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Cadernos do Arquivo Municipal

On-line version ISSN 2183-3176

Cadernos do Arquivo Municipal vol.ser2 no.13 Lisboa June 2020

 

DOSSIER TEMÁTICO

Igualdade, Justiça e Fraternidade. A identidade dos operários tabaqueiros de Lisboa (1860-1936)

Equality, Justice and Fraternity. The identity of the Lisbon tobacco workers (1860-1936)

 

Rui Manuel Brás*

*Rui Manuel Brás, CECC – Centro de Estudos de Comunicação e Cultura, Universidade Católica Portuguesa, 1649-023 Lisboa, Portugal. rui.bras2005@gmail.com

 

 

RESUMO

Aceitando a perspetiva de William Sewell de que todas as relações sociais são discursivas, mas que nunca se esgotam na sua discursividade, propomo-nos abordar a identidade própria dos operários tabaqueiros de Lisboa no seio da classe operária. Fá-lo-emos através das fontes escritas disponíveis, como os jornais da época, operários ou burgueses, e dos textos escritos por e sobre os tabaqueiros, entre os anos 60 do século XIX e a primeira década do Estado Novo. Destacar-se-ão, necessariamente, os artigos publicados no órgão dos manipuladores de tabacos, o jornal A Voz do Operário. Através desta abordagem, pretendemos mostrar a relevância que tem o estudo dos vários segmentos dentro da classe operária, para uma análise que, contra quaisquer intenções totalizantes, vá para lá do conceito de uma classe unitária com mera existência teórica, para uma classe em que os operários se dispersavam em várias direções.

 

PALAVRAS-CHAVE

Identidade / Classe Operária / Tabacos / Socialismo / Política

 

ABSTRACT

Accepting William Sewell's perspective that all social relations are discursive, but that they are never exhausted in their discourse, we propose to address the specific identity of Lisbon's tobacco workers within the working class. We will do this through the available written sources, such as the newspapers of the time, workers or bourgeois, and the texts written by and about tobacco workers, between the 1860s and the first decade of the Estado Novo. The articles published in the tobacco workers' newspaper A Voz do Operário (The Workers Voice), will necessarily stand out. Through this approach, we intend to show the relevance of the study of the various segments within the working class, for an analysis that, against any totalizing intentions, goes beyond the concept of a unitary class with a mere theoretical existence, to a class in which the workers were torn in multiple directions.

 

KEYWORDS

Identity / Working Class / Tobacco / Socialism / Politics

 

PROLEGÓMENOS

Numa época em que o mundo do trabalho e os movimentos sociais têm vindo a sofrer alterações profundas nas suas características, continua a fazer sentido o estudo da História operária. Uma das virtudes da História é, precisamente, a de dar uma perspetiva alargada sobre os problemas humanos, contribuindo não apenas para a compreensão do passado, mas também para a identificação de caminhos possíveis no presente. Analisar a proletarização e os seus efeitos na vida dos indivíduos por ela afetados permite-nos perceber como se construiu a identidade da classe operária, quais os rumos de ação que seguiu para satisfazer os seus interesses e como se manifestou no plano político. Com este artigo, focado numa parcela relevante da classe operária de Lisboa – os tabaqueiros –, pretendemos contribuir para um estudo da classe operária livre de (pre)conceitos que reduzem a História operária à análise de um caminho único, teleológico, que não tem em consideração as diferentes experiências no seio da classe operária, as quais levam a diferentes escolhas e, necessariamente, a diferentes caminhos1.

Aceitando a perspetiva de William Sewell2 de que todas as relações sociais são discursivas, mas que nunca se esgotam na sua discursividade, propomo-nos abordar a identidade própria dos operários tabaqueiros de Lisboa no seio da classe operária. Fá-lo-emos através das fontes escritas disponíveis, como os jornais da época, operários ou burgueses, e dos textos escritos por e sobre os tabaqueiros, entre os anos 60 do século XIX e as primeiras décadas do Estado Novo. Destacar-se-ão, necessariamente, os artigos publicados no órgão dos manipuladores de tabacos, o jornal A Voz do Operário. Na análise das palavras, tomamos a linguagem como construtora de identidade, dos interesses, das intenções e das ações dos operários, e não apenas como reflexo dessas mesmas dimensões. Por isso, consideramos que os textos são locais de produção de significado e não meras fontes de informação. No entanto, temos a consciência de que a linguagem, pela sua natureza, revela, mas também esconde, tal como pode ser desordenada e mesmo contraditória.

Para alcançarmos o nosso objetivo, dividimos o artigo em três partes: os pilares da construção da identidade dos tabaqueiros de Lisboa, as ações levadas a cabo para satisfazerem os seus interesses e as formas de envolvimento político. Através desta abordagem, pretendemos mostrar a relevância que tem o estudo dos vários segmentos dentro da classe operária, para uma análise que, contra quaisquer intenções totalizantes, vá para lá do conceito de uma classe unitária com mera existência teórica, para uma classe em que os operários se dispersavam em várias direções.

 

PELA IGUALDADE, PELA JUSTIÇA E PELA FRATERNIDADE

Não havendo um discurso de ofício semelhante ao de outros setores operários, como os sapateiros, por exemplo, devido às características próprias ao regime de produção dos tabacos, a proletarização foi sentida pelos tabaqueiros como a afirmação de um sistema baseado no egoísmo e na concorrência entre os próprios operários3. Foi através da associação que os trabalhadores dos tabacos acresceram as suas capacidades de cristalização identitária e representaram a sua autonomia cultural. Fosse sob o formato de associação de socorros mútuos, como a Associação União Fraternal dos Operários da Fabricação de Tabacos, fundada em 1863, fosse sob a égide de diferentes associações de classe4, em particular a Associação de Classe dos Manipuladores de Tabacos de Lisboa (ACMT), os tabaqueiros desenvolveram, à semelhança de outros ofícios, a ideia de solidariedade como suporte para ultrapassarem as dificuldades quotidianas, como o desemprego, a doença, a inabilidade ou a morte. Neste sentido, essas associações exprimiam a comunidade moral deste grupo operário, ao unir os seus sócios através do auxílio mútuo e de laços que se prolongavam para lá da morte. Esta função da associação de ensinar e reforçar a solidariedade entre os operários, e de definir a identidade, era essencial para a defesa perante o inimigo – o Capital. Só através da união na associação, os tabaqueiros teriam a capacidade para defrontar semelhante poder e prosseguir o caminho da sua emancipação:

a união pela associação, só ela pode, e só ela tem força de terminar essa árdua guerra do capital com o trabalho e promover a nossa emancipação que tanto precisamos. Mas para isso é mister a União, é mister que todos se unam pelos sagrados laços da inseparável fraternidade, que se alistem debaixo da nossa bandeira, porque ela tem por divisa a igualdade, fraternidade e justiça5.

A igualdade, a fraternidade e a justiça eram os conceitos inscritos na bandeira associativa.

A igualdade entre todos os Homens, porque todos podem ser úteis à sociedade humana. Por maioria de razão, os operários, os detentores da força de trabalho, hábeis, criadores de riqueza, não deveriam ser desconsiderados por aqueles que, por uma razão ou por outra, enriqueceram com o seu trabalho. O trabalho, libertado pelo Iluminismo dos constrangimentos ideológicos a que tinha estado preso, era finalmente entendido como motor da Humanidade:

a classe operária desempenha um importante papel no teatro do mundo porque dela derivam todas as outras. É fora de toda a dúvida que é pelo trabalho que o homem se nobilita e imortaliza, porque é ele que constitui a riqueza e a opulência das nações. É o trabalho a causa primordial de todo o movimento e a mola real da civilização e do progresso, porque é ele que põe em prática a ciência humana, a qual, sepultada na mente não era mais de que uma fantasia e um ideal irrealizável6.

Seguindo o discurso comum a outros setores da classe operária, os tabaqueiros reproduziam a ideia de que o trabalho era sinónimo de criatividade e emanação do sublime, como argumento para a defesa dos seus interesses em nome da justiça. Numa sociedade dominada pelas relações de produção e por uma visão do mundo em que a produção desempenha um papel central, os operários eram “mártires da burguesia”7 e o capitalismo era visto como um sistema onde a justiça não podia existir. Baseado na concorrência que podia levar ao encerramento de fábricas, à falta de trabalho e à degradação da condição dos operários, como os manipuladores de tabacos cedo compreenderam, desde 1865, com o fim do monopólio e a liberalização da produção, o capitalismo levava ao egoísmo e à imoralidade. Contra a injustiça, enfim, deveria prevalecer a fraternidade, último pilar da trindade acima referida. Uma ideia de fraternidade marcada pelo género, em que predominava a conceção masculina de solidariedade e de comunidade, assente na codificação da atividade pública como essencialmente masculina e numa distinção de género que representava a mulher como um ser emocional, fraco e dependente8. Para os autores dos textos publicados na imprensa operária coeva, a presença das mulheres na indústria era implementada pelos proprietários das fábricas como uma manobra para tentar enfraquecer a capacidade de resistência dos operários. Aqueles viam “na horrorosa ignorância das mulheres plebeias, e na sua fragilidade, um ótimo instrumento para escarnecerem e zombarem com os operários. E a prova é que as companheiras ainda são mais exploradas, calando-se elas sempre em face de tão vil despotismo”9. A concorrência provocada pela crescente introdução de mão-de-obra feminina nas fábricas de tabaco fazia com que se tornasse imperativo o acolhimento das operárias sob a égide da associação10. Só assim poderiam ultrapassar as limitações impostas pelo género e seguir um rumo correto na defesa dos interesses de todos os que trabalhavam nesta indústria, naturalmente sob a liderança dos homens, já que as mulheres eram “esse sexo frágil”, que servia os patrões como “uma arma terrível com que têm combatido os nossos direitos”11. Se neste artigo datado de 1880 se percebe uma clara dicotomia entre homens e mulheres, sublinhando a ameaça que elas representavam para os “nossos direitos”, ou seja, os direitos específicos dos homens como verdadeiros produtores de tabaco, dezasseis anos mais tarde, na sessão comemorativa do aniversário da ACMT, realizada a 3 maio de 1896, o dirigente associativo Joaquim José da Rocha mostrava-se preocupado com a situação dos tabaqueiros, um setor operário onde o número de homens era cada vez mais reduzido e questionava: “O que será das mulheres sem o apoio do sexo forte?” Segundo ele, era importante que as operárias começassem a integrar os corpos gerentes da associação “para se irem iniciando nos trabalhos associativos, para, se um dia se acharem sós, sem o apoio dos homens, saberem conduzir-se na associação”12. Esta sugestão, se bem que reafirmando a conceção de fraternidade marcada pelo género, abre a porta à participação das mulheres nos órgãos dirigentes da associação. Essa abertura é uma necessidade decorrente do peso feminino na mão-de-obra e na associação: de facto, entre 1892 e 1896, 74% da mão-de-obra feminina fazia parte da ACMT13. Se em 1872, não sabemos por que motivo, excecionalmente uma operária presidiu à assembleia realizada em 13 de dezembro, decorrendo a reunião “dentro do normal respeito” por parte dos participantes, os quais incluíam muitas mulheres que usaram da palavra para elogiar a associação14, só muito mais tarde se verificou a integração preconizada por Joaquim José da Rocha, pois foi durante a 1ª República que foram eleitas as primeiras delegadas suplentes15. Esta demora institucional não impediu que as mulheres lutassem pelos direitos dos operários em geral, se bem que, segundo o discurso associativo, no êxito tivessem sido sempre enquadradas pela associação liderada pelos homens:

