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Cadernos do Arquivo Municipal

versão On-line ISSN 2183-3176

Cadernos do Arquivo Municipal vol.ser2 no.6 Lisboa dez. 2016

 

ARTIGO

 

Pátios e vilas de Marvila e Beato: modos de vida de um movimento antigo

Pátios and Vilas of Marvila e Beato: ways of life from an old motion

Margarida Reis e Silva*

 

RESUMO

Marvila e Beato constituíram um dos núcleos fabris de Lisboa.A partir de meados do século xix, estes espaços ribeirinhos foram-se moldando ao ritmo acelerado da produção, recebendo milhares de pessoas que chegavam em busca de trabalho, encontrando e criando também aqui os seus lugares para habitar. Nas últimas quatro décadas, o fim da indústria marcou nesta região uma nova fase, encontrando-se as velhas unidades maioritariamente desativadas, e até abandonadas. Também os velhos pátios e vilas de habitação popular se foram desertificando, perdendo o movimento de outrora. Procurámos aqui preservar o testemunho dos seus modos de vida, resgatados das imagens e fontes escritas, mas também dos testemunhos de quem aqui viveu. Deste processo de recolha de memórias, de realçar a noção de que um espaço urbano se valoriza e poderá ser regenerado, não só pelo (necessário) conhecimento sobre o seu património arquitetónico, mas antes de tudo pelo entendimento das suas vivências e sociabilidades, o “tecido humano” que sustentará o construído.

 

PALAVRAS-CHAVE

Zona ribeirinha oriental de Lisboa / Marvila / Beato / Habitação popular / História oral

 

ABSTRACT

Marvila and Beato were one of Lisbon's industrial boroughs. From mid-19th century onwards, these riverfront neighbourhoods were shaped at the quick pace of the industrial production, harbouring thousands of people in search of work, who would also find or make their homes here. In the last decades, the end of the industries as set a new phase for this region, with most of its old units now closed. The pátios and vilas, units of working class housing, have also known some desertification, leaving behind the motion of olden days. Our aim with this article is to keep the accounts of the ways of living in these units, redeemed from old photographs and written sources, but also from the testimonies of those who lived here. From this memorialistic process, we take the general notion that urban landscapes can be valued and regenerate not only by (rightfully) researching their architectural heritage, but first of all, by understanding their social interactions and ways of living, the “social fabric” which holds the built environment.

 

KEYWORDS

Lisbon's oriental riverfront / Marvila / Beato / Working class housing / Oral history

 

 

“What is the city but the people?”

Curiolanus, William Shakespeare

 

O presente artigo é parte de uma investigação alargada1 sobre os pátios e vilas da zona ribeirinha oriental de Lisboa, testemunhos de uma forma de habitar característica da industrialização portuguesa de meados do século xix, e que se mantém até aos dias de hoje.

Nesse trabalho, procurou conhecer-se os núcleos arquitetónicos mais significativos desta tipologia na região, e para melhor descrever e acompanhar as profundas alterações vividas neste espaço urbano, pretendeu conhecer--se igualmente um pouco do dia-a-dia destas populações, sensivelmente a partir de meados do século xx. A par da bibliografia e fontes (em especial as imagens) disponíveis sobre esse quotidiano, foi ainda possível recolher alguns testemunhos orais junto dos antigos habitantes da região. Este texto resulta desse trabalho de síntese.

Gostaria de louvar a Câmara Municipal de Lisboa, onde foi possível aceder aos seus centros de documentação e materiais das suas entidades ligadas à reabilitação urbana, mas também ao seu Arquivo Fotográfico, acervo decisivo para este trabalho, assim como quero prestar o meu sentido reconhecimento aos habitantes dos pátios e vilas de Marvila e Beato que partilharam comigo um pouco da sua vida e das suas memórias, as felizes e as dos tempos mais difíceis.

 

MARVILA E BEATO: BREVE RESENHA HISTÓRICA

Durante séculos, a orla ribeirinha oriental de Lisboa era uma zona rural e de lazer da cidade, que se veio povoando de quintas de recreio das famílias abastadas, onde se procurava usufruir dos bons ares do rio e do campo, assim como das magníficas vistas da região. Em finais do século xviii, como resultado das políticas pombalinas de incremento à indústria, este cenário idílico começa a povoar-se de manufaturas, que produzem bens facilmente embarcados para os seus destinos nas “praias” de Xabregas, por meio da grande via de transportes que era o rio Tejo2.

