SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.ser2 número7Arquitetura e supremacia: analogias entre a decoração de portais e arcos no contexto das festividades filipinas e brigantinasO ofício de ensaiador da prata em Lisboa (1690-1834) índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Cadernos do Arquivo Municipal

versão On-line ISSN 2183-2176

Cadernos do Arquivo Municipal vol.ser2 no.7 Lisboa jun. 2017

 

ARTIGO

António Coelho, um ourives da prata lisboeta na segunda metade do século XVII: as encomendas para D. Diogo de Sousa, arcebispo de Évora (1671-1678)

António Coelho, a silversmith from Lisbon in the second half of the 17th century: the orders of D. Diogo de Sousa, archbishop of Évora (1671-1678)

 

Nuno Cruz Grancho*

ARTIS-IHA – Instituto de História da Arte, Faculdade de Letras / Universidade de Lisboa, 1600-214 Lisboa, Portugal.

 

RESUMO

O presente estudo revela-nos a existência de António Coelho [Pinhão], um ourives lisboeta na 2.ª metade do século XVII, autor de peças – religiosas e civis – encomendadas por D. Diogo de Sousa, arcebispo de Évora. A documentação conhecida possibilita traçar os percursos individuais e conjuntos de ambos os medianeiros, possibilitando-nos uma maior proximidade às questões artísticas. Entre estas salientamos os processos de encomenda, as tipologias e até mesmo perceções de gosto do referido arcebispo, que a correspondência trocada entre ambos os interlocutores permite identificar.

 

PALAVRAS-CHAVE

Évora / D. Diogo de Sousa / Século XVII / Ourives / António Coelho

 

ABSTRACT

The present study discloses the existence of António Coelho [Pinhão], a Lisbon silversmith in the second half of the 17th century, the author of the innumerable objects – civil and religious - ordered by Diogo de Sousa, Archbishop of Évora. The documents allow us to trace the individual and joint passages of the mediators, enabling a bigger proximity to the artistic questions. Between these, we point out the ordering processes, the typologies and even perceptions of taste of the mentioned archbishop, as referred by the correspondence between both of them.

 

KEYWORDS

Évora / D. Diogo de Sousa / 17th Century / Silversmith / António Coelho

 

D. DIOGO DE SOUSA ( ? / 1678): PERCURSO

D. Diogo de Sousa, natural de Vila Viçosa1, era o terceiro filho do segundo casamento de Fernão de Sousa com D. Maria de Castro. Foi seu pai VI senhor de Gouveia, moço fidalgo do infante D. Henrique e vedor da Casa de D. Teodósio II, duque de Bragança. Foi ainda empossado no cargo de governador e capitão-geral de Angola por Filipe III de Portugal, para além de outros títulos honoríficos com que foi agraciado em vida, os quais atestavam de igual modo a sua condição de nobre2. Seria a linhagem nobiliárquica de seu progenitor e a proximidade ao ducado de Bragança que proporcionariam ao futuro prelado eborense uma educação cuidada no Paço de Vila Viçosa.

Ingressou na Universidade de Coimbra, onde se formou em Direito Canónico, tendo seguidamente entrado no Colégio de S. Pedro da mesma cidade. Em novembro de 1630 seria eleito arcediago de Santa Cristina e, quatro anos mais tarde, feito deputado do Santo Ofício de Évora. Em setembro do ano seguinte, seria promovido a deputado do Santo Ofício da cidade de Lisboa, encontrando-se em 1637 como inquisidor de Coimbra, tendo sido promovido no mesmo cargo na cidade de Lisboa dois anos mais tarde. Sabemos que em 1642 desempenhava o cargo de deputado do Conselho Geral do Santo Ofício, seguido do lugar de deputado da Mesa da Consciência e Ordens em 16443.

Quatro anos mais tarde, vamos encontrá-lo como juiz da Confraria do Santíssimo Sacramento da Igreja de S. Paulo4, para só na segunda metade da década de cinquenta, voltarmos a ter notícia de D. Diogo de Sousa em diversos outros lugares, nomeadamente no desempenho do cargo de visitador das inquisições do reino, sumilher de cortina, esmoler-mor e reformador das ordens militares. Em janeiro de 1666, tornou-se membro do Conselho de Estado de D. Afonso VI e do príncipe regente D. Pedro II, altura em que é eleito bispo de Leiria, cargo que recusou5. Entre 1664 e 1667, desempenhou o lugar de provedor da Misericórdia da vila de Messejana, concelho de Aljustrel6.

A vida eclesiástica, no sentido do desempenho de uma prelatura, começava e acabava no arcebispado de Évora, o único que ocupou no decorrer de todo o seu percurso. A sua escolha em 22 de junho de 1671, por D. João IV, efetivou-se num primeiro momento por intermédio do seu procurador D. João Velho, vigário-geral de Évora, tendo-se apenas oficializado com a sua entrada na cidade em novembro desse mesmo ano7. Por essa ocasião, foi da competência dos senhores cónegos mais velhos levar as varas do pálio, conforme ficara assente em cabido ordinário de 29 de outubro desse mesmo ano8.

Sabemos que em 1674, o arcebispo solicitou aos capuchos descalços do Convento da Piedade de Vila Viçosa,

(…) para seu jazigo na Capella maior do nosso convento de S. Antonio de Evora hua sepultura que esta defronte do altar collateral das Chagas de Nosso Padre S. Francisco, ao lado da Sepulura do Illm.º Senhor D. Theotonio. (…) tendo respeito a sua singular devoção, e grande obrigação que lhe temos pellas muitas charidades, esmolas que tem feito de continuo faz, e deseja fazer a ditta caza (…) e ao muito amor (…) outorgamos sua petição e lhe concedemos a sobre ditta sepultura pera seu jazigo perpetuo, em tal maneira que nem hua outra pessoa se possa nella enterrar e lhe possa mandar por hua sepultura raza a maneira da do Illm.º Sr. D. Theotonio em testemunho do qual mandei passar a prezente segunda de meu nome, e dos charisimos Irmãos Diffinidores e selado9.

 

10

 

Este pedido, para o qual obtivera resposta favorável, nunca se chegou a efetivar por razões que desconhecemos.

No ano de 1677 celebrou o sínodo provincial, no mesmo ano em que se tornou senhor de Figueiró e Pedrógão, por morte de D. Ana de Meneses – 1.ª condessa de Figueiró – de quem não havia sucessão11. E “por não saber o que Deus nosso senhor quer fazer de myor e quando seja servido de me levar a si; e porque a morte he certa, ho dia incerto fasso este testamento”12 elegendo como seus herdeiros Fernão e João de Sousa, ambos seus sobrinhos13. O seu governo à frente da arquidiocese de Évora, durante aproximadamente oito anos, terminaria por sua morte a 23 de janeiro de 167814, pelo que “mando que o meu corpo seja mortalhado na forma que ordena o cerimonial romano”15, tendo ainda pedido que fosse enterrado na Santa Sé desta cidade defronte da capela do Santíssimo Sacramento em campa rasa e “enterrado com o Pontifical de damasco negro que para esse efeito tenho feito”16.

