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Cadernos do Arquivo Municipal

On-line version ISSN 2183-3176

Cadernos do Arquivo Municipal vol.ser2 no.10 Lisboa Dec. 2018

 

VARIA

Os Filipes em Belém: dois desenhos de Teodósio de Frias (I) para o Mosteiro dos Jerónimos

Miguel Soromenho *, **

*Miguel Soromenho, MNAA–Museu Nacional de Arte Antiga, Direcção-Geral do Património Cultural, 1249-017 Lisboa, Portugal. miguelsoromenho@mnaa.dgpc.pt

 

Embora raros, os desenhos de projecto dos séculos XVI e XVII conservados em arquivos e bibliotecas nacionais, faziam parte, naturalmente, dos processos de produção arquitectónica da época. Além da consabida usura do tempo, da fragilidade dos suportes e dos desastres naturais, a união dinástica foi, sem dúvida, uma das causas da grande dispersão de registos gráficos na Época Moderna. Entre nós, era na Provedoria das Obras Reais que se guardavam as traças dos grandes estaleiros dependentes da Coroa, mas entre 1580 e 1640 estes projectos subiam todos a Madrid e muitas vezes não voltavam. Muitos outros, ainda, perderam-se nos espólios pessoais dos arquitectos; em 1623, por exemplo, os frades de São Vicente de Fora e os vereadores da Câmara de Lisboa pediram ao rei que lhes mandasse entregar os desenhos da sua igreja, na posse de Baltasar Álvares, porque temiam que, com a sua morte, que ocorreu de facto no ano seguinte, pudessem vir a cair nas mãos dos legatários1.

Cabia na verdade ao provedor das obras manter no seu arquivo todos os papéis tocantes ao cargo – provisões de ofícios, regimentos, contratos, orçamentos, consultas, folhas de pagamento, notas de despesa e correspondência diversa, tarefa que se revelou difícil. Em 1655, ainda se guardava memória dos livros da Provedoria Real levados para Espanha em 1629, e que nunca mais regressaram2. Após a Restauração, o novo provedor, António Cavide, foi obrigado a reorganizar os seus serviços, na sequência da prisão do provedor que tinha atravessado todo o período filipino, Gonçalo Pires Carvalho, detido com o filho, Lourenço, ambos suspeitos de simpatias filocastelhanas3. Faltando, no arquivo, desenhos dos projectos principais das obras da Coroa, Cavide, homem de confiança de D. João IV, inquiriu a propósito o arquitecto régio Teodósio de Frias (II), que lhe lembrou todas as traças que deveriam estar em poder do provedor: as dos paços de Lisboa, das Casas dos Contos e da Alfândega, da Quinta de Alcântara – estas recentes, dizia, feitas para a remodelação ordenada pelo rei – as dos paços de Sintra, Almeirim, Salvaterra e da Penha Longa, as de Almada (talvez relativas às fábricas de biscoito de Vale do Zebro), as de todas as fortalezas do reino, as dos mosteiros da Batalha e dos Jerónimos, além da papelada administrativa correspondente, em documentos avulsos ou organizadas em livros de registo. Muitos desses desenhos, talvez a maior parte, escrevia o arquitecto, eram de sua lavra; mas ele só guardava os «borrões», ou seja, os esquiços preparatórios e desenhos informais para servir na obra, que já vinham de «visavo, avo e pai que todos forão architectos mores de sua majestade»4. Os originais deviam estar portanto com o provedor, que zelava ainda por outros materiais de arquivo e de apoio às obras, como a colecção de maquetes que se presume ali ter existido, uma vez que eram as obras régias que de uma forma sistemática mais recorriam a modelos tridimensionais, construídos em materiais e a escalas diversas5.

Os riscos dos Jerónimos que Teodósio de Frias assegurava existirem na provedoria eram sem dúvida os que o seu avô homónimo tinha produzido na década de 20 para a construção de uma nova caixa de escada e para a deslocação do portal de remate do corpo do dormitório para a portaria, que de novo se fazia. Nesta incumbência, uma importante empreitada de qualificação do Mosteiro que culminava um interesse continuado dos Filipes desde 1580, ou até anterior6, contou com o concurso do pedreiro Diogo Vaz7, empreiteiro e oficial useiro nas grandes obras da Coroa e sempre associado aos arquitectos régios.