Em 1838, no dealbar daquela que ficou conhecida como a primeira industrialização portuguesa, a primeira fábrica a vapor a fixar-se nesta zona (a Companhia de Fiação e Tecidos Lisbonense) instala-se no convento de São Francisco de Xabregas, então recentemente extinto. Tal representava um sinal do desenvolvimento industrial sem precedentes vivido na cidade de Lisboa, com os seus principais polos nas zonas ribeirinhas limítrofes. A ocidente, as fábricas cresciam no vale de Alcântara; a oriente, as (atuais) freguesias de Marvila e Beato eram palco de iguais transformações. Com a expansão da linha ferroviária do norte, que passa a atravessar ambas as freguesias a partir de 1856, estas tornam-se definitivamente locais de destaque para a fixação industrial e de grandes armazéns comerciais, com especial prevalência do fabrico de tecidos de algodão, tabacos, transformação de cortiça, moagens, tanoarias, ou comércio vinhateiro.

Ao longo das décadas de implantação fabril, e à semelhança das restantes regiões industrializadas do país e da capital, também a zona oriental de Lisboa se viu confrontada com a necessidade de albergar a sua população operária, que aumentava de dia para dia.

As sucessivas vagas de trabalhadores, na sua maioria vindos do mundo rural, encontrariam meios de se fixar no espaço oriental da cidade; desde a rua de Marvila ao beco dos Toucinheiros (no Beato), por todo o lado se ocupavam pátios e outros espaços obsoletos do edificado, reaproveitando velhos palácios devolutos ou ocupando os logradouros de prédios de habitação com a construção de pequenas “células” habitacionais. Assim, e à semelhança do que sucedera ao longo dos séculos em épocas de rápido crescimento populacional, proliferou em Lisboa uma nova geração de pátios de habitação popular.

Vivia-se a transição para um novo século, e rapidamente se levantaram vozes, entre a imprensa e mesmo em alguns quadrantes políticos, denunciando as más condições de vida das classes populares. Perante a ausência de soluções estatais, surgiu outra forma de alojamento − a vila. Construída com maior planeamento do que o pátio, esta nova solução foi muitas vezes ensaiada pelas próprias empresas para albergar os seus empregados, a par de outros (geralmente pequenos) promotores particulares, que procuravam com esta nova oferta habitacional rentabilizar terrenos de menor valor.

Ao longo do século xx, a industrialização portuguesa, apesar do seu carácter lento e incipiente, conhece ainda alguma consolidação. Na primeira metade do século, e mantendo ainda a força motriz do carvão da velha indústria oitocentista, − com as suas longas chaminés de tijolo − na zona oriental estendem-se grandes unidades de produção. Ao mesmo tempo, afirmam-se os grandes entrepostos comerciais (como a José Domingos Barreiro ou a Abel Pereira da Fonseca), no Poço do Bispo, e a atividade portuária prospera. A partir de finais dos anos 40, Portugal ensaia finalmente a sua adesão à indústria moderna; os alargados complexos fabris, movidos agora a energia elétrica, manter-se-ão a oriente, procurando espaços mais amplos, mas conseguindo ainda alguns (como o grande complexo de Material de Guerra, em Braço de Prata, ou a Sociedade Nacional de Sabões, na estrada de Marvila), implantar-se neste velho núcleo ribeirinho. Na década de 1960 dar-se-á a abertura ao exterior da economia portuguesa, com um aumento significativo da presença da indústria, que representava agora, para os trabalhadores, uma real alternativa ao emprego agrícola. Esta conjuntura ter-se-á mantido até cerca de 1973, configurando-se este período como uma época de significativo crescimento económico para Portugal3.

A aceleração da produção far-se-á sentir igualmente na força de trabalho que procura a região de Lisboa, que conhece novo aumento populacional, numa década em que todo o país perdera habitantes devido à emigração. Os pátios e vilas de habitação popular, agora já uma marca permanente no edificado da zona oriental, estariam então na sua capacidade máxima. Marvila e Beato eram zonas de intensa atividade, num espaço urbano que se foi moldando sob o peso desta grande concentração populacional. Por todo o país e em especial em Lisboa, ensaiam--se sucessivas campanhas de incentivo à construção de habitação económica, mas estes não vão conseguindo responder às necessidades, assistindo-se à proliferação de bairros clandestinos ou bairros de lata um pouco por toda a envolvente da cidade, realidade a que não ficou alheia a zona ribeirinha oriental.