As manipuladoras de tabaco têm de há muito respeitado a linha de conduta aconselhada pelos seus companheiros nas diferentes evoluções por que tem passado a classe para reivindicar os seus direitos. Elas têm-se manifestado contra a usurpação de garantias adquiridas com sacrifício e perseverança, pactuando nos protestos e reclamações justas que se têm evidenciado coletivamente. Podem ficar certas de que, enquanto seguirem os seus companheiros como até aqui e compreenderem que a causa dos trabalhadores se resume nos sublimes princípios de ‘um por todos e todos por um', ser-lhes-ão respeitados os seus direitos e regalias pela lealíssima defesa imposta com ardor e interesse que se deve prodigalizar a todas as causas justas que se pretendam amesquinhar; de contrário, voltariam de novo aos horríveis tempos da miséria extrema, aos ignóbeis vexames por que passaram e a todas essas deploráveis situações de sacrifícios e martírios16.

O discurso construía uma identidade dos tabaqueiros marcada pelo género, não obstante as mulheres dominarem quantitativamente os efetivos operários na indústria. Sob a liderança dos dirigentes associativos, exclusivamente masculinos, tinha sido possível obter conquistas e melhorar as condições de trabalho e de vida. De outra forma, nada teriam conseguido, dado que esta não seria a esfera própria das mulheres, o que condicionava a sua capacidade de liderança e de combate à miséria.

Este discurso, se bem que mantendo-se influenciado pelo género ao longo do período em análise, acabou por ser moderado, não apenas pelo crescente número de mulheres na mão-de-obra fabril, mas também pelo carácter combativo e interventivo que as operárias demonstraram. O seu poder de iniciativa fez-se sentir no meio associativo e nos locais de trabalho desde muito cedo: em novembro de 1872, formou-se uma comissão paritária de cinco cigarreiros e cinco cigarreiras para reunir com o visconde da Horta e discutir a redução do pagamento do fabrico de diversos tipos de cigarro. Na sequência desta luta, em que os operários rejeitaram o aumento que lhes era proposto, porque no acordo não era incluído o trabalho feminino, um charuteiro escreve que os operários da Lisbonense haviam praticado

o mais sublime exemplo de fraternidade! É porque estes companheiros conhecem perfeitamente que a mulher, como operária, tem os mesmos direitos e os mesmos deveres que o homem, como operário. Vejam neste ato as nossas irmãs de trabalho de quantos sacrifícios somos nós capazes, para que os seus direitos sejam respeitados por esses exploradores, que todo o seu fim é matar-nos à fome, zombando a todos os momentos de nós, ora tirando-nos o pão da boca, ora prostituindo as nossas filhas, muitas vezes vítimas da sua ignorância – e da miséria!17

Ao enaltecer o sacrifício dos operários, o autor não deixa de também sublinhar a igualdade de direitos e de deveres para todos os que compunham a mão-de-obra fabril. Naturalmente, subjacentes a estas palavras estão preocupações de ordem económica, em particular a preferência pela contratação de mulheres, a quem as fábricas pagavam menos do que aos homens, e o aumento do risco de desemprego para estes, mas parece-nos importante que se assuma uma ideia de fraternidade inclusiva, envolvendo operários e operárias.

Se através do discurso verificamos a delineação de uma conceção de fraternidade diversa da que encontramos noutros setores operários, também na prática se afirma o papel ativo das mulheres na associação e nos locais de trabalho, quer em conjunto com os seus companheiros de fábrica, quer de forma autónoma. A definição das mulheres como frágeis, submissas e facilmente manipuladas pelos patrões, ou seus representantes, e incapazes de, por si, lutarem contra o que percebiam como injustiça, parece ser contrariada pelas diversas ações de iniciativa feminina. Exemplos disso são a recusa das operárias de substituírem os charuteiros, ganhando um salário inferior ao dos homens, mantendo-se no trabalho em que estavam18 a paragem espontânea do trabalho na fábrica de Xabregas, em 1873, contra a admissão de duas ex-operárias da Regalia, numa altura em que era recusado trabalho a operários e operárias daquela fábrica, logo seguida pela greve das cigarreiras da Regalia contra a má qualidade do papel, que prejudicava a manipulação. A atitude das operárias, porém, seria criticada pelos dirigentes associativos, nomeadamente da Fraternidade Operária que, numa reunião mantida nessa mesma noite, as demoveram da ação por ser inconveniente19, a luta das charuteiras da Lisbonense contra a suspensão de oito companheiras, em 187720; a greve das operárias da fábrica de Xabregas, em 1881, contra a substituição do mestre da oficina de charutos finos por um mestre alemão21; a paralisação das operárias da mesma fábrica, três meses depois, contra a diferença de pagamentos pelo mesmo trabalho em duas fábricas da mesma empresa, a Companhia Nacional de Tabacos22; a iniciativa das cigarreiras da Regalia, em 1882, exigindo melhor tabaco para manipular, convidando os cigarreiros que as acompanhassem na luta23 e a integração de mulheres na comissão operária durante a greve da mesma fábrica Regalia, naquele ano. Para lá das ações no local de trabalho, e sendo raros os testemunhos escritos por operárias, é importante que se registe este apelo de uma cigarreira da fábrica Luso-Britânica, em defesa da igualdade de pagamento para trabalho igual:

Porque nos pagam mais barato a nós? Pois não temos tanta precisão? De certo que temos, e é tanta maior injustiça quanto às nossas companheiras charuteiras se lhes paga pelo mesmo preço que aos charuteiros. Isto porque o seu trabalho tem tanto valor como o deles, assim como o nosso comparado com o dos cigarreiros; portanto temos igual direito à paga, pertence-nos a mesma justiça, e aos srs. industriais pertence-lhes o mesmo dever para connosco, e não abusar da nossa fraqueza24.

A vida associativa não podia, portanto, ficar indiferente à força numérica e à capacidade interventiva das mulheres nesta indústria, influenciando decisivamente os interesses que as associações operárias defenderam junto dos patrões e dos poderes públicos, como veremos adiante. Em suma, o papel das operárias dos tabacos terá sido, na nossa opinião, importante, não no desempenho de cargos associativos, não na elaboração do discurso patente nas publicações operárias, até porque a larga maioria era analfabeta25, mas sim de modo informal, fazendo com que a marca dominante do género masculino tivesse de ser moderada no discurso e na prática.

A construção da identidade dos tabaqueiros assentou em três pilares – a igualdade, a justiça e a fraternidade. Se, nos casos da igualdade e da justiça, o discurso dos tabaqueiros não difere do de outros setores operários, já o conceito de fraternidade teve de ser infletido no que ao carácter de género diz respeito. Predominando nos textos a assunção da superioridade do homem sobre a mulher, detetamos, porém, alguma incoerência nesse discurso, motivada pela supremacia numérica das mulheres na mão-de-obra e pela intervenção ativa destas na vida associativa e nas lutas quotidianas nos locais de trabalho. Ao contrário do propalado carácter submisso e frágil, as operárias tabaqueiras revelaram um espírito combativo e mobilizador, por diversas vezes demonstrando a sua autonomia em relação à associação. Quer tenham sido enquadrados pela associação, quer tenham tido formas e estruturas que revelam alguma dificuldade por parte dos dirigentes associativos para controlar os protestos dos tabaqueiros, esses combates foram travados em nome da justiça e da igualdade, contra um sistema económico, social e político considerado responsável pela degradação do operário enquanto ser humano.

 

OS TABAQUEIROS, “PROLETÁRIOS MORAIS”

Os protestos que mencionamos anteriormente, bem como outros a que nos referiremos mais à frente, mostram que os interesses dos tabaqueiros eram, em muitos aspetos, semelhantes aos de outros setores da classe operária. Como proletários, sentiam a fragilidade da sua condição derivada da precariedade do que tinham para oferecer – os seus braços – e sofriam com a incerteza do emprego. Assim, as preocupações dos operários das fábricas dos tabacos de Lisboa, particularmente entre os anos 60 e os anos 80 do século XIX, centraram-se em questões relacionadas com o local de trabalho e a ameaça ao emprego.

