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Cadernos do Arquivo Municipal

On-line version ISSN 2183-3176

Cadernos do Arquivo Municipal vol.ser2 no.13 Lisboa June 2020

 

DOCUMENTA

Luz e sombra: 100 imagens do mundo operário no limiar do século XX

Nuno Martins*

*Nuno Gomes Martins, Divisão de Arquivo Municipal – Câmara Municipal de Lisboa, 1070-017 Lisboa, Portugal. nuno.martins@cm-lisboa.pt

 

NOTA INTRODUTÓRIA

A imagem visual tem sido utilizada, desde sempre e em todas as geografias, como veículo de comunicação e projeção do poder político. Terreno fértil e fascinante para cruzar em várias disciplinas, tem sido objeto para uma vasta produção de investigação, sobretudo na esfera anglo-saxónica. Contudo, em Portugal, o estudo sistemático no domínio da cultura visual é ainda frágil não obstante alguns importantes trabalhos11. A imagem visual, nos seus vários suportes, tem sido, sobretudo, utilizada como um artefacto ilustrativo do texto, sem ser inquirida per si nas suas múltiplas valências e potência.

Na economia deste texto, não se pretende fazer algum tipo de estudo temático ou de caso, mas sim, expor um conjunto documental fotográfico organizado em quatro módulos, o qual, para além de registar momentos e aspetos ligados à indústria e ao operariado em Lisboa, num espectro cronológico entre os últimos anos do século XI e a entrada da segunda metade do século XX, pode contribuir com valor de fonte para estudos nos domínios da história, da antropologia, da sociologia, entre outros.

Desta forma, cada módulo é constituído por várias fotografias selecionadas no acervo do Arquivo Municipal de Lisboa, acompanhadas por uma síntese de enquadramento. A produção historiográfica – política, social, económica – dos séculos XI e X português é reputada e vastíssima, e a centralidade desta Documenta é a fotografia como significante. Por isso, os capítulos não têm a ambição de serem peças de argumentação de âmbito historiográfico, mas, sim, apontar para os contextos em que as fotografias foram realizadas, e sugerir enquadramentos para a imagem e os seus significados. Os indícios podem ser vários: o diálogo entre um produtor e um recetor – pela representação, intermediação, leitura e receção –, o que revela ou omite, a escolha do objeto, a opção técnica e estética, os códigos de figuração simbólica, os locais escolhidos, a biografia social e política do autor, o contexto de encomenda, a finalidade objetiva e subjetiva2. Ou seja, numa inversão à tendência ilustrativa, aquilo que a fotografia pode oferecer de informação se devidamente interrogada enquanto significante.

 

CIRCUNSTÂNCIAS ESTRUTURAIS E CONJUNTURAIS DE PORTUGAL NO LIMIAR DO SÉCULO XX EUROPEU

Embora com variações muito desiguais consoante a cronologia, a taxa de crescimento da população portuguesa no decurso do século XI manteve-se positiva e, em termos absolutos, quase que duplicou no fim da centúria3. Entre 1821 e 1850, a dimensão demográfica em Lisboa estabilizou, com algumas regressões de intermédio, enquanto o arranque do Porto, apesar de precoce, só se tenha verificado na segunda metade do século. Emigrava-se a partir do norte de Portugal, onde a população era mais elevada, devido à alta produtividade dos campos agrícolas.
No sul, nomeadamente no Alentejo, a população era muito reduzida. As grandes cidades localizavam-se todas na foz dos rios – Lisboa, Porto, Faro, Viana do Castelo, Aveiro ou Setúbal. Portugal era um país periférico, de pequeno mercado, sem matérias-primas e com baixo nível de instrução4.

Em janeiro de 1837, o governo de Passos Manuel promulgou a Pauta Alfandegária, dando sequência a um anterior esboço embrionário de Mouzinho da Silveira. Esta medida protecionista teve reflexos imediatos, duplicando os impostos sobre as importações nas receitas das alfândegas, aumentando as receitas do Estado. Tratando-se de um instrumento financeiro, a lógica da Pauta foi produzir receitas fiscais, e não a proteção da indústria. Havia uma enorme dívida pública antiga, em grande parte ampliada pela guerra civil (1828-1834), alimentada à custa de empréstimos externos. Apesar de, até ao final do século, o Estado português permanecer subsidiado, em receitas próprias, pelas taxas alfandegárias, estas receitas não resolveram o endividamento público5. Em termos produtivos, 85% do tecido populacional português era agrário. Desde meados do século que ocorriam fluxos migratórios temporários e definitivos do Norte para o Sul do território, devidos ao crescimento da agricultura cerealífera e ao aumento dos grandes empreendimentos públicos6.

À entrada do século XI , não existia em Portugal um sistema desenvolvido e coerente de transportes terrestres.
A opção marítima era, de longa data, a mais frequente, consolidada e económica. Afastado do litoral, o interior era acessível, a longa distância, com recurso à tração animal, muito difícil e dispendiosa. Tudo isto alterou-se no decurso da segunda metade do século, com a introdução do caminho-de-ferro e a construção de novas vias de comunicação7.

Nos espaços europeus mais precocemente industrializados, desde o último quartel do século anterior e princípios do século XI que se havia iniciado a construção sistemática de canais fluviais e outras vias de comunicação e obras públicas dentro dos territórios nacionais – estradas, canais, pontes, etc. Por oposição, em Portugal não houve esta fase antecedente e o primeiro troço ferroviário surgiu apenas em 1856. Este facto deveu-se às sucessivas crises institucionais e económicas que impediram o investimento público no desenvolvimento – em França, no mesmo período, um terço dos rendimentos do Estado foram investidos na construção e desenvolvimento de vias de comunicação.

Em 1852, a grande reforma das Finanças Públicas de Fontes Pereira de Melo permitiu atenuar o desequilíbrio da balança de pagamentos, consolidar as Finanças do Estado e, mais tarde, lançar um programa de construção de Obras Públicas.

Portugal começou a construir caminhos-de-ferro sem ter indústria do ferro. Não havia nenhuma siderurgia nem alto-forno a lenha. De qualquer forma, as necessidades de ferro para os caminhos-de-ferro nacionais não justificariam a existência e manutenção de uma empresa de alto-forno, mesmo que tradicional, a lenha. A partir de 1876, os carris passaram a ser de aço, em vez de ferro, mais fraco e deteriorável. Esta alteração piorou as hipotéticas necessidades de um alto-forno, aliado ao facto da qualidade do minério e do carvão mineral português não ser boa.

A quimera positivista fin-de-siècle na crença do progresso científico inquestionável, que suportou os expansionismos nacionalistas bélicos, alimentados pela industrialização, carente de matérias-primas em abundância, colocou as potências europeias em concorrência por recursos naturais. Em 1885, as principais nações europeias detentoras de territórios ultramarinos, ou com ambições a eles, e os EUA, acordaram na Conferência de Berlim a partição do continente africano para os seus interesses geoestratégicos, exploração de recursos e projetos coloniais.

Em 1891, a par dos ecos da crise política do Ultimatum inglês no ano anterior, ocorreu um salto na produção agrícola e no desenvolvimento dos caminhos-de-ferro8. Estes, tornaram-se importantes para a circulação de produtos agrícolas e de animais (gado), e a população aderiu rapidamente ao transporte ferroviário, serviço que se tornou a principal fonte de rendimentos e estimulou a mobilidade inter-regional9.

No final do século, o dinheiro havia sido gasto em juros, em obras públicas (principalmente em ferrovia), no Exército, na Marinha, nas Colónias, na Justiça e Negócios Estrangeiros. Neste período, a Alemanha tornara-se a principal credora de Portugal10 devido ao seu interesse nas colónias portuguesas para obtenção de matérias- -primas, de que necessitava para alimentar as grandes indústrias germânicas em poderosa ascensão.

No contexto do sul europeu, apesar do rápido crescimento da produção e do comércio externo desde meados do século XI – e até 1914 –, Portugal foi o país que mais lentamente cresceu. A balança comercial era cronicamente deficitária e a dívida pública aumentou. No discurso intelectual coevo, a “nação decadente” tornara-se uma realidade confrangedora de uma inevitabilidade inconsequente.

Na transição para o século X , a par da emergência do anarquismo, do socialismo e do anarco-sindicalismo, surgiram correntes de pensamento autoritárias que defendiam um Estado forte: o socialismo de Estado da Alemanha e a emergência de autoritarismos de direita, do antissemitismo e de nacionalismos anticapitalistas. Eram elementos extremamente contraditórios: por um lado, o socialismo anticapitalista, por outro, as miragens autoritárias que desembocariam nos totalitarismos da década de 1930.

Em Portugal, o rei D. Carlos comungou de uma ilusão de autoritarismo. A corte portuguesa era parcialmente uma casa privada e não detinha os recursos necessários para expor o fausto e tornar-se um símbolo nacional. Não conseguiu, por isso, ocupar o espaço do nacionalismo.

Num cenário de constante crise política e económica, e face à dificuldade dos governos em serem estáveis, o rei interveio cada vez mais, postura que acarretou uma quota de responsabilidade em tudo o que corresse mal. Em 1907, perante mais uma crise governativa, D. Carlos manifestou apoio e sancionou, de forma inequívoca, a solução de João Franco. Dissolvido o Parlamento, e mantida a ditadura de João Franco, o regime fechou-se e o monarca encontrou-se no epicentro da perturbação, e numa posição de irrefutável descrédito. Concorrente para a descredibilização da monarquia foram as permanentes dívidas dos adiantamentos à Casa Real, elementos que, na conjuntura, contribuíram para a deterioração da imagem de D. Carlos, principalmente no período antecedente ao seu assassinato no primeiro dia de fevereiro de 190811.

No seguimento do regicídio, o reinado de D. Manuel II já nada podia contra os ventos de mudança que se faziam sentir. Em 1910, e após várias tentativas falhadas de golpe pelos republicanos, a revolução de 5 de outubro depôs o rei, consagrou em definitivo o fim da monarquia constitucional e a separação entre o Estado e a Igreja – promulgada por lei no ano seguinte12. Em 1914, o assassínio do arquiduque da Áustria foi a espoleta para a 1ª Grande Guerra, que se esperava breve e lesta, mas que ficaria marcada na memória nacional pela batalha de La Lys, em abril de 1918, quase um ano depois da primeira aparição de Fátima, em maio de 1917. Entre 65 a 70% da população portuguesa era analfabeta13.

No mesmo ano, e a dois tempos, em março e novembro, consumou-se a queda da monarquia do czar Nicolau II da Rússia e consolidou-se o novo governo socialista soviético. Em dezembro, Sidónio Pais executou um golpe de Estado, obrigando ao exílio o presidente da República Bernardino Machado, e impôs um governo autoritário centrado na sua pessoa e na imagem de um presidente-rei absolutista. No ano seguinte, a primeira guerra de cariz industrial terminaria em novembro, com uma mortandade nunca antes prevista, e com graves consequências para as relações económicas e políticas europeias. No mês seguinte, Sidónio Pais foi assassinado na Estação do Rossio, em Lisboa, por um militante republicano.

A história do longo século X português desembocaria em modelos de governação autoritária e ditatorial, repressiva e policial, com o golpe militar de 1926 e a instituição do Estado Novo em 1933, e que só terminaria com uma nova revolução à entrada do último quartel do século14. Não obstante um crescimento económico e industrial sustentado e de abertura à economia mundial, a partir dos anos 1960, o crónico desfasamento com os mais desenvolvidos países europeus permaneceria em todos os índices de avaliação: político, social, económico, educação, saúde.

 

ASSISTENCIALISMO E CONDIÇÃO SOCIAL

A suscetibilidade das sociedades medievas e modernas, fechadas e de cariz corporativo, às diferentes crises que a assolavam – guerras, epidemias, clima adverso – era elevada, e a importância dos ciclos familiares na fortuna dos indivíduos era essencial. Desde a Idade Média que era fundamental o enquadramento religioso e cultural da dimensão cristã da beneficência caritativa, na abordagem da secular questão da pobreza, mendicidade e indigência15.

Numa perspetiva cronológica, desde o período medievo que o assistencialismo foi um suporte de amparo a pessoas com situações muito diversas, sendo assegurado por instituições distintas, como as mercearias, gafarias, hospitais, esmolas, albergarias, casas para pobres, confrarias, ordens religiosas e, já na Época Moderna, pelas misericórdias. O fenómeno da assistência operava como mecanismo fundamental no conceito da caridade cristã, exercendo também uma forma de controlo social16.

A grande novidade ocorreu com a criação fulminante das misericórdias a partir do final do século XV – sendo o momento matricial a Misericórdia de Lisboa, por suposta vontade da rainha viúva D. Leonor em 1498, contando-se documentadas, pelo menos, 43 durante o reinado de D. Manuel I17. O importante papel da mutação ideológica operada pelas misericórdias, que atuavam no âmbito espiritual, material e judicial, com abundante património, tornou-se visível nas isenções, benefícios e privilégios outorgados pelos monarcas, elevando-as à mais poderosa das instituições assistenciais em Portugal ao longo dos séculos seguintes.