A partir da década de 80, porém, a reconfiguração da economia e a adoção de novos modelos produtivos foram ditando o fim da era industrial que mudara a face desta antiga zona de lazer da nobreza. Com a terciarização da cidade e do país, também aqui as fábricas foram fechando e os grandes armazéns parecem ter perdido a competitividade, agonizando até à sua extinção total. Marvila e Beato viram desaparecer as razões do seu desenvolvimento dos últimos dois séculos – a indústria e os grandes armazéns vitivinícolas – e as populações que para aqui haviam afluído ao longo de décadas tiveram de lidar com a perda dos seus meios de subsistência. À medida que cresceram, as novas gerações foram muitas vezes partindo, procurando novos locais de trabalho. O antigo frenesim de operários silenciou-se, as fábricas e as frágeis habitações populares dos núcleos mais antigos foram-se desertificando.

Atualmente, estas freguesias de Lisboa perderam a sua identidade industrial, mas pouco ganharam no seu lugar. Os antigos bairros “operários” e os complexos fabris, testemunhos de uma época histórica que ainda marca a memória desta população, confundem-se na restante malha urbana, conhecendo em conjunto uma galopante degradação. Recentemente, esta realidade parece finalmente estar a ser contrariada, com as novas fábricas criativas a resgatar os amplos espaços deixados vagos pela indústria tradicional. Será este um novo começo para a zona ribeirinha oriental? A descoberta de uma nova feição para o futuro? Assim se espera.

De momento, procuraremos deixar aqui um pouco da sua caracterização histórica durante boa parte do século xx, a materialidade e memória deste espaço que foi, em determinada altura, o “principal centro industrial de Lisboa”4.

 

VIVER NOS PÁTIOS E VILAS DE MARVILA E BEATO: MIGRAÇÕES E MISÉRIA

Apesar do crescimento industrial desta região, a vida nos pátios e vilas da zona ribeirinha oriental foi marcada pelas dificuldades dos seus habitantes, entre os quais os recém-chegados.

Além dos pequenos núcleos populacionais em torno das quintas aqui existentes, a partir de finais do século xix começaram a chegar populações do interior, que, procurando melhores condições na capital, se empregavam nas novas indústrias desta zona, que mantinha, não obstante, uma marcada feição rural. As famílias que aqui vivem há pelo menos três gerações têm como referência para a sua fixação, não só a indústria da região, mas também as suas grandes quintas, onde alguns dos seus antepassados trabalharam no abastecimento de produtos agrícolas à cidade de Lisboa, papel primordial desde sempre desempenhado por estas freguesias “do termo” da cidade. O trabalho agrícola ter-se-á mantido até meados do século xx, saindo todos os dias produtos das quintas de Marvila com destino à praça da Figueira, ou ao mercado da Ribeira5.

Chegados para trabalhar nas quintas ou para se empregar nas fábricas, os novos habitantes parecem ter seguido os seus familiares ou conterrâneos que já se haviam mudado para esta região. As famílias recebiam os seus parentes, ajudando os recém-chegados a encontrar lugar não longe de si. Os habitantes do bairro Chinês, por exemplo, representantes maioritariamente de uma última fase de migração rural para esta zona, tinham muitas vezes familiares já instalados em pátios e vilas das proximidades. Ao longo das décadas, era comum as famílias habitarem diferentes locais destas freguesias, à medida que iam melhorando as suas condições económicas, ou iam aproveitando as flutuações na oferta de habitação6.

Na bibliografia e fontes, incluindo as entrevistas no terreno, fala-se de um modo geral em casas com más condições de habitabilidade. Repetem-se afirmações como as deste antigo morador: “ali em casa vivíamos seis pessoas em três divisões pequenas. Eu e os milhares de pessoas do bairro. Não havia condições nenhumas, não havia higiene nem nada. A gente estava a dormir e a chover em cima da cama”7.

Ao recordar o passado, os habitantes mais idosos relembram um cenário de “fome e miséria”, num contexto generalizado de carência e privações. O mesmo entrevistado recorda a mercearia do pátio do Colégio, em Marvila, que, com uma clientela de baixos recursos, vendia 1 ou 2 dl de azeite, assim como fósforos avulsos: “isto aqui era um sítio muito miserável, e não se riam uns dos outros, que era uma miséria pegada!”. Recorda igualmente uma moradora, chegada a Marvila nos anos de 1950: “A minha vida na terra foi triste, aqui triste foi […]”8.

Outros, ainda assim, conseguem recordar a vida num pátio com algum humor:

às vezes íamos a subir as escadas [forradas de azulejo] do pátio [do Colégio] e dizíamos: Ó mãe, não diga mal, que a sua casa é um palácio! E ela [...]: É um palácio nas escadas, que aqui em casa é uma barraca! [...]9.