Ainda assim, não deixou de contemplar com algumas peças de prata o bispo de Targa, a quem deixou um cálice pequeno e “avendo respeito a não ter calix, a see substituira hua tocheira piquena, que qua esta, e lhe dou caldeira de agoa benta com o isope, Turibulo e naveta he dous castiçais Ponteficais pequenos”17. A mesma virtude de generosidade levou-o a contemplar com cem mil reis Vicente Coelho Borges18, seu protegido e responsável pela realização do dito testamento, mandado fazer por ordem de D. Diogo, no ano de 167819.

 

AO SERVIÇO DO ARCEBISPADO DE ÉVORA: DA ESMOLA À AÇÃO MECENÁTICA

Visto pelos autores como um prelado “de muita caridade e pobreza”20, como refere António Francisco Barata, a sua ação pia pode ser dividida em dois núcleos: por um lado, um desempenho na órbita do seu arcebispado e, por outro, todo um conjunto de ações maioritariamente pias, mas fora do contexto da sua jurisdição geográfica, sobretudo na Corte onde se conhece uma demorada permanência deste prelado. Para esta última, a documentação permite-nos uma vasta informação da relação de esmolas ao clero regular21 atribuídas por D. Diogo de Sousa, arcebispo de Évora.

No contexto do arcebispado eborense – que constituía à data o maior território eclesiástico português – as suas dádivas dividiram-se entre esmolas de cereais em “socorro a pessoas ordinárias”22, viúvas e órfãos23, pessoas particulares24 e a conventos diversos, estes últimos, por vezes com periodicidade mensal25. No tocante ao clero secular, os exemplos assumem um maior interesse na perspetiva das artes decorativas, sendo apenas por nós conhecidos casos circunscritos ao seu governo arcebispal e muito concretamente às igrejas da cidade de Évora. Entre outros exemplos conhecidos, citamos o da igreja de Santo Antão com os quatro frontais e quatro vestimentas pelos quais se pagaram 87.900 reis, ou ainda as doze vestimentas feitas para a mesma igreja, pelo valor de 155.275 reis, ambos os recibos pagos ao vestimenteiro Manuel Álvares26.

A este mesmo artífice seriam encomendados outros conjuntos, sem que tenhamos qualquer conhecimento quanto ao seu local de destino, como é exemplo o ornamento de festa branco27 pelo qual se pagaram 427.615 reis e três véus e quatro bolsas de corporais pelo valor de 36.265 reis28. Para o ano de 1676 foi feita a despesa de 236.410 reis com o pontifical para o dito arcebispo29. Novo pagamento seria processado, desta vez a António Ferreira Cardoso, por uns panos para as cadeiras e outras miudezas no valor de 87.617 reis30.

Presumimos que muitas outras encomendas foram realizadas por D. Diogo de Sousa – para além dos paramentos – tendo em consideração o rol de contas de Diogo Velho, secretário-geral do Santo Ofício da Inquisição31, datadas de 24 de outubro de 1676 em diante, onde consta a título exemplificativo a dívida de 13.189 reis despendidos com quadros, para além de outros 8.800 reis pagos a António Freitas pela pintura de Nossa Senhora32.

 

ANTÓNIO COELHO: UM DESCONHECIDO OURIVES DE LISBOA NO SÉCULO XVII

As primeiras informações de foro pessoal encontradas no decorrer da nossa investigação no que concerne a António Coelho encontram-se à guarda da Biblioteca da Ajuda, não obstante os dados mais significantes tivessem sido facultados pelas habilitações do Santo Ofício, conforme teremos oportunidade de divulgar no decorrer do presente capítulo. Não se tendo encontrado qualquer outra referência da esfera pessoal e profissional do dito ourives na historiografia de arte portuguesa, poderão ser estas um conjunto de novas achegas para o estudo da ourivesaria seiscentista produzida em Lisboa.

Seriam as diligências genealógicas de habilitação do Santo Ofício (1635) relativamente a António Coelho, como referimos anteriormente, que nos revelariam a quase totalidade da informação por nós conhecida33. Na verdade, trata-se de António Coelho Pinhão34, embora assine toda a documentação, analisada, como António Coelho, facto que Gonçalo Vasconcelos e Sousa justifica – ainda que em universos geográficos e artísticos distintos – como prática comum, de maneira a evitar possíveis enganos, já que o não tratamento pelo apelido evitava uma menor probabilidade de coincidências35.

António Coelho era ourives da prata, filho de André Coelho e de Isabel Luís, ambos moradores no sítio da Ribeira da Penha Longa, termo de Cascais, de onde era natural36. Casou com Maria dos Reis, filha de Manuel Leal e Bárbara Borges, moradores na Rua dos Douradores, freguesia de S. Nicolau, na dita cidade de Lisboa37. Sabemos que no ano de 1623 já residia na Rua dos Ourives da Prata, freguesia da Madalena da dita cidade38, residência que acreditamos deter logo após a concretização do seu matrimónio. Em 1635 já trabalhava como ourives da prata, passando a partir desse mesmo ano “e por sua devoção”39 a integrar a família do Santo Ofício, desejo que o levaria a servir essa instituição de “tudo o que lhe for mandado”40.

Houve do referido matrimónio um descendente conhecido, de seu nome Vicente Coelho Borges, que, à semelhança de seu pai, contou com a proteção de D. Diogo de Sousa, como transparece nas missivas deste para o dito prelado, onde são constantes as manifestações de reconhecimento e gratidão que “devo he tenho obrigação”41, pelos “favores e honras que me faz”42, nomeadamente da “lembransa que tem do estudo do meu filho”43.

 

44

 

António Coelho, enquanto ourives da prata eleito por D. Diogo de Sousa, teve oportunidade de desenvolver alguns trabalhos agora revelados, para o período correspondente aos anos entre 1671 e 1677, constituindo estes, até à data, os únicos conhecidos.

 

AS ENCOMENDAS

As referências a encomendas de prataria feitas por D. Diogo de Sousa são praticamente inexistentes na historiografia de arte nacional, se excetuarmos um cálice de prata dourada “ostentando as imagens de alto-relevo dos quatro Evangelistas, Virgem Maria e o brasão do Arcebispo de Évora D. Diogo de Sousa”45, datado de 1672. Trata-se de uma peça do período denominado protobarroco, mas ainda manifestamente arcaizante na opinião de Túlio Espanca46.