Se estabelecermos uma correspondência nas sociedades europeias do Antigo Regime, entre o recrudescimento da repressão aos pobres e indigentes, as reformas e laicização de instituições assistenciais, e a progressiva implementação de uma visão capitalista liberal que exaltava as virtudes do trabalho, percebe-se a implicação ambivalente destes fatores, com diferentes pesos consoante as geografias, na consequente alteração do tratamento dispensado à população mais desfavorecida e carenciada, associando-a à criminalidade, às doenças, e ao ócio, considerados párias da sociedade, logo, viciosa e alvo de correção ou punição.

Em The Fable of The Bees: or, Private Vices, Publick Benefits (1714) Bernard Mandeville defendeu uma visão sobre os pobres como exército de mão-de-obra indispensável aos interesses da engrenagem social. A terminar o século XVIII, Thomas Malthus, em An Essay on the Principle of Population (1798), considerou a miséria humana e a pobreza como flagelos e uma ameaça à homeostasia social, que só a natureza poderia equilibrar, pois, o engenho humano não tinha a capacidade de lidar com o crescimento económico e demográfico insustentável. Indiferenciados, os pobres incluíam uma amálgama de diferentes situações socioeconómicas, onde se incluía uma larga maioria de trabalhadores e artesãos, pois a sua volatilidade às crises era enorme e, aliada à inexistência de elos de fixação sociais – propriedade, residência, emprego, família –, facilmente cairiam no pauperismo. Pela mesma razão, eram recrutados compulsivamente para integrar contingentes para a guerra.

No decorrer do século XI , a demografia rural e urbana transformou-se gradualmente por via da Revolução Industrial, com diferentes cronologias na geografia europeia. O impacto social da industrialização em grande escala foi enorme e acarretou implicações de ordem política, cultural e económica ímpares, por comparação com os anteriores sistemas de atividade e relações económicas nas sociedades europeias e norte-americana. Se a industrialização impulsionou novos modelos de desenvolvimento, acarretou também um novo potencial gerador de pobreza por via das crises económicas e da alteração dos paradigmas de trabalho, originando que largas fatias do operariado rural e urbano caíssem no desemprego e na miséria extrema.

Esta massa de população relativamente numerosa e frágil ganhou contornos de categoria social. Contudo, caracterizava-se, lato sensu, pela heterogeneidade, a qual, devido à sua composição e suscetibilidade às conjunturas, detinha fronteiras sociais fluidas. A partilha de traços comuns, entre eles a “incapacidade” de subsistência pelo trabalho, através de meios próprios, a ausência de direitos políticos, de propriedade e, muitas vezes, de residência, facilitaram a identificação generalista. Acrescente-se ainda que, a constante recorrência a estratégias para assegurar a sobrevivência, quer legais (assistência social, trabalho ocasional, casamento tardio, famílias nucleares, migração, mendicidade – quando autorizada); quer ilegais (revolta, prostituição, mendicidade – quando proibida –, crime ou delinquência), contribuiu para amalgamar num mesmo grupo de pauperismo, longe de homogéneo, os indigentes, mendigos, enfermos, desempregados, órfãos, inválidos e idosos. Numa fronteira porosa, situavam-se os operários, camponeses, servos, e escravos – porque detinham meios de subsistência (mesmo que precários) e residência fixa (mesmo que degradada e independentemente do vínculo) –, que alimentavam aquela camada social18.

Ao longo do século XI , aumentou a consciencialização progressiva da pobreza e da “cultura da pobreza” como um problema social e, tal como outras vertentes inerentes à sociedade, tornou-se objeto de estudo “científico” na esfera das investigações sociológicas, dos trabalhos etnográficos e antropológicos, da psicologia e da economia, na representação em obras artísticas, no domínio da literatura e das artes visuais19. Cresceu em importância e relevância nos debates públicos, na imprensa, nos parlamentos nacionais, nas sociedades filantrópicas, nas academias científicas e universitárias. Com a inexorável transformação das relações de trabalho operadas pelo capitalismo industrial e as visíveis consequências na condição social operária urbana –, um cenário que suscitou as sublimes, porque trágicas e belas, gravuras que ilustraram as urbes negras e sobrelotadas da época vitoriana do contemporâneo Gustav Doré –, as sondagens sobre as condições de vida do proletariado tornaram-se o terreno de eleição para vários estudos sobre a pobreza, no quadro das novas reflexões político-filosóficas que emergiam na Europa20.

Sublinhe-se que o mapa da pobreza do proletariado europeu ocidental no século XI não foi homogéneo nem linear, uma vez que os ritmos e a geografia do processo de industrialização, as crises das economias agrárias e manufatureiras, pré-industriais e industrializadas, e os contextos político, económico, demográfico, social, religioso e cultural eram heterogéneos entre os diferentes Estados-Nação, o que reflete a diversidade de situações específicas. Contudo, todos estes fatores de dimensão estrutural e conjuntural, e a aceleração indomável da industrialização, concorreram para os efeitos depauperativos da massa de trabalhadores, urbanos e rurais.

Embora no quadro mental dominante se insistisse na atribuição à mendicidade um carácter de crime, já no final do século XI , e como culminar da progressiva dissociação entre as questões penal e social, verificou-se uma tendência para a despenalização dos “desempregados” temporários e indigentes involuntários, categorias onde caíam uma larga percentagem de operários e famílias que gravitavam na esfera das indústrias e fábricas. O papel político intervencionista do Estado, herdeiro do Iluminismo, reforçou-se e acentuou a conceção do individualismo liberal assente na propriedade, cidadania e trabalho. Por isso, é possível identificar na continuidade do problema da pobreza novos instrumentos para a mitigar e coartar, embora em contextos diferenciados e em transformação. Estas novas condições refletiram-se, necessariamente, nas formas de assistência e repressão. Na assistência consolidaram-se as propostas institucionais – eclesiásticas, privadas, filantrópicas –, contudo, persistiu a repressão do Estado, consubstanciada por leis e pela prisão. Na geografia da assistência e repressão, distinguiram-se pela precocidade os casos da Inglaterra, França e Holanda21. Em Portugal, o Código de 1852 punia a mendicidade, a embriaguez ou a prostituição, mas estabelecia a proteção através das freguesias e dos asilos a pobres “virtuosos”, crianças abandonadas, idosos e estropiados, entre outros22.

Com o novo regime constitucional saído da assinatura da convenção de Évora-Monte a 27 de maio de 1834, a nova organização administrativa do reino e do poder hierárquico no território nacional, em distritos (pelo governador civil), concelhos (em dupla estrutura, de administração e representação do Estado, e de representação autárquica, a câmara municipal) e paróquias (as freguesias), as misericórdias, hospitais e confrarias encontraram-se sujeitas a forte escrutínio e fiscalização por parte dos governadores civis, ao abrigo das novas jurisdições sobre a matéria. Apesar dos conflitos vários ao longo das décadas seguintes, de afrontas e choques, as misericórdias permaneceram estabelecimentos essenciais de caridade e filantropia, e continuaram a prestar serviços assistenciais fundamentais às camadas mais carenciadas da população23.

Já no período da República, apesar de alterações no enquadramento, regulamentação e financiamento das instituições de beneficência, das graves dificuldades económicas que enfrentaram e, mais tarde, das aproximações e ambiguidade, na anuência às soluções políticas advindas em 1926 e em 1933, o papel meritório e indispensável das misericórdias permaneceu reconhecido no campo da assistência sanitária, como foi prova o desempenho decisivo durante o surto epidémico pneumónico de 1918-191924.

Note-se que a população agrícola permaneceu maioritária na demografia portuguesa, até bem tarde no século X , enquanto o proletariado constituía uma minoria e concentrava-se, sobretudo, em Lisboa e no Porto. Nestas cidades, a mortalidade urbana era superior à rural, devido a doenças, sobretudo gastrointestinais e do foro respiratório, resultantes das deficientes condições de higiene associadas ao fornecimento de água e aos sistemas de esgoto, e à péssima qualidade do ar em espaços fechados. A elevada taxa de mortalidade infantil espelha a alta vulnerabilidade das crianças. Nas camadas populares, e no seio das famílias operárias25, o acesso a roupa nova era muito difícil. Possuir vários jogos de roupa limpa era um sinal de distinção social, que a maior parte dos operários não tinha condições de assegurar. A higiene corporal era um ritual ocasional e não uma prática regular. Tomar banho era caro e trabalhoso, havia que comprar a água, transportá-la e aquecê-la.

Não é de estranhar, por isso, que a par da consolidação de instituições de tipo protetor, assistencialista, hospitalar e dedicadas à instrução popular, com ramificações em todo o território, as correntes de pensamento inspiradas em Owen, Fourier e Proudhon, tenham tido impacto em novos modelos de assistencialismo, nomeadamente na ampliação de uma cultura associativa e cooperativa operária que encontrou na criação das associações de ajuda mútua a sua expressão máxima, multiplicando-se velozmente ao longo da segunda metade do século XI – sobretudo desde o último quartel e até à primeira década do século X , sob o efeito da Comuna de Paris na expressão social e política dos trabalhadores26. O mutualismo, materializado em centenas de sociedades de socorros mútuos e caracterizado como uma forma de organização coletiva centrada em exclusivo nos interesses dos associados – homens, mulheres, ou mistas –, teve como objetivo a salvaguarda e proteção dos trabalhadores e suas famílias em casos de acidente, invalidez, doença, prisão ou morte, tornando-se a expressão paradigmática da cultura associativa do proletariado27.

A partir dos anos 1930, e após um enfraquecimento do movimento mutualista, o Estado Novo defendeu e promoveu a acomodação das associações de socorros mútuos a um modelo corporativo de Estado, moldado na política da moral, do altruísmo e fraternidade católica, reduzindo a expressão militante associativa de classe traduzida na vigilância institucional da beneficência e assistência pelo Estado, incorporadas numa rede de outras instituições de educação, saúde e assistência28.

 

*

 

O conjunto de fotografias que integra esta secção, sobretudo do primeiro quartel do século X , ilustra algumas das dimensões associadas à condição social dos trabalhadores e operários, e ao assistencialismo, embora se estendesse e abarcasse todo um conjunto mais vasto de indivíduos numa população desfavorecida, e não necessariamente empregada nas indústrias. Estas fotografias representam e apresentam o olhar e perspetivas de diferentes autores, em vários contextos de produção, sobre a mendicidade, a pobreza, o desemprego, a indigência, os mecanismos de assistencialismo, os asilos, os abrigos, as esmolas, os recolhimentos de órfãos, as cozinhas económicas, a sopa dos pobres, as creches e escolas maternais, os sanatórios e dispensários.

 

 

Adolescente operário, largo de Santa Bárbara, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Alberto Carlos Lima, 9x12 cm, [191-]. Arquivo Municipal de Lisboa (AML), PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/LIM/000876.

 

 

 

 

Vila Dias, Beato, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Alberto Carlos Lima, 9x12 cm, [191-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/LIM/000883.

 

 

 

 

Vila operária não identificada, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Alberto Carlos Lima, 9x12 cm, [191-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/LIM/000868.

 

 

 

 

Entrada do antigo Colégio dos Meninos Órfãos, Recolhimento do Amparo, com inúmeras ocupações desde a sua fundação em 1549, atualmente posto da Polícia de Segurança Pública e espaço recreativo INATEL, rua da Mouraria, 64, Lisboa, negativo de gelatina e prata em poliéster, Joshua Benoliel, 9x12 cm, [191-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/000607.

 

 

 

 

Portal de entrada para o oratório do antigo Colégio dos Meninos Órfãos, denominado Ermida da Senhora da Guia, rua da Mouraria, 64, Lisboa, pátio interior, negativo de gelatina e prata em vidro, José Artur Leitão Bárcia, 13x18 cm, anterior a 1907. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/BAR/000911.

 

 

 

 

Bazar de sorteios e peditório para a sopa dos pobres, organizado pelo jornal O Século, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Alberto Carlos Lima, 9x12 cm, [ca 1900]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/LIM/001395.

 

 

 

 

Rainha D. Amélia em visita ao Dispensário Dona Amélia, rua Saraiva de Carvalho, Prazeres, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, anterior a 1908. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/002603.

 

 

 

 

Cozinha N.º 6 da Sociedade Protectora das Cozinhas Económicas de Lisboa, inaugurada em 1906, servia maioritariamente operários, rua de São Bento, 140, entre as travessas da Arrochela e da Peixeira, negativo de gelatina e prata em vidro, Machado&Souza Fl., 13x18 cm, 1908. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/003/FAN/000875.

 

 

 

 

Dispensário de Alcântara, inaugurado em 1893, posto médico de puericultura e prevenção da tuberculose, gaveto entre a avenida Infante Santo e a rua Tenente Valadim, antiga freguesia dos Prazeres, atual Estrela, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1910. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/002862.