 

Figura 1

 

Apesar do grande atrativo das fábricas e armazéns da região, os salários eram baixos, permitindo por vezes pouco mais do que a sobrevivência. Piores eram as condições daquelas famílias que, aqui chegadas, não conseguiam empregar-se. Recorda uma moradora, que, chegada com o marido à zona oriental se viu a braços com a escassez de trabalho:

Trabalhava eu, e ficava o meu marido em casa, porque ele não tinha trabalho. […] Eu obriguei-me para o Cais da Batata. Ganhava 15$00 ao dia a escolher batata. No fim do meu dia feito, cortava os bocados bons das batatas que eram para o lixo, para trazer para nós comermos. […] Levantava-me de manhã, com a navalhinha, e ia por aí abaixo. Se trabalhasse, trabalhava, se não, trazia pelo menos para nós comermos10.

Se muitas vezes os laços familiares eram a forma de ingressar numa empresa, nem assim o lugar era garantido, num contexto de grande procura:

As fábricas empregavam muita gente, mas também havia muita gente cá! […] E alguns nem trabalhavam toda a semana, porque não havia trabalho para todos. Aquilo antigamente era assim; iam trabalhar, numa tanoaria, (por exemplo) […], e depois não havia mais nada para fazer, e acabava-se […]11.

Além do surgimento dos pátios e vilas, a chegada à zona ribeirinha oriental de numerosos novos habitantes a partir de finais do século xix irá operar um sem-número de transformações neste espaço urbano. Com o incremento industrial e consequente pressão demográfica, todo um conjunto de novas infraestruturas se tornará necessário. Entre as respostas do poder político às novas exigências e as ações da própria população para melhorar a sua qualidade de vida e adaptar a si o novo espaço, somam-se elementos que marcarão para sempre a memória de quem aqui viveu ou trabalhou.

 

SOCIABILIDADES E TEMPOS LIVRES

No coração de grande parte dos pátios e vilas, encontramos o primeiro espaço de utilização coletiva das novas populações operárias, o pátio interior. Este pátio resultava do aproveitamento do interior dos quarteirões e da maximização da área construída, característico destes núcleos de habitação popular, mas terá assumido desde logo o papel de grande terreiro comunitário para os seus habitantes. Nas palavras de Maria João Rodrigues, este é um espaço “restrito e de transição entre o isolamento interior e a rua”12. Em conjuntos residenciais com casas de pequena dimensão, o pátio interior do Pátio ou Vila funcionava como uma extensão da habitação, neste caso partilhada com a restante comunidade. Já sobre a década de 1990, escrevia Cristina Leite:

No pátio substitui-se a casa pela rua e a rua pela casa; se o tempo promete, […] passam as horas mortas sentados numa cadeira ou banco no terreiro; […] As portas, uma janela ou o postigo estão sempre abertos para o pátio. Neste, o cheiro dos cozinhados misturam-se com os sons da rádio ou da televisão; ouve-se a mãe a ralhar com o filho e uma vizinha a pedir emprestado um bocado de farinha, enquanto outras falam de postigo para postigo […] o pátio é um microcosmos, onde tudo parece poder existir e suceder.13

Entre os moradores entrevistados foram comuns expressões como “a vizinhança era toda uma”, recordando igualmente este espírito de entreajuda. No entanto, essas recordações não serão consensuais. O autor local Mário Furtado refuta a ideia generalizada de uma convivência castiça e salutar, vendo-a por seu turno como um “comunitarismo forçado”, fruto das carências económicas dos seus habitantes14.

Nestes lugares, por vezes de estadias prolongadas, identifica-se facilmente a presença de elementos de utilização pela comunidade, sendo possível testemunhar, pelas mudanças ocorridas nesses, as próprias transformações vividas no seio destas populações ao longo dos anos.

 

Figura 2

 

As imagens antigas ilustram um espaço povoado de crianças, muitas vezes arborizado e com bancos, para melhor usufruto destas zonas exteriores.

Num contexto social de carência generalizada era comum as crianças estarem todo o dia entregues a si próprias, durante as horas de trabalho (ou procura deste) dos pais. Neste contexto, o pátio interior constituía um espaço privativo mais restrito e seguro do que a rua, recordado frequentemente nas entrevistas como palco das brincadeiras de infância nos pátios e vilas.

O pátio era a extensão da habitação também no que respeitava às atividades domésticas das mulheres, tais como a lavagem e secagem da roupa, que aqui eram executadas num contexto de proximidade com as vizinhas. Em conjuntos habitacionais geralmente com pequenas habitações, muitas vezes sem um espaço de cozinha formal ou água corrente, os tanques de roupa dispostos em conjunto são uma visão comum.