Com Santa Maria de Belém sempre mantiveram os Habsburgo uma relação de reverência dinástica. Afinal, tinha sido na igreja que D. Manuel, avô de Filipe I de Portugal, se fizera sepultar, em campa rasa colocada no cruzeiro, e que a tia, D. Catarina, dispusera o panteão dos Avis-Beja, ampliando a capela-mor de acordo com um projecto de Jerónimo de Ruão, concebido internamente num classicismo triunfal bem adaptado às pretensões imperiais da dinastia.

Ao mausoléu real fez o monarca castelhano questão de acrescentar os túmulos da restante parentela lusa, distribuídos pelos braços do transepto, também segundo um plano de Jerónimo de Ruão. No final do ano de 1582, o embaixador de Veneza em Lisboa, Matteo Zane, reportou à Sereníssima República a organização da trasladação para os Jerónimos dos despojos do cardeal D. Henrique, que estava em Almeirim, e de D. Sebastião8, cerimónia que o rei pretendia feita com a maior solenidade e com a participação de toda a cleresia, e a que queria assistir pessoalmente9.

Por aqueles trabalhos de preparação dos túmulos reais foi paga de forma faseada a Jerónimo de Ruão a generosa quantia de quase um conto e quinhentos mil réis entre 1587 e 159210. Em 1591, mandaram-se fazer retábulos novos para o Mosteiro11 e foi comprado um lote de veludos e tafetás para as sepulturas que custou cento e vinte mil réis12. Em 1597, encomendaram-se duas lâmpadas para os espaços sepulcrais com desenho idêntico às do Escorial13. O interesse da Coroa continuou vivo com Filipe II. Foi decidido desmancharem-se as sepulturas de D. Henrique e de D. Sebastião e fazerem-se umas novas, cujos desenhos foram enviados de Lisboa à Corte pelo bispo vice-rei, D. Pedro de Castilho, em Fevereiro de 160514, projecto que pode ser atribuído a Teodósio de Frias, uma vez que Jerónimo de Ruão tinha morrido em 1601 e que foi ele o arquitecto da Coroa apontado às obras dos Jerónimos.

A ambição pela exclusividade régia dos enterramentos no Mosteiro de Belém explica ainda a ordem para o levantamento das sepulturas do claustro, a picagem dos respectivos epitáfios e a proibição de outros sepultamentos, feita por provisão de 1606, mas que o rei logo revogou, confrontado com as queixas dos monges15. Em 1610, revelou-se de novo o empenho de Filipe II no melhoramento da igreja. Dando seguimento a uma intenção que remontava ao reinado do cardeal-infante16 e que ele próprio tinha retomado já em 159917, mandou-se finalmente comprar na Índia madeira de angelim para as portas do Mosteiro18. Não admira assim que tivessem decorrido nesta igreja, em 1599, as exéquias simbólicas de Filipe I, tanto mais que era notória a vocação funerária da Ordem de São Jerónimo e a sua ligação aos panteões espanhóis dos Habsburgos. A monumental erguida no cruzeiro, concebida por Nicolau de Frias, foi o primeiro memorial funerário a adoptar uma tipologia de templete turriforme, em vez das tradicionais máquinas piramidais19.

Quando finalmente veio a Lisboa, em 1619, para reunir Cortes e assistir ao juramento do filho como príncipe herdeiro da monarquia dual, viagem repetidamente adiada desde a morte do pai, em 1598, Filipe II pousou por alguns dias no Mosteiro de Belém, à espera de que tudo estivesse pronto para a festa triunfal que se preparava no Terreiro do Paço e nas ruas circundantes. Cortesãos, ministros e outros oficiais régios foram também acolhidos nos Jerónimos ou espalhados em regime de aposentadoria pelas casas do lugar. O rei ali recebeu o marquês de Castelo Rodrigo para o beija-mão e aproveitou a estadia para conhecer os «Mosteiros circunvezinhos, a torre de S. Vicente, os engenhos das armas & pólvora de Barquerena», antes de embarcar, a 19 de Junho, nas galés acabadas de chegar de Espanha expressamente para a Entrada20. É natural que se tivesse então demorado a visitar o Mosteiro e detido nas particularidades da sua arquitectura, e que tenha até acertado com a comunidade os melhoramentos que levaram à construção da nova portaria.