A documentação existente à guarda na Biblioteca da Ajuda foi reveladora de algumas encomendas empreendidas por D. Diogo de Sousa, entre a baliza cronológica anteriormente referida, abrangendo praticamente todo o período temporal em que foi governador do arcebispado eborense. O mesmo conjunto documental permitiria trazer ao conhecimento do panorama artístico nacional, mais um ourives da prata durante a década de setenta do século XVII, período para o qual lhe conhecemos atividade. A total ausência de qualquer referência a obras de autoria de António Coelho, por nós conhecida, permite-nos atribuir a esta documentação um caráter inédito, conferindo uma certa singularidade ao presente estudo. A abordagem por nós empreendida, ao conjunto em análise, proceder-se-á segundo um critério cronológico, remetendo para último as peças cujas datas não nos são reveladas pelos registos escritos.

A primeira menção encontrada surge numa missiva na qual o ourives António Coelho refere, sem mencionar tipologias, a feitura de uma peça com o peso de três marcos de prata que vale em dinheiro 14.400 reis, a 4.800 reis cada marco, valor fixo para as demais peças constantes neste estudo. Sabemos, relativamente ao seu feitio, terem sido cobrados 4.000 reis, acrescidos de outros 2.500 pelo seu douramento, totalizando a soma de todas as parcelas 20.90047.

No fim do mês de fevereiro de 1672, surgem referenciadas sete tigelas, entregues em uma bolsa ao portador Manuel Gomes da Inquisição48, pesando todas seis marcos, seis onças e cinco oitavas. Correspondia o seu peso em dinheiro a 32.770 reis, mais 6.000 pelo trabalho do ourives, somando a despesa 38.770 reis, valor pago por D. Diogo de Sousa, arcebispo de Évora, por intermédio de Vicente Coelho, mestre na Sé de Évora e filho do dito ourives49.

Aos onze dias do mês de março de 1673, seriam dadas quarenta moedas de ouro a António Coelho, segundo atesta o recibo por este assinado, como pagamento de uma caldeira de água benta, turibulo e naveta. As alusões constantes no referido documento permitem-nos saber que a caldeirinha com o seu hissope pesava cinco marcos, quatro onças e uma oitava, que valem a dinheiro aproximadamente 24.000 reis, acrescidos de outros 8.000 reis pelo seu fabrico. Relativamente à naveta e respetiva colher, somavam ambas três marcos, quatro onças e uma oitava, enquanto o seu feitio apontava para um valor inferior, na ordem dos 6.000 reis. Incluía ainda um turíbulo com sete marcos e sete oitavas, acrescidos de 8.000 reis pelo trabalho do mesmo50. A proximidade dos valores mencionados poderá ser indicativa de uma certa homogeneidade do dito conjunto, possibilidade essa exigida por parte do seu encomendador.

Uma missiva do ourives com data do dia seguinte informava da impossibilidade de concluir a encomenda para a Páscoa, conforme havia pedido D. Diogo de Sousa, possivelmente pelas peças que tinha em mãos para o senhor Fernão de Sousa, “he pasarão muitos dias que ahora as tenho no torneiro he por estar muito ocupado”51, ainda assim, procederá à realização do pedido com a maior brevidade possível. Tratar-se-ia possivelmente de peças que, ainda desconhecidas quanto às suas tipologias, surgem referidas como sendo o seu valor de 2.000 reis cada uma, esperando-se que fossem a gosto no tocante aos feitios52.

Somem-se ainda três pratos “que farei logo he os remeterei pela ordem”53, questionando o seu encomendador se a marca constante na banda de fora do prato – que fora por modelo – era para manter nos novos54. A respeito destes, sabemos terem sido remetidos ao senhor arcebispo D. Diogo de Sousa juntamente com o exemplar que serviu de modelo, seguindo juntamente a relação dos valores correspondentes ao dito encargo. Deste modo, sabemos terem os três novos pratos um peso de oito marcos, sete onças e três oitavas, valendo em dinheiro um total de 42.320, pelo feitio dos mesmos 4.500 reis, cada um a 1.500 reis55.

A ourivesaria civil encontra alguma expressão nas encomendas empreendidas pelo dito arcebispo de Évora, desta feita com uma bacia de barba terminada no primeiro dia de setembro de 1673, a qual totalizou 35.400 reis. O referido montante dividia-se em 29.400 reis, correspondentes ao peso de seis marcos e uma onça, e 6.000 reis pelo seu feitio. A encomenda seria entregue ao arcebispo pelo portador, uma vez “que não se pode acabar para que o meu filho a levasse ontem quinta-feira estimarei que va a gosto”56. O mesmo documento refere o abate desta despesa no dinheiro que tinha em sua posse António Coelho, o que nos leva a depreender a existência de uma conta permanente que permitia este e outros ajustes, demonstrativos de uma certa confiança entre ambas as partes, permissiva de tais acordos.

As peças até agora dadas a conhecer denotam um caráter civil e religioso, revelador de uma capacidade por parte do ourives António Coelho em trabalhar em ambos os registos, pese embora as especificidades muito próprias de cada um dos universos. A frequência de encomenda de peças em prata, num ritmo que podemos afirmar contínuo, levar-nos-ia a registar desta vez três castiçais remetidos nos primeiros dias de janeiro de 1674 pelo portador, sendo um deles o que serviu de modelo – como era prática frequente nos processos de encomenda – cuja prata importou em 30.570 reis. Sabemos terem ambos os exemplares as armas de D. Diogo de Sousa, já que constava do rol remetido juntamente com estes o registo de uma parcela no valor de 150 reis, derivados de “abrir armas”57. O pagamento seria feito uma vez mais a dinheiro, por mão de Vicente Coelho Borges, filho de António Coelho, pelo que “de corenta mill reis (…) restão nove mil e duzentos he oitenta reis”58.

Para a realização de uma peça que “logo me porei a fazela”59, da qual desconhecemos uma vez mais a sua tipologia, recebeu o ourives uns castiçais de prata do arcebispo de Évora, os quais foram pesados sem se “habachar nem hum marco”60. Após se lhe retirar “a sera que trazião os canos”61 foram os mesmos devidamente pesados, totalizando quinze marcos, sete onças e duas oitavas.

De um conjunto composto de cálice e quatro tigelas, rececionados por D. Diogo de Sousa a 24 de maio de 1674, apenas vamos encontrar na documentação menção ao valor de 2.900 reis para o cálice62. Permite-nos saber ainda, esse mesmo documento, que “toda esta prata dei a João de Sousa”63, embora as tigelas não constem da relação dos bens de seu sobrinho, realizada no ano de 1705, a qual tivemos oportunidade de estudar, no contexto das encomendas de prata para o dito arcebispado de Braga e de Lisboa64.

Obra de maior relevância no conjunto de encomendas que aqui damos a conhecer, são os doze tocheiros para a Sé de Évora “todos irmãos, com três triângulos”65remetidos a 2 de maio de 167566 – desde logo pelos seus quatrocentos e quarenta e seis marcos e uma onça, que à razão dos mesmos 4.800 reis o marco, somavam a significativa quantia de 2.141.400 reis. Acrescia por sua vez mais 1.115.000 reis pelo trabalho de feitio (a 2.500 reis o marco) perfazendo a importância total de 3.256.400 reis67.