 

 

 

 

Reabertura das cozinhas económicas, Sociedade Protectora das Cozinhas Económicas, fundada pela 3.ª duquesa de Palmela, Maria Luísa Holstein, e pela sua prima, Maria Isabel Saint-Léger, Palácio dos Viscondes de Lançada, rua do Século, 51-59, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1910. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/001435.

 

 

 

 

Refúgio e Casas de Trabalho, da Provedoria Central da Assistência de Lisboa, fundado em 1905, após 1926 Asilo Dom Nuno Álvares Pereira, antigo Mosteiro da Visitação de Santa Maria, rua Alexandre de Sá Pinto, 26, Belém, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1915. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/001544.

 

 

 

 

População aguarda a abertura de um armazém regulador de preços, instituídos por Sidónio Pais, na rua da Junqueira, 158, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1918. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/001437.

 

 

 

 

Sidónio Pais visita a sopa dos pobres, a cargo da Obra de Assistência 5 de Dezembro, instituição assistencial criada por Sidónio Pais em 1918, no Asilo Dona Maria Pia, criado em 1867, Largo Marquês de Nisa, Xabregas, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1918. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/001727.

 

 

 

 

Sidónio Pais agradece as manifestações populares, na inauguração da distribuição da sopa aos pobres, a cargo da Obra da Assistência 5 de Dezembro, rua da Mouraria, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1918. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/001442.

 

 

 

 

Fornecimento de géneros alimentícios distribuídos e tabelados pelo governo, Armazém Geral Agrícola de Lisboa, largo do Terreiro do Trigo e rua Cais de Santarém, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1918. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/001443.

 

 

 

 

Refeição de assistência a crianças e mulheres pobres, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Eduardo Portugal, 6x9 cm, 1924. AML, PT/AMLSB/POR/000829.

 

 

 

 

Balneário da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, rua da Esperança, 51, Estrela, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, [191-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/000341.

 

 

 

 

Convento dos Moinhos, fundado em 1780, onde funcionou o Recolhimento de Nossa Senhora do Monte Carmo, ou Recolhimento de Meninas Orfãs Desamparadas, extinto em 1910, e demolido nos anos 1990 para acolher a Expo 98, Santa Maria dos Olivais, Lisboa, >negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Filmarte, 6x8,5 cm, [19-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/FIL/000121.

 

 

 

 

Asilo de Santa Catarina, extinto Convento de S. João Nepomuceno, dos Carmelitas Descalços alemães, foi a partir de 1858, asilo e internato feminino, passando a integrar a Casa Pia de Lisboa em 1972, acesso pela calçada de Salvador Correia de Sá, Misericórdia, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Eduardo Portugal, 10x15 cm, 1948. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/EDP/000842.

 

 

 

 

Creche Fortunato de Abecassis, pertencente à fábrica Lusalite, Cruz Quebrada-Dafundo, Oeiras, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Artur João Goulart, 6x6 cm, 1961. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/AJG/002402.

 

 

 

GREVE E MANIFESTAÇÃO COMO INSTRUMENTOS REIVINDICATIVOS

A partir de 1851, com o governo da Regeneração, começaram os primeiros grandes empreendimentos de infraestruturas e obras públicas, que acolheram milhares de trabalhadores. A par deste desenvolvimento, que permitiu alargar e unificar o mercado interno, cresceram as indústrias a um ritmo regular. Em 30 anos, até 1881, o setor industrial sofreu um incremento enorme, sextuplicando os números do inquérito de 185229. Neste mesmo ano, fundou-se o Centro Promotor dos Melhoramentos das Classes Laboriosas, e em agosto de 1853, foi criada a Comissão Promotora das Associações Operárias, que se declarava apolítica e, para além de colaborar com as existentes, se predispunha a organizar a criação de novas associações por todo o país.

Em 1881, o novo Inquérito Industrial declarava que existiam cerca de 90 mil operários, dos quais 39% eram mulheres jovens e 12% crianças. Na última década do século, havia um excedente de mão-de-obra operária em Lisboa, enquanto escasseava nas áreas rurais30. Apesar do crescimento ser substancial e inequívoco, ainda assim, a população operária era bastante mais reduzida e frágil por comparação com outros espaços da Europa industrializada, nomeadamente o inglês e o francês, com um movimento operário já consolidado.

A decomposição das atividades pré-industriais, a permanência e transformação da pequena unidade de produção em sistema de oficina, e a consolidação das médias e grandes operações industriais, foram acompanhadas pela difusão de ideais e propostas anarquistas, socialistas, comunistas, anarco-sindicalistas, e outras, trazidas pelos ventos que transformavam o pensamento político. Parte destes grupos defendeu a ação direta revolucionária, a luta e o confronto como meios de combate efetivo, abdicando de projetos públicos comemorativos ou festivos. Outros, preferiram a ação sindical, mais sensíveis na colaboração com os republicanos. Todos socorreram-se da exposição pública das suas ideias e vozes proporcionada pelo periodicismo em explosão como veículo de disseminação e sedução31. Para além dos sindicalismos republicano e revolucionário, despontou também um sindicalismo católico, sobretudo no norte de Portugal32. Para almejar a rutura da hegemonia que os socialistas possuíam sobre os órgãos de classe, o radicalismo operário associou-se às lutas quotidianas, procurando assumir o protagonismo da iniciativa, pretendendo capturar os operários rurais do Sul, o grupo mais numeroso do proletariado português, cujas formas de resistência próprias tinham ate´ ai´ ficado a` margem do movimento organizado33.

A expressão reivindicativa proletária adquiriu crescente visibilidade no último quartel do século, com a manifestação pública dos trabalhadores concertados por motivações comuns, de uma forma organizada e dotada de consciência de classe, o que, antes, não era evidente. No início de 1891, realizou-se em Lisboa o II Congresso das Associações de Classe onde se fizeram representar 50 associações e núcleos operários de todo o país.

A partir dos últimos anos do século XI , a influência anarquista sobre o movimento operário acentuou-se e, fiéis ao primado de independência de Bakunine, destacaram-se nas atividades sindicais e na defesa de um sindicalismo autónomo dos partidos políticos. As duas maiores concentrações operárias situavam-se em torno de Lisboa e Porto e foi, sobretudo, na capital que se verificou a maior combatividade anarco-sindicalista34.

Embora toleradas, o Código Penal criminalizava as greves. Antes dos grandes surtos grevistas, a greve não era um facto social relevante. A reunião organizada de trabalhadores havia sempre sido associada e gerada como insurreição, encarada como uma alteração da ordem pública e, como tal, tratada pelos poderes do Estado através da repressão pelas forças policiais35.

Apesar dos insuficientes dados disponíveis, é seguro afirmar que o primeiro grande impulso grevista terá ocorrido entre 1871-73, coincidente com a progressiva consciência de classe e de um socialismo operário, em sintonia com os ecos da Comuna de Paris e do seu espírito, e dos rebates nas Conferências do Casino, entre maio e junho de 1871. As condições base da emergência e organização das lutas e reivindicações proletárias conjugaram-se com o crescimento da indústria e do número de trabalhadores operários36. Com avanços e recuos, recrudescimento e retrações, que se traduziram numa maior conflitualidade social – greves, repressão, reivindicações, cedências, violência de parte a parte –, as lutas operárias cresceram de intensidade e em número.

À porta da crise de 1890, o proletariado conseguiu algumas importantes vitórias consubstanciadas na promulgação da legislação sobre o trabalho operário. Os regulamentos de 10 de fevereiro e de 7 de agosto desse ano, de 14 de abril de 1891 e, mais tarde, de 16 de março de 1893, promulgaram algumas importantes alterações na proteção ao trabalho dos menores e das mulheres, estabelecendo os mínimos de idade, as condições de emprego, a duração da jorna, o repouso semanal, os requisitos de higiene e segurança, entre outros aspetos. Para as mulheres conseguiu-se um período de isenção de 4 semanas após o parto, a obrigatoriedade de existir uma creche e o usufruto de intervalos de tempo para lactância no período de trabalho37. No entanto, a aplicação foi frágil, pouco eficaz, e acarretou um efeito perverso, promovendo a ausência do registo de mulheres e crianças. Para além da diminuição de custos com salários, desqualificação, e de uma maior eficácia na aplicação de mecanismos de coação, o emprego de mulheres e crianças procurou, em alguns setores, diminuir a influência do operariado masculino, mais combativo, reivindicativo e virulento. Após a formação do governo de João Franco em 1906 e dos decretos ditatoriais do ano seguinte, em 1908 ocorreram graves tumultos em Alcântara.

Nos anos subsequentes à instauração da República acentuou-se o movimento grevista, reflexo da capacidade de combate, da propaganda e do envolvimento do anarco-sindicalismo.

Em 1911, regulamentou-se o descanso semanal obrigatório ao domingo, e existiriam 356 sindicatos em todo o país, a maioria fundada no ano imediatamente anterior, e organizou-se o congresso anarco-sindicalista em novembro. Três anos depois, no congresso operário de Tomar, foi criada a União Operária Nacional (UON). Em julho de 1917 foi declarado o estado de sítio em Lisboa e nos concelhos limítrofes devido ao forte movimento grevista. Dois anos mais tarde, no II Congresso Nacional Operário foi criada a Confederação Geral do Trabalho (CGT), com predominância do sindicalismo revolucionário, apologista da luta de classes e da revolução38. Em maio do mesmo ano, em Lisboa, a UON conseguiu mobilizar 30.000 trabalhadores em manifestação onde, entre o clamor, se elogiou a revolução soviética de 1917.

A expansão e lutas sindicalistas atingiram o seu auge neste período e, até 1926, com múltiplos desenvolvimentos (surtos grevistas, greves gerais, ruturas, fracassos, violência, reivindicações, confrontos, cisões, repressão, declarações de estado de sítio, prisões) esteve frequentemente na ofensiva, concretizadas por metalúrgicos, ferreiros, torneiros, serralheiros, corticeiros, ferroviários, varinas, trabalhadores da CUF, da Carris, dos correios, dos telégrafos, dos têxteis e dos tabacos, entre tantos outros39.

As imensas reivindicações encontravam-se ligadas à melhoria das condições de vida e de trabalho dos operários, relativamente à duração da jorna, à precariedade dos vínculos, à arbitrariedade dos despedimentos, aos acidentes de trabalho, à variação dos salários, ao descanso semanal e à revogação de leis antigas40.

Em dezembro de 1924, Lisboa assistiu ao início de um ciclo de grandes manifestações populares contra a carestia de vida e os baixos salários. No ano seguinte, em resposta à ação direta de elementos da Legião Vermelha e à contestação da CGT, foram deportados para as colónias, sem julgamento, sindicalistas e revolucionários. Depois do golpe militar de 28 de maio de 1926, as estruturas sindicais de maior relevo ainda contemplaram a hipótese de uma greve geral revolucionária como forma de combate à perspetiva da ditadura militar que despontava no horizonte.

Durante os anos seguintes, várias greves gerais conseguiram vitórias pontuais com paralisações e a expressão de um movimento sindical que tentava acompanhar as revoltas que amiúde eclodiam, procurando derrubar o governo militar de Portugal, mesmo com violência, atos de sabotagem, greves, manifestações e uma cerrada luta que conseguisse na união de todos os trabalhadores sob o ideal anarco-sindicalista, a força necessária para o derrube da ditadura. O prospeto de uma vitória não se verificou, o malogro das várias ações e uma crescente divisão e enfraquecimento em várias correntes sindicais que almejavam a hegemonia sobre o movimento operário, e uma violenta repressão sobre os quadros sindicais e os trabalhadores, ditaram a falência de uma utopia sindical revolucionária.

Em 1933, o novo quadro legislativo tornou a greve ilegal, privou os trabalhadores de quaisquer formas de luta e reprimiu duramente quaisquer veleidades reivindicativas com pesadas penas de prisão. O cenário de resistência revolucionária tornou-se uma miragem e desarticulou-se. O enquadramento do trabalho industrial e latifundiário e a ação sindical encontraram-se enquadrados e condicionados em definitivo sob o colete de forças corporativo desenhado pelo Estado Novo41.

 

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As fotografias que integram esta secção, retratam, sob o olhar de um único fotógrafo, para além da diversidade dos setores do trabalho, onde figuram trabalhadores masculinos e femininos, os espaços da cidade onde ocorreram as contestações e o trânsito de manifestantes, a reação à captação das imagens, o vestuário e alguns aspetos do aparelho policial e da exibição pública dos mecanismos de repressão e controlo do aparelho do Estado, numa cronologia que reflete o período de auge das reivindicações dos trabalhadores e sindicatos, entre o início da República e o golpe militar de 1926.

 

 

Operários têxteis entregam no Parlamento uma petição sobre a lei dos acidentes de trabalho, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1911. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/001476.

 

 

 

 

Operários da indústria têxtil a caminho de São Bento para entregar uma petição pedindo o horário de trabalho de 8 horas e outras regalias, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1911. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/001473.

 

 

 

 

Operárias da indústria têxtil, frente ao palácio de São Bento, onde entregaram à Assembleia Constituinte um pedido de horário de 8 horas e outras regalias, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12cm, 1911. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/001377.