Como se viu, o ano de 1625 foi pois o ápice de um processo contínuo de investimento material e simbólico nos Jerónimos de Lisboa, processo acompanhado pelos frades mas em boa medida organizado e patrocinado pela Coroa. As evidências documentais dessa última empreitada filipina, espalhadas pelo cartório monástico – de que é exemplo o pagamento de trabalhos de gesso, em 1626, realizados na «casa da Portaria Nova»21 – pela Provedoria das Obras e pelo arquivo oficinal e familiar dos Frias22, acabaram igualmente recolhidas no arquivo da Câmara de Lisboa, sempre que os correspondentes processos de obras careciam de autorizações camarárias. Foi o caso de dois desenhos assinados por Teodósio de Frias (I), à época, com Baltasar Álvares, o primeiro dos arquitectos portugueses, com um longo currículo de trabalhos para a Coroa e para a Câmara de Lisboa. Datados de 1625, estes debuxos conservam-se nos livros da Chancelaria Régia do Arquivo Municipal de Lisboa e referem-se a certas intervenções demandadas pelos padres jerónimos para os espaços exteriores do Mosteiro de Santa Maria de Belém e explanadas na súplica a que os desenhos estão anexos23(Figura 1).

 

 

Trata-se de duas aguadas coloridas, uma planta (Figura 2) e um alçado (Figura 3), destinados a ilustrar a pretensão dos monges em afastar o trânsito de pessoas e animais do caminho que habitualmente se fazia ao longo do dormitório monástico, «bem por baxo das janelas delle e de suas proprias cellas», caminho «torcido e mal tomado» que devassava também o adro da igreja, «pegado às portas della», propiciando evidentes incomodidades e indecencias» à comunidade; era tão incómoda a circunstância que muitas vezes chegavam a entrar «cavalgaduras carregadas dentro na mesma egreiya».

 

 

 

 

A solução apresentada propunha a concentração do tráfego na estrada real que já existia, de traçado mais regular, através da construção de um muro de separação entre as duas vias, que deveriam desenvolver-se paralelamente, embora a cotas diferentes. O parapeito, desenvolvido no alçado, de pouca altura e pontuado por bolas assentes em plintos, devia ser apenas interrompido na zona fronteira ao portal sul com uma modesta escadaria de acesso. A zona do terreiro apresentada na planta era limitada, a Ocidente, pela portaria do Mosteiro, e, a Oriente, pelo braço do transepto; para ela, Teodósio de Frias concebeu um pavimento em «calsada», recticulado por faixas lageadas.

A planta e o alçado eram as projecções ortogonais habituais dos registos técnicos apresentados pelos arquitectos portugueses desta época. O corte, que fazia também parte dos métodos básicos de representação divulgados pela cultura arquitectónica renascentista, desde inícios do século XVI, era provavelmente usado de forma mais esporádica, por implicar talvez uma maior capacidade de abstracção. Os desenhos em perspectiva, os mais aptos para agradar aos clientes, eram com certeza também conhecidos, bem como muitos outros recursos gráficos já então familiares aos arquitectos portugueses. O próprio patriarca da linhagem dos Frias, Nicolau (†1610), deixou num taccuino recentemente identificado as suas impressões arquitectónicas e antiquárias de uma viagem a Itália feita cerca de 1568-1570, recordadas em perspectivas, combinações de elevações ortogonais com projecções oblíquas e secções perspectivadas24, mesmo se vertidas em desenhos frustes de um artista ainda em formação. Enfim, os códigos de cores, a que Teodósio de Frias recorre na planta do terreiro, indicando a cor «rosa» para distinguir as faixas lageadas do pavimento em «calsada»25, eram também convenções gráficas usadas habitualmente em desenhos de projecto.