Apesar de trabalharem numa das mais rentáveis indústrias nacionais, os operários tabaqueiros contavam-se, até aos anos 90 do século XIX, entre os trabalhadores mais pobres de Lisboa26. Os baixos salários auferidos, fosse no período do contrato, fosse durante o período de liberalização do fabrico, assim como a perda dos postos de trabalho levaram os operários a tomar medidas extremas em diversas ocasiões, que refletem a fragilidade da sua situação. Em 1874, por exemplo, operários charuteiros que haviam sido dispensados requereram licença para pedir esmola27; nove anos depois, vinte e seis operárias cigarreiras da fábrica de Xabregas entregaram uma petição à Rainha, pedindo uma esmola28; em 1887, as operárias empacotadoras da fábrica Vasco da Gama, afetadas pela fusão das fábricas, foram ao Palácio da Ajuda pedir esmola29. O recurso à esmola do público em geral, ou da família real, ou ainda a ocupação dos desempregados em outras tarefas, como a construção, não solucionava os problemas dos operários30. Como escrevia Alves Roque, em 1883, as esmolas apenas minoravam a carência de trabalho e de salário31, pelo que se tornariam necessárias outras formas de pressão sobre os patrões e os poderes públicos.

O repertório de ações coletivas levadas a cabo pelos tabaqueiros incluiu, desde logo, a greve32, das quais damos conta em síntese, no Quadro 1. Foram greves de duração variável, mas relativamente longas, com destaque para a de fevereiro de 1920 (80 dias), também abrangendo um número de operários variável, e com motivações dominantemente salariais, ou contra os despedimentos. Apenas a greve na Regalia, em 1882, e que terminou em derrota para os operários, visava contestar a substituição de cigarreiros por mulheres. Aliás, das nove greves referenciadas, apenas em três os operários foram total ou parcialmente bem-sucedidos, reflexo do fraco poder de negociação evidenciada por este setor da classe operária face aos patrões e aos interesses estabelecidos.

 

 

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Para lá da greve e de protestos com ou sem o abandono dos postos de trabalho, como os exemplos dados anteriormente, várias vezes protagonizados por mulheres e não estruturados pelas associações, os tabaqueiros recorreram a concentrações seguidas de manifestações pelas ruas da cidade, à formação de comissões com vista a entabular negociações com os patrões das fábricas, ou para levar as suas preocupações e reclamações a outros níveis do poder. Fosse qual fosse o tipo de ação levada a cabo, a justificação tinha por base a questão da justiça e da moral. Os tabaqueiros são um exemplo do conceito de proletários morais, cunhado por Donald Reid, isto é, trabalhadores cujas práticas morais individuais ou coletivas lhes permitiriam triunfar sobre a degradação e a penúria34. Assim, as suas ações visavam combater um sistema injusto e imoral, que privava os operários de direitos fundamentais e, no limite, do próprio direito à vida:

A natureza dá-nos vida, por conseguinte temos o direito de viver, ela que nos dá esse direito, ela e só ela tem o mesmo direito de no-la tirar. Não temos ódio a classes ou homens; eles obram unica e exclusivamente debaixo das praxes da organização atual que tudo isso lhe permite. Queremos uma nova organização baseada na justiça e na razão que tenha por fim a perfeita distribuição da riqueza social produzida por todas as coletividades de que se compõem os seres humanos35.

Nestas linhas, escritas em 1896, exprime-se um programa de cariz socialista, isto é, rejeitando o individualismo inerente ao capitalismo, assente em princípios como a associação, a igualdade, a justiça e o orgulho da força produtiva e o direito natural, mas rejeitando o ódio de classes. A sociedade socialista seria cooperativa e coletivista, em alternativa à competitividade e ao individualismo que caracterizavam a sociedade capitalista. Os operários tabaqueiros consideravam possível garantir a justiça social através de meios que não implicavam a violência ou o confronto radical entre classes sociais. Esta linha de pensamento materializou-se na prática, mesmo quando recorriam a formas de luta mais duras. O seu objetivo era assegurar as melhores condições possíveis para os operários, utilizando para esse fim todos os meios ao seu alcance, independentemente do seu carácter de classe. Os patrões deviam fazer o que estava moralmente certo e os operários responderiam da mesma forma. Em 1887, apelava-se à Companhia Nacional de Tabacos:

deve harmonizar o capital trabalho com o capital monetário, porque a aristocracia de um não é inferior à aristocracia do outro, e repartindo com aqueles que os ajudam a enriquecer não faz mais do que o seu dever, é preciso que se fraternize o capital com o trabalho, e cesse essa exploração assaz indigna que outra coisa não é mais do que um odioso que já há muito devia ter acabado36.

Retomando o tema da nobreza do trabalho, e colocando ao mesmo nível o Capital e o Trabalho, fazia-se a apologia da conciliação das classes. Esta perspetiva seria repetida em 1895, agora já de novo sob o monopólio, em documento enviado ao Conselho de Administração da Companhia dos Tabacos de Portugal (COTAPO): “A classe dos manipuladores de tabaco tem o maior respeito pelo digníssimo Conselho de Administração e pela lei, e o seu mais ardente desejo consiste em harmonizar quanto possível os interesses do capital com os do trabalho”37. Não havia sonhos de expropriações, nem sequer de partilhas de riqueza com os operários. Desejava-se a igualdade e a justiça sem tirar nada a ninguém, mas dando aos que trabalhavam aquilo a que tinham direito por Natureza. À semelhança de outros setores operários, os tabaqueiros de Lisboa lutavam contra a pressão para transformar os seres humanos em meros servidores da economia, numa sociedade dominada pelas relações de produção e por uma visão do mundo em que a produção desempenhava um papel central. Nesse quadro, os operários cedo perceberam a relevância política e económica da indústria dos tabacos, adaptando o seu discurso e as suas ações a essa especificidade, rejeitando levar à prática uma ideia de luta de classes. Fazendo uso de uma retórica em que sublinhavam o carácter ordeiro e respeitador destes trabalhadores, aliaram-se a todos aqueles que os poderiam ajudar a conquistar os direitos que consideravam legítimos, independentemente da classe de onde viesse esse apoio.

Um dos meios a que os tabaqueiros recorreram para chamar a atenção para a sua situação e afirmar o seu carácter moral foi a imprensa não operária. Dessa forma, alcançavam uma audiência mais vasta que, ao simpatizar com a sua causa, poderia exercer pressão sobre os poderes públicos. Logo em 1863, numa carta publicada pelo jornal O Português, expunham as suas queixas e apelavam à intervenção do governo “em favor dos que tiveram só a intenção de obterem melhor salário” e que, após uma assembleia no Campo de Santa Clara, tinham atravessado “parte desta capital na melhor ordem possível” em direção à casa do ministro da Fazenda, que recebeu um operário portador da representação aprovada naquela reunião. O comentário do responsável pelo artigo reforçava a ideia de que as reclamações eram “bem justas e dignas de ser atendidas” e sublinhava o facto de o ministro ter recebido enquanto “intermediário” “aqueles deserdados da fortuna, que buscaram o patriotismo numa conjuntura difícil”38. Ao optar por um comportamento ajustado ao cumprimento da lei e da ordem, os tabaqueiros punham a opinião pública do seu lado, pelo que insistiam neste ponto, alguns dias mais tarde, aquando da deslocação de tropas de Cavalaria e da Guarda para junto das instalações fabris de Xabregas. Numa nova carta dirigida à imprensa, reafirmavam:

os operários não pedem mais do que pão para poderem subsistir, e não lhes é possível viver tão desgraçadamente e suas famílias. Se os seus inimigos os querem excitar à desordem, estão perfeitamente enganados porque eles hão-de mostrar ao público desta capital, que são pacíficos, e que o ato em que incorreram foi filho da desesperação39.

No ano de 1870, mesmo sob a ameaça e o cerco da fábrica Regalia por tropas, os operários que haviam entregado um pedido “nos termos mais respeitosos e no livre uso do direito de petição”, contra a nova tabela de salários para os charuteiros, mantinham o seu propósito de “afastar de si qualquer má impressão que o caso produzisse no espírito público”. Não queriam “ser tidos por desordeiros ou exigentes do que não seja legal ou razoável dentro dos limites da ordem e do respeito que mutuamente se devem todas as classes”. Se o fizessem, prejudicariam “as suas reputações como homens”, mas também poderiam afetar o seu futuro quando “hajam de procurar trabalho noutro estabelecimento”40.

Um ano mais tarde, na sequência da derrota da greve da Regalia, explicava-se que os operários haviam decidido pôr fim ao protesto “cônscios de terem procedido com a dignidade própria de operários civilizados, que souberam advogar os seus interesses com ordem e moderação”. Ao mesmo tempo, agradeciam à imprensa “a maneira atenciosa por que foram tratados, e bem assim ao Governador Civil e comissário Rangel”41. Os tabaqueiros enalteciam o seu comportamento e o de todos aqueles que haviam mantido uma atitude considerada justa. Eles eram proletários morais, dispostos ao sacrifício, mas seguros de que a justiça chegaria mais tarde ou mais cedo, sem haver necessidade de recorrer a meios violentos: “Paciência! Um dia mais no Calvário, crucificados pela fome, pelo frio, pelo vilipêndio; e a ressureição, essa obra assombrosa que nós preparamos com os nossos males, fará tremer a terra! Sim, fará!”42, escreviam como reação à recusa dos patrões em recuar nos despedimentos na Regalia. Enquanto estes tinham um comportamento imoral, os tabaqueiros recorriam ao simbolismo cristão para reforçar a representação da sua realidade quotidiana. Também nos momentos de celebração da vitória, os operários manifestavam o seu carácter moral:

Somos vencedores, mas fraternais, e havemos de sê-lo sempre, perdoando áqueles que, sendo nossos inimigos, só nos queriam aniquilar e cavar a nossa ruína, sem se lembrarem que podíamos ainda ganhar uma vitória, com a qual abatêssemos a sua altivez e principiássemos a despedaçar os grilhões da escravidão… Honra aos proprietários da fábrica que reconhecendo que eram iludidos e que os operários só reclamavam o que era de justiça (…)43.

Sem triunfalismo, ou afirmação de ódio de classe, os tabaqueiros optavam por um caminho que divergia do escolhido por outros setores operários, não conciliadores com os “inimigos”. Isso não impediu que, no seio dos manipuladores de tabacos, houvesse quem, num ou outro momento, usasse uma retórica mais agressiva, como Damásio da Graça, em 1887, numa diatribe contra o monopólio:

Se os poderes constituídos não atenderem às nossas justas reclamações; então nós que sempre temos sido sossegados e bastante moderados em todos os nossos atos, nós que sempre temos sido prudentes e ordeiros, não hesitaremos nem um instante em recorrermos aos meios extremos, e acabarmos com a prudência, com a tolerância e com todo o respeito à lei, e servir-nos-emos dos meios violentos que deixam de ser crime para se tornarem em virtudes44.

