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Cadernos do Arquivo Municipal

On-line version ISSN 2183-3176

Cadernos do Arquivo Municipal vol.ser2 no.11 Lisboa June 2019

 

DOCUMENTA

Nota Introdutória

No códice intitulado Livro dos Regimentos dos officiaes mecanicos da mui excelente e sempre leal cidade de Lixboa …1, encontram-se registados, por Duarte Nunes de Leão, os regimentos reformados por ordem do Senado da Câmara de Lisboa. Estes regulamentos referem uma série de normativas para o exercício de cada ofício mecânico e as medidas disciplinares a aplicar aos não cumpridores. Datados da primeira metade do século XVI, testemunham a intervenção do “município” na regulamentação das profissões pois da Câmara dependia a acreditação do detentor do ofício na sua função.

Entre mais de uma centena de regimentos referentes aos oficiais mecânicos, transcrevemos os que se relacionam com cargos relacionados com a prática da medicina na cidade: boticários, cristaleiras, drogoeiros, sangradores e parteiras.

 

REGIMENTO DOS BOTICáRIOS, cap. LXVIII, f. 245v-2462

Nenhua pessoa poderaa ser boticario nem ter botica nesta Cidade sem ter carta de seu exame para o poder ser a qual seraa registrada na Camara desta Cidade onde pediraa este regimento daquillo que he obrigado a fazer. E usando do offiçio sem carta de exame da Cadea pagaraa dez Cruzados e não a tendo registrada nem tendo este regimento pagaraa mil rs. soomente. das quaes penas seraa a metade para a çidade e a outra para quem os accusar.

Item todo o boticairo seraa obrigado a ter em sua botica os Livros que convem a seu offiçio e os pesos e medidas costumadas.

Item nenhum boticario venderaa merzinhas assi simplezes como compostas, senão pelo preço que estaa escrito nos Livros da camara desta Cidade. Os quaes preços lhe dirão quando apresentar sua carta nas costas da qual se faraa assento disso.

Item todo o boticario seraa obrigado vender todas as merzinhas que tiver per sua mão. E quando for fora de casa nenhua outra pessoa lhe poderaa vender meizinha algua salvo se for criado seu que saiba Ler e que aja dous annos pelo menos que anda por boticas a aprender o offiçio. O qual criado se Iraa apresentar aa Camara para lhe darem Liçença e Juramento para servir na botica em quanto não tem carta e o que o contrario fezer assi o boticario como o criado pagara cada hum mil rs. a metade para a Cidade e a outra para quem os accusar.

Item nenhum boticario daraa mais quantidade de meizinhas purgativas daquella que os doctores mandão posto caso que qualquer fisico o mande em sua recepta. sob pena de dous mil rs. a metade para a cidade E a outra param quem o accusar.

Item nenhum boticario compoera meizinha algua sem primeiro o fazer saber ao medico da çidade para que despensada a meizinha a veja compoer. E fazendo o contrario ser lhe a tomada a tal mezinha E pagara dous mil rs. ametade para a cidade E a outra para quem o accusar. salvo quando a fezer perante o fisico que curar o enfermo.

Item todo o boticario E seu criado sera obrigado a escrever sobre o papel da mezinha que vende o preço per que a vende muito declaradamente sob pena de dous mil rs a metade para a Cidade E a outra para quem os accusar.

 

REGIMENTO DOS DROGOEIROS, cap. LXVIIII, f. 246v

Nenhua pessoa poderaa usar do officio de drogoeiro sem primeiro ser examinado no conheçimento das drogas pelo fisico da Cidade. E achando o dito fisico que tem perfeito conheçimento da drogaria lhe daraa sua Certidão per elle assinada para en camara lhe darem Juramento em que lhe poera o que he obrigado a gardar. E pagara pela certidão do exame çem rs. ao dito fisico, e o que for achado sem ella pagaraa dous mil rs. a metade para a Cidade e a outra para quem o accusar.

Item todo o drogoeiro seraa obrigado a ter em sua tenda boas drogas e verdadeiras as quaes serão conservadas com aquellas cousas que os doctores mandão, e apartadas huas das outras para se não corromperem. E sabendo que alguas pessoas as tem falsas ou velhas que não são para aproveitar o farão saber ao dito fisico da Cidade sob pena de quem o contrario fezer pagar mil rs.

 

REGIMENTO DOS SANGRADORES, cap. LXX, f 247-247v

Nenhua pessoa poderaa usar do offiçio de sangrador sem ter carta do Cirurgião moor, a qual seraa registrada na camara desta çidade. E não tendo carta não usaraa do dito offiçio sob pena de dous mil rs. da Cadea a metade para a Cidade e a outra para quem o accusar.

Item nenhum sangrador poderaa sangrar, saiar, nem lancar ventosas sem mandado do medico ou Cirurgião posto que o doente lho requeira sob pena de pagar do tronco dous mil rs. a metade para a çidade e a outra para quem o accusar.

Item nenhum sangrador sangraraa senão na vea que lhe mandar o medico ou Cirurgião. E fazendo o contrario do tronco pagaraa dous mil rs.

Item todos os sangradores trarão pelo menos duas Lançetas estreitas para sangrar no verão e no estio duas Largas, para sangrar no outono e no Inverno, e assi teraa hum espinho de lançeta e não tendo estas peças pagara mil rs. a metade de para a çidade e a outra para quem o accusar.

Item o sangrador trara sajador ou Lanceta, sem ponta e não sarrafaraa nem sajaraa com Lançeta sob pena de quinhentos rs. a metade para a cidade e a outra para quem o accusar.

Item todo o sangrador traraa consigoo poos restrictivos para estancar qualquer fluxo de sangue que aconteçer das sangraduras sob a mesma pena.