Além da lavagem da roupa, o pátio prolongava a cozinha, permitindo trabalhos mais sujos ou os cozinhados mais difíceis de fazer em casa. Também era muitas vezes para o pátio que se traziam os arranjos de costura, para serem feitos à luz do sol que em alguns casos escasseava dentro de portas. As vizinhas juntavam-se, ensinavam-se novos pontos de bordado ou de croché. Por vezes, a sala de costura já se torna “loja” aberta ao público com clientela do bairro e até de fora. E surgem no pátio outras pequenas oficinas, de sapateiro, de arranjos vários, a par de um sem-número de lojas que nasciam ou se vinham alojar nestes pequenos espaços populares, e que, mais do que contar para a caracterização arquitetónica do espaço, se inscreveram antes de tudo no seu tecido humano15.

 

Figura 3

 

Nas recordações de alguns dos antigos moradores destes espaços, ficaram os serões passados em convívio com os vizinhos, hábito que, segundo os próprios, se perdeu nos anos mais recentes:

A minha avó fazia o jantar, o meu avô vinha da fábrica depois de trabalhar […], da Fábrica da Cortiça que havia ali na Calçada do Grilo, jantava, e depois de se arrumar a cozinha, vinha tudo para a janela! [...] Ainda tenho lá uma fotografia em que está a minha avó e várias pessoas à janela e da parte de fora estão as pessoas do pátio, que vinham para ali fazer sala, tudo a conversar. […] Tudo se cumprimentava, tudo se conhecia […]. Não havia televisão, não havia cafés, conversava-se mais […]16.

Além dos momentos de lazer quotidiano, também as grandes celebrações tinham lugar nestes conjuntos interiores das vilas e pátios operários. Era comum aqui se realizarem festas e em particular a celebração do dia de Santo António. Por toda a cidade se enfeitavam “tronos de Santo António”, numa competição em que participavam também as vilas da zona ribeirinha oriental.

 

Figura 4

 

 

Figura 5

 

Não será por acaso que se dedica um capítulo a estas festividades no livro Pátios de Lisboa: cidades entre muros, relatando a azáfama a que se entregam os moradores17. A mesma moradora recorda também estes dias de festa, cujos preparativos envolviam a comunidade no seu conjunto:

Nos Santos Populares isto aqui era uma festa. Aqui no pátio do Colégio, do 3 de Agosto, saltava-se à fogueira, enfeitava--se tudo com bucho, com folhas de palmeira […] As raparigas faziam bandeirinhas, iam comprar balões, enfeitava-se, e depois fazia-se o bailarico!

Atualmente, o cenário dos pátios interiores dos conjuntos de habitação operária tem vindo a transformar-se. Em muitos locais a vivência comunitária parece ter perdido expressão e os elementos visíveis da fruição deste espaço alteraram-se igualmente. Em muitos casos, os automóveis invadiram o pátio interior, transformado agora quase exclusivamente em parque de estacionamento privativo dos moradores. Identifica-se, não obstante, a criação de espaços de lazer vocacionados para as crianças − parques infantis − nos mesmos locais onde anteriormente estas brincavam sozinhas. Infelizmente, esta não é uma visão comum na região.

 

Figura 6 e 7

 

O evidente abandono dos tanques de lavagem da roupa testemunha a sua substituição pelos eletrodomésticos, fruto de uma (desejável) melhoria das condições económicas dos moradores, registando-se o surgimento de novas formas de sociabilização que passam a enquadrar a nova realidade deste pátio interior.

Saindo já do núcleo interior dos conjuntos de habitação operária, outros foram os locais de sociabilidade que se identificaram em Marvila e Beato.

Reduto dos homens, as tabernas eram, para os habitantes e trabalhadores da zona ribeirinha oriental, o local preferencial de convívio nas horas de lazer. Norberto de Araújo, na sua passagem pela zona ribeirinha oriental, em 1939, assim falou do Beato, das suas tabernas e do seu papel no bulício da hora de almoço:

Tudo isto é popular, em formigueiro de agitação sem tumulto. Do lado do rio abre-se [...] uma fábrica […] e logo se vê uma enfiada de tavernas e casas de comida, frequentadas por operários − “messes” − que à hora do meio-dia eles preferem a quaisquer outras18.

Em Do antigo sítio de Xabregas, Mário Furtado, recordando estes velhos lugares de brigas e desacatos, mas também de descontração, preciosa depois das horas de trabalho, esclarece: “as tabernas estão para Xabregas como os cafés para o Chiado19” − ou não fosse a zona oriental o berço das companhias vinícolas que davam de beber a Lisboa.

Também Carlos Consiglieri falou sobre as tabernas da zona ribeirinha oriental, e sobre o seu papel no tecido social da região:

As tascas […] serviam para as práticas culturais que muita dessa gente trazia das terras da sua naturalidade. Foi dessa maneira que nasceram associações, muitas delas a funcionar em tabernas […]. Foi assim que surgiram as primeiras colectividades, os cofres do mutualismo ou os peditórios lutuosos. Muitas dessas iniciativas eram concebidas nas almoraçadas nas hortas e nos retiros […]20.