A conhecida vista dos Jerónimos, do pintor Filipe Lobo, datada de 1657, sugere que o projecto de Teodósio de Frias não se terá concretizado (fig. 4). Ao longo do dormitório, que se estende para Poente, mantém-se o mesmo desarranjo de terras soltas, sem pavimento empedrado e sem o muro de separação da estrada real ou o lanço de escadas de acesso ao adro que o arquitecto propusera; e até à porta da igreja estaciona uma besta muar, irrespeitosa, confirmando as queixas dos frades sobre os animais que de vez em quando ali entravam. De resto, a utilização dos pisos térreos do dormitório para se «lavrar a enxarcea para a fábrica das naos», ou seja, cordame para a mastreação dos navios das armadas oceânicas, aproveitando a dimensão das grandes naves do Mosteiro, fábrica estabelecida ali em 1626 e que se mantinha ainda em finais do século XVIII26, sacrificou em definitivo o ordenamento condigno do espaço, contrariando aliás um desvelo especial pela dignidade simbólica da grande fachada sul, que desde D. João III fazia parte da política régia de salvaguarda do conjunto monástico de Belém27.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FONTES

MANUSCRITAS

Arquivo Municipal de Lisboa

Chancelaria Régia, Livro 1º de consultas, respostas e cartas de Filipe III.

Chancelaria Régia, Livro 1º de consultas, respostas e cartas de Filipe III.

Livro de cordeamentos de 1625-1626.

Arquivo Nacional da Torre do Tombo

Manuscritos da Livraria, 168.

Manuscritos da Livraria, 1076.

Manuscritos da Livraria, 2674.

Mesa da Consciência e Ordens, Livro 1.

Miscelâneas Manuscritas do Convento da Graça, tomo 6L.

Mosteiro de Santa Maria de Belém, maço, 4.

Mosteiro de Santa Maria de Belém maço 5.

Núcleo Antigo, Ementas da Casa Real, Livro 125.

Núcleo Antigo, Ementas da Casa Real, Livro 125.

Núcleo Antigo, Ementas da Casa Real, Livro 126.

Biblioteca Nacional de Portugal

Secção de Reservados, Colecção Pombalina, cod. 641.

Biblioteca da Ajuda

51-IX-3.

51-VIII-7.

 

IMPRESSAS

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ESTUDOS

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NOTAS

**O autor não escreve segundo o Novo Acordo Ortográfico.

SOROMENHO, Miguel – Os Filipes em Belém: dois desenhos de Teodósio de Frias (I) para o Mosteiro dos Jerónimos. Cadernos do Arquivo Municipal. 2ª Série Nº 10 (julho-dezembro 2018), p. 235 – 244.         [ Links ]

1 Arquivo Municipal de Lisboa (AML), Chancelaria Régia, Livro 1º de consultas, respostas e cartas de Filipe III, f. 91-94v.

2 Arquivo Nacional Torre do Tombo (ANTT), Manuscritos da Livraria, nº 168, f. 141. Por esta nota manuscrita percebe-se que havia um arquivo organizado desde o século XVI, e que incluía livros de registo das consultas feitas pela provedoria. Sobre a data do documento indicada nos instrumentos de descrição da ANTT – 1689 – tenho algumas dúvidas: como leitura alternativa proponho 1655.

3 SOROMENHO, Miguel – A administração da arquitectura: o Provedor das Obras Reais em Portugal no século XVI e na 1ª metade do século XVII. Anuario del Departamento de Historia y Teoria del Arte. Madrid: Universidad Autonoma de Madrid. Vol. IX-X (1997-1998), p. 197-209. Separata.