Porém, a atitude dominante não foi a do confronto, preferindo-se buscar na opinião pública e noutros aliados a força que os operários admitiam não ter no contexto em que viviam. Ao longo do período em análise, a defesa dos interesses dos tabaqueiros exerceu-se sempre dentro dos limites de que acima demos exemplos, acentuando-se durante e após o regime de régie45. Entre 1888 e 1891, não houve conflitos de maior dimensão, até porque muitas das reclamações que tinham apresentado anteriormente foram satisfeitas com a intervenção do governo e, muito em particular, pela administração liderada por Oliveira Martins46. Nesses anos, desaconselhavam-se ações precipitadas, ou exigências descabidas que pusessem em causa o que havia sido garantido. Assim:

Nós aconselhamos aos operários a máxima cordura, e aplaudimo-los pelo seu procedimento ordeiro, no sábado (22); mas também lhes lembramos, que quando se julguem lesados ou ofendidos, junto da Companhia há um fiscal do governo, que há-de atender às reclamações dos operários. E depois do fiscal há o sr. Ministro da Fazenda, há o parlamento, e ainda há mais a quem podem reclamar justiça, quando dela careçam”47.

É significativo que não se sugira qualquer ação incluída no repertório tradicional de luta operária. Tal terá a ver, necessariamente, com a gestão estatal, mas corresponde no essencial à opção por uma via de diálogo transversal às classes, uma via pragmática que tinha como objetivo central a defesa da dignidade das condições de vida e de trabalho dos tabaqueiros. Esta opção foi também importante para que estes operários não apresentassem apenas reclamações relacionadas com as relações de produção no local de trabalho, mas que fugissem ao reducionismo próprio de muitas associações e sindicatos que tendiam a focar os trabalhadores no consumo. Ou seja, os sindicatos, em diversos contextos, afastavam-se dos problemas relacionados com a comunidade, a família ou o género, para centrarem a resistência operária apenas nas questões materiais48. As associações de tabaqueiros souberam ir para lá dessas questões e desenvolveram reclamações relacionadas com outros aspetos do dia a dia, satisfazendo as necessidades de todos, e especificamente das mulheres. Foram importantes as lutas pelo direito à reforma paga e à assistência médica fora do local de trabalho, garantidas durante o período da régie, pelo estabelecimento de uma farmácia privativa, criada pela Companhia dos Tabacos de Portugal em 1894, pela criação de creches junto às fábricas49. Esta foi uma luta que se arrastou ao longo de vários anos, que teve uma primeira experiência em 1910, a qual terminou por aparente falta de adesão das operárias50 e apenas se concretizou durante o Estado Novo, em 193651. Associada à importância das mulheres nesta indústria, está ainda a construção de uma maternidade da Companhia, em funcionamento no ano de 1931, com uma adesão crescente por parte das operárias52. Não poderia ser esquecida a participação das organizações dos tabaqueiros nos protestos contra a carestia da habitação em Lisboa, um dos flagelos que afetava a classe em geral, mas a que os operários dos tabacos deram particular atenção53.

A satisfação dos interesses imateriais passava, também, pela instrução dos operários e dos seus filhos. É muito significativo que, logo no primeiro número de A Voz do Operário, o tabaqueiro Custódio Braz Pacheco condene o tratamento do operário como um escravo, até porque o talento não era um monopólio de classe. Dava mesmo o exemplo do manipulador de tabaco, Pedro José de Carvalho, autor de poesia e de peças de teatro, entre outros operários com dotes artísticos. Eles eram provas vivas da capacidade de elevação dos trabalhadores, mas que era essencial que houvesse as condições para que o talento desabrochasse, nomeadamente condições de igualdade ao nível da instrução:

Dizem esses desumanos potentados pretendendo justificar o seu repreensível procedimento, que cada um tem o direito de viver com a grandeza e a decência relativas à sua posição. Mas quem os elevou a esse estado de grandeza não fomos nós os operários? Certamente que sim, porque o capital procede ou deve proceder do trabalho. Nós que lhes proporcionamos todas as comodidades não teremos direito a gozar também algumas, e a mandarmos educar os nossos filhos? O talento não é privilégio dos ricos, e por isso se os filhos do povo fossem instruídos como deviam ser não se perderiam algumas inteligências que passam despercebidas por não serem cultivadas54.

Os verdadeiros criadores de riqueza também podiam ser criadores de saber e de cultura, desde que lhes fornecessem as ferramentas adequadas. Daí a importância que a instrução teve para os manipuladores de tabacos, criadores dessa grande instituição do ensino que foi a Sociedade de Instrução e Beneficência “A Voz do Operário”, cuja primeira escola foi inaugurada em 11 de outubro de 189155. Chegando a ter mais de três mil alunos de ambos os sexos em escolas espalhadas por toda a cidade no início do século XX56, a “Voz do Operário” tornou-se um símbolo do direito à instrução para todos, mesmo (ou principalmente…) aqueles que não tinham condições económicas para estudar ou pôr os seus filhos a estudar. Através da sua obra, os manipuladores de tabacos procuravam distribuir a luz da instrução aos que eram vítimas da injustiça que caracterizava a sociedade capitalista57. Como afirmava António de Jesus Soares em carta dirigida a A Voz do Operário, a instrução dos operários devia partir da iniciativa dos próprios, porque nada se devia esperar dos governos58.

Os operários da indústria dos tabacos em Lisboa desenvolveram ao longo do século XIX e das primeiras décadas do século XX uma identidade própria no seio da classe operária. Essa identidade passou pela afirmação de uma estratégia de ação na defesa dos seus interesses que correspondia à especificidade do setor e se traduziu na rejeição da luta de classes, na procura do diálogo com o poder económico e político e no estabelecimento de alianças com elementos ligados a esse poder que pudessem auxiliar na satisfação daqueles interesses. A contínua representação do tabaqueiro como cumpridor da lei e da ordem, e com o direito à garantia de condições de vida e de trabalho dignas de um ser humano, fizeram destes operários exemplos de proletários morais que, representados pelas suas associações, não apenas lutaram por interesses relacionados diretamente com o local de trabalho e o consumo, mas também com interesses não materiais, em particular, a instrução.

 

A AÇÃO POLÍTICA

O caminho conciliatório seguido pelos manipuladores de tabacos nem sempre foi bem aceite pelo chamado movimento operário. As acusações de isolacionismo, de falta de solidariedade e de defesa de interesses corporativos generalizaram-se, em especial, ao longo das duas últimas décadas de Oitocentos e inícios do século XX.

Na verdade, depois do perturbado Congresso das Associações de Classe de 1892 no Porto, jamais as associações de manipuladores de tabacos voltaram a enviar delegados a qualquer congresso operário59. Se bem que reconhecendo “a conveniência da federação, que bem organizada é útil”, os dirigentes associativos consideravam haver assuntos mais prementes a tratar e a Federação das Associações de Classe foi votada ao desprezo60. A esta decisão juntava-se o desinteresse dos manipuladores de tabacos pela participação nas comemorações do 1º de Maio organizadas pela União Operária. Desde 1899, os manipuladores de tabaco deixaram de nomear delegados à organização da manifestação e em 1900 não participaram mesmo no desfile61.

Em contrapartida, os operários dos tabacos prestavam homenagem a Oliveira Martins, Augusto Fuschini e Dantas Baracho, inaugurando os seus retratos na sede associativa, em agradecimento pelas suas intervenções em benefício dos operários no período da administração estatal, no parlamento ou no tribunal arbitral62. Não participavam nas manifestações do 1º de Maio, um “ritual da classe operária”, mas incluíam-se nas cerimónias fúnebres do rei D. Luís ou exprimiam a intenção de se incorporar no cortejo cívico em homenagem a Camões63. Esta participação nos rituais cívicos revela o desejo de integração por parte deste setor da classe operária, de obtenção de uma justiça simbólica, para lá da real, pois durante essas cerimónias ser-lhe-ia concedido reconhecimento e estatuto social.

O caminho seguido pelos tabaqueiros provocou reações de vários quadrantes, nomeadamente dos setores socialistas representados pelo jornal O Protesto Operário, órgão do Partido Socialista. Acusando A Voz do Operário de ser um órgão que semeava a discórdia nos meios operários, questionava-se “se essa ‘Voz' é do céu ou do inferno; se é de operário oprimido, ou de patrão velhaco, se é de político burguês ou de trabalhador socialista”64. Alguns dias depois, voltavam a levantar-se dúvidas sobre o verdadeiro carácter do jornal dos manipuladores de tabacos: “A ‘Voz do Operário' é socialista? Se é socialista e sabe que os esforços isolados são inúteis por que não trabalha com os outros socialistas portugueses? Se não é socialista, para que está constantemente mentindo aos operários?”65 A polémica prolongar-se-ia com um ataque direto às alianças dos tabaqueiros de Lisboa, criticando aqueles que consideravam ser possível uma aproximação entre o Trabalho e o Capital, numa clara assunção da ideia de luta de classes: “A aliança deste com aquele, é impossível; pois que dessa aliança resultaria a existência dos ricos e pobres, de servos e patrões, de governados e governantes, tal qual hoje existe, e, portanto, a miséria, a dependência e a servidão”66. Esta crítica em particular havia nascido como réplica a Custódio Braz Pacheco, que havia afirmado ser republicano em política e socialista em economia. Ora, do ponto de vista dos socialistas de O Protesto Operário, essa era uma posição indefinida e, no limite, insustentável, até porque, escrevia o articulista:

republicanos TODOS NÓS O SOMOS; mas que aqueles que só se contentam com a forma republicana, continuam a querer na essência as coisas tais quais estão, isto é – a supremacia do capital; e que os que trabalham pelo triunfo do socialismo querem não só a república, mas também a supremacia do trabalho, com todas as suas consequências.