Nascidas por vezes nessas mesas, mas não só, muitas foram as coletividades nascidas em Marvila e no Beato ao longo das décadas, como a Sociedade Musical 3 de Agosto de 1885, ainda hoje responsável pela marcha popular de Marvila, ou a também velhinha Sociedade Musical União do Beato, fundada em 189621 e ainda existente. Na primeira destas, por exemplo, há testemunho da existência, pelo menos nos meados do século xx, de uma escola para associados, que procurava, desta forma, garantir melhores perspetivas de vida às novas gerações22.

De algumas dezenas de associações referidas, os entrevistados recordam sem dúvida as sociedades musicais, os grupos de teatro amador, mas ressaltaram igualmente a prática desportiva e em especial o papel dos clubes de futebol de bairro, como o Marvilense, fundido, a partir de 8 de agosto de 1946, com o Chelas Futebol Clube e o Grupo Desportivo “Os Fósforos”23, para criar o Clube Oriental de Lisboa, ainda hoje uma referência incontornável desta zona, e do desporto lisboeta.

Tanto na bibliografia como nas entrevistas efetuadas, são comuns as referências aos cinemas de bairro, nomeadamente à sala de cinema do Poço do Bispo (Cinema Popular, 1917-1990) e ao “cinema do Beato”, inaugurado em 1917 como Animatógrafo do Beato, tendo mais tarde mudado o nome para Cine Pátria, que se manteve em atividade, com interrupções, até à década de 1980 e, no auge da sua popularidade, chegou a ter 447 lugares24. Nestes locais, as matinés a preços baixos permitiam um acesso relativamente frequente a este tipo de entretenimento: “O cinema, sentados no chão, era muito barato. Ainda me lembro de, por 7 tostões e meio, estar sentado no chão a ver um filme”25.

 

Figura 8

 

Mas, de todos os divertimentos referidos, os bailes foram sem dúvida os locais de encontro e diversão mais marcantes na juventude dos entrevistados. O interesse por estes locais de convívio era tal que, segundo um morador de Marvila, era comum haver intercâmbio de bandas entre os diferentes bailes dos clubes e coletividades da região. Outros, falando de épocas em que viveram noutros locais da cidade de Lisboa, recordam deslocarem--se propositadamente à zona oriental para não perder os bailes do seu antigo pátio. Num quotidiano rodeado de algumas carências, os bailes são recordados como momentos especiais: “Ai […] [o meu preferido] era o baile […] o baile aqui no 3 de Agosto! Eu adorava dançar! [...] Havia matinés todos os domingos. Os rapazes todos engravatadinhos, de fatinho [...] Era a delícia! [...]"26 para os quais valiam a pena até alguns sacrifícios:

Às vezes andávamos a juntar […] juntávamos 8 tostões para poder comprar um bolo, mas não comprávamos um bolo para nós. Íamos para a Sociedade, começávamos a dançar e a certa altura diziam: “Damas ao bufete!” − estava lá uma pessoa da sala de baile com bolos − e quem tinha de pagar eramos nós. E as damas ficavam todas contentes com um bolo! [...]27.

Estes locais ficaram também nas memórias de dias marcantes, sendo recordados com um sorriso, pesem embora as dificuldades do passado: “no dia do meu casamento, a minha lua-de-mel foi a dançar no baile!”28.

 

Figura 9 e 10

 

Nos meses de junho, o baile tomava uma forma especial, nas já referidas festas dos Santos Populares, que, a partir de 1932, passaram a incluir o concurso de marchas dos bairros tradicionais da cidade, a que Marvila concorre desde 1952. Em tempos recordados com saudade, lembram-se as noites de Santos Populares em que a marcha de Marvila desfilava pelas ruas, com “toda a gente à janela”. Mais recentemente, também o Beato criou a sua própria marcha, e ambos os bairros participam no concurso até aos nossos dias29.

Longe das salas de baile ou dos ambientes fechados do cinema, outra presença de relevo no dia-a-dia dos moradores de Marvila e Beato foi sempre o rio Tejo, que até meados do século xx, banhava ainda algumas das fábricas e armazéns da região, que o usavam como preferencial via de transporte de mercadorias. Com a sucessiva expansão do porto, muitos foram os moradores desta região, que, além das fábricas e armazéns, encontraram trabalho nas docas desta zona oriental.