António Coelho recebera ainda o valor de 100.000 reis para “gasto meudos das tocheras”68, os quais incluíam 20.000 reis para o torneiro onde se trabalhariam as madeiras, 16.000 reis pagos ao marceneiro pela feitura dos balaustres e outros 7.000 reis para os gastos com ferros e parafusos. A caixa das ferragens obrigava à despesa de 33.000 reis, aos quais acrescentamos mais 6.000 reis por as pintar, com as bolsas de frisas seriam despendidos mais 7.660 reis, com folha-de-flandres para se aplicar nas arandelas mais 1.200 reis e 1.400 com outros gastos não discriminados69. Somadas todas as parcelas, obtinha-se o valor de 92.260 reis, que deviam juntar-se à demais despesa apresentada anteriormente.

Os doze tocheiros para a catedral eborense tornam-se o conjunto de maior relevância do ponto de vista da informação do seu processo de encomenda. Além dos dados sobre a morfologia dos mesmos, detemos também a informação do seu peso, do valor da prata e do feitio, assim como de uma quantidade de gastos ditos menores. Tenha-se igualmente em conta, no tocante ao pagamento, que este se realizou em frações efetivadas de formas distintas, primeiro a quantia equivalente a 2.400.000 reis à qual se segue uma porção de prata com vinte e dois marcos, duas onças e quatro oitavas, equivalentes a 107.100 reis recebidos por António Coelho. Refiram-se ainda 100.00 reis aplicados em gastos considerados menores70.

Restava segundo o ourives “pera se me agustar há minha conta do que se me deve”71 714.560, que recebeu por mão do senhor Diogo Velho, intermediário de D. Diogo de Sousa, pelo que se declarava inteiramente pago72. Fez o senhor arcebispo doação perpétua destes tocheiros à Sé de Évora, para serem usados, à semelhança de outras peças devidamente identificadas, nas festas de Cristo, Nossa Senhora, Espírito Santo e Apóstolos, vontade expressa pelo referido prelado no seu testamento73. Era condição que não se

pudesse vender a ditta prata, trocar, e se amular, nem emprestar a pessoa alguma particular, nem em geral, nem a alguma relligião, sob pena desde logo ouvessem os Padres da Companhia de Jesus desta cidade seis dos doze tocheiros sobreditos, e os outros seis os Religiosos da Cartuxa extramuros desta mesma e se pudessem servir delles, para cujo effeito em tal caso lhes fazia delles doação74.

Numa missiva datada de 12 de setembro de 1676, endereçada por Diogo Velho ao arcebispo de Évora, referia--se que António Coelho não tinha nenhuma peça terminada75. Embora, uma vez mais, não seja especificada a tipologia das mesmas, podemos contudo depreender tratar-se do cofre e tinteiros enviados pelo reverendo, segundo refere o mesmo remetente numa carta escrita alguns dias depois. Descritas como sendo todas da mesma mão, estas foram remetidas com o valor de 96.100 reis de feitios76.

Tratava-se efetivamente de um cofre, do qual D. Diogo de Sousa fez doação à sua catedral para servir o Santíssimo Sacramento, sendo que qualquer contrariedade na execução da sua vontade, este passaria para posse dos religiosos do Salvador da cidade de Évora77. Sabemos ter sido o seu custo total de aproximadamente 109.770 reis, valor que se distribuía pelas seguintes parcelas, a saber 74.170 pelo peso de quinze marcos, três onças e cinco oitavas, conferindo-se pelo trabalho do ourives os restantes 35.000 reis78.

No âmbito das encomendas realizadas ao ourives António Coelho, temos vindo a observar que Diogo Velho se apresenta como um dos principais intermediários na concretização deste processo. Relativamente aos tinteiros, encontramos numa missiva endereçada por este último a D. Diogo de Sousa, na qual refere o envio de um cofre e tinteiros que lhe parecia “que tudo vai como obra de sua mão. Aqui me trouxe o rol da despesa que vay com esta, os 96$100 dos feitios lhe paguei, da plata da razão no mesmo rol”79.

Resultante da análise da documentação a que procedemos, sabemos que o ano de 1677 viria a acolher as últimas encomendas empreendidas pelo dito prelado. Posto isto, António Coelho, único ourives autor das obras aqui referidas, envia em 28 de julho do dito ano, segundo refere Diogo Velho, uns castiçais descritos como “perfeitíssimos”80, qualificação que poderá justificar os valores elevados cobrados pelos mesmos, como se atesta da missiva onde refere “ele pagasse bem mas tudo merece sua obra”81.

Pesava todo o conjunto cento e seis marcos e quatro oitavas, que valiam a dinheiro 509.100 reis82, sendo o seu feitio de 2.000 reis cada marco, totalizando 212.000 reis. Acrescia o custo das madeiras de 4.000 reis, pelas caixas 7.400 reis, 600 reis pelos ferros e pela folha-de-flandres 300 reis. Esta relação de despesa permite-nos, ainda, uma noção bastante prática de como as peças eram acondicionadas para serem remetidas ao seu destinatário com a segurança pretendida83.

Acreditamos de igual modo – embora a documentação não seja completamente esclarecedora – serem os mesmos seis castiçais referidos num outro documento como sendo “irmãos da cruz para a mesma sé”84, cujas peças António Coelho esperava “acertar no gosto de V. S.”85. Quanto ao seu feitio “desta falamos devagar”86 pois “o que agora se pratica aqui nas confrarias (…) a cruz com seus remates nas pontas, porque pede panela redonda, tem se já por cousa de Aldea”87.

Esta interessante referência tem a particularidade de nos dar informações valiosas na atualização do gosto vigente, desde logo pelo papel desempenhado pelas confrarias e irmandades enquanto organizações com uma importância singular na dinâmica artística no seio da Igreja portuguesa. A esse facto devemos acrescentar um outro que se prende com a Corte, como oposição à aldeia, onde as suas elites se caracterizavam, na generalidade das vezes, pela pouca cultura artística, por um gosto arcaizante e por uma manifesta dificuldade em acompanhar as novidades estilísticas em seu tempo útil.

Regressando à referida cruz e crucifixo, sabemos que detinham o peso de vinte marcos e uma onça88, que valiam a dinheiro a quantia de 106.200 reis89, para além dos 30.000 reis pelo feitio da mesma (1.500 reis por cada marco) e pela madeira para o pé da cruz deu-se 570 reis. Ao valor de 136.950 reis seriam abatidos 41.550 do valor da prata de uma cruz que fora enviada para esse mesmo efeito90.