Esta polémica não tinha apenas origem externa, pois no seio dos tabaqueiros havia divergências quanto à estratégia a seguir, de que seria reflexo o aparecimento de associações opostas à ACMT, e que diziam ser representativas dos operários do setor67. Os êxitos obtidos com a régie e nos contratos após o final da administração estatal não deixaram espaço de manobra para os que defendiam a radicalização dos tabaqueiros de Lisboa, apesar do aumento da conflitualidade laboral sob a 1ª República. Isso não impediu que houvesse greves setoriais nas fábricas de tabaco, ou que participassem ativamente em greves gerais e de solidariedade com outros setores operários após a implantação da República68 e de receber a solidariedade dos ferroviários durante a greve na Primavera de 1918 (Figura 1). Ou seja, os tabaqueiros não estavam tão afastados do chamado movimento operário como alguns setores procuravam fazer crer, tendo mesmo entregue à União Operária Nacional a resolução da única greve que terminou em vitória, se bem que parcial, durante a 1ª República69.

 

 

 

 

Na origem das críticas apontadas aos tabaqueiros está o seu aparente afastamento da luta política pela transformação da sociedade, mas especificamente pela substituição do sistema capitalista pelo socialismo, isto é, por um sistema de maior justiça social. De facto, desde cedo que a recusa da mistura da política com a luta sindical fez parte do discurso dos manipuladores de tabacos. Na apresentação de A Voz do Operário, afirmava-se a independência em relação aos partidos políticos e dizia-se em relação ao periódico recém-nascido: “Não lhe ensinamos política porque para o mister a que se propõe não precisa dela”70. Em 1887, numa reunião associativa contra o grémio dos tabacos, houve o cuidado de evitar a infiltração de estranhos, “por causa dos políticos que quisessem especular com a questão”, e dava-se o exemplo negativo dos manipuladores de tabacos do Porto, cujos protestos teriam sido utilizados como arma da luta política, com impacto nocivo para aqueles operários71.

Compreende-se esta rejeição da interferência política nas lutas por objetivos económicos centrados no local de trabalho, tanto mais que o setor dos tabacos era, por natureza, apetecível para a luta partidária durante o período em análise. O debate em torno do regime de fabrico, no final dos anos 80 do século XIX, é revelador disso mesmo. Enquanto os dirigentes associativos mostravam a sua simpatia pela administração estatal, pelo menos enquanto regime de transição72, esta solução era contestada pelos socialistas marxistas de O Protesto Operário que alertavam para o carácter de classe do Estado, o que faria com que as condições de vida e de trabalho dos tabaqueiros, no fundo, não sofreriam alteração73. Para essa corrente socialista, o regime dos tabacos era essencialmente uma questão política, numa perspetiva que não era bem vista pelos dirigentes das principais associações de operários tabaqueiros. Contudo, isso não significa que tenham desprezado a intervenção política para a obtenção da saída que consideravam mais adequada à realidade dos manipuladores de tabacos. Pelo contrário, o estabelecimento de alianças de facto com deputados como Fuschini ou Eduardo Abreu, desvalorizando a questão de classe tão cara aos marxistas, é uma ação significante de uma estratégia pragmática que usava as forças disponíveis na arena política, em função da satisfação dos superiores interesses dos operários tabaqueiros.

Essa estratégia adequava-se ao contexto económico e político e não era impeditiva de que o discurso dominante fosse de cariz socialista, isto é, defendendo a Justiça, a Igualdade e a Fraternidade, se bem que numa perspetiva reformista. Os manipuladores de tabacos haviam sido uma das mais importantes secções profissionais da Associação Fraternidade Operária, fundada em janeiro de 1872, com cerca de 1640 inscritos, 960 homens e mulheres74. O entusiasmo que as ideias socialistas veiculadas pela Fraternidade Operária provocou entre os manipuladores de tabacos foi evidente em momentos como aquele em que, numa só assembleia, foram aprovados 590 novos sócios75. Desde então, os operários dos tabacos identificaram-se e foram identificados com o socialismo76. As divergências em relação à estratégia reivindicativa e grevista seguida até 1873, e que culminara na derrota da greve na fábrica Luso-Britânica77, fizeram com que os dirigentes dos tabaqueiros tomassem consciência de que os trabalhadores haviam sido conduzidos a um beco sem saída:

Quando entrámos no movimento operário, em 1872, entusiasmados com as teorias socialistas, que para nós surgiam como raios vermelhos em alvorada de Maio, julgámos, com a ingenuidade dos poucos anos e a crença no ideal que abraçámos, que a hora redentora para o operariado ia prestes soar, que a exploração do homem pelo homem em breve acabava, que o reinado da justiça em pouco tempo seria um facto78.

A euforia do início dos anos 70 deu lugar a uma linha de ação que se pretendia mais refletida, mais realista, em que os esforços dos operários fossem dirigidos no sentido das conquistas imediatas, sem valorizar a luta de classes ou os objetivos revolucionários que outros setores operários perseguiam79. O socialismo reformista tornou-se o discurso unificador dos tabaqueiros, nomeadamente nos anos 80 e 90 do século XIX, levando-os numa via de compromisso de classe que, escreveu um operário, se não os fez alcançar a felicidade, levara-os a uma situação melhor do alguma vez haviam tido, pelo menos durante a vigência da administração estatal80.

As lutas que se seguiram ao fim da régie mantiveram o mesmo carácter, com a procura de apoio em todos os quadrantes, em especial junto de quem tinha o poder para se opor à Companhia, incluindo o monarca:

Operários manipuladores de tabaco, ide aos poderosos da Nação, aos que pela nobreza dos seus sentimentos compreendem conscienciosamente o que é a justiça dos homens mal intencionados, levai-lhe a vossa lei de proteção que está sendo anulada sofisticamente, implorai-lhes a sua defesa por uma classe que foi desgraçada e que o pode tornar a ser sem justificação plausível, a não ser para tornar mais valiosa a riqueza dos contratadores. Ide ao Chefe do Estado, lembrai-lhe as promessas feitas por seu pai, e postas em execução protetora para com esta classe, dizei-lhe que a Companhia dos Tabacos é mais poderosa do que lei de proteção iniciada pelos humanitários princípios concedidos pelo seu saudoso pai. Dizei-lhe tudo enfim, porque a Constituição dá-lhe o supremo direito de fazer manter a lei ou rescindir o contrato”81.

Através da pressão exercida junto dos poderes públicos seria possível contrariar o “colosso” que era a Companhia dos Tabacos. De outra forma, nada se poderia obter. A conquista do apoio junto dos detentores do poder político e da opinião pública continuava a ser fundamental na estratégia dos tabaqueiros. Nada devia ser feito que pudesse alienar esse apoio ou, pelo menos, a simpatia obtida: “O operariado, dando ao mundo exemplos de cordura e sensatez, conquista por esse meio, mais, muito mais em seu proveito, do que porventura praticar qualquer insensatez que o manche perante a história”82. Nenhum aliado podia ser desprezado, fossem deputados ou pares do Reino, como Fuschini, Baracho, Anselmo de Andrade, ou João Franco83, fosse o próprio monarca84. Afinal, o governo parecia ser o garante do estabelecimento e cumprimento de um contrato justo e seria nele que os tabaqueiros depositariam a sua esperança quando não houvesse abertura da parte da administração da Companhia para satisfazer as reclamações operárias:

Não sabemos o que sucederá, afinal, de tantos debates. Mas indiferentes à solução ulterior, só hoje consideramos o Estado como elemento de valor e de competência para nos auxiliar. É dele que depende o sermos atendidos no que pedimos e que por demais se vê que é justo e equitativo. Sendo a parcela mais valiosa de quantos entram na indústria do tabaco, sendo uma parte importante da Nação, para o Estado apelamos neste momento em que se joga o nosso futuro85.

Consequentemente, a arena política seria um espaço em que os tabaqueiros teriam de saber mover-se habilmente, jogando com as diversas alianças que pudessem fazer a fim da concretização dos seus objetivos. Ao aproveitar as dissensões internas nos partidos, ainda no regime monárquico, ou já na República, contando com o apoio do Partido Socialista Português em diversas ocasiões, os manipuladores de tabacos mostravam a consciência que tinham da importância que a luta política tinha para o seu setor. A manifestação de 25 de março de 1911 , motivada pela questão dos feriados, mas que tinha como objetivo também o despacho dos requerimentos da reforma e os problemas pendentes entre os operários e a Companhia, tinha um pendor claramente político86. Sempre sublinhando a intenção de não pretender “praticar distúrbios ou fazer arruaças” e que a manifestação seria “ordeira e respeitosa”, pois os tabaqueiros sabiam reclamar “com a mais perfeita correção, e se sabe zelar os seus interesses com o máximo cuidado, prima em fazê-lo dentro da mais estrita legalidade”, esta ação pretendia exigir a intervenção do presidente do Ministério, único que poderia resolver o problema dos feriados. A forma ordenada como os operários desfilaram, com os delegados e a comissão dos operários de ambos os sexos à frente, seguindo-se as operárias formadas a quatro e os operários (“em coluna cerrada”), não deixou de despertar “a atenção do público”. No final, e antes de dispersarem “na melhor ordem”, os delegados falaram com o secretário de Teófilo Braga, Levy Bensabat, e com José Relvas, ministro das Finanças87. A esta manifestação, outras se seguiriam até 1926, sempre como forma de intervenção dos tabaqueiros no espaço político, não enquadrados por qualquer partido, mas pelas associações representativas. Subjacente às ações dos tabaqueiros esteve sempre uma ideia de justiça social, de moralização das suas condições de vida e de trabalho que devia ser garantida pelo Estado, sempre que os patrões não cumprissem essa função.