 

 

 

 

Grevistas da panificação aguardam a comissão que foi agradecer a promulgação do decreto sobre o descanso semanal, Praça do Comércio, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1911. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/001413.

 

 

 

 

Operárias da Companhia União Fabril em greve, Alcântara, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1911. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/001096.

 

 

 

 

Greve dos elétricos, grevistas reunidos num comício no Terreiro do Trigo, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1912. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/001447.

 

 

 

 

Operários em greve promovida pela União dos Sindicatos Operários, frente à redação do jornal O Século, rua do Século, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1912. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/001479.

 

 

 

 

Grupo de manifestantes presos por ocasião da greve geral, com a suspensão de garantias, em direção ao forte de Monsanto, Belém, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1912. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/001179.

 

 

 

 

Casa Sindical, sede das associações operárias, Palácio Pombal, rua do Século, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1912.AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/001475.

 

 

 

 

Varinas manifestam-se pelo direito de comprar peixe no mercado de Santos, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1912. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/001461.

 

 

 

 

O Rossio depois de decretado o estado de sítio, na sequência da greve do operariado em Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1912. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/001183.

 

 

 

 

Greve dos estivadores, antigas docas frente ao largo do Museu da Artilharia, fachada do Museu Militar, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1912. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/001381.

 

 

 

 

Largo de São Domingos ao Rossio durante a greve geral, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1912. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/002723.

 

 

 

 

Greve dos trabalhadores dos elétricos, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1912. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/000433.

 

 

 

 

Varinas em greve pelo direito de comprar peixe no novo mercado, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1913. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/000108.

 

 

 

 

Guarda Nacional Republicana junto à Central Tejo durante a greve dos elétricos, Belém, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1916. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/000432.

 

 

 

 

Reunião da Assembleia Geral do Sindicato dos Empregados do Comércio e da Indústria, para nomeação dos elementos encarregados de fiscalizar o horário de trabalho, Palácio Almada, Largo de São Domingos, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, autor não identificado, 9x12 cm, 1926. AML, PT/AMLSB/EFC/000016.

 

 

 

ESPAÇOS DE TRABALHO: INDÚSTRIAS, FÁBRICAS E OFICINAS

Apesar de todas as dificuldades e vicissitudes, a indústria portuguesa cresceu sistematicamente ao longo do século XI , em função de uma adaptação às particularidades e limitações nacionais. Em meados do século, nos meios urbanos e em atividades semi-industriais, continuava a haver mais artesãos que operários, com uma participação sempre ativa na defesa de direitos e privilégios corporativos<42, e seria um erro julgar que os artesãos desapareceram no final de novecentos. Se por um lado, as grandes máquinas nas unidades fabris exigiam vários trabalhadores para as operar, o pequeno motor facilitou a criação e manutenção de pequenas unidades artesanais.

Nas cidades mais importantes – Lisboa, Porto, Braga, Aveiro, Coimbra, Évora –, convergia a totalidade dos ramos artesanais. As maiores unidades fabris concentravam-se em Lisboa, embora houvesse mais indústrias na zona do Porto.

Cresceram as indústrias do ferro, no mobiliário urbano e doméstico (camas, varandas, guardas, grades, corrimões, candeeiros, portões, coretos, pavilhões, entre muitas outras aplicações). As empresas de metalurgia portuguesas conseguiam fazer estas peças recorrendo à importação de ferro, sobretudo da Suécia, cuja produção era de alta qualidade para utilização nas pequenas indústrias. Por outro lado, as empresas portuguesas não tinham a capacidade nem a qualidade para produzir e construir grandes máquinas industriais, que tinham de ser importadas dos principais centros industriais europeus.

A única indústria clássica da revolução industrial em que Portugal possuía matéria-prima, era a lã. Progressivamente, as cidades tornaram-se grandes consumidoras de carvão e lenha originando períodos de escassez e de concorrência elevada. Devido aos protestos, a indústria do vidro foi transferida para a Marinha Grande, onde já não havia concorrência urbana para o consumo de carvão, embora, a nível nacional, não existisse carvão de qualidade. Nas indústrias não clássicas, para as quais Portugal já possuía matéria-prima, contavam- -se o cimento, cerâmica, papel, cortiça, destilação do vinho e bagaço, lanifícios, fiação e tecidos de algodão, linho e seda, cordoaria, chapéus, artefactos de cortiça, curtumes, explosivos, fósforos, fundição, louças e cerâmicas, vidro, papel, tabaco, conservas43.

Na segunda metade do século XI , o Douro encontrou-se em crise na produção e exportação de vinho, que havia sido um dos produtos essenciais durante o século XVIII, em sequência do Tratado de Methuen. Ainda assim, a indústria do vinho empregou muitas pessoas e foi um produto altamente exportável, fundamental no desenvolvimento português. Mesmo com a crise dos vinhos de 1890, Portugal ultrapassou as dificuldades do mercado, ao começar, paulatinamente, a exportar vinho para as colónias, fomentando o seu consumo e a emergência de um novo mercado. Para além do propósito económico de expansão do mercado e suplantação da crise, o alcoolismo em África desempenhou um papel instrumental na dominação colonial, pela dependência que criou e fomentou, agravado pela facilidade de fabrico de álcool a partir do arroz, milho, cana sacarina ou batata doce44.

A par do estímulo na exploração colonial, em anos de crise económica e de perturbação da vida política continuou a verificar-se um crescimento industrial e, a partir de 1890, houve um aumento substancial de indústrias sob a forma de sociedades anónimas.

Como se sabe, a intensificação da produção e das mais-valias do trabalho promoveu a necessidade de mão-de-obra, geralmente precária e de baixo custo, onde se incluíam mulheres e crianças, a que correspondeu difíceis e deficientes condições de trabalho e de vida dos operários e suas famílias. As crianças eram empregues na indústria e na agricultura assim que tivessem autonomia e destreza motora, sacrificando uma educação a que não tinham acesso para trabalhar com muito poucos, ou nenhuns, direitos, em duras condições, sem remuneração como aprendizes, ou por parca recompensa.

Mas, à variedade e complexificação da atividade industrial urbana correspondiam diferenças nas qualificações e instrução dos trabalhadores, e nas condições de trabalho nos espaços das oficinas e fábricas.

A produção industrial foi-se transformando no compasso das inovações tecnológicas e ao ritmo das necessidades de produção, transformação e manufatura. No espaço da fábrica, era comum o horário de trabalho ser de doze horas diárias, seis dias por semana, sem períodos de descanso, uma disciplina férrea e um apertado controlo. Esta disciplina fabril foi uma mudança em relação à pequena unidade de oficina, que se caracterizava pelo relacionamento pessoal e por uma gestão própria dos horários, dos ritmos, do comportamento e do espaço de trabalho. A imposição concentrada desta disciplina de fábrica aos grupos de operários e técnicos, envolveu a fiscalização do cumprimento das tarefas e a vigilância da conduta, com reflexo, muitas vezes, na retribuição salarial de acordo com a produção e o comportamento individual na fábrica. A progressiva mecanização e complexidade tecnológica, a especialização e a escalada de produção, trouxe também a burocratização e hierarquização da organização do espaço da fábrica, promovidas e orientadas para o fluxo de produção.

Os espaços de trabalho fabril eram no dealbar do século X , lugares de pouca higiene, fraca iluminação e circulação de ar, e débil segurança, propícios ao acidente e à doença, sobretudo por contaminação, infeção ou envenenamento. Acrescente-se as grandes debilidades no alojamento, na subsistência e na alimentação, aliados à precariedade dos vínculos de trabalho, e obtém-se a receita para as difíceis condições de vida do proletariado em geral45.

Do lado dos empreendedores industriais, o mapa português era extremamente ambivalente. Existia um polo de grandes industriais da alta sociedade e, por outro lado, um grupo oriundo do mundo rural que se dedicava à pequena indústria. O primeiro grupo era detentor de grandes fortunas, enquanto o segundo grupo caracterizava-se por um acumular, lento, mas progressivo, de capitais pelo trabalho gerado.

Os banqueiros pouco investiam na indústria. Contudo, foi a própria industrialização que produziu o desequilíbrio da balança comercial. Aumentaram as importações de matérias-primas (para além das constantes importações de produtos alimentares – cereais – incrementadas pelo aumento da população) e não houve compensação com as exportações. A cobertura iria diminuir paulatinamente ao longo do século X , desde os finais do século anterior.

Não obstante a libertação das forças produtivas e das importantes modificações estruturais, com reflexo num rápido crescimento da produção e do comércio externo desde meados do século XI e até ao início da 1ª Grande Guerra, Portugal não conseguiu acompanhar o ritmo das economias mais desenvolvidas. Na longa discussão da historiografia portuguesa para as causas do atraso económico, Miriam Halpern Pereira enfatizou a existência de grandes latifúndios no sul do país e a excessiva especialização agrícola, em paralelo com a associação do livre-cambismo, para a estagnação industrial, enquanto Jaime Reis destacou a enorme deficiência de capital humano, num feixe que articula o atraso económico ao atraso social e educativo dos agentes económicos, que pouco poderiam fazer para ultrapassar, no imediato, essas condições46.

Após 1926, o domínio normativo do Estado sobre a organização das formas de produção, criou as condições que entendeu necessárias para a consolidação de um plano de industrialização nacional de iniciativa estatal, desenhado e titulado à medida das ambições e capacidades do regime militar.

A partir da década de 1930, entre a desconfiança num acelerado fomento industrial, que inevitavelmente reproduziria uma mole de operários vista com alarme para a “paz social” do Estado Novo, e a necessidade de recuperar setores vitais do país para acompanhar o ritmo económico mundial, radicava a incógnita dualidade do ruralismo enquadrado numa ideia política tradicionalista de família e moral, e os fundamentos progressistas defensores de uma industrialização nacional, que algumas áreas da sociedade pugnavam, de forma a Portugal abraçar e acompanhar a economia mundial47.

A estratégia configurada pelo Estado, enquadrada e condicionada pelo regime corporativo, iria, a partir dos anos 1930, potenciar o aumento contínuo, regrado e espartilhado de um processo de industrialização que, não obstante um papel vital em alguns setores e por via das ruturas e carências da economia de guerra – o que lhe permitiu, apesar das dificuldades e condicionamentos, um impulso localizado e pontual neste período –, continuaria subdimensionado por comparação aos padrões da Europa ocidental. Ajustado ao mercado interno, satisfazendo e perpetuando um cenário de estabilidade sem grandes projetos que pudessem irromper a normalidade das relações sociais, económicas e políticas, a industrialização de Portugal só sofreria alguma potenciação com o arranque de grandes empreendimentos públicos já na segunda metade do século48.

Os espaços do trabalho, as fábricas e oficinas, altamente regulados e disciplinados, diversificaram-se e, consoante os setores de atividade, mecanizaram-se à medida das possibilidades tecnológicas. Embora algumas grandes indústrias se tenham modernizado por via da sua própria exigência, libertando-se de espaços fechados, de iluminação deficiente e ar saturado, muitas outras continuaram a laborar em condições de higiene e segurança precárias. Para além do espaço físico, os ritmos, horários, relações e direitos operários permaneceram soterrados na pirâmide das prioridades do capitalismo industrial, para o qual os anseios dos trabalhadores pouco contava. No outro prato da balança do Estado, e de forma a procurar um equilíbrio simulado, a Fundação Nacional para a Alegria no Trabalho – criada em 1935 e extinta em 1974 – propunha e oferecia atividades de lazer, recreio, cultura e desporto, uma promoção paternalista e fantasiosa da condição física e psicológica dos trabalhadores, para a “valorização do trabalho nacional”, que almejava dirimir o descontentamento e anular quaisquer veleidades de classe49.

 

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As fotografias que se apresentam nesta secção, distribuem-se em dois grupos cronológicos distintos. O primeiro entre a última década do século XI e os primeiros anos do século seguinte, enquanto o segundo se concentra desde o início do Estado Novo até aos anos 1960. Apesar deste segundo grupo se encontrar fora do âmbito cronológico, pode servir como material visual de indústrias cujo passado não se encontrava assim tão distante. Pese embora a distância tecnológica, são registos onde se encontram vestígios de ambientes e formas de organização do trabalho que remontam à décadas anteriores. Na sua maioria, estas fotografias retratam operários nos seus locais de trabalho, em oficinas e fábricas de indústrias diversas, quer do setor base, ou bens de produção, do setor de bens intermediários e, ainda, dos bens de consumo. Por vezes em pose expectante ou em registo desprevenido, as fotografias permitem observar homens, mulheres e crianças em trabalho, a divisão de género, os espaços, as máquinas, ou o vestuário. Numa subcamada, é de salientar as composições que os diferentes fotógrafos idealizaram e realizaram, seja na utilização da luz, mais dura ou mais difusa, conseguindo uma qualidade pictórica ora grosseira, ora singela, a que, porventura, não será alheia a cronologia.