Entre 1938 e finais da década de 1950 funcionou, não muito longe de Marvila, o primeiro aeroporto comercial português, o aeroporto marítimo de Cabo Ruivo. O hidroavião ficou na memória de alguns dos entrevistados, que ainda hoje recordam nomes de companhias de aviação americanas que faziam parte do seu quotidiano, avistadas a partir das janelas dos pátios de Marvila.

Mas até à grande campanha de obras do porto de Lisboa que criou a doca do Poço do Bispo, Marvila e Beato iam “desaguar” ao rio a que chamavam mar, num cenário aparentemente intocado pela poluição que se verifica hoje em dia. Recorda uma moradora: “aquela zona não tinha trânsito, […] não havia nem muralhas, nem docas, era só o rio […]”30.

Nos meses de calor, este espaço ribeirinho fazia parte do dia-a-dia de brincadeiras das crianças da região, em especial dos rapazes: “No verão íamos para a praia do Poço do Bispo. Aquilo era uma praia com areia e com tudo! A gente estava dentro de água, com água pelo peito, e via-se os pés!”31. Ou, numa recordação em registo mais poético, escrita por um antigo morador:

A gente chamava-lhe praia

e o rio chamava-se mar

nadar nadava-se à cão

fora aquilo que se chamava

quando o polícia vilão

levava a roupa prá esquadra.

Na nossa imaginação

era ainda melhor ca Cruz Quebrada32.

Tal era então a proximidade com o rio Tejo que as famílias da região iam à praia do Poço do Bispo “molhar os pés” ou simplesmente passear, depois de um dia de trabalho: “saíamos da fábrica e íamos, pela fresquinha, levávamos os miúdos e dávamos uma voltinha pela praia”33, ou frequentavam a popularmente chamada “praia da Marabana”, junto a Xabregas. Mas não só durante o dia. Segundo Mário Furtado, era um hábito comum, durante os meses estivais, as famílias saírem das suas casas e passarem os serões nessa praia, procurando amenizar o calor da cidade neste espaço junto ao rio34.

Hoje em dia, depois dos vários aterros e após a construção da avenida Infante D. Henrique, o Tejo foi ficando mais e mais longe das pessoas. Como escreveu Alice Vieira no seu livro Esta Lisboa: “e as águas ficam lá tão longe que parece história de outro mundo, elas terem chegado até aqui dentro do Beato”35.

 

Figura 11

 

Para lá da pesca desportiva e da náutica de recreio, que já conheceu alguma expressão local36, o contacto destas populações com o rio parece quase cingir-se agora aos momentos de cheia, em que o Tejo inunda as ruas mais baixas da zona ribeirinha oriental, recordando décadas passadas, em que o deficiente escoamento das águas pluviais provocava danos muito avultados nesta zona da cidade.

Em freguesias que ainda hoje não perderam totalmente a sua feição rural, com algumas quintas na região que continuaram a funcionar muito depois da chegada das fábricas, era comum os habitantes terem também a sua própria horta ou pelo menos um pequeno quintal. Aqui se passava o tempo, depois do trabalho, relembrando os costumes das suas origens, e mais importante, ajudando também a equilibrar a economia familiar: “as casas aqui à volta tinham uns quintaizinhos, e as pessoas cultivavam umas couves, umas alfaces. Na quinta marquês de Abrantes toda a gente tinha um quintal. Ao domingo, quando não trabalhavam, granjeavam os quintais”37. A paisagem rural da região era também o cenário preferido para celebrações como a do dia da Espiga, em concorridos piqueniques “debaixo das oliveiras”.

Este interesse pelas hortas e quintais é ainda consentâneo com a ligação ao mundo rural de boa parte da antiga força de trabalho. Não se esqueça que, em 1881, os operários não se apresentavam ao trabalho na fábrica (de algodões) da Samaritana nas épocas de colheita agrícola38.

 

OS LUGARES DE REFERÊNCIA DE UM DIA-A-DIA DIFÍCIL

Além dos espaços de lazer, muitos outros locais são referidos como pontos de sociabilidade desta zona ribeirinha oriental, nomeadamente sítios ligados a gestos quotidianos da população, muitas vezes imprescindíveis para a sua sobrevivência.

Inseridos numa lógica de providenciar a higiene dos mais carenciados, surgiram os lavadouros públicos. A par dos já referidos tanques nos pátios interiores, permitiam cumprir uma componente importante dos trabalhos domésticos, e constituíam também um espaço de sociabilização das mulheres destes bairros. Ainda hoje é possível identificar, em ambas as freguesias, os locais dos antigos lavadouros municipais que estiveram ao serviço da população durante décadas. Dos três locais identificados (rua Direita de Marvila, rua de Xabregas e rua Gualdim Pais), apenas o lavadouro da rua Gualdim Pais ainda se encontra em funcionamento, após obras de requalificação.

