, p. 18).

Como propósitos da contrapropaganda, os inquiridos apontam chamar a atenção e humilhar o adversário, que se somam ao potencial para descredibilizar, responsabilizar e convocar à prestação de contas, objetivos descritos por Desposato (2013) e que preconizam o modelo de intensificação e diminuição referido por Mills (2000).

Os recetores lisboetas avaliam a contrapropaganda como “importante” (46%), o que se encaixa nas ideias de que o ataque é “a melhor forma de defesa” e uma “regra de ouro” da campanha política (e.g. Delaney, 2015) e nas evidências de que a negatividade pode ter um efeito revigorante na participação dos eleitores (e.g. Freedman & Goldstein, 1999). Contudo, White (2010) advoga que só funciona quando plasma o que os eleitores já pensam e articula “impressões meio sentidas” e há estudos que enunciam a hipótese da desmobilização (e.g. Ansolabehere & Jyengar, 1995).

Um dos principais propósitos do uso da contrapropaganda num cartaz, apontado pelo espetador, é segurar a atenção de quem o vê, um dos níveis e efeitos da persuasão (teoria da persuasão). Tal ilação é confirmada com a escolha dos inquiridos pelo cartaz contrapropagandístico como o mais chamativo, em comparação com o propagandístico. A negatividade é um dos atributos que ditam o êxito da campanha de contrapropaganda, pois prende com maior facilidade a atenção do espetador, criando memorização da mensagem e uma impressão negativa do adversário mais duradoura (e.g. Lariscy, 2012; Mandelaro-Rochester, 2016).

Os resultados indicam que o elemento mais eficaz é a “colocação da propaganda do adversário em contradição com os factos”, convocando o conceito de logos de Aristóteles e o saber popular de que “contra factos não há argumentos”. Também as respostas mais pontuadas na preferência pelo cartaz D valorizam a agenda temática e a mostra da verdade. Os resultados do inquérito adensam as evidências sobre a influência da contrapropaganda, ao revelar uma ligação entre variáveis. Na relação entre a atenção dada aos cartazes e o nível de escolaridade, entende-se que este influencia a atenção do eleitor reservada ao cartaz. Esta ligação pode sugerir o vínculo, constatado em investigações anteriores, entre as habilitações e a participação política (e.g. Brade & Piopiunik, 2016; Burden, 2009).

Apura-se dados que contrariam resultados precedentes, que revelam que o homem prefere a campanha negativa e que a sua utilização aumenta a participação eleitoral do género masculino (e.g. Brooks, 2010; Fridkin & Kenney, 2011; Galasso, 2013). Ao invés, as mulheres são descritas como intolerantes à contrapropaganda, diminuindo a sua mobilização política (e.g. Brooks, 2010; Fridkin & Kenney, 2011; Galasso, 2013). Em Portugal, no concelho de Lisboa, as mulheres preferem a contrapropaganda, ao contrário do que acontece nos EUA e na Itália (e.g. Brooks, 2010; Fridkin & Kenney, 2011; Galasso, 2013). Todas as investigações apoiaram-se na técnica do inquérito, indicando que a maior diferença se funda na localização do estudo. Neste sentido, lembramos questões de identidade cultural: “todos nós escrevemos e falamos desde um lugar e tempo particulares, desde uma história e uma cultura que são específicas” (Hall, 2003, p. 116). Ou seja, o contexto sócio-histórico influi na codificação e na descodificação.

 

Conclusões

O investimento no cartaz contrapropagandístico nas eleições portuguesas parece ser uma tendência, atendendo a que, nas eleições de 2015, foram usados 25. É um instrumento da persuasão política que tende a estar mais presente nas estratégias de comunicação dos partidos da oposição, já que esta, por não ter exercido funções governamentais, reúne mais motivos para criticar o governo incumbente. O BE é o partido com mais cartazes: 13 no cômputo de todas as eleições em análise.

Os resultados indicam que o cartaz contrapropagandístico tende a usar figuras políticas concorrentes como protagonistas que personificam os problemas enunciados numa associação mental autor-mal, cores da bandeira portuguesa numa construção de sentimento patriótico, o contraste entre PB e cores, o ângulo normal que potencia realismo ao que é mostrado, uma estratégia integrada que se ancora em elementos textuais, icónicos, plásticos e simbólicos, elementos icónicos familiares e da paisagem citadina que potenciam um reconhecimento fácil, o excesso de tempo governativo de forças partidárias concorrentes como assunto e a regra “referência a medidas políticas dos adversários” numa exposição e denúncia da incapacidade de resolver problemas do incumbente. Estas tendências compõem a estratégia persuasiva do cartaz. Nas palavras de Mintzberg (1978) para estratégia: o “padrão numa sucessão de decisões” (p. 934).

Os inquiridos lisboetas avaliam a contrapropaganda como “importante”, o cartaz contrapropagandístico como o mais chamativo, a regra “colocação da propaganda do adversário em contradição com os factos” como a mais eficaz. “Chamar a atenção” é o objetivo que comanda a contrapropaganda mais indicado pelos respondentes. A agenda temática e a mostra da verdade justificam preferências entre os cartazes negativos. Os inquiridos que dizem estar informados sobre política costumam prestar atenção aos cartazes políticos e mais as mulheres dos que os homens. Os que votam sempre, ou quase sempre, e dizem estar informados e ter interesse na política tendem a rejeitar o cartaz contrapropagandístico.

Regista-se quatro relações estatisticamente significativas: (1) atenção dada aos cartazes e nível de escolaridade; (2) preferência pelo cartaz contrapropagandístico e género; (3) escolha do cartaz que chama mais a atenção e género; (4) motivo por que o cartaz é mais fático e género. As mulheres preferem o cartaz contrapropagandístico, atribuindo-lhe maior capacidade de captar a atenção, por ser mais engraçado e criativo. Os homens tendem a rejeitar este tipo de cartaz, argumentando que são vazios sobre o partido promotor.

O slogan “Yes, we can”, de Barack Obama, foi em 2008 mobilizador e sonante pelas suas marcas de positividade, inspiração e simplicidade. “No, you cannot” parece também ser mobilizador e assumir-se como uma tendência, atendendo a que se confia que o seu “pregador”, comprometido com a transparência e a verdade, desmascara, denuncia e funciona como um “advogado das boas causas” ou um watchdog do cidadão face aos políticos, que possam ser incapazes, demagogos ou prevaricadores.

 

 

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Recebido | Received | Recebido: 2018-02-20
Aceite | Accepted | Aceptación: 2018-06-06

 

 

Notas

1 Definição avançada por Pomerantsev (2015, p. 2).

 

 

Notas biográficas

Célia Belim é doutora em Ciências da Comunicação (2016) e professora auxiliar no ISCSP (Universidade de Lisboa), exercendo funções de docência desde 2001. Já desempenhou funções nos diversos sub-campos da Comunicação, como jornalismo, comunicação organizacional e assessoria mediática. Tem publicado e participado em conferências sobre os seus focos de interesse.

Raphaël Baptista é mestre em Ciências da Comunicação, vertente de Comunicação Estratégica, pelo ISCSP, obtendo 17 valores na sua dissertação. É licenciado em Jornalismo pela Universidade de Coimbra. Será doutorando em Ciências da Comunicação no ISCSP, a partir de outubro de 2018. Profissionalmente e enquanto jornalista, tem experiências na TVI, Media Capital Rádios e em projetos online.

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