Item todo o sangrador teraa duas ventosas muito pequenas para o pescoço e duas meaãs e duas grandes, e hua muito grande composta para barriga. sob a mesma pena.

E nenhum sangrador consentiraa em sua casa obreiro algum sangrar senão for aprendiz de dous anos para çima, o qual dos dous anos para cima podera sangrar seis meses antes que aja carta para ter pratica de sangrador, e mais não. sob pena de pagar o mestre que en casa o tever dous mil rs. e o tal criado pagaraa a pena dos que usão do offiçio sem terem carta.

 

REGIMENTO DAS PARTEIRAS, cap. LXXI, f. 248

Nenhua parteira podera Usar do offiçio sem ser examinada pelo fisico da Cidade. O qual achando que he para poder usar do dito offiçio lhe daraa lhe daraa hua certidão per elle assinada para em Camara ser confirmada E lhe darem Juramento para fazer verdade do qual exame e çertidão pagaraa ao dito Fisico çincoenta rs. e usando algua o dito offiçio sem a dita examinação e Juramento do tronco pagaraa mil rs. a metade para as obras da Cidade, e a outra para quem a acusar.

Item toda a parteira tanto que chegar a molher que estiver para parir saberaa della se estaa confessada e não o estando a amoestara que o faça. E a parteira que estever com molher que não for confessada pagaraa a sobredita pena.

Item toda a parteira seraa obrigada a tomar meudamente conta do tempo que a molher estaa prenhe para ver se he tempo de poder parir, e antes do tempo a não faraa parir pelo perigo que a molher corre em a fazer parir mais cedo. E fazendo o contrario pagaraa dous mil rs. a metade para a cidade e a outra para quem a accusar.

Item nenhua parteira se entremetteraa em caso em que tiver duvida mas diraa ao prinçipal da casa que mande chamar hum medico ou cyrurgião para conselho. E fazendo o contrario do tronco pagaraa dous mil rs. pela sobredita maneira.

 

REGIMENTO DAS CRISTALEIRAS, cap. LXXII, f. 248v-249

Toda a molher quiser usar do offiçio de Cristeleira o não poderaa fazer sem primeiro ser examinada pelo fisico da Cidade se he suffiçiente para o tal official, e achando que o he lhe passaraa sua certidão para en camara lhe ser passado carta E dado Juramento de fazer verdade na qual carta Irão todas as cousas que ella for obrigada a fazer per este regimento que lhe outrosi seraa dado. E pagaraa ao dito fisico da çertidão trinta rs., e sendo achada sem a dita carta de exame pagaraa mil rs. para a Cidade de que haveraa a metade quem a acusar.

Item toda a Cristaleira seraa obrigada a ter em sua casa dous cristeis -scillicet- hum para o comum da gente E o outro para meninos nos quaes teraa resguardo que estem em lugar que se não enchão de terra. E fazendo o contrario pagaraa quinhentos rs. a metade para a cidade e a outra para quem a accusar.

Item toda a Cristeleira seraa obrigada ter em sua casa tres medidas -scillicet- hua de nove onças e outra de duas e a terceira de hua onça. E assi teraa tachos E baçias que não sirvão de outra cousa senão dos cozimentos das caldas para os cristéis e fazendo o contrario pagaraa a sobredita pena.

Item toda a Cristaleira seraa obrigada a ter em sua casa a calda fresca que não passe de dous dias. A qual não poderão serenar nem mesturar com calda çerdiça, nem acrescentar nem deminuir salvo per conselho de médicos. E fazendo o contrario pagarão mil rs.

Item nenhua Cristeleira poderaa deitar cristel senão de cozimento comum feito de malvas, celgas, urtiga, morta, folhas de violas, malvaisco, agoa de farellos, azeite, mel, e sal sem outra herva nem mezinha da botica ainda que lho diga o doente salvo se for per mandado do medico que o cura, sob pena de pagar do tronco mil rs.

Item toda a Cristeleira mediraa sua calda onde a levar se for a doente robusto E esforçado E de boom sujeito lançar lhe a no cristel ate dezoito onças de calda E quatro onças d´azeite e duas de mel e mea de sal. E se o doente for debelitado e fraco ou de pouca idade Lançar lhe a a metade disto. E fazendo o contrario do tronco pagaraa quinhentos rs. E porem não poderaa lançar no dito cristel mais de dezoito onças ainda que o enfermo seia muito robusto pelo perigo que corre o enfermo Lançando lhe mais quantidade e menos poderaa Lançar quando enfermo o for moço ou estever debelitado como dito he.

Item toda a Cristeleira seraa obrigada no Lançar dos cristeis mostrar a alguas pessoas de casa o folle como nelle não fica calda nem azeite para que o doente saiba que levou bem tudo o que lhe mandarão Lançar. E a dita Cristeleira não levaraa azeite no folle. E fazendo o contrario pagaraa mil rs.

 

NOTAS

1 ARQUIVO MUNICIPAL DE LISBOA, Livro dos Regimentos dos officiaes mecanicos da mui excelente e sempre leal cidade de Lixboa reformados per ordenação do Illustrissimo Senado della pelo Licenciado Duarte Nunes de Liam, 1572. http://arquivomunicipal2.cm-lisboa.pt/xarqdigitalizacaocontent/Documento.aspx?DocumentoID=1623212&AplicacaoID=1&Value=84809da39f0cb34fa0471862f874ad16b8ecb0e72af57550&view=1

2 Optou-se por um critério de transcrição rigoroso mantendo a grafia e a pontuação original, mas aplicando certas normas que permitissem uma leitura mais acessível. Assim, separaram-se e juntaram-se as palavras de acordo com a grafia atual, desenvolveram-se as abreviaturas (com exceção da referência à moeda), assinalando as letras acrescentadas e atualizou-se o uso do U e do J.

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