Hoje em dia talvez um pouco afastados do quotidiano, mas sempre relembrados, como aqui, pelo beatense Mário Furtado: “O rectangular e alpendrado lavadouro público, que se animava de um mulherio irrequieto e palrador, abanando as ancas ao ritmo da esfregação […]. O tanque, mais do que qualquer outro lugar, era o areópago das trivialidades bairristas39.”

 

Figura 12

 

Parte da mesma lógica de prover o quotidiano foram os fontanários municipais. Numa cidade em que a escassez de água sempre se fez sentir, esta tornava-se essencial num espaço em que a maioria das casas não tinha ligação à rede pública de água. Nas conversas mantidas com os habitantes da região, foram frequentes as referências a estes locais, em primeiro lugar como parte importante das tarefas diárias, mas também com uma segunda vertente, de local de sociabilidade, em que as raparigas trocavam segredos ou os namoros começavam:

Era uma alegria! A gente fazia uma malandrice, para estarmos na paródia […] Chegávamos ao meio da estrada e catrapumba, água p'ró chão, para podermos voltar para trás! [...] A minha mãe às vezes perguntava-me: “demoraste tanto tempo para ir buscar um caneco de água?” […] e eu dizia: “estava uma bicha tão grande, estive lá que tempos à espera! [...]” 40.

O autor local Mário Furtado, no já referido livro Do antigo sítio de Xabregas, recorda igualmente o “colorido” deste [pesado] gesto quotidiano:

Era um vaivém de povoléu, homens, mulheres e até cachopinhas, de vasilha na mão, aguardando vez. E por entre ditos, mexericos, brejeirices, […] lá se ia abastecendo. Depois abalavam derreados, eles de barril ou bilha ao ombro, elas de lata na mão ou à cabeça apoiada numa rodilha. Era assim todo o santo dia, nesta faina, percorrendo sempre o mesmo caminho, calcorreando sempre as mesmas pedras, enquanto os homens, mais adiante, formando magotes, de mãos nos bolsos, se entregavam a estéreis discussões sobre os golos do clube do bairro41.

Atualmente, a grande maioria dos fontanários recordados ainda existem fisicamente, na rua Direita de Marvila, à entrada da Vila Dias ou no pequeno largo no início da rua de Xabregas. As pedras e o tanques estão lá, mas na maioria das vezes a água já não corre nestas antigas bicas, que se juntam assim à restante desolação que as envolve, sem que nenhuma solução tenha sido encontrada para as reintegrar, ou como se escreveu sobre o chafariz do largo de Xabregas: “ainda lá o surpreendemos desativado, como um cadáver adiado à espera de sepultura”42.

 

 

 

Figura 14

 

Nas imediações de um destes velhos fontanários, encontramos outra memória recorrente dos habitantes da região: a popularmente chamada “Sopa do Sidónio”. No número 13 da rua Direita de Marvila, existiu, desde 191843, uma delegação da Sopa de Assistência 5 de Dezembro, criada pelo governo de Sidónio Pais com o intuito de combater a fome entre os mais pobres. Nas memórias, ficou a sopa/refeição distribuída diariamente neste local, juntamente com o pão − ¼ por pessoa44 − que eram entregues a cada um consoante a composição do seu agregado familiar. Recorda um octogenário nascido num pátio de Marvila: “A maior parte das pessoas, quando eram 10 horas, ia para ali com uma panela na mão. Matou aqui a fome a muita gente. Havia todos os dias, aos domingos e tudo!”. No Natal, a Sopa de Assistência oferecia uma refeição quente: “estávamos à espera do Natal para comer galinha!”45.

Também no Beato, no n.º 44 da rua de Xabregas, junto à Fábrica de Tabacos, se conhece a existência, desde 1896, de uma Cozinha Económica, a quarta unidade a ser criada na cidade de Lisboa por esta obra de assistência fundada em 1893 pela duquesa de Palmela. Durante o governo de Sidónio Pais instalou-se no Beato a Sopa de Assistência 5 de Dezembro, já de iniciativa estatal, inaugurada pelo próprio chefe de Estado em julho de 191846.

 

Figura 15

 

Outra instituição referida pelos habitantes dos pátios da região, mais concretamente as mulheres, é o Lactário outrora existente na alameda do Beato. Criado pela instituição de beneficência Associação Protectora da Primeira Infância47, com sede na vizinha Santa Apolónia, esse pequeníssimo edifício terá aberto ao público em 192948. Para as famílias de Marvila e Beato, este posto constituiu um apoio