Quanto ao pagamento pelo trabalho, António Coelho recebeu uma cruz velha que pesava a quantia de oito marcos e duas oitavas, correspondentes a 41.550 reis, valor que seria abatido ao montante total da despesa. Segundo a relação apresentada, encontramos ainda a quantia de 3.000 reis cobrados pela caixa para transporte da mesma91. A cruz, à semelhança de outras peças já aqui mencionadas, integrava o conjunto doado por D. Diogo de Sousa à Catedral de Évora, para ser usado em dias específicos sob pena de se fazer doação à Misericórdia eborense92.

Nova relação de despesa – não assinada – refere uma encomenda de piveteiros com o peso de 44 marcos, seis onças e cinco oitavas, à qual se soma uma caldeira, turíbulo e naveta, que pesavam no seu conjunto 19 marcos, uma onça e três oitavas, totalizando o dito conjunto 64 marcos, os quais valiam em dinheiro 307.200 reis. Acresce ainda o valor 96.000 reis pelo feitio das peças (1.500 reis cada marco), 4.750 reis pelas duas caixas que se mandaram fazer para um correto transporte dos objetos. Somavam todas as parcelas 407.950 reis93.

A questão do transporte destas peças de Lisboa para Évora encontra resposta nesta documentação, que refere bolsas e caixas para esse mesmo efeito, distintos meios para distintas tipologias de peças, mais precisamente para as diferentes dimensões como podemos constatar dos exemplos aqui referidos. Em síntese, para peças de maior vulto o seu transporte fazia-se através de caixas de madeira, onde eram devidamente acondicionadas, destinando-se as bolsas para peças de reduzida dimensão.

Tal como havíamos alertado anteriormente, terminamos esta exposição com o conjunto de peças cujas encomendas não se encontram datadas, mas que continuam a ter D. Diogo de Sousa e o ourives António Coelho como os principais intervenientes. Maioritariamente no contexto da ourivesaria civil, este conjunto compõe-se de prato e jarro com o peso de dez marcos e três onças de prata, dois castiçais com três marcos, quatro onças e seis oitavas e seis pratos com nove marcos, seis onças e duas oitavas. No que aos feitios diz respeito, e começando pelos valores mais elevados, vamos encontrar a quantia de 53.850 reis pelo custo dos seis pratos (a sete tostões cada um), um jarro que totalizou 9.000 reis e, por fim, uns castiçais com um valor de 2.000 reis94. À totalidade destas parcelas seriam abatidos quinze marcos, sete onças e duas oitavas de prata velha.

Encomenda distinta seria o cofre com o peso de quinze marcos, três onças e cinco oitavas que, à razão de 4.800 reis cada marco, remontava a 74.170 reis, pedindo António Coelho pelo trabalho nele despendido 35.000 reis, auferindo mais 600 reis por pratear a chave do dito cofre95. Na mesma relação de despesa apresentada pelo mesmo ourives, constava uma escrivaninha – por vezes referenciada apenas como tinteiros – trabalho em prata que pesava 13 marcos, 3 onças e 3 oitavas, equivalente a 64.720 reis, aos quais acrescem mais 15.000 reis pelo feitio correspondente. Reunia esta última peça três outros itens, a saber uma tesoura, um canivete e uma campainha, cobrando-se pelos dois primeiros 600 reis e pelo outro 700 reis, respetivamente96. No mesmo rol de encomenda, umas galhetas, duas colherinhas e duas chaves de candeeiros e mais “meudesas”97 que custaram 4.500 reis.

Quatro outros piveteiros “com piramidas”98, que pesavam quinze marcos, cinco onças e sete oitavas, levaram a que D. Diogo de Sousa despendesse o montante de 75.529 reis em dinheiro, acrescido de 30.000 reis pelo feitio. Note-se que este conjunto de peças doadas à Sé deveria ter, à semelhança de outros exemplares aqui referidos, uma utilização criteriosamente definida pelo seu doador, sob pena de poderem reverter estes exemplares, para a Misericórdia da dita cidade99. Integra ainda, o conjunto doado à Sé, duas tocheiras pequenas que custaram 258.550 reis, assim como uma bacia “pera servir no lava peês”100 pelo valor de 69.250 reis.

O conjunto de ourivesaria civil mandado obrar ao ourives António Coelho contava com diversos espécimes, entre eles doze colheres e os doze garfos, cujo rol de despesa se conhece. O peso destas vinte e quatro peças valia em dinheiro 20.930 reis, não se encontrando qualquer diferença de valores, no feitio das duas tipologias de talheres, custando cada um deles seis vinténs, que todos somados ascendiam a 2.880 reis101.

 

NOTAS CONCLUSIVAS

Finalizados os processos de encomenda por nós conhecidos, entre o arcebispo de Évora e o ourives António Coelho, podemos resumir do estudo aqui apresentado, o percurso individual de ambas as personalidades, para além do percurso conjunto, visando a relação estabelecida entre os interlocutores, relacionamento esse, que se estendia ao filho deste último, também ele protegido do referido arcebispo eborense. Estes e outros factos permitiram-nos uma proximidade a estes personagens, facilitando a compreensão dos processos de encomenda, amplamente enriquecidos pelos inúmeros pormenores constantes na documentação à guarda da Biblioteca da Ajuda.

Desde logo, a produção de ourivesaria civil e religiosa, encomendada por D. Diogo de Sousa, expressa a capacidade do dito ourives em trabalhar em ambos os registos, o que naturalmente implicava técnicas distintas. A esta versatilidade do autor, podemos associar uma qualidade artística meritória – pese embora não tenhamos conhecimento da existência das peças aqui mencionadas – comprovada pelas diversas observações à qualidade dos referidos espécimes, nomeadamente nos valores cobrados, como pudemos atestar na correspondência conhecida.

A escolha de António Coelho, ativo no decorrer de todo o percurso de D. Diogo de Sousa à frente da cátedra eborense e responsável por um número apreciável de peças, evidenciava igualmente um encomendador com um sólido gosto artístico, a par de uma exigência verificada nos processos de encomenda. Por outro lado, a percetibilidade de que a posse de tais objetos de prata, a par da sua utilidade prática, detinha também todo um valor simbólico facilmente associado ao poder, ao prestígio e à memória do seu encomendador.

Não menos importante, constitui o contributo das confrarias no estímulo à dinâmica artística, papel que se encontra ainda mais fortalecido, quando no interior do país tais mecanismos de empreendedorismo artístico são amplamente mais escassos, comparativamente à cidade de Lisboa e à Corte, muito particularmente. É nesse sentido que encontramos de forma bastante explícita uma permanente preocupação de proximidade ao gosto cortês, tão presente na esfera de certos prelados nacionais nos quais se inclui D. Diogo de Sousa, arcebispo de Évora.

 

Tabela 1

 

 

Tabela 2

 

 

Tabela 3

 

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Fontes

Arquivo da Sé de Évora

Livro dos acórdãos do Cabido (1659-1673), PT/ASE/ CSE/ C/002/ Lv 006.

Cabido da Sé de Évora (Bachareis, 1672-1691), PT/ASE/E/A/001/004/Mç 002.