4 Biblioteca da Ajuda (BA), 51-IX-3, f. 214 e 214v.

5 São inúmeras na documentação da época as notícias sobre «modelos», que não podem ser confundidos com «desenhos», «traças», «riscos», «rascunhos», «debuxos» ou «feitios». Nos finais do século XVI já se usavam modelos nos mais diversos contextos, feitos sobretudo para as grandes obras da Coroa. Muitos deles estão documentados: os dos arcos triunfais da Entrada de Filipe I em Lisboa, em 1581, ainda existindo em 1612, na posse de Teodósio de Frias(OLIVEIRA, Eduardo Freire de – Elementos para a história do município de Lisboa. Lisboa: Tip. Universal, 1882-1943. 1ª parte, tomo II, p. 285-286); maquetes das principais fortalezas do reino, de que há notícia das que estavam na posse de Filipe Terzi(COELHO, Henrique; BATTELLI, Guido – Filippo Terzi architeto e ingegnere militare in Portogallo (1588-1597). Firenze: Tipografia Alfani, 1935. p. 49 e 51)) e das que o engenheiro Anton Coll fez, de madeira e de papel, da fortificação do Monte Brasil, na ilha Terceira, em 1594 (CÁMARA, Alicia – Fortificación y cuidad en los reinos de Felipe II. Madrid: Editorial Nera, 1998. p. 112); a Jerónimo de Ruão foram mandados construir modelos dos sítios aptos para terem fortificações (MOREIRA, Rafael – A arquitectura militar do Renascimento em Portugal. In A introdução da arte da Renascença em Portugal. Coimbra: EPARTUR, 1981. p. 303); faziam-se modelos experimentais de engenhos, como o pedido por João Batista Lavanha a Francisco de la Hara para ilustrar um projecto que apresentou para uma máquina da fábrica de pólvora de Barcarena, em 1617 (ANTT, Manuscritos da Livraria, 2674, nº 11); do aqueduto da Água Livre mandou-se fazer em 1619 uma secção de madeira (OLIVEIRA, Eduardo Freire de, idem, p. 424-426); deviam, por outro lado, ser habituais os modelos para retábulos – veja-se o exemplo do altar e retábulo da capela de S. Vicente, na Sé de Lisboa, ordenados pelo rei em 1615 (OLIVEIRA, Eduardo Freire de, idem, p. 358-360) – que se tornaram muito comuns nos séculos XVII e XVIII.

6 Já em 1568, D. Catarina tinha consultado o rei de Espanha, seu sobrinho, sobre o retábulo que pretendia para a capela-mor da Igreja de Belém, pensando contratar o pintor flamengo Franz Floris, o que não chegou a fazer, vd. BOUZA ÁLVAREZ, Fernando, org. – Cartas para duas infantas meninas: Portugal na correspondência de D. Filipe I para as suas filhas (1581-1583). Lisboa: Publicações D. Quixote, 1999. p. 74.

7 OLIVEIRA, Lina Maria Marrafa – Anexos documentais. Cadernos: Mosteiro dos Jerónimos: a intervenção de conservação e restauro. Lisboa: IPPAR, 2006. p. 287-288. Em 1611, Diogo Vaz edificou, com Estácio Correia, as casas de Baltasar Álvares. Em 1613 foi empreiteiro da reedificação do Convento de Santa Clara de Lisboa (SERRÃO, Vítor – O arquitecto maneirista Pedro Nunes Tinoco: novos documentos e obras (1616-1636). Boletim Cultural da Assembleia Distrital de Lisboa. Lisboa: Assembleia Distrital de Lisboa. III Série Nº LXXXIII (1977). Separata).

Em 1614 aparece de novo como empreiteiro no estaleiro do Convento de Palmela, com Estácio Correia e Manuel Quaresma, este último irmão do arquitecto Pedro Nunes Tinoco (ANTT, Mesa da Consciência e Ordens, Livro 1, f. 144-144v. e 188v. e FERNANDES, Isabel – O castelo de Palmela: do islâmico ao cristão. Palmela: Câmara Municipal; Ed. Colibri, 2004. p. 303 e 304, e COELHO, Teresa Campos – Os Nunes Tinoco, uma dinastia de arquitectos régios dos séculos XVII e XVIII. Lisboa: [s.n.], 2014. p. 72 e 73. Tese de doutoramento em História da Arte, especialidade História da Arte Moderna em Portugal, apresentada à Universidade Nova de Lisboa), sendo-lhe paga, em 1616, a segunda prestação pelos seus serviços, no valor de 2.500 cruzados (Idem, f. 190v.). Neste ano, titulado de mestre pedreiro, é o medidor do Convento da Penha de França, construída com risco de Teodósio de Frias (VITERBO, Sousa – Dicionário histórico e documental dos arquitectos, engenheiros e construtores portugueses. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, imp. 1988. vol. II, p. 33 e ANTT, Manuscritos da Livraria, nº 1076, sem foliação). De novo ligado a Pedro Nunes Tinoco, obriga-se a executar a capela-mor da Igreja do Mosteiro do Salvador (SERRÃO, Vítor – Documentos dos protocolos notariais de Lisboa referentes a artes e artistas portugueses (1563-1650). Boletim Cultural - Assembleia Distrital de Lisboa. Lisboa: Assembleia Distrital de Lisboa. 1º e 2º Tomos Nº 90 (1984-1988), p. 74 e 75) e participa nas obras da Igreja do Loreto (1630) e de S. Nicolau, esta em 1640. Outra notícia conhecida da actividade profissional de Diogo Vaz refere-se a um pedido de cordeamento do Convento de Santa Mónica de Lisboa, em 1625, quando as freiras quiseram demolir umas casas para construir a sua igreja (AML, Livro de cordeamentos de 1625-1626, f. 2v. a 4).