 

 

Trabalhadores adultos e crianças numa serração, negativo de gelatina e prata em vidro, autor não identificado, 18x24 cm, [ca 1890-192-].AML, PT/AMLSB/NEG/000373.

 

 

 

 

Dirigentes e operários da fábrica de cimento em Alcântara, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Francesco Rocchini, 30x38 cm, [ant 1893].
AML, PT/AMLSB/ROC/000101.

 

 

 

 

Operários adultos e crianças numa oficina de metalomecânica, negativo de gelatina e prata em vidro, Alberto Carlos Lima, 13x18 cm, [191-].AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/LIM/002903.

 

 

 

 

Operários adultos e crianças numa oficina de móveis metálicos, negativo de gelatina e prata em vidro, Alberto Carlos Lima, 13x18 cm, [191-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/LIM/002904.

 

 

 

 

Operário na forja de metal, oficina de ferreiro, indústria metalúrgica, negativo de gelatina e prata em vidro, Alberto Carlos Lima, 13x18 cm, [191-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/LIM/002910.

 

 

 

 

Operários adultos e crianças numa oficina de torneiro mecânico, negativo de gelatina e prata em vidro, Alberto Carlos Lima, 13x18 cm, [19-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/LIM/002915.

 

 

 

 

Operários numa oficina de latoeiro, negativo de gelatina e prata em vidro, Alberto Carlos Lima, 13x18 cm, [19-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/LIM/002923.

 

 

 

 

Operários adultos e crianças numa oficina de fresa e torneiro mecânico, negativo de gelatina e prata em vidro, Alberto Carlos Lima, 13x18 cm, [19-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/LIM/002900.

 

 

 

 

Operários numa oficina de ferreiro, indústria metalúrgica, negativo de gelatina e prata em vidro, Alberto Carlos Lima, 13x18 cm, [19-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/LIM/002902.

 

 

 

 

Máquinas industriais no interior de uma fábrica, negativo de gelatina e prata em vidro, Alberto Carlos Lima, 13x18 cm, [19-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/LIM/002898.

 

 

 

 

Operários metalúrgicos em trabalho numa fundição, negativo de gelatina e prata em vidro, Alberto Carlos Lima, 9x12 cm, [19-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/LIM/001599.

 

 

 

 

Operários na descarga de carvão na Fábrica de Gás da Boavista, avenida 24 de Julho, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, 1907. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/000566.

 

 

 

 

Operários do estaleiro naval onde foi construído o contratorpedeiro Douro, reunidos no castelo da proa do navio, negativo de gelatina e prata em vidro, Ferreira da Cunha, 9x12 cm, 1933. AML, PT/AMLSB/EFC/001001.

 

 

 

 

Operário na limpeza de fornos na Fábrica de Gás de Belém, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Kurt Pinto, 6x9 cm, [194-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/KPI/000215.

 

 

 

 

Preparação de atum em fábrica de conservas, indústria conserveira, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Artur Pastor, 6x6 cm, [1944-1946]. AML, PT/AMLSB/ART/005625.

 

 

 

 

Trabalhadores selecionando aparas de cortiça, indústria corticeira, Sociedade Granuladora de Cortiça, Barreiro, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Arnaldo Madureira, 6x6 cm, [19-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/ARM/002683.

 

 

 

 

Trabalhadores ensacando aparas de cortiça, indústria corticeira, Sociedade Granuladora de Cortiça, Barreiro, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Arnaldo Madureira, 6x6 cm, [19-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/ARM/002684.

 

 

 

 

Operário e carroça para transporte de cortiça, indústria corticeira, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Arnaldo Madureira, 6x6 cm, [19-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/ARM/002673.

 

 

 

 

Trabalhadores na preparação de azeitonas em conserva, indústria conserveira, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Artur Pastor, 6x6 cm, [1957-1961]. AML, PT/AMLSB/ART/007907.

 

 

 

 

Operárias na preparação de azeitonas em conserva, indústria conserveira, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Artur Pastor, 6x6 cm, [1957-1961]. AML, PT/AMLSB/ART/007906.

 

 

 

 

Operárias no fabrico de rolhas, indústria corticeira, Junta Nacional dos Resinosos, Alentejo, prova em papel de revelação baritado, Artur Pastor, 13x18 cm, [ca 1960].AML, PT/AMLSB/ART/022333.

 

 

 

 

Operárias numa fábrica de transformação da cortiça, indústria corticeira, prova em papel de revelação baritado, Artur Pastor, 13x18 cm, [ca 1960]. AML, PT/AMLSB/ART/022330.

 

 

 

 

Fábrica de transformação de lã, indústria têxtil, Junta Nacional dos Produtos Pecuários, prova em papel de revelação baritado, Artur Pastor, 13x18 cm, [ca 1960]. AML, PT/AMLSB/ART/022392.

 

 

 

 

Operários no tratamento de cortiça, indústria corticeira, prova em papel de revelação baritado, Artur Pastor, 13x18 cm, [ca 1960]. AML, PT/AMLSB/ART/022311.

 

 

 

 

Operárias no tratamento da cortiça, indústria corticeira, prova em papel de revelação baritado, Artur Pastor, 13x18 cm, [ca 1960]. AML, PT/AMLSB/ART/022314.

 

 

 

 

Operária operando máquina de corte da cortiça, indústria corticeira, prova em papel de revelação baritado, Artur Pastor, 13x18 cm, [ca 1960]. AML, PT/AMLSB/ART/022319.

 

 

 

 

Fumigação de cortiça, indústria corticeira, Junta Nacional dos Resinosos, Alentejo, prova em papel de revelação baritado, Artur Pastor, 13x18 cm, [ca 1960]. AML, PT/AMLSB/ART/022316.

 

 

O PROBLEMA DA HABITAÇÃO: BAIRROS E VILAS OPERÁRIAS

São inúmeros os estudos que se têm debruçado, direta ou colateralmente, em síntese ou estudos de caso, sobre os programas de acesso à habitação – social, económica e operária –, desde o século XI e, sobretudo, no período do Estado Novo50. Uma reflexão imediata sobre o problema da habitação das classes operárias, coloca uma labiríntica, porque multifacetada, prospeção de problemas e formas de abordagem: a disponibilidade e modalidades de oferta, tipologias existentes, condições de habitabilidade, de higiene e segurança, a geografia da distribuição urbana, as estratégias de usufruto e/ou ocupação, a composição dos agregados familiares, a sensibilidade e ideologia política, os programas de governo na criação de habitação acessível, entre outros aspetos adicionais, todos variáveis na cronologia.

Devido ao crescente fluxo demográfico para os centros urbanos, a escassez da habitação disponível acentuou-se. O desenho das cidades alterou-se, demoliram-se áreas, reconverteram-se quintas, alargaram-se arruamentos, abriram-se avenidas, construíram-se bairros inteiros novos segundo os primados do planeamento urbano novecentista de inspiração haussmanniana51. Para Friedrich Engels, o problema habitacional coevo e a produção social da miséria urbana encontravam-se intrinsecamente ligados ao modo capitalista de produção, a extração e acumulação privada das mais-valias do trabalho, pois a geração de riqueza convivia com o crescimento da miséria dos trabalhadores, acentuando o pauperismo, do qual a questão da habitação era uma parte da equação52.

O fenómeno teve como consequência múltiplas estratégias, nomeadamente a ocupação e instalação de famílias em edifícios precários, conventos ou casas apalaçadas abandonadas, a oportunidade de ocupação de edifícios secundários de quintas, em sobrelotação e com zonas fechadas ao exterior, e o arrendamento de casas, geralmente degradadas ou em condições exíguas e muito débeis de espaço, segurança, saneamento e salubridade, que se multiplicaram no fenómeno espontâneo dos pátios, gerando microcosmos em zonas de elevada densidade populacional53.

Em Lisboa, num relatório parcial, feito em 1902, por incumbência do Ministerio das Obras Publicas, Commercio e Industria, em que se recensearam 130 pátios de arrendamento particular situados em 18 freguesias de Lisboa54 (faltando completar o trabalho de examinação em outras 11 freguesias), com o objetivo de “reconhecer o valor hygienico das habitações mais perigosas de Lisboa”55, o eng. Ângelo de Sarrea Prado qualificava-os de “na maioria imundos e miseravelmente habitados”56.

Dos 130 espaços elencados no roteiro, 28 já se encontravam transformados em via pública, demolidos ou reconfigurados em oficinas e depósitos, sendo que, nos 102 pátios existentes haviam 4294 moradores distribuídos por 1106 habitações. Destes, Ângelo Prado considerava 32 em condições habitáveis, 45 em mau estado, mas suscetíveis de melhoramentos, e 35 “em condições manifestamente condemnaveis por impróprios á habitação humana”, onde se albergavam 1225 moradores em 293 habitações, acrescentando que faltavam “condições de hygiene e salubridade para serem habitados, e só a muita miséria e falta de recursos leva os seus infelizes moradores a abrigarem-se em taes espeluncas, sem ar puro, sem luz, nem possível asseio”57.

Relativamente à tipologia das habitações, assinalou uma elevada heterogeneidade, com escala e configuração variáveis, umas “abarracadas e irregularmente dispersas em quintaes, outros rodeados de casas altas, que as affrontam mais na sua mesquinhez”, outras “pardieiros e casas antigas aproveitadas nas suas ruinas, lojas sombrias e encaixadas”, ou ainda “pequenas habitações de construção defeituosa e muita limitada capacidade, húmidas por encostarem ao terreno, ou terem lojas subterraneas (…) em deploráveis condições de salubridade”58.

Associado à decrepitude das habitações encontrava-se um conjunto de fenómenos que concorriam para a eclosão de doenças e problemas de saúde: a defeituosa disposição ou inexistência de sistemas de esgoto, a deficiente canalização de água e a falta de circulação de ar. Em 1891, havia eclodido uma epidemia de cólera em Lisboa. Analisando a cubagem de ar, Prado concluiu que em 66 pátios (não indicando o número de habitações) respirava-se “um ar viciado pelas exhalações dos proprios moradores demasiadamente accumulados”. Os potenciais problemas de saúde eram então confrontados com a mortalidade por tuberculose, uma relação identificada como “coincidencia notável”, pelo facto “de se encontrarem os pateos mais condemnaveis justamente nas freguesias onde tem sido maior a mortalidade pela tuberculose”59. Os sucessivos indicadores das taxas de mortalidade exprimiam as miseráveis condições de vida dos operários, trabalhadores diversos e classes mais pobres60.

A moral não ficava de fora dos considerandos, “vivendo promiscuamente naqueles míseros albergues, sem conforto e mal conservados”, e deduzia-se que “alguns d'esses recintos formam escolas terriveis de immoralidade, a par do estiolamento d'esses desgraçados, cuja apparencia bem demonstra a sua miseria em todos os sentidos”61.

O pungente diagnóstico expunha um sintoma que refletia uma realidade conhecida, nas palavras do autor do inquérito, a “falta que se nota em Lisboa de casas convenientes para operarios e classes pobres e indigentes”62, cuja resolução apontava para incentivos financeiros à iniciativa particular de forma a “emprehender a construcção de bastantes casas e bairros para operarios e classes pobres”63.

Apesar da distância social que sobressai da posição de Prado, a avaliação coaduna-se com as preocupações político-filosóficas que emergiam desde o século XI com as condições da habitação das famílias operárias e populações mais desfavorecidas, e que levariam mais tarde à idealização do primeiro projeto do Bairro Social do Arco do Cego, em Lisboa, uma primeira tentativa, utópica e gorada, do Estado assumir a construção de habitação acessível para os estratos sociais mais desfavorecidos, e cuja continuidade desembocaria em múltiplos programas de construção de habitação a preços acessíveis, já durante o Estado Novo64.

Quase a rematar as conclusões do relatório parcial, Ângelo Prado asseverava que a urgência nas “providencias que teem de realizar-se para melhorar e salvaguardar a salubridade publica atingem tambem a hygiene moral, que não tem menor importancia para garantia dos progressos benéficos da civilização”65.

Entre critérios de higiene, moral e economia, opunham-se duas visões político-ideológicas: a “classe industrial” preconizada por Saint-Simon e o socialismo utópico, a par de Owen e Fourier; e a filosofia sociológica social- -cristã de Frédéric Le Play, da família entendida como núcleo de estudo da condição de uma sociedade e, como tal, recetora por direito da solidariedade patronal. Segundo Le Play, e apenas de um ponto de vista produtivo, o capitalista beneficiaria da moralização e do equilíbrio físico e mental dos operários de forma a retirar o máximo partido da sua condição produtiva. Concomitantemente, o acesso a alojamento salubre seria uma forma de controlo social e familiar, já que promovia a submissão do operário aos interesses do patronato, enjeitando uma natureza puramente benemérita. Foi este ângulo de pensamento que, entre a contínua procura por habitação de baixo custo, e a necessidade de concentrar os operários e trabalhadores das fábricas junto às zonas industriais, conduziu à construção de vilas operárias, estruturas habitacionais coletivas construídas de raiz em zonas de menor densidade populacional, com tipologias diversificadas na disposição do terreno e implantação urbana, espaços exteriores e estruturas de apoio comunitário.