A ação política dos tabaqueiros de Lisboa caracterizou-se, com maior incidência a partir dos anos 80 do século XIX, por uma estratégia que não foi influenciada nem pelo socialismo marxista, nem pelo republicanismo. O socialismo veiculado pelos dirigentes associativos tinha uma matriz reformista, pragmática, logo aberta à possibilidade de alianças com indivíduos que, pertencendo à classe dominante, poderiam ajudar a fazer chegar as reclamações e os interesses dos operários aos centros de poder político. Era o Estado que podia, no contexto nacional, pelo menos moderar a exploração que os patrões levavam a cabo nas fábricas e que se refletia nas condições de vida dos manipuladores dos tabacos e suas famílias. Por isso, o carácter de classe do Estado, que era uma questão central para os marxistas, ou o tipo de regime – monárquico ou republicano –, não marcaram o discurso dos tabaqueiros: o mais importante era jogar na arena política da forma mais adequada, a fim de garantir a melhoria das condições de trabalho e de vida dos operários.

 

CONCLUSÕES

Tendo como matriz comum às suas variantes a procura da justiça social, o socialismo foi o discurso de resposta ao processo de proletarização adotado por vários setores da classe operária que interiorizaram os seus valores alternativos democráticos, igualitários e coletivistas. O socialismo foi, assim, o discurso unificador da classe operária na sua luta pela justiça, pela igualdade e pela fraternidade. No entanto, a elaboração do discurso é feita por “comunidades discursivas”88 que adequam o seu conteúdo de modo a tornar-se inteligível, persuasivo e capaz de ajudar a consolidar e a preservar o grupo. Não8 podemos, por isso, falar de um discurso comum a toda a classe operária, mas sim de um discurso com uma matriz comum, a justiça social, adaptado aos indivíduos que compõem essa classe e refletindo os contextos sociais em que os seus autores escrevem. Os manipuladores dos tabacos de Lisboa são um exemplo de como o socialismo foi aplicado às condições específicas da indústria, às relações sociais de produção e às relações com o Estado, e de como a tradução dos interesses de qualquer grupo social é tudo menos espontâneo e simples.

A perceção do socialismo revelada pelos tabaqueiros na luta pela Igualdade, pela Justiça e pela Fraternidade mostra como qualquer ideologia não é, como escreveu Stuart Hall, totalmente lógica ou consistente, conjugando elementos discordantes, abrindo espaço para diferentes interpretações89. A estratégia que seguiram divergiu das estratégias de outros setores da classe operária, também eles em processo de proletarização, confirmando que não há uma correlação automática entre as condições objetivas, como uma relação semelhante com os meios de produção, e o que as pessoas constroem como sendo os seus interesses e como agem no sentido de os concretizar. Liderados pelas suas associações e não por partidos políticos, os tabaqueiros de Lisboa traduziram os seus problemas e as suas necessidades numa base moral de certo e errado, de justo e injusto, em que os operários se assumiram como proletários morais por oposição à imoralidade do comportamento de todos os que punham em causa a sobrevivência de quem trabalha. Assim, os manipuladores de tabacos adaptaram o socialismo à defesa dos seus interesses e à forma como viam a sua relação com as classes dominantes e o Estado. A rejeição da luta de classes e as alianças que fizeram com personalidades ligadas ao poder político foram escolhas que serviram os interesses imediatos e reais daqueles operários. Ao fazê-lo, deram provas daquilo a que Pierre Bourdieu chamou um “profundo realismo”, que funcionou como uma espécie de instinto de conservação socialmente constituído90. Em suma, a identidade própria dos tabaqueiros de Lisboa no seio da classe operária fez-se de escolhas feitas em momentos chave que determinaram uma trajetória que condicionou outras opções e abriu outras possibilidades.

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FONTES

Arquivo Municipal de Lisboa

Greve dos trabalhadores da Companhia Portuguesa de Tabacos, Ferreira da Cunha, 1918. PT/AMLSB/EFC/001916.

 

Biblioteca Nacional

Arquivo Histórico-Social.

Núcleo Congressos Operários Nacionais.

Núcleo Educação e Cultura.

Espólio de Oliveira Martins.

Correspondência de Oliveira Martins. Cartas a Oliveira Martins.

 

Instituto dos Arquivos Nacionais / Torre do Tombo

Arquivo do Partido Socialista Português.

Livro nº 1. Livro de ponto da Federação das Associações de Classe. 1895-1896.

Livro nº 6. Livro de atas do Centro Socialista de Lisboa. 1899-1913.

Livro nº 7. Livro de matrícula do Centro Socialista de Lisboa. 1901-1926.

Livro nº 8. Livro de atas da União do 1º de Maio. Março de 1903 a Outubro de 1905.

 

 

PUBLICAÇÕES EM SÉRIE

Periódicos dos manipuladores de tabacos

A Voz do Operário (1879-1929).

O Eco dos Tabacos (1932-1933).

 

Outra imprensa

A Batalha (1920).

A Internacional (1923-1931).

A Revolução de Setembro (1871).

Boletim do Trabalho Industrial (1910).

Diário de Notícias (1864-1933).

Jornal do Trabalho (1863).

O Pensamento Social (1872-1873).

O Português (1853-1866).

O Protesto Operário (1882-1894).

O Século (1892-1927).

 

 

PUBLICAÇÕES INSTITUCIONAIS

Inquéritos, legislação e estatísticas oficiais

Administração Geral dos Tabacos – Leis, Decretos e Regulamentos. Lisboa: Imprensa Nacional, 1889.

Administração Geral dos Tabacos – Relatório do Conselho de Administração (1888-1889). Lisboa: Imprensa Nacional, 1889.

Administração Geral dos Tabacos – Relatório do Conselho de Administração (1889-1890). Lisboa: Imprensa Nacional, 1890.

Administração Geral dos Tabacos – Regulamento Orgânico. Lisboa: Imprensa Nacional, 1890.

Companhia Portuguesa de Tabacos – Relatório, parecer do Conselho Fiscal e Documentos (1931-1965).

PORTUGAL. Ministério das Obras Públicas, Comércio e Indústria. Direção Geral do Comércio e Indústria – Inquérito sobre as condições do trabalho manual nas fábricas de tabacos e situação dos respetivos operários. Lisboa: Imprensa Nacional, 1887.

 

 

ESTUDOS

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Submissão/submission: 31/01/2020

Aceitação/approval: 27/03/2020

 

 

NOTAS

1 Para o conceito de classe como formação social e cultural, cf. THOMPSON, E. P. – The making of the english working class. London: Penguin Books, 1991. p. 8-11.

2 SEWELL, William – Toward a post-materialist rhetoric for labor history. In BERLANSTEIN, Lenard, ed. – Rethinking labor history. Chicago: University of Illinois Press, 1993. p. 33.

3 Para uma abordagem à transição do idioma de ofício para o idioma de classe nos sapateiros de Lisboa, cf. BRÁS, Rui Manuel – Formas institucionais e sistemas de valores: as associações de sapateiros de Lisboa, da segunda metade do século XIX ao Estado Novo Oeiras: Celta Editora, 2004, em especial o capítulo 4, da parte II.

4 Em Portugal, as associações de classe conjugavam a função de socorro mútuo e a função sindical. Muitas vezes nascidas a partir de associações mutualistas, evoluíram no sentido de se tornarem verdadeiros sindicatos. A Associação de Classe dos Manipuladores de Tabacos de Lisboa foi fundada no início de 1880, em estreita relação com o jornal A Voz do Operário e a sociedade de instrução e beneficência com o mesmo nome.

5 Divagações. A Voz do Operário Nº 80 (24-4-1881), p. 2.

6 BRAZ PACHECO, Custódio – Os operários. A Voz do Operário Nº 1 (11-10-1879), p. 3.

7 Manipuladores de tabaco: as transferências de manufaturas. A Voz do Operário Nº 1073 (20-5-1900), p. 1.

8 Cf. AMINZADE, Ronald – Class analysis, politics, and french labor history. In BERLANSTEIN, Lenard, ed. – Rethinking labor history. Chicago: University Illinois Press, 1993. p. 103-104.

9 Companheiro V – Os manipuladores de tabaco. O Pensamento Social Nº 42 (02-02-1873), p. 3.

10 Segundo os dados do inquérito realizado, em 1887, nas fábricas de tabaco, em Lisboa, havia 3008 manipuladores de tabaco, sendo 835 homens (27,8%) e 2173 mulheres (72,2%). PORTUGAL. Ministério das Obras Públicas, Comércio e Indústria. Direção Geral do Comércio e Indústria – Inquérito sobre as condições do trabalho manual nas fábricas de tabacos e situação dos respetivos operários Lisboa: Imprensa Nacional, 1887.

11 A Voz do Operário Nº 15 (17-1-1880), p. 1.

12 O aniversário da Associação de Classe dos Manipuladores de Tabacos. A Voz do Operário Nº 863 (10-5-1896), p. 2. Uma posição em contradição com o que era praticado na União Fraternal que, à semelhança de outras associações de socorros mútuos, excluía as mulheres, conforme estatuído no artigo 3º dos seus estatutos. Cf. Estatutos da Associação União Fraternal dos Operários da Fabricação dos Tabacos. A Voz do Operário Nº 266 (30-11-1884), p. 3.

13 Cálculos próprios, cruzando os dados relativos aos números oficiais de operários na indústria com os dos associados na ACMT, patentes nos respetivos relatórios e contas anuais publicados em A Voz do Operário Para o caso francês, Christophe Charle apresenta 55% de sindicalizados nos setores dos tabacos e fósforos, ambos públicos. Cf. CHARLE, Christophe siècle. Paris: Éditions du Seuil, 1991. p. 304-305. Em Marselha, no ano de 1891, 40% das operárias dos tabacos estavam sindicalizadas, segundo TILLY, Louise – Women's collective action and feminism in France, 1870-1914. In TILLY, Louise; TILLY, Charles, ed. – Class conflict and collective action Beverly Hills; Londres: Sage Publications, 1981. p. 225.

14 Segundo o articulista, as operárias intervenientes salientaram que “só a associação afastará do seio das nossas famílias a fome, a nudez e a prostituição!” O Pensamento Social Nº 36 (22-12-1872), p. 3-4.