8 Os supostos restos de D. Sebastião foram trazidos de Ceuta pelo duque de Medina Sidónia. Sobre as trasladações cf. o relato setecentista de CASTRO, Frei Manuel Bautista de Chronica do Maximo Doutor e Principe dos Patriarchas São Jeronymo Particular do Reyno de Portugal, dedicado a D. João V, ANTT, Manuscritos da Livraria, nº 729, f. 555v. e segs..

9 OLIVEIRA, Julieta Teixeira Marques de – Fontes documentais de Veneza referentes a Portugal. Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 1997. p. 301. Por esta altura, continuava a Coroa a pagar dívidas contraídas muito tempo antes por trabalhos diversos na capela-mor. Foi o caso do pagamento aos pintores Gaspar Dias e António Nogueira – ou melhor, aos herdeiros – por «papéis», talvez decorações efémeras, pedidos no tempo de D. Sebastião para a trasladação definitiva de D. Manuel, D. Maria e D. João III (ANTT, Ementas da Casa Real, Núcleo Antigo, Livro 125, f. 16v., cf. CAETANO, Joaquim Oliveira – António Nogueira: um pintor do tempo de Trento. In PORTUGAL. Instituto Português de Conservação e Restauro – Retábulo de Ferreira do Alentejo. Lisboa: IPCR, 2004. p. 28).

10 ANTT, Núcleo Antigo, Ementas da Casa Real, Livro 125, f. 198v., e Livro 126, f. 73v., 118 e 140v.

11 ANTT, Núcleo Antigo, Ementas da Casa Real, Livro 126, f. 61.

12 Idem, f. 70v. e 71.

13 Biblioteca Nacional de Portugal (BNP), Secção de Reservados, Colecção Pombalina, cod. 641, f. 585.

14 BA, 51-VIII-7, f. 180v.

115 OLIVEIRA, Lina Maria Marrafa – Anexos documentais. Cadernos: Mosteiro dos Jerónimos: a intervenção de conservação e restauro. Lisboa: IPPAR, 2006. p. 286.

16 Idem.

17 ANTT, Miscelâneas Manuscritas do Convento da Graça, tomo 6L, f. 427 e 429. Carta de 8 de Fevereiro de 1599 do rei para D. Francisco da Gama, vice--rei da Índia e conde almirante, sobre a necessidade de madeira de angelim para as portas dos Jerónimos. Conserva-se, em anexo, a relação da madeira necessária. Existem no ANTT duas relações afins da madeira necessárias para as portas do Mosteiro, uma delas com o sinal de Diogo Godinho, “mestre e carpynteyro das obras del rey” (ANTT, Mosteiro de Santa Maria de Belém, maço, 4, doc. 58), transcrito em OLIVEIRA, 2006, p. 287. Diogo Godinho foi mestre das obras de carpintaria do Paço da Ribeira entre 1585 (VITERBO, op. cit., vol. I) e 1615 (VITERBO, idem, p. 552-553), estando documentados os pagamentos pela sua prestação nas obras da Torre do Relógio, feitos entre 1590 e 1592 (ANTT, Núcleo Antigo, Ementas da Casa Real, Livro 125, f. 29, Livro 126, f. 82v. e 83).