Vinte e cinco anos depois do relatório de Ângelo Prado não se verificavam substanciais melhorias. Em 1937, num pequeno artigo para um boletim camarário, Álvaro da Fontoura, engenheiro da Repartição das Edificações Urbanas, assegurava que “entre nós é muito pouco o que há feito e mesmo êsse pouco só realizado ou concluído, já pelo Estado Novo”66.

Defendendo a realização de um profundo inquérito em Lisboa, o diagnóstico era em tudo similar ao anterior. As famílias viviam “em promiscuidade, sem ar e sem luz, na zona central” da cidade. Para além do centro, haveriam “vários prédios de rendimento em cujos andares se abriga em cada quarto uma família, cosinhando em fogões de petróleo com perigo para a saúde e segurança”, bem como “várias barracas que, de más arrecadações ou armazéns, se transformaram em apetecidas habitações”. Por fim, nos limítrofes da cidade, haviam “milhares de barracas, de madeira e latas velhas, as chamadas barracas clandestinas (…) espalhadas por zonas onde nem sequer existe canalização de esgôtos”67. Embora os “bairros de lata” não tivessem nascido com a industrialização, o grande afluxo de gente às cidades contribuiu para que este tipo de construção se expandisse enormemente.

O estudo e urgência na resolução do problema habitacional “das classes trabalhadoras da capital” residia no mesmo feixe de motivos: “higiene, moral, ordem, disciplina, organização da família, restrição dos direitos de propriedade pela lei do inquilinato, emprêgo de capitais, combate ao desemprêgo na construção civil, etc”68.

Defendendo as primeiras iniciativas do Estado Novo, no âmbito da legislação para fomento da construção das Casas Económicas, Fontoura concluía, no entanto, que “nenhuma das providências legislativas até hoje promulgadas conseguiu atacar o problema”, pois, “tornando-se necessária a construção de mais de onze mil habitações económicas para trabalhadores, construíram-se, por enquanto, umas centenas”, as quais seriam “inassecíveis aos ocupantes dos bairros clandestinos”69.

Com efeito, os orçamentos familiares eram tão reduzidos que dificilmente faziam face às despesas básicas, como a alimentação, o vestuário, iluminação e aquecimento, ou uma renda de habitação. Um bom vestuário e calçado era inatingível, um “luxo” que não era possível de satisfazer. Sempre que possível, as roupas eram utilizadas por todos os membros do agregado familiar, mesmo que degradadas, e passavam de irmãos em irmãos e de pais para filhos. Para as crianças, o calçado, na maior parte das vezes, era inexistente e, frequentemente, andavam descalças. Questão como a limpeza, a salubridade, ou a higiene, apesar de fundamentais, tornavam-se secundárias.

O Fundo das Casas Económicas, regulamentado pelo decreto-lei Nº 23052 de 23 de Setembro de 1933, dirigia-se “aos operários e funcionários modestos com regularidade de emprêgo assegurado”70. De fora, ficava toda uma mole de famílias que habitavam em condições miseráveis e degradadas, mas que alimentavam as necessidades industriais diversas, com contratos precários e à jorna, não qualificados para uma candidatura a habitação, nem sequer com condições económicas de a cumprir. Com efeito, o Estado Novo iria apostar em vários programas de habitação social dirigidos sobretudo às camadas de funcionários públicos (serviços, militares, forças de segurança, etc.), devidamente enquadradas pelas regras do serviço público e da moral de Estado71.

 

*

 

As fotografias que constituem esta última secção foram realizadas, na sua esmagadora maioria, em meados do século X , entre os anos 1940 e o final da década de 1960. Os registos anteriores são escassos e, provavelmente, não foram objeto de atenção pelos fotógrafos. Por esta razão, e porque é muito plausível que a grande maioria destes bairros tenha a sua origem algumas décadas atrás, subsistindo com poucas alterações, optou-se por incluir estes registos, funcionando como fontes para uma arqueologia visual destas habitações e espaços. Esta assunção ganha consistência ao cotejarmos as imagens mais antigas com representações visuais posteriores (ou mesmo atuais) que delas conhecemos. Os autores são diversos, e as suas fotografias registaram diversas tipologias de habitação operária, sempre a partir de uma vista do exterior. A identificação destas vilas e pátios permite localizá-
-las espacialmente e verificar a sua distribuição na cidade. Em muitos casos, parcialmente ou na sua totalidade, ainda subsistem na malha urbana atual. Outras foram, entretanto, demolidas e outras ainda, não foi possível localizá-las. No registo dos diferentes fotógrafos houve, em muitas das ocasiões, a preocupação de incluir o elemento humano, geralmente mulheres e crianças e, mesmo que subtil, é possível extrair informação sobre as condições de habitação e os seus habitantes, na época em que as fotografias foram realizadas. Na generalidade das imagens, nota-se que a preocupação do autor foi a do registo visual dos espaços habitacionais, uma fotografia documental.

 

 

Vila Sousa, largo da Graça, Lisboa, Machado & Souza, [1898-1908]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/003/FAN/003177.

 

 

 

 

Vila Dias, ao Beco dos Toucinheiros, Beato, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Alberto Carlos Lima, 9x12 cm, [191-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/LIM/000884.

 

 

 

 

Bairro Grandella, construído sobre a cobertura da regueira de Benfica que ligava à ribeira de Alcântara, por Francisco de Almeida Grandella para os operários da sua fábrica de têxteis, São Domingos de Benfica, Lisboa, negativo de gelatina e prata em vidro, Joshua Benoliel, 9x12 cm, [191-].AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/000685.

 

 

 

 

Arco da Vila Dias e viaduto ferroviário de Xabregas, beco dos Toucinheiros, Xabregas, Lisboa, prova em papel de revelação baritado, Eduardo Macedo Portugal, 10x15 cm, 1940. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/EDP/002208.

 

 

 

 

Vila Maia, rua Domingos de Sequeira, Lapa, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Artur João Goulart, 6x6 cm, 1960. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/AJG/000441.

 

 

 

 

Vila Miguéis, já demolida, Campo Grande, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Arnaldo Madureira, 6x6 cm, 1960. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/ARM/000749.

 

 

 

 

Vila Afifense, rua Doutor Gama Barros, Alvalade, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Arnaldo Madureira, 6x6 cm, 1960. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/ARM/000865.

 

 

 

 

Vila Benitez, entre as ruas Campo de Ourique, Pereira e Sousa, e Tomás da Anunciação (ocupando parte do que é hoje a Praça Afonso do Paço), edificada por Firmino Benitez Lopes (um dos primeiros proprietários em Campo de Ourique, e um dos promotores do Pátio das Barracas, rua da Infantaria, 16), em 1888, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Augusto de Jesus Fernandes, 6x6 cm, 1961. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/AJF/000131.

 

 

 

 

Vila Benitez, Campo de Ourique, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Augusto de Jesus Fernandes, 6x6 cm, 1961. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/AJF/000309.

 

 

 

 

Vila Benitez, Campo de Ourique, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Augusto de Jesus Fernandes, 6x6 cm, 1961. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/AJF/000310.

 

 

 

 

Vila Benitez, Campo de Ourique, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Augusto de Jesus Fernandes, 6x6 cm, 1961. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/AJF/000313.

 

 

 

 

Vila Ramos, rua Maria Pia, Prazeres, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Artur João Goulart, 6x6 cm, 1962. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/AJG/003574.

 

 

 

 

Vila Estefânia, rua Barão de Sabrosa, Penha de França, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Augusto de Jesus Fernandes, 6x6 cm, 1964. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/AJF/001354.

 

 

 

 

Vila Lopes, bairro da Liberdade, Campolide, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Artur João Goulart, 6x6 cm, 1965. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/AJG/S02560.

 

 

 

 

Vila Mota, rua Soares dos Reis, Campolide, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Augusto de Jesus Fernandes, 6x6 cm, 1965. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/AJF/001756.

 

 

 

 

Vila Matos, rua Maria Pia, Prazeres, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Artur João Goulart, 6x6 cm, 1966. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/AJG/S02830.

 

 

 

 

Vila Elvira, 1, 2 e 3, sítio do Calhau, São Domingos de Benfica, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Armando Maia Serôdio, 6x6 cm, 1966.
AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/SER/007851.

 

 

 

 

Vila Maia, rua Domingos de Sequeira, Estrela, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, João Hermes Goulart, 6x6 cm, 1966. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JHG/000505.

 

 

 

 

Vila da Bela Vista, Alto dos Toucinheiros, Beato, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, João Hermes Goulart, 6x6 cm, 1966. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JHG/000572.

 

 

 

 

Vila Celeste, construída em 1910, hoje integrada na via pública por rasgamento do fundo, destruindo o antigo pátio, projetada à rua Castelo Branco Saraiva, Penha de França, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Arnaldo Madureira, 35mm, 1967. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/ARM/005352.

 

 

 

 

Vila Rosário, rua da Penha de França, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Vasco Gouveia de Figueiredo, 6x6 cm, 1967. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/VGF/001130.

 

 

 

 

Vila Saraiva, calçada do Poço dos Mouros, Penha de França, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, João Hermes Goulart, 6x6 cm, 1967. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JHG/001136.

 

 

 

 

Vila Cordoaria, estrada dos Prazeres, Santo Condestável, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, João Hermes Goulart, 6x6 cm, 1968.AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JHG/001898.

 

 

 

 

Vila Elvira, travessa do Tarujo, Campolide, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Arnaldo Madureira, 35 mm, 1968.AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/ARM/006110.

 

 

 

 

Vila Sete Rios, antiga estrada de Benfica, Sete Rios, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, João Hermes Goulart, 6x6 cm, 1969. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JHG/003159.

 

 

 

 

Vila Lourenço, travessa do Tarujo, Campolide, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Arnaldo Madureira, 6x6 cm, [19-].AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/ARM/004359.

 

 

 

 

Vila Sousa, travessa do Tarujo, Campolide, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Arnaldo Madureira, 6x6 cm, [19-].AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/ARM/004366.

 

 

 

 

Vila Correia, rua Bartolomeu Dias, Belém, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Arnaldo Madureira, 6x6 cm, [19-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/ARM/004474.

 

 

 

 

Vila Emília, rua do Alvito, Alcântara, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Vasco Gouveia de Figueiredo, 6x6 cm, [19-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/VGF/000110.

 

 

 

 

Vila Emília, rua do Alvito, Alcântara, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Vasco Gouveia de Figueiredo, 6x6 cm, [19-].AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/VGF/000111.

 

 

 

 

Vila Tanque, sítio do Alto da Eira, Penha de França, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Vasco Gouveia de Figueiredo, 6x6 cm, [19-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/VGF/000382.

 

 

 

 

Vila Conceição, sítio do Alto da Eira, Penha de França, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Vasco Gouveia de Figueiredo, 6x6 cm, [19-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/VGF/000508.

 

 

 

 

Vila Sampaio, sítio do Alto da Eira, Penha de França, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Vasco Gouveia de Figueiredo, 6x6 cm, [19-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/VGF/000512.

 

 

 

 

Vila Beirão, sítio do Alto da Eira, Penha de França, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Vasco Gouveia de Figueiredo, 6x6 cm, [19-]. AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/VGF/000680.

 

 

 

 

Vila Henriques da Silva, sítio do Alto da Eira, Penha de França, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Vasco Gouveia de Figueiredo, 6x6 cm, [19-].AML, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/VGF/000683.

 

 

 

 

Vila operária, Lisboa, negativo de gelatina e prata em acetato de celulose, Amadeu Ferrari, 6x6 cm, [19-]. AML, PT/AMLSB/FER/008104.

 

 

 

 

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NOTAS

1 Ultrapassando os limites que se concentram na história da fotografia, e recorrendo à sua utilização como fonte na perspetiva da cultura visual, com múltiplas abordagens, vejam-se os trabalhos sobre a produção e circulação de ideias, pessoas e imagens de Filipa Lowndes Vicente, sobre resistência e conflito de Afonso Dias Ramos, ambos em contextos coloniais, de Nuno Pinheiro no âmbito da História Social, ou Ana Gandum, a respeito da circulação da imagem fotográfica no circuito da emigração, bem como, os trabalhos apresentados no colóquio O império da Visão: fotografia no contexto colonial português (1860-1960), ICS, 26-27 de setembro de 2013, nos domínios da representação de género, classificação, controlo populacional e sanitário, estudos antropológicos, identidade ou construção de saberes.

2 Para o sentido de representação social e da sua inteligibilidade à audiência, ver CHARTIER, Roger – A história cultural entre práticas e representações. Lisboa: Difel, 1988. Para a noção das camadas de informação encerradas no significante, e a capacidade de perceção e leitura, bem como os diferentes tipos de receção, veja-se PANOFSKY, Erwin – Estudos de iconologia: temas humanísticos na arte do renascimento. Lisboa: Editorial Estampa, 1995. É ainda útil recorrer-se ao entendimento proposto por Foucault, de que entre o real e uma ideia há uma proposta de relações intermediadas por convenientia, ou similaridade, aemulatio, analogia e simpatia, v. FOUCAULT, Michel – As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas. Lisboa: Edições 70, 2002.