15 A primazia coube à Associação de Classe do Pessoal dos Tabacos, na qual aparecem as primeiras mulheres escolhidas como delegadas, se bem que ainda suplentes: Olímpia dos Santos e Maria Gracinda Donas. Logo no ano seguinte, 1915, esta passou a delegada efetiva. Na Associação de Classe dos Manipuladores de Tabacos, a mais antiga, as mulheres entraram para cargos nos corpos gerentes apenas em 1918: Amélia Maria dos Santos foi eleita 1ª secretária da mesa da Assembleia Geral. Entre 1914 e 1926, dezoito mulheres ocuparam cargos de responsabilidade nas associações de tabaqueiros. Esta tendência crescente não seria contrariada nos primeiros anos do Estado Novo: nas direções dos sindicatos nacionais de 1933 e 1936, encontramos doze mulheres, quatro delas antigas dirigentes da ACMT. Porém, com a exceção de Ana Maria Josefa e Ana Moreira, diretoras no Sindicato Nacional dos Operários Manipuladores de Tabaco do Distrito de Lisboa, em 1933, as mulheres habitualmente exerciam funções como tesoureiras, vogais ou, no máximo, vice-presidentes da mesa da assembleia geral. (Dados compilados a partir de várias fontes, e organizados em base de dados pelo investigador).

16 A solidariedade e fraternidade das manipuladoras de tabaco. A Voz do Operário Nº 1075 (3-6-1900), p. 2.

17 Carta de um charuteiro. O Pensamento Social Nº 29 (3-11-1872), p. 3.

18 O Pensamento Social Nº 35 (15-12-1872), p. 3.

19 O Pensamento Social Nº 40 (19-1-1873), p. 1-2.

20 V. – Manipuladores de Tabacos. O Protesto Nº 124 (Dezembro 1877), p. 3.

21 A Voz do Operário Nº 95 (7-8-1881), p. 2; A Voz do Operário. Nº 97 (21-8-1881), p. 2; Xabregas. A Voz do Operário. Nº 98 (28-8-1881), p. 4.

22 Xabregas. A Voz do Operário Nº 111 (27-11-1881), p. 1.

23 A Voz do Operário Nº 119 (22-1-1882), p. 3.

24 Uma companheira cigarreira – O Pensamento Social Nº 40 (19-1-1873), p. 2.

25 De acordo com José Bento de Oliveira, dirigente da Associação de Classe dos Operários Manipuladores de Tabaco (depoimento nº 4), em 1887, as operárias tabaqueiras eram quase todas analfabetas. Cf. PORTUGAL. Ministério das Obras Públicas, Comércio e Indústria. Direção Geral do Comércio e Indústria – Inquérito sobre as condições do trabalho manual nas fábricas de tabacos e situação dos respetivos operários Lisboa: Imprensa Nacional, 1887.

26 Maria Filomena Mónica definiu a indústria dos tabacos como a “jóia da Coroa do capitalismo português”. MÓNICA, Maria Filomena – O tabaco e o poder: 100 anos da Companhia dos Tabacos de Portugal (COTAPO) Lisboa: COTAPO; Quetzal Editores, 1992. p. 90.

27 Diário de Notícias Nº 2985 (30-5-1874), p. 1.

28 A Voz do Operário. Nº 203 (16-9-1883), p. 2. Em resposta à petição, a Rainha determinou um dia para as operárias irem ao Governo Civil receber o seu donativo: 26 libras por ordem da Rainha e 13$000 rs do Governador Civil. Cf. Barreiras de Xabregas. A Voz do Operário. Nº 205 (30-9-1883), p. 3.

29 Coisas da fusão das fábrica de tabacos. A Voz do Operário. Nº 375 (2-1-1887), p. 1.

30 Em 1865, o secretário de Estado das Obras Públicas, Comércio e Indústria, João Crisóstomo de Abreu e Sousa, publicou duas portarias dando preferência aos despedidos da Fábrica de Xabregas na admissão de trabalhadores para a construção da estrada de Loures a Torres Vedras e noutras obras a cargo da Intendência das Obras Públicas do distrito de Lisboa, na contratação por parte da Provedoria da Real Casa Pia de Lisboa de trabalhadores para as obras do aterro e na construção do muro de cais em frente ao mosteiro dos Jerónimos. O Português Nº 4402 (8-1-1865), p. 1.

31 ALVES ROQUE. A Voz do Operário Nº 206 (7-10-1883), p. 1-2.

32 Os tabaqueiros, assim como os tipógrafos do jornal A Revolução de Setembro, terão sido dos primeiros a utilizar esta forma de luta em Portugal, em 1852.

33 Às greves referidas no Quadro 1, devemos acrescentar a greve geral dos tabaqueiros pela melhoria dos salários, em novembro de 1886, as greves dos tabaqueiros da fábrica de Xabregas, de fevereiro de 1895 e de novembro de 1897, e a dos tabaqueiros da Companhia Nacional, em agosto de 1907, referidas por Carlos da Fonseca, cujos motivos, amplitudes e resultados não puderam ser confirmados em fontes primárias. Cf. FONSECA, Carlos – História do movimento operário e das ideias socialistas em Portugal Mem Martins: Publicações Europa-América, [s.d.]. vol. IV, p. 155-156, 161.

34 REID, Donald – Reflections on labor history and language. In BERLANSTEIN, Lenard, ed. – Rethinking labor history. Chicago: University Illinois Press, 1993. p. 49.

35 A situação do operariado perante as classes superiores. A Voz do Operário Nº 882 (20-9-1896), p. 1.

3636 Monopólio do tabaco. A Voz do Operário Nº 380 (6-2-1887), p. 1.

37 Classe de manipuladores de tabaco. A Voz do Operário Nº 801 (3-3-1895), p. 1.

38 O Português Nº 4052 (31-10-1863), p. 1.

39 O Português. Secção noticiosa. Nº 4058 (7-11-1863); Boato falso. Jornal do Trabalho Nº 67 (6-11-1863), p. 4.

40 Questão operária. Diário de Notícias Nº 1678 (14-8-1870), p. 1.

41 Diário de Notícias Nº 2138 (21-12-1871), p. 2.

42 O Pensamento Social Nº 40 (19-1-1873), p. 1-2.

43 O Pensamento Social Nº 42 (2-2-1873), p. 4.

44 GRAÇA, Damásio da – Abaixo o monopólio. A Voz do Operário Nº 380 (6-2-1887), p. 1.

45A nacionalização das fábricas existentes foi aprovada a 25 de maio de 1888, através duma lei (22-5-1888) na qual se definia o exclusivo do fabrico de tabacos como pertencendo ao Estado através da Administração Geral dos Tabacos (AGT). A oposição à lei veio dos regeneradores e dos republicanos e, na Câmara dos Pares, foi corporizada por Hintze Ribeiro. Entre outras medidas, a régie definia a expropriação por utilidade pública de todas as fábricas; garantia a venda livre, mas sujeita a normas; comprometia o Estado a conservar o pessoal de todas as empresas pagando salários uniformizados. Para administrador da régie foi nomeado o Conde Castro, mais tarde substituído por Oliveira Martins. As fábricas em funcionamento eram quatro, duas em Lisboa (Xabregas e Lisbonense) e duas no Porto (Portuense e Lealdade).

46 Recebido inicialmente com desconfiança devido à sua adesão ao Partido Progressista, Oliveira Martins acabou por granjear a simpatia dos operários tabaqueiros: “O que nos importa é que o sr. Oliveira Martins até agora tem tratado dos interesses dos operários, proporcionando-lhes trabalho e promovendo-lhes confortos que nunca tiveram noutras épocas”. Greve anunciada mas que não existiu. A Voz do Operário Nº 510 (4-8-1889), p. 2.

47 Manipuladores de tabacos. A Voz do Operário Nº 618 (30-8-1891), p. 1.

48 JOHNSON, Christopher – Lifeworld, system, and communicative action: the habermasian alternative in social history. In BERLANSTEIN, Lenard, ed. – Rethinking labor history. Chicago: University Illinois Press, 1993. p. 80.

49 Os primeiros estudos para o estabelecimento da creche junto à fábrica Lisbonense são mencionados no relatório da Administração Geral dos Tabacos relativo a 1889-1890, onde se assume que as creches “são de primeira urgência numa indústria em que o pessoal feminino tem uma parte tão considerável”. Cf. Administração Geral dos Tabacos – Relatório do Conselho de Administração (1889-1890). Lisboa: Imprensa Nacional, 1889.

50 Boletim do Trabalho Industrial N.º 49 (1910), p. 511.

51 Companhia Portuguesa de Tabacos – Relatório, Parecer do Conselho Fiscal e Documentos. (1936).

52 Companhia Portuguesa de Tabacos – Relatório, Parecer do Conselho Fiscal e Documentos. (1931-1932).

53 Em 1932, é lançada a ideia de “um grande bairro onde pudesse albergar a grande família tabaqueira”. Os fundos viriam da Caixa de Reformas e seria construído nos terrenos das Comendadeiras de Santos, por se localizarem num “sítio central para o pessoal das duas fábricas”. Cf. TORRES, J. – Crise de habitação. Eco dos Tabacos Nº 8 (Agosto de 1932), p. 3.

54 BRAZ PACHECO, Custódio – Os operários. A Voz do Operário Nº 1 (11-10-1879), p. 3.

55 A Voz do Operário Nº 625 (18-10-1891), p. 4.

56 Sociedade de Instrução e Beneficência A Voz do Operário. A Voz do Operário Nº 1358 (5-11-1905), p. 2.

57 A Sociedade “A Voz do Operário” ainda existe e mantém uma escola integrada no sistema de ensino português.

58 SOARES, António de Jesus – A Voz do Operário Nº 10 (13-12-1879), p. 3.

59 O Congresso das Associações de Classe de 1892 ficou marcado pelas divergências entre marxistas, possibilistas, autonomistas e anarquistas, acerca da manifestação do 1º de Maio. Os representantes das associações do sul do país abandonaram o Congresso e convocaram outro para julho do mesmo ano, a realizar em Lisboa. Neste Congresso foi reafirmada a autonomia das associações operárias em relação aos partidos políticos, em especial o Republicano e o Socialista.