 

Arquivo Municipal de Lisboa

Livro 2.º da Casa da Almotaçaria.

Livro 2.º de testamentos.

 

Arquivo Nacional da Torre do Tombo,

D. Diogo de Sousa, Inventário de bens, Livro 1, 1678.

Habilitações do Santo Ofício, Diligência de habilitação de António Coelho, 1635.

 

Biblioteca da Ajuda

Inventário, 51-X-10.

 

Estudos

BARATA, António Francisco – Memoria histórica sobre a fundação de Évora e suas antiguidades com os esboços chronologicos-biographicos dos bispos e arcebispos d'ella. 2.ª ed. Évora: Minerva Commercial, 1903.         [ Links ]

ESPANCA, Túlio – Inventário artístico de Portugal. Lisboa: Academia Nacional de Belas-Artes, 1966. vol. 7.         [ Links ]

GRANCHO, Nuno Cruz – O «melhor amigo» de D. João de Sousa: a prata no mecenato artístico nos arcebispados de Braga e de Lisboa (1696-1670). Bracara Augusta. Braga: Câmara Municipal. Vol. 61 Tomo 1 (2016), p. 57-99.         [ Links ]

GUERREIRO, Jerónimo de Alcântara – Galeria dos prelados de Évora. Évora: Gráfica Eborense, 1971.         [ Links ]

SOUSA, D. António Caetano – História genealógica da Casa Real Portuguesa. Coimbra: Atlântida-Livraria Editora, 1954. tomo XII, parte II.         [ Links ]

SOUSA, Gonçalo Vasconcelos e – iArte e devoção: a ourivesaria nas colecções da Santa Casa da Misericórdia do Porto. Porto: Santa Casa da Misericórdia, 2013.         [ Links ]

VALE, Teresa Leonor M. – O convento de S. Domingos de Benfica, D. João de Castro e o Instituto Militar dos Pupilos do Exército. Lisboa: Instituto Militar dos Pupilos do Exército, 1996.         [ Links ]

VALE, Teresa Leonor M. – Um convento dentro do convento: a intervenção do inquisidor geral D. Francisco de Castro no convento de S. Domingos de Benfica à luz do seu testamento e outras fontes. In COLÓQUIO UM ACERVO PARA A HISTÓRIA, 2, Lisboa, 2015 – Atas. Lisboa: Arquivo Municipal, 2015. p. 111-123.         [ Links ]

 

submissão/submission: 03/02/2017

aceitação/approval: 21/04/2017

 

 

NOTAS

* Doutorando em Arte, Património e Teoria do Restauro pela ARTIS - FLUL, tem desenvolvido o seu percurso de investigador em torno da problemática da circulação de bens móveis no contexto da desamortização oitocentista e I República, aplicado ao universo religioso na cidade de Elvas. Mais recentemente tem direcionado o seu interesse para a prataria no âmbito da importação espanhola em Portugal durante a dinastia de Habsburgo, tema que tem vindo a desenvolver nos estudos doutorais. Correio eletrónico: ngrancho@gmail.com

1 GUERREIRO, J. Alcântara – Galeria dos prelados de Évora. Évora: Gráfica Eborense, 1971. p. 62.

2 SOUSA, D. António Caetano – História genealógica da Casa Real Portuguesa. Coimbra: Atlântida-Livraria Editora, 1954. tomo XII, parte II, p. 82. Na presente obra, a mãe de D. Diogo de Sousa aparece como sendo Maria de Sousa, contrariando J. Alcântara Guerreiro, que a refere como Mariana de Sousa.

3 Idem, p. 83.

4 Biblioteca da Ajuda (BA), Inventário, 51-X-10, f. 537. A referência ao ter sido juiz da dita confraria surge por via de um recibo passado pelo tesoureiro da Mesa do Santíssimo Sacramento da igreja de S. Paulo, João de Carvalho, em como recebeu do padre Pedro Álvares, capelão do senhor Diogo de Sousa, o valor de 40.000 reis, que mandou dar de esmola por ter servido de juiz na dita confraria no presente ano de 1648.

5 Idem, ibidem. Quanto ao primeiro bispado para que é eleito, vamos encontrar algumas divergências entre os autores. Uma vez mais, J. Alcântara Guerreiro refere ter sido o bispado de Lamego e não o de Leiria. O facto de termos encontrado na documentação arquivística uma alusão a Leiria, optamos por dar como válida essa mesma referência. Veja-se BA, Inventário, 51-X-10, f. 5.

6 BARATA, António Francisco – Memoria histórica sobre a fundação de Évora e suas antiguidades com os esboços chronologicos-biographicos dos bispos e arcebispos d'ella. 2.ª ed. Évora: Minerva Commercial, 1903. p. 77.

7 SOUSA, D. António Caetano, op. cit., p. 83.

8 Ver Arquivo da Sé de Évora (ASE), Livro dos acórdãos do Cabido (1659-1673), f. 142, PT/ASE/CSE/C/002/ Lv. 006.

9 BA, Inventário, 51-X-10, f. 389-389v. Trata-se de um documento, “Pera sepultura do Senhor D. Diogo de Souza”, do Convento da Piedade de Vila Viçosa em abril de 1674. O pedido feito pelo dito prelado para que fosse concedido.

10 Agradecemos ao Inventário Artístico de Évora, na pessoa do Professor Goulart, a disponibilidade, cedência e respetiva autorização para a publicação da imagem acima constante.

11 SOUSA, D. António Caetano, op. cit., 84. Para além do que herdara da 1.ª condessa de Figueiró, sabemos ser senhor de outros bens patrimoniais, nomeadamente rendimentos na província do Alentejo (Borba, Campo de Ourique (Messejana), Elvas, Redondo e Vila Viçosa), Lisboa e seu termo, Entre Douro e Minho, Beira e Trás-os-Montes, os quais passaram a pertencer a seu sobrinho Fernão de Sousa, senhor de Gouveia, segundo a relação dos rendimentos feita em Lisboa a 21 de março de 1651.Veja-se Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT), D. Diogo de Sousa, Inventário de bens, Livro 1, 1678, f. 1, e BA, Inventário, 51-X-10, f. 9.

12 ANTT, D. Diogo de Sousa, Inventário de bens, Livro 1, 1678, f. 44v.

13 Idem, ibidem. Devemos acrescentar ainda o facto de D. Diogo de Sousa ter ficado responsável pela educação de seu sobrinho João de Sousa, futuro bispo do Porto e arcebispo de Braga e Lisboa, tendo sido um fator singular na sua formação, nomeadamente artística.