3 Em acordo com as fontes disponíveis e com as devidas ressalvas quanto à sua fiabilidade e variações, é consensual que, em 1801, a população portuguesa estimava-se na ordem dos 2.900.000, ultrapassando os 5.000.000 em 1900, o que corresponde a um aumento na ordem dos 75%, grosso modo. Ver PINTO, Maria Luís Rocha; RODRIGUES, Teresa – A evolução da população ao longo do século XIX: uma perspectiva global. Revista da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas. Lisboa. Nº 6 (1992-93), p. 254; VEIGA, Teresa Rodrigues – A população portuguesa no século XI . Porto: CEPESE / Edições Afrontamento, 2004. p. 19-ss.

4 VAQUINHAS, Irene; NETO, Margarida – Agricultura e mundo rural: tradicionalismos e inovações. In MATTOSO, José, dir. – História de Portugal. Lisboa: Estampa, 1993. vol. V, p. 325-337; TORGAL, Luís Reis – A instrução pública. In MATTOSO, José, dir. – idem. p. 609-651.

5 RAMOS, Rui; Sousa, Bernardo Vasconcelos; Monteiro, Nuno Gonçalo – História de Portugal. Lisboa: A Esfera dos Livros, 2009. p
. 498-ss; LAÍNS, Pedro – O proteccionismo em Portugal (1842-1913): um caso mal sucedido de industrialização «concorrencial». Análise Social. V. XXIII Nº 97 (3º 1987), p. 481-503.

6 6 Para um panorama económico sobre o século XIX português, v. LAÍNS, Pedro; SILVA, Álvaro Ferreira da – História económica de Portugal: o século XI . Lisboa: ICS, 2005. vol. II.

7 PINHEIRO, Magda – A construção dos caminhos-de-ferro e a encomenda de produtos industriais em Portugal (1855-90). Análise Social. V. XIV Nº 101-102 (1988), p. 745-767.

8 Ainda assim, muito abaixo dos números europeus. Compare-se este e outros indicadores de desenvolvimento económico de Portugal e da Europa em 1910, em REIS, Jaime – O atraso económico português em perspectiva histórica: estudos sobre a economia portuguesa na segunda metade do século XIX (1850-1930). Lisboa: Imprensa Nacional Casa da Moeda, 1993.

9 ALEGRIA, Maria Fernanda – A organização dos transportes em Portugal (1850-1910): as vias e o tráfego. Lisboa: Instituto Nacional de Investigação Científica / Centro de Estudos Geográficos, 1990. SILVEIRA, Luís Espinha da [et al.] – Caminhos de ferro, população e desigualdades territoriais em Portugal, 1801-1930. Ler História. Nº 61 (2011), p. 7-37.

10 PINHEIRO, Magda – Investimentos estrangeiros, política financeira e caminhos de ferro em Portugal na segunda metade do século XIX. Análise Social. V. XV Nº 58 (1979), p. 265-286; Caminhos de ferro – In SERRÃO, Joel, dir. – Dicionário de História de Portugal. Porto: Livraria Figueirinhas, 2002. vol. I, p. 447-451.

11 Sobre o período do governo de João Franco, a questão dos adiantamentos e abonos entregues à Casa Real para fazer face às suas despesas, e que, por falta de pagamento, se avolumavam, bem como o panorama político até ao assassinato do rei, veja-se RAMOS, Rui – O governo de João Franco (1906-1908). In MATTOSO, José, dir. – História de Portugal. Lisboa: Estampa, 1994. vol. VI, p. 267-298.

12 RAMOS, Rui – A estranha morte da Monarquia Constitucional. Idem, p. 335-400.

13 CANDEIAS, António; PAZ, Ana Luísa; ROCHA, Melânia, dir. e coord. – Alfabetização e escola em Portugal nos séculos XIX e XX: os censos e as estatísticas. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004. p. 120-ss.

14 ROSAS, Fernando; ROLLO, Maria Fernanda, coord. – História da Primeira República portuguesa. Lisboa: Tinta da China, 2010; RAMOS, Rui – O mito da política nacional (1918-1926). In MATTOSO, José, dir. – História de Portugal. Lisboa: Estampa, 1994. vol. VI, p. 597-634. ROSAS, Fernando, coord. – O Estado Novo, 1926-1974. In MATTOSO, José, dir. – História de Portugal. Lisboa: Estampa, 1994. vol. VII, p. 151-ss.

15 Como introdução ao tema, na geografia europeia, veja-se GEREMEK, Bronislaw – A piedade e a forca: histo´ria da mise´ria e da caridade na Europa. Lisboa: Terramar, 1995.

16 Para uma súmula histórica das instituições medievas, veja-se PAIVA, José Pedro – Introdução. In PAIVA, José Pedro, coord. – Portugaliae monumenta misericordiarum: antes da fundação das misericórdias. Lisboa: União das Misericórdias Portuguesas, 2003. vol. 2, p. 7-20.

17 Sobre a criação das misericórdias em Portugal, veja-se SÁ, Isabel dos Guimarães; PAIVA, José Pedro – Introdução. In PAIVA, José Pedro, coord. – Portugaliae monumenta misericordiarum: a fundação das misericórdias: o reinado de D. Manuel I. Lisboa: União das Misericórdias Portuguesas, 2004. vol. 3, p. 7-24; bem como, SÁ, Isabel dos Guimarães – As misericórdias da fundação a` União Dinástica. In PAIVA, José Pedro, coord. – Portugaliae monumenta misericordiarum: fazer a história das misericórdias. Lisboa: União das Misericórdias Portuguesas, 2002. vol. 1, p. 19-45.

18 A exceção eram as ordens religiosas, que optavam por uma vivência mendicante.

19 Na produção nacional de monografias, assinale-se, na conjuntura anterior e após o virar do século, entre outros, os trabalhos de PEREIRA, José Augusto – Resumo historico da Santa Casa e Irmandade da Misericórdia da cidade de Coimbra... Coimbra: Imprensa da Universidade, 1842, de GOODOLPHIM, Costa – As misericordias. Lisboa: Imprensa Nacional, 1897, e de RIBEIRO, Victor – A Santa Casa da Misericordia de Lisboa: subsidios para a sua história, 1498-1898... Lisboa: Typ. da Academia Real das Sciencias, 1902 (no campo das misericórdias); de COSTA, D. António da – Historia da instrucção popular em Portugal desde a fundação da monarchia até aos nossos dias. Lisboa: Imprensa Nacional, 1871 (no campo da instrução popular); de CABRAL, José Curry – Assistência pública e hospitalização. In Notas sobre Portugal. Lisboa: Imprensa Nacional, 1908. vol. I (no campo da assistência hospitalar), de AZEVEDO, António de – Habitações operárias em Portugal: relatório apresentado ao 3° Congresso da Liga Nacional contra a Tuberculose. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1905, e de MATA, José Caeiro da – Habitações populares. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1909 (no campo da habitação); de GOODOLPHIM, Costa – A Associação: história e desenvolvimento das associações portuguezas. Lisboa: Typ. Universal, 1876, Idem – A previdência: Associações de socorro mútuo, cooperativas, caixas de pensões e reformas, caixas económicas. Lisboa: Imprensa Nacional, 1889, de RIBEIRO, Victor – Historia da beneficencia publica. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1907. O Instituto. Vol. 48 a 54. Separata, de LIMA, José Lobo D'Avila – Soccorros mutuos e seguros sociais. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1909 (no campo do assistencialismo); de PEREIRA, João Manuel Esteves – A industria portugueza: século XII a XIX, com uma introdução sobre corporações operárias em Portugal. Lisboa: Occidente, 1900, de LIMA, Jose´ Lobo D'Avila – Movimento operário em Portugal. Lisboa: Ferreira & Oliveira, 1905, de GONÇALVEZ, Luiz – A evolução do movimento operário em Portugal. Lisboa: Adolpho de Mendonça, 1905, de POINSARD, Léon – Portugal ignorado: estudo social, economico e politico seguido de um appendice... Porto: Magalhães e Moniz, 1912, de SILVA, Fernando Emygdio da – O operariado português na questão social. Lisboa: Typographia Universal, 1905, Idem – Acidentes de trabalho. Lisboa: Imprensa Nacional, 1913 (no campo do operariado); de GOMES, António Luís – Ociosidade, vagabundagem e mendicidade... Coimbra: Imprensa da Universidade, 1892, e de AUGUSTO, António Ferreira – Alienados criminosos, cadeias, serviços médico legaes e toxicologicos, pessoal judiciário dos tribunaes criminaes. Porto: Imprensa Commercial, 1894 (nos campos da pobreza e repressão).

20 Um fluxo traçado desde o socialismo utópico e do cooperativismo de Saint-Simon, Robert Owen e Charles Fourier, ao federalismo e anarquismo de Proudhon, e ao socialismo científico e revolucionário de Karl Marx e Friedrich Engels.

21 GEREMEK, Bronislaw – Op. cit., p. 23-148 e 267-293; SCOTT, John – Poverty & wealth: citizenship, deprivation and privilege. London: Longman Group UK, 1994. p. 1-59; THOMPSON, Francis Michael Longstreth, ed. – The Cambridge social history of Britain 1750-1950: social agencies and institutions. Victoria: Cambridge University Press, 1990. vol. 3, p. 243-309 e 357-393; VAN LEEUWEN, Marco – The logic of charity: Amsterdam, 1800-1850. London: Macmillan Press, 2000. p. 1-37.

22 Código Penal aprovado por decreto de 10 de Dezembro de 1852. Lisboa: Imprensa Nacional, 1855, p. 74-76. Para uma perspetiva nacional, veja-se VAZ, Maria João – Crime e sociedade: Portugal na segunda metade do século XI . Oeiras: Celta Editora, 1998.

23 Para uma síntese histórica das misericórdias no período da monarquia constitucional, veja-se LOPES, Maria Antónia; PAIVA, José Pedro – Introdução. In PAIVA, José Pedro, coord. – Portugaliae monumenta misericordiarum tradição e modernidade: o período da monarquia constitucional (1834-1910). Lisboa: União das Misericórdias Portuguesas, 2010. vol. 8, p. 7-30.

24 Sobre a pandemia da pneumónica em Portugal, veja-se SOBRAL, José Manuel; LIMA, Maria Luísa – A epidemia da pneumónica em Portugal no seu tempo histórico. Ler História. Nº 73 (2018), p. 45-66. Sobre o percurso atribulado das misericórdias desde a República até ao final do século, veja-se PAIVA, José Pedro; FONTES, Paulo F. Oliveira – Introdução. In PAIVA, José Pedro, coord. – Portugaliae monumenta misericordiarum: misericórdias e secularização num século turbulento (1910-2000). Lisboa: União das Misericórdias Portuguesas, 2010. vol. 9, tomo I, p. 7-36.

25 Importa salientar a heterogeneidade da composição aglomerada na categoria popular. No meio rural eram artesãos e operários rurais, trabalhadores da agricultura, à jorna, sobretudo, servos e mendigos. No meio urbano eram mendigos, empregados, operários e artesãos, desde a pequena oficina à grande unidade industrial, pequenos e médios comerciantes. Apesar de se falar genericamente em camadas populares, havia grandes divergências de instrução, segurança e rendimentos.

26 MÓNICA, Maria Filomena – O movimento socialista em Portugal (1875-1934). Lisboa: Casa da Moeda / Instituto de Estudos para o Desenvolvimento, 1985.

27 Esta cultura cooperativa não se esgotou nas associações de socorros mútuos, e os domínios alvo do associativismo prolongaram-se na beneficência, no desporto, na cultura e recreio, na música e teatro, ou na instrução, estimando-se em mais de 3.000 associações criadas em Portugal entre a segunda metade do século XIX e a aprovação do Estatuto do Trabalho Nacional, no Estado Novo, promulgado no Decreto-Lei n.º 23048, de 23 de setembro de 1933. LOUSADA, Maria Alexandre – Tradição e renovação nas associações profissionais. In FREIRE, João, org. – Associações profissionais em Portugal. Oeiras: Celta Editora, 2004. p. 21-55.

28 Para uma história da evolução do mutualismo em Portugal, ver ROSENDO, Vasco – O mutualismo em Portugal: dois séculos de história e suas origens. Lisboa: Montepio Geral, 1996, e BARROS, Carlos Pestana; SANTOS, José Carlos, coord. – O mutualismo português: solidariedade e progresso social. Lisboa: Vulgata, 1998.

29 COSTA, Ramiro da – Elementos para a história do movimento operário em Portugal. Lisboa: Assírio e Alvim, 1979. vol. I, p. 18-19.

30Portugal na alvorada do século XX: forças sociais, poder político e crescimento económico de 1890 a 1914. Lisboa: Editorial Presença, 1988. p. 129-154.

31 MÓNICA, Maria Filomena – A formação da classe operária portuguesa: antologia da imprensa operária (1850-1934). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1982.