18 Sobejamente popular na época pelas suas qualidades, o angelim destacava-se, segundo João Baptista Lavanha, entre as boas madeiras importadas do Oriente, aquelas cuja «rijeza e fortaleza (…) resiste ao impeto dos mares, e dos Ventos, sendo enxutas da humidade, [e que] não apodreção com a muita das agoas, antes nellas se conservão. E para as despedir de sy, ha de ser o seu çumo resinento, e para q não entre nellas o Busano, amargoso. E ultimamente brandas, para que de lavradas (como he necessario em algumas partes) não estalem». Resistente e apta para os trabalhos de marcenaria fina e de escultura, foi por isso a madeira escolhida para a cruz do altar-mor da Igreja do Mosteiro do Escorial, a pedido de Filipe II de Espanha, certamente por sugestão do cosmógrafo-mor João Baptista Lavanha e do arquitecto régio Juan de Herrera, que fez procurar em Lisboa, em 1590, os toros adequados para a execução da peça, que ainda hoje existe, vd. SOROMENHO, Miguel – Madeiras da Índia: Juan de Herrera, João Baptista Lavanha e a cruz do altar-mor do Escorial. Artis: Revista de História da Arte da Faculdade de Letras de Lisboa. Lisboa: Instituto de História da Arte da Faculdade de Letras de Lisboa. Nº 3 (2004), p. 353-361.

19 VITERBO, op. cit., vol. I, p. 569 e 570, e SOROMENHO, Miguel – “Ingegnosi ornamenti”: arquitecturas efémeras em Lisboa no tempo dos primeiros Filipes. In PEREIRA, João Castel-Branco, coord. – Arte efémera em Portugal. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001. p. 33-35.

20 LAVANHA, João Baptista – Viagem da Catholica Real Magestade del Rey D. Filipe II N.S. ao Reyno de Portugal e rellaçao do solene recebimento que nelle se lhe fez S. Magestade a mandou. Madrid: Thomas Iunti, 1622. p. 8.

21 ANTT, Mosteiro de Santa Maria de Belém, maço 4, doc. 59. Pagamento, em Fevereiro de 1626, a Pedro Pinheiro «mestre do gesso», de 10 mil réis de um total de catorze que lhe eram devidos por obras miúdas na nova escada e portaria. É provável que um outro pagamento feito em Janeiro ao ferreiro André Gonçalves se refira também àquela empreitada (idem).

22 Neste arquivo guardava ainda Teodósio de Frias, além dos «borrões» de que falava, desenhos e modelos dos arcos triunfais da Entrada de Filipe I em Lisboa, em 1581, como vimos, testemunhos do provável envolvimento do pai, Nicolau de Frias, na preparação dos festejos, (vd. nota 5).

23 AML, Chancelaria Régia, Livro 1 de consultas, respostas e cartas de Filipe III, f. 106 a 109v.

24 DESWARTE-ROSA, Sylvie – Identificação do anónimo português do Museo Cartaceo de Cassiano del Pozzo: Nicolau de Frias em Roma. Artis: Revista de História da Arte e Ciências do Património. Lisboa: Caleidoscópio, 2017. p. 20-31.

25 No contrato para a construção da Estalagem das Vendas Novas feito com o empreiteiro Miguel Rodrigues em Março de 1610, faz-se menção a uma «trasa» do arquitecto Teodósio de Frias e ao código de cores usado no seu desenho para diferenciar as paredes já existentes (de «cor parda»), das que se deviam fazer de novo – estas, de «collor vermelha». Um passo mais obscuro do documento sugere a realização de desenhos de pormenor -- «as mais paredes e aliserses que mostra o dito desenho de partinhos(?)», FONSECA, Jorge –Teodósio de Frias e a construção da Estalagem Real de Vendas Novas. Almansor: Revista de Cultura. Montemor-o-Novo: Câmara Municipal de Montemor-o-Novo. Nº 3 3ª Série (2017), p. 145.

26 ANTT, Mosteiro de Santa Maria de Belém, maço 4, doc. 39.

27 A D. João III se deve a proibição de estender roupa «desde o princípio da Capella mor do dito dormitorio athee o cunhal do arco que esta abaixo dos dormitorios», ANTT, Mosteiro de Santa Maria de Belém, maço 4, doc. 27, bem como a proibição de construção de casas «en fronte do dito mosteiro contra o mar», em 1524, alvará confirmado sucessivamente por D. Sebastião e por Filipe II, este em Abril de 1625, ANTT, Mosteiro de Santa Maria de Belém, maço 5, doc. 91.

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