14 SOUSA, D. António Caetano, op. cit., 84. Para o ano da sua morte, os autores dividem-se entre o ano de 1678, como defende aquele por nós citado, com base no epitáfio que se encontra na sua sepultura, ou 1677, como avançam Fortunato de Almeida e Túlio Espanca, que se fundamentam na data da bula passada ao seu sucessor no arcebispado de Évora. Veja-se para essa questão ALMEIDA, Fortunato – História da Igreja em Portugal. Porto: Livraria Civilização, 1968. vol. II, p. 624. Uma pequena nota fora referida em cabido extraordinário de 23 de janeiro de 1678, na presença do Senhor Deão: “Faleceo o Senhor Arcebispo”. Ver ASE, Livro dos acórdãos do Cabido (1659-1673), f. 77v., PT/ASE/CSE/ C/002/Lv 006.

15 ANTT, D. Diogo de Sousa, Inventário de bens, Livro 1, 1678, f. 45.

16 Idem, ibidem.

17 Idem, f. 46.

18 Veja-se, para outras informações relativas a Vicente Coelho Borges, GRANCHO, Nuno Cruz – O «melhor amigo» de D. João de Sousa: a prata no mecenato artístico nos arcebispados de Braga e de Lisboa (1696-1670). Bracara Augusta. Braga: Câmara Municipal. Vol. 61 Tomo I (2016), p. 57-99.

19 ANTT, D. Diogo de Sousa, Inventário de bens, Livro 1, 1678, f. 46v.

20 BARATA, António Francisco, op. cit., p. 78.

21 Como destinatários das esmolas encontramos inúmeras casas conventuais em Lisboa, como o convento de Carnide com 100.000 reis (1673), das flamengas com 20.000 reis (1673), dos capuchinhos franceses com 20.000 reis (1672), e das irmãs franciscanas do convento do Calvário de Lisboa (1672). Acresce ainda a despesa paga pelos consertos na igreja de S. Vicente, com a construção e reparo de pontes na cadeia e na casa da audiência. Devemos acrescentar, embora não constitua uma obra pia, o patrocínio dos consertos nas casas de Fernão de Sousa – que supomos ser o seu sobrinho, e um dos herdeiros, juntamente com João de Sousa – em Lisboa, no valor de 133.870 reis pagos a João Dias, mestre pedreiro; Francisco Simões, carpinteiro e, João Carvalho, gesseiro (1674). Outra referência encontramos numa carta de Diogo Velho para o arcebispo de Évora, D. Diogo de Sousa, cuja referência acreditamos ser a mesma que encontramos numa carta endereçada por Diogo Velho ao arcebispo de Évora, D. Diogo de Sousa, onde “em primeiro lugar dou a V. S. os parabens de merce que V. M. S. foy servido fazer ao Sr. Fernão de Sousa e sua casa, Assi lhe dei a elle logo com a carta de V. S e com os 560 mil reis”. BA, Inventário, 51-X-10, f. 417, 420v, 421, 423, 474, 482 e 539.

22 Idem, f. 427, 447, 476, 470 e 478.

23 Idem, f. 473. Refira-se neste contexto concreto, pelo interesse na perspetiva da artística, a esmola de trinta alqueires dados a Hermínia de Azevedo, viúva de Pero Lopes, que foi pintor e criado de D. António.

24 Idem, f. 306 e 485.

25 Idem, f. 485, 571. Conhece-se, entre outros exemplos, a esmola de 20.000 reis dados ao convento da Esperança, segundo recibo passado por Soror Ana de Jesus (1677).

26 Idem, f. 580 e 582.

27 Idem, f. 580.

28 Idem, f. 583.

29 Idem, f. 584.

30 Idem, f. 590.

31 É este mesmo Diogo Velho – enquanto secretário-geral do Santo Ofício da Inquisição – que vamos encontrar a certificar no processo de habilitação de Vicente Coelho Borges, conforme consta no ASE, PT/ASE/E/A/001/004/Mç 002, f. 4. Trata-se do mesmo Diogo Velho que lavrou o testamento do inquisidor-geral D. Francisco de Castro, como se atesta na obra de Teresa Vale, na qual se transcreve a partir do original, à guarda do Arquivo Municipal de Lisboa, veja-se Arquivo Municipal de Lisboa (AML), Livro 2.º de testamentos, f. 4-16v. Veja-se VALE, Teresa – O convento de S. Domingos de Benfica, D. João de Castro e o Instituto Militar dos Pupilos do Exército. Lisboa: Instituto Militar dos Pupilos do Exército, 1996. p. 217, e ainda VALE, Teresa Leonor M. – Um convento dentro do convento: a intervenção do inquisidor geral D. Francisco de Castro no convento de S. Domingos de Benfica à luz do seu testamento e outras fontes. In COLÓQUIO UM ACERVO PARA A HISTÓRIA, 2, Lisboa, 2015 – Atas. Lisboa: Arquivo Municipal, 2015. p. 111-123.

32 BA, Inventário, 51-X-10, f. 588v.-589.

33 ANTT, Habilitações do Santo Ofício, Diligência de habilitação de António Coelho, 1635. Refiram-se, paralelamente a António Coelho, outros ourives constantes no processo na condição de testemunhas, a saber Duarte, de idade de 51 anos, ourives e familiar da Santa Inquisição, morador na Rua dos Ourives da dita cidade de Lisboa. António de Sousa, de 37 anos, era igualmente ourives da prata, ainda Domingos Antunes, de 40 anos de idade, também ele vizinho de António Coelho na Rua dos Ourives, e um outro ourives da prata de 44 anos de idade, chamado de António de Paiva.

34 É com esse nome que vem referenciado na diligência para familiar do Santo Ofício de seu filho Vicente Coelho Borges. Veja-se ANTT, Habilitações do Santo Ofício, Conselho Geral, Habilitações, Vicente, Maço 2, doc. 33, f. 1, 7v, 15v-16.

35 SOUSA, Gonçalo Vasconcelos e – Arte e devoção: a ourivesaria nas colecções da Santa Casa da Misericórdia do Porto. Porto: Santa Casa da Misericórdia do Porto, 2013. p. 25.

36 ANTT, Habilitações do Santo Ofício, Diligência de habilitação de António Coelho, 1635, f. 4. Foram seus avós paternos Pedro Anes Pinhão e Clara Coelha, moradores no lugar de Bocharda, termo de Cascais. Manuel Luís e Águeda Esteves, moradores na dita Ribeira da Penha Longa, foram seus avós maternos.

37 Idem, ibidem. Seus avós paternos eram Diogo Leal e Isabel Gonçalves, naturais da vila de Colares, e pelo lado materno António Lourenço e Justa Gonçalves, moradores na freguesia de S. Nicolau, na cidade de Lisboa.

38 Relativamente à Rua da Prata, onde António Coelho passa a residir, encontramos no Arquivo Municipal de Lisboa, referência a uma postura quinhentista sobre esse mesmo arruamento, no qual se alude a obras do canto da travessa abaixo da Rua da Madalena no sentido da Conceição, pela rua abaixo da Ourivesaria até à Alfândega (junto ao Pelourinho Velho). Deveria ser nestes arruamentos que se deviam situar os ourives da prata, sob pena de penalização a todos os que tenham oficina aberta em outras partes. Pretendia-se assim contribuir para o enobrecimento da cidade e, para uma melhor fiscalização dos vereadores, de cada um dos ofícios. Veja-se AML, Livro 2.º da Casa da Almotaçaria, doc. 30, f. 13v.-14v.