60 Classe dos manipuladores de tabacos. A Voz do Operário Nº 652 (24-4-1892), p. 1. Na sessão da Federação de 29 de julho de 1895, estiveram presentes os redatores dos jornais A Obra, A Federação e A Voz do Operário, esta representada por José António do Carmo. Cf. Arquivo Nacional da Torre do Tombo. Arquivo do PSP Livro 1. Livro de Ponto da Federação das Associações de Classe. 1895 e 1896.

61 Sobre as participações dos manipuladores de tabacos nas comemorações do 1º de Maio, cf. FONSECA, Carlos da – O 1º de Maio em Portugal. 1890-1990: crónica de um século Lisboa: Antígona, 1990. Em 1900, a ACMT decidiu apenas iluminar a fachada da sede no dia 1º de Maio. Cf. Associação de Classe dos Manipuladores de Tabaco. A Voz do Operário Nº 1069 (22-4-1900), p. 1.

62 Oliveira Martins ganhou a simpatia dos tabaqueiros quando foi administrador geral dos tabacos entre 1889 e 1891. Cf. as cartas assinadas por Saul Pacoldino Fernandes e outros dirigentes da ACMT datadas de 7 de novembro de 1893 e 15 de março de 1894 in Biblioteca Nacional. Espólio de Oliveira Martins Correspondência. Cartas a Oliveira Martins. 1367 e 1368. Cf. ainda o elogio a Oliveira Martins após a sua morte, in Oliveira Martins. A Voz do Operário Nº 775 (2-9-1894), p. 1. Fuschini teve várias intervenções no parlamento a favor dos manipuladores de tabacos, conseguindo que a garantia das 8 horas diárias ficasse consignada na lei de 1888, serviu em muitas ocasiões de conselheiro legal da ACMT e representou os operários no tribunal arbitral ao lado de Saul Pacoldino Fernandes. No dia 24 abril de 1898, foi alvo de mais uma homenagem com a inauguração do seu retrato na sede da associação e a oferta de um quadro a óleo representando uma oficina de manipulação de tabaco. Cf. Associação de Classe dos Manipuladores de Tabaco. A Voz do Operário Nº 965 (24-4-1898), p. 1. Em 1906, na sequência da aprovação do novo contrato dos tabacos, voltou a ser agraciado com lembranças oferecidas pelas operárias. Cf. Manipuladores de tabacos. O Século Nº 8726 (12-4-1906), p. 2. No primeiro aniversário da sua morte, foi elogiado como o “maior amigo da classe”. Cf. Augusto Fuschini. A Voz do Operário. Nº 1691 (24-3-1912), p. 1. Dantas Baracho interveio na Câmara dos Pares em defesa dos interesses dos operários aquando do debate do novo contrato dos tabacos em 1906. O seu retrato foi inaugurado em finais desse ano. Cf. Classe dos manipuladores de tabaco. A Voz do Operário Nº 1410 (4-11-1906), p. 2.

63 Manipuladores de tabaco: ainda a questão dos dias santificados. A Voz do Operário Nº 1651 (18-6-1911), p. 2.

64 O Protesto Operário Nº 20 (16-7-1882), p. 2-3.

65 O Protesto Operário Nº 22 (30-7-1882), p. 2.

66 Os manipuladores de tabaco. O Protesto Operário Nº 29 (23-9-1883), p. 1.

67 A Associação Auxiliadora dos Manipuladores de Tabacos, mais tarde Associação de Classe dos Operários do Fabrico e Manipulação dos Tabacos (1893), era apoiada pelos socialistas de O Protesto Operário, mas a sua representatividade era fraca. Pelo contrário, na última década de Oitocentos, a ACMT teve um número médio de 1400 sócios.

68 Em sessão da ACMT, de 30 de janeiro de 1912, o histórico dirigente Saul Pacoldino Fernandes considerou a greve geral “o facto mais grandioso modernamente produzido pelo operariado português” e defendeu o apoio à ação da União dos Sindicatos Operários. Cf. Manipuladores de tabaco. A Voz do Operário Nº 1684 (4-2-1912), p. 3.

69 Greve do pessoal dos tabacos: a solução do conflito foi entregue à União Operária Nacional. O Século Nº 12952 (1-1-1918), p. 2. No final da 1ª República, os tabaqueiros continuavam a ser atacados pelo seu alegado corporativismo, agora pelos partidários da Internacional Sindical Vermelha. Cf. A questão dos tabacos. A Internacional Nº 65 (15-5-1926), p. 1 e 3.

70 A Voz do Operário Nº 1 (11-10-1879), p. 1.

71 A questão do tabaco e os manipuladores. A Voz do Operário Nº 409 (28-8-1887), p. 1-2. O movimento de protesto dos tabaqueiros do Porto de março de 1887 saldou-se pela prisão de vários operários e o despedimento de dezasseis. Inicialmente, estava previsto o despedimento de cento e cinquenta trabalhadores. Sobre as origens do movimento e as manobras políticas, cf. VERDIAL – Manifesto ao público e aos manipuladores de tabaco. A Voz do Operário Nº 408 (21-8-1887), p. 2-3.

72 Em 1883, Custódio Braz Pacheco escrevia: “O remédio para estes males é simples e consiste apenas no estabelecimento da régie, para mais tarde ser dada a liberdade de fabrico e cultura do tabaco em todo o Reino, depois de se estudar teórica e praticamente esta questão”. BRAZ PACHECO, Custódio – A situação dos manipuladores de tabacos. A Voz do Operário Nº 195 (22-7-1883), p. 1.

73 “os manipuladores do tabaco permanecerão nas mesmas condições de servidão e de miséria. (…) Os governos são impotentes; os queixumes vãos. O remédio tem de ser radical: a destruição do existente e a sujeição absoluta do capital ao trabalho”. Fotografia do dia. O Protesto Operário Nº 21 (29-7-1883), p. 1-2.

74 GOODOLFIM, José Cipriano da Costa – A Associação: história e desenvolvimento das associações portuguesas Lisboa: Seara Nova, 1974 [1876]. p. 159. A Associação Fraternidade Operária foi fundada por iniciativa de Antero de Quental, Nobre França, José Fontana e Brito Monteiro, membros do grupo original que esteve na origem da criação da secção portuguesa da Associação Internacional dos Trabalhadores. O seu primeiro órgão de imprensa foi a revista O Pensamento Social

75 O Pensamento Social Nº 28 (27-10-1872), p. 3.

76 “Juntamente com os chapeleiros, marceneiros e metalúrgicos, os tabaqueiros constituíram um dos mais sólidos apoios que o socialismo reformista, ligado a José Fontana e Luís Figueiredo, teve em Portugal”. Cf. MÓNICA, Maria Filomena – O Tabaco e o poder: 100 anos da Companhia dos Tabacos de Portugal (COTAPO) Lisboa: COTAPO; Quetzal Editores, 1992. p. 39.

77 Um esclarecimento. A Voz do Operário Nº 706 (7-5-1893), p. 2.

7878 Palavras simples. A Voz do Operário Nº 935 (26-9-1897), p. 1.

79 Apesar da desilusão com os resultados da Fraternidade Operária, houve alguns manipuladores de tabacos que mantiveram militância política, como o charuteiro Saul Pacoldino Fernandes, eleito membro do Conselho Federal do Partido Socialista, com voto consultivo, e membro do Conselho Central, no 1º Congresso realizado em 1877, ou João José Sabino, que aderiu ao Partido Socialista Português, em 1915.

80 A régie. A Voz do Operário Nº 516 (15-9-1889), p. 1-2.

81 Manipuladores de tabaco. A Voz do Operário. Nº 1071 (6-5-1900), p. 1.

82 O socialismo. A Voz do Operário Nº 1085 (12-8-1900), p. 1.

83 Classe dos manipuladores de tabaco. A Voz do Operário Nº 1305 (30-10-1904), p. 2. O apoio de João Franco e dos regeneradores-liberais é mencionado por João José Sabino numa assembleia realizada em 29 de abril de 1905. Cf. Classe dos manipuladores de tabaco de Lisboa e Porto: reuniões importantes. A Voz do Operário Nº 1332 (7-5-1905), p. 2.

84 Manipuladores de tabaco: petição ao Chefe de Estado. A Voz do Operário Nº 1500 (26-7-1908), p. 3. Em 18 de julho de 1908, uma comissão de tabaqueiros foi recebida por D. Manuel II, de quem receberam palavras de interesse pelos seus problemas e a vontade de proteger todos os trabalhadores.

85 O novo contrato dos tabacos. A Voz do Operário Nº 1305 (30-10-1904), p. 3.

86 Os decretos republicanos de 12 e 26 outubro de 1910 definiam os feriados a serem observados. A Companhia contestara-os, afirmando que não se podiam aplicar a uma empresa privada como a Companhia dos Tabacos, querendo manter em vigor os feriados definidos na lei de 1906. Os operários consideravam-se no direito de não trabalhar e ganhar as 8 horas, nos domingos e nos cinco feriados decretados. Cf. Manipuladores de tabaco. A Voz do Operário Nº 1635 (26-2-1911), p. 3. A situação apenas ficou resolvida em 1912, com a aceitação pela Companhia dos feriados definidos pelo governo.
Cf. Manipuladores de tabaco. A Voz do Operário Nº 1698 (12-5-1912), p. 3.

87 Operários dos tabacos: os manipuladores de tabaco protestam, perante o governo, contra os dias santificados impostos pela Companhia. O Século
Nº 10518 (26-3-1911), p. 3; Manipuladores de tabaco. A Voz do Operário Nº 1640 (2-4-1911), p. 1.

88 AUSLANDER, Leora – Perceptions of beauty and the problem of consciousness: parisian furniture makers. In BERLANSTEIN, Lenard, ed. – Rethinking labor history. Chicago: University of Illinois Press, 1993. p. 161.

89 HALL, Stuart – Variants of liberalism. In DONALD, James; HALL, Stuart, ed. – Politics and ideology. New York, Open University Press, 1986. p. 36.

90 BOURDIEU, Pierre – O poder simbólico Miraflores: Difel, 2001. p. 141.

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