32 Sobre o sindicalismo católico e a Liga Operária Católica, veja-se REZOLA, Maria Inácia – O sindicalismo católico no Estado Novo (1931-1948). Lisboa: Editorial Estampa, 1999.

33 CABRAL, Manuel Villaverde – Op. cit., p. 213-ss. Veja-se também PEREIRA, Ana Paula de Brito – As greves rurais de 1911-12: uma leitura através da imprensa. Análise Social. V. XIX Nº 77-78-79 (1983), p. 477-511, especialmente p. 492-ss. Para o período e problemas específicos da 1ª Grande Guerra, v. REDONDO CARDEÑOSO, Jesús-Ángel – Protestas populares por las subsistencias en el Alentejo durante la Gran Guerra, 1914-1918. Ler História. Nº 70 (2017), p. 141-160.

34 FREIRE, João – Anarquistas e operários: ideologia, ofício e práticas sociais: o anarquismo e o operariado em Portugal, 1900-1940. Porto: Afrontamento, 1992; COSTA, Ramiro da – Op. cit., p. 68-71.

35 TENGARRINHA, José – As greves em Portugal: uma perspectiva histórica do século XVIII a 1920. Análise Social. V. XVII Nº 67-68 (1981), p. 573-601.

36 CABRAL, Manuel Villaverde – Op. cit., p. 195-212; FONSECA, Carlos da – História do movimento operário e das ideias socialistas em Portugal. Mem Martins: Europa-América, 1980. vol. IV – Greves e agitações operárias .

37 CABRAL, Manuel Villaverde – Op. cit., p. 121-140.

38 Já com uma idade assinalável, continua fundamental o trabalho de FONSECA, Carlos da – História do movimento operário e das ideias socialistas em Portugal. Mem Martins: Europa-América, 1980. vol. II – Os primeiros congressos operários.

39 Para um excelente panorama sobre a situação portuguesa enquadrada no contexto europeu, veja-se PEREIRA, Joana Dias O ciclo de agitação social global de 1917-1920. Ler História. Nº 66 (2014), p. 44-55. Referências clássicas são FONSECA, Carlos da – História do movimento operário e das ideias socialistas em Portugal. Mem Martins: Europa-América, 1980. vol. IV – Greves e agitações operárias; e COSTA, Ramiro da – Op. cit., p. 79-101.

40 COSTA, Ramiro da – Op. cit., p. 76.

41 Apesar de tudo, durante o longo período do Estado Novo e até ao seu ocaso com a revolução de 25 de abril de 1974, ocorreram diversas greves, que não lograram perturbar a “paz social”, sendo ferozmente reprimidas. Após altos e baixos ao longo das décadas, nos últimos anos pré revolução dos cravos, as iniciativas grevistas recrudesceram de intensidade e ganharam visibilidade exponencial até ao 25 de abril. “Greves Operárias” e “Greves rurais e agitação camponesa”, in ROSAS, Fernando; BRITO, J. M. Brandão de, dir. – Dicionário de história do Estado Novo. Lisboa: Círculo de Leitores, 1996. vol. I, p. 401-406; COSTA, Ramiro da – Op. cit., p. 167-177. Veja-se ABRANTES, José João – O direito do trabalho do “Estado Novo”. Cultura. V. 23 (2006), p. 331-339, sobre os limites impostos na ação sindical e no direito do trabalho. Sobre o sistema corporativo do Estado Novo, veja-se entre outros LUCENA, Manuel de – A evolução do sistema corporativo português: salazarismo. Lisboa: Perspetivas&Realidades, 1976. vol I; e SCHMITTER, Philippe C. – Portugal: do autoritarismo à democracia. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 1999.

42 FERREIRA, Maria de Fátima Sá e Melo – Os artesãos e a política na primeira metade do século XIX. In VIEIRA, Benedicta Maria Duque, org. – Grupos Sociais e Estratificação Social em Portugal no Século XI . Lisboa: CEHCP-ISCTE, 2003. p. 53-64; PEREIRA, Miriam Halpern – Artesãos, operários e o liberalismo: dos privilégios corporativos para o direito do trabalho. Ler História. Nº 14 (1988), p. 41-86.

43 Para um panorama histórico da evolução industrial em Portugal, ver MENDES, José Amado – A indústria em Portugal na 2ª metade do século XI . Coimbra: Imprensa de Coimbra, 1990.

44 Sobre as relações de domínio colonial através da exportação de bebidas alcoólicas, a criação de um novo mercado nas colónias portuguesas, e o fomento do consumo de álcool, no caso de Moçambique, ver CAPELA, José – O vinho para o preto: notas e textos sobre a exportação do vinho para África. Porto: Centro de Estudos Africanos da Universidade do Porto, 2009. Para o caso de Angola, ver CURTO, José C. – Alcohol under the context of the Atlantic slave trade: the case of Benguela and its hinterland (Angola). Cahiers d'études africaines. Nº 201 (2011), p. 51-85.

45 MARTINS, Conceição Andrade – Trabalho e condições de vida em Portugal (1850-1913). Análise Social. V. XXXII Nº 142 (1997), p. 483-535.

46 Cf. as conceções historiográficas qualitativas da estrutura da propriedade agrícola em PEREIRA, Miriam Halpern – Livre câmbio e desenvolvimento económico em Portugal na segunda metade do século XI. Lisboa: Cosmos, 1971, e os modelos de análise quantitativa contra-factual, da nova história económica, em REIS, Jaime – O atraso económico português em perspectiva histórica: estudos sobre a economia portuguesa na segunda metade do século XIX (1850-1930). Lisboa: Imprensa Nacional Casa da Moeda, 1993 e, mais recentemente, em LAINS, Pedro – A economia portuguesa no século XI . Lisboa: Imprensa Nacional da Casa da Moeda, 1995, que atribui as causas a uma economia periférica e pequena, cujo desempenho na segunda metade do século XIX e até ao final dos anos 1910 teve uma apreciação positiva, mas, contudo, a evolução do produto agrícola, da indústria e do comércio externo pouco melhor desempenho poderiam ter para diminuir o fosso em relação a outros países europeus.

47 Indústria/Industrialização. In ROSAS, Fernando; BRITO, J. M. Brandão de, dir. – Dicionário de história do Estado Novo. Lisboa: Círculo de Leitores, 1996. vol. I, p. 460-461.

48 Idem, p. 463-ss.

49 A atividade da FNAT, replicando a versão fascista italiana Opera Nazionale Dopo Lavoro de 1925, inseria-se na ideologia política do Estado Novo, de promoção da “política do espírito” e de um “homem novo”, no “ressurgimento do povo português”, e da qual fizeram parte outras instituições e iniciativas. Entre outros, ver VALENTE, José Carlos – Estado Novo e alegria no trabalho: uma história política da FNAT (1935-1958). Lisboa: Colibri/INATEL, 1999; DOMINGOS, Nuno – Desproletarizar: a FNAT como instrumento de mediação ideológica no Estado Novo. In DOMINGOS, Nuno; PEREIRA, Victor, eds. – O Estado Novo em questão. Lisboa: Edições 70, 2010; e ROSAS, Fernando – O salazarismo e o homem novo: ensaio sobre o Estado Novo e a questão do totalitarismo. Análise Social. Nº 157 V. XXXV (2001), p. 1031-1054.

50 O tema tem sido objeto de uma enorme produção no âmbito historiográfico e sociológico, e não é propósito fazer-se um exaustivo estado da arte. A título de indicação de alguns estudos sobre a habitação social e os programas de habitação económica do Estado Novo, desde o final do século XIX e durante o Estado Novo, entre outros, vejam-se LISBOA. Câmara Municipal, ed. – Habitação social na cidade de Lisboa, 1959-1966. Lisboa: Câmara Municipal, 1967; TEIXEIRA, Manuel C. – As estratégias de habitação em Portugal, 1880-1940. Análise Social. V. XXVIII 1 Nº 115 (1992), p. 65-89; PEREIRA, Nuno Teotónio – Pátios e vilas de Lisboa, 1870-1930: a promoção privada do alojamento operário. Análise Social. V. XXIX Nº 127 (1994), p. 509-524; BAPTISTA, Luís V. – Cidade e habitação social: o Estado Novo e o programa das casas económicas em Lisboa. Oeiras: Celta Editora, 1999; ANTUNES, Gonçalo – Políticas de habitação: 200 Anos. Casal de Cambra: Caleidoscópio, 2018; ou LAMEIRA, Gisela, ROCHA, Luciana, coord. – Mapa da habitação: guia para uma terminologia específica em arquitectura habitacional apoiada pelo Estado em Portugal [1910-1974]. Porto: Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, 2019.

51 Para Engels, atento à realidade do seu tempo, a gravidade do problema do parque habitacional existente, ou a falta dele, para acolher a grande massa de trabalhadores, não se colocou nas cidades desenvolvidas a partir de grandes centros industriais (como Manchester), mas sim, nas seculares, que haviam sofrido o impacto da transformação e do crescimento industrial, agudizando o problema (como Paris ou Londres e, acrescenta-se, Lisboa). Ver ENGELS, Friedrich – O problema da habitação. Lisboa: Estampa, 1975.

52 Atento às dinâmicas urbanas no sistema industrial coevo, Engels construiu o seu pensamento sobre as condições da classe operária e a evolução do capitalismo industrial, observando, entrevistando e estudando, entre 1842 e 1844, o grande centro industrial inglês da cidade de Manchester. V. ENGELS, Friedrich – A situação da classe trabalhadora na Inglaterra. Lisboa: Presença, 1975.

53 Ver PEREIRA, Nuno Teotónio – Op. cit.

54 Sacramento, Socorro, Coração de Jesus, Mercês, S. José, S. Cristovão, Sé, S. Miguel, Santo Estevão, Santo André, S. Vicente, Santa Engrácia, Santa Cruz do Castelo, S. Tiago, Anjos, Arroios, Santa Catarina e S. Paulo. Arrolamento feito a partir de um roteiro da CML. V. PORTUGAL. Ministerio das obras Publicas, Commercio e Industria. Conselho dos Melhoramentos Sanitarios – Inquerito aos pateos de lisboa: ano de 1902. Lisboa: Imprensa Nacional, 1903. p. 3-4.

55 PORTUGAL – Op. cit., p. 3.

56 Ibidem.

57 Idem, p. 5.

58 Ibidem. A elevada diversidade tipológica dos pátios advém da sua própria raiz, ao serem, na sua maioria, o resultado do aproveitamento de espaço pré-existentes, não diferindo muito das características das vilas sucedâneas. Para uma visão da diversidade de tipologias, ver PEREIRA, Nuno Teotónio; BUARQUE, Irene – Prédios e vilas de Lisboa. Lisboa: Livros Horizonte, 1995. p. 262-369.

59 PORTUGA – Op. cit., p. 7.

60 Para o decénio 1887-1897, a mortalidade infantil em Lisboa, variou entre 24,69% (1890) e 22,55 (1896), enquanto a mortalidade geral se situou entre os 20,44% (1887) e 27% (1897). COSTA, Ramiro da – Op. cit., p. 78.

61 PORTUGAL – Op. cit., p. 7.

62 Idem, p. 5.

63 Idem, p. 8.

64 Os programas foram vários, com diferentes enquadramentos legais, destinatários e modalidades. V. LAMEIRA, Gisela; ROCHA, Luciana, coord. – Op. cit., p. 39-93. Para a evolução das soluções habitacionais nos contextos da Monarquia Constitucional e da Iª República, v. ANTUNES, Gonçalo – Op. cit., p. 27-146.

65 PORTUGAL – Op. cit., p. 7.

66 LISBOA. Câmara Municipal – Boletim Cultural e Estatístico. Lisboa: Câmara Municipal. V. I Nº 1 (1º trimestre de 1937), p. 59.

67 LISBOA. Câmara Municipal, idem, p. 58. Sobre esta tipologia de bairros improvisados e extremamente degradados na cercadura da cidade, e no domínio da representação fotográfica do espaço urbano, veja-se o caso singular do álbum de fotografias de Eduardo de Portugal sobre o Bairro das Minhocas, realizado precisamente na mesma época, em SANTOS, Denise – Representações fotográficas de um plano de reabilitação do espaço urbano: o caso do Bairro das Minhocas e do Bairro da Quinta da Calçada por Eduardo Portugal (1938-1944). Cadernos do Arquivo Municipal [Em linha]. 2ª Série Nº 4 (julho-dezembro 2015), p. 369-390. Disponível na Internet: http://arquivomunicipal.cm-lisboa.pt/fotos/editor2/Cadernos/2serie/4/4_varia02.pdf.

68 LISBOA. Câmara Municipal – idem, p. 58-59.

69 LISBOA. Câmara Municipal – idem, p. 61.

70 LISBOA. Câmara Municipal – idem, p. 63.

71 ANTUNES, Gonçalo – Op. cit., p.181-343; BAPTISTA, Luís V. – Op. cit.; e TEIXEIRA, Manuel C. – Op. cit., p. 65-89.

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