39 Idem, f. 3.

40 Idem, ibidem.

41 BA, Inventário, 51-X-10, f. 528.

42 Idem, f. 527.

43 Idem, f. 553. Para além do ourives da prata António Coelho ter sido contratado para executar um número significativo de encomendas para D. Diogo de Sousa, enquanto arcebispo de Évora, também seu filho, Vicente Coelho Borges, gozou dessa proteção, nomeadamente nos seus estudos em Arte e Teologia desenvolvidos na Universidade de Évora, tendo assistido, nesse mesmo período, no serviço do dito prelado eborense, como já tivemos oportunidade de referir num outro estudo, dedicado à encomenda de prataria de D. João de Sousa, enquanto à frente do arcebispado de Braga e Lisboa, sobrinho de D. Diogo, e na esfera do qual vamos encontrar o cónego Vicente Coelho Borges, seu assistente no bispado do Porto e arcebispado de Braga.

44 Agradecemos à sr.ª diretora da Biblioteca da Ajuda, dr.ª Cristina Pinto Basto, a disponibilidade, cedência e respetiva autorização para a publicação da imagem acima constante.

45 ESPANCA, Túlio – Inventário artístico de Portugal. Lisboa: Academia Nacional de Belas-Artes, 1966. vol. 7, p. 52.

46 Idem, ibidem. Descreve o autor o cálice acima mencionado como tendo um “nó cilíndrico de dois andares vasado de edículas envieiradas e a congregação dos Apóstolos. Copa de seis tintinábulos suportados por anjos brutescos e serafins amparando os símbolos da Paixão de Cristo, também esculpidos”.

47 BA, Inventário, 51-X-10, f. 527.

48 Idem, f. 566.

49 ASE, PT/ASE/E/A/001/004/ Mç. 002.

50 Idem, f. 541.

51 Idem, f. 555.

52 Idem, f. 553.

53 Idem, ibidem.

54 Idem, f. 542v. A marcação da prataria por parte do ourives responsável, como se atesta por parte de António Coelho nas encomendas empreendidas para o arcebispo de Évora, resulta do facto de esta constituir uma preocupação no decorrer da 2.ª metade do século XVII – muito particularmente em Lisboa – devido ao avanço legislativo e a um significativo peso que a organização gremial dos ourives possuía.

55 Idem, f. 568.

56 Idem, f. 523-523v.

57 Os três castiçais imediatamente acima mencionados constituem as únicas peças com alusão às armas de D. Diogo de Sousa no contexto das inúmeras encomendas que a documentação dá a conhecer. Todavia, como tivemos oportunidade de mencionar no presente capítulo, Túlio Espanca havia já referenciado a existência de um cálice que evidenciava as armas do referido prelado, distintivo que apenas conhecemos nestas três peças.

58 Idem, f. 551.

59Idem, f. 557.

60 Idem, ibidem.

61 Idem, ibidem.

62 Idem, f. 527v.

63 Idem, ibidem.

64 Este estudo foi recentemente publicado veja-se GRANCHO, Nuno Cruz, op. cit, p. 83.

65 BA, Inventário, 51-X-10, f. 396.

66 Temos conhecimento que a 9 de maio de 1675, já os mesmos doze tocheiros se encontravam em posse do arcebispo de Évora D. Diogo de Sousa. Veja-se Idem, f. 548v.

67 Idem, f. 546-546v.

68 Idem, f. 547.

69 Idem, ibidem.

70 Idem, ibidem. Num outro “instrumento de pura e irrevogável doação”, refere-se, a propósito dos doze tocheiros, gastos miúdos com “ferro, madeiras torneadas, e caixas em que estão fechados, e as bolças de baeta verde importam noventa, e dous mil duzentos, e doze mil reis e doze quaixas emcouradas, que custarão dose mil reis”. Veja-se Idem, f. 396v.

71 Idem, f. 546-546v.

72 Idem, f. 546v.

73 ANTT, D. Diogo de Sousa, Inventário de bens, Livro 1, f. 46v.

74 BA, Inventário, 51-X-10, f. 396v.-397.

75 Idem, f. 586.

76 Idem, f. 562.

77 Idem, f. 396-396v.

78 Idem, f. 559. Ainda assim, os valores para o dito cofre, apresentados no citado documento, apresentam algumas diferenças comparativamente com outras mencionadas a fólio 397 e 397v. A opção pelas primeiras justifica-se por serem essas as mesmas constantes nas parcelas do rol de despesa da peça em análise.

79 Idem, f. 562.

80 Idem, f. 539v.

81 Idem, ibidem.

82 Idem, f. 544.

83 Idem, f. 561-561v.

84 Idem, f. 539.

85 Idem, ibidem.

86 Idem, ibidem.

87 Idem, ibidem.

88 Num outro documento encontramos, para o que julgamos ser esta mesma peça, uma referência para o peso da cruz sem o elemento escultórico da imagem de Cristo, totalizando vinte marcos e uma onça. Ver Idem, f. 543.

89 Idem, f. 544.

90 Idem, f. 543.

91 Idem, f. 543 e 561-561v.

92 Idem, f. 396v.-397.

93 Idem, f. 586-586v. A documentação permite-nos, ainda assim, saber que os piveteiros detinham o peso de 44 marcos, seis onças e cinco oitavas, totalizando as restantes três - caldeirinha, turíbulo e naveta - dezanove marcos, uma onça e três oitavas.

94 Idem, f. 525.

95 Idem, f.559 e 562v.

96 Idem, ibidem. Os pagamentos foram feitos com vinte sete marcos e cinco oitavas de prata velha, que lhe tinham sido entregues, e mais sete marcos, três onças e quatro oitavas. Pagou Diogo Velho o valor de 56.100 reis.

97 Idem, f. 559.

98 Idem, f. 396v.

99 Idem, f. 544 e 397.

100 Idem, f. 397.

101 Idem, f. 521. Curiosamente, encontramos neste mesmo documento, assinado pelo ourives da prata António Coelho, a aquisição de “sette mil he duzentos reis de seda (…) carmezim he roxo” para se fazerem dois pares de meias e luvas, referindo conjuntamente no rol das pratas acima mencionadas, o valor pelos feitios destas. A existência destas peças, que se encontram descontextualizadas das obras de prataria, deve-se em nossa opinião ao facto de ter ficado António Coelho responsável pela aquisição dos tecidos e fabrico das peças, assim como o envio destas, juntamente com as peças de prata, para D. Diogo de Sousa, arcebispo de Évora.

Creative Commons License Todo o conteúdo deste periódico, exceto onde está identificado, está licenciado sob uma Licença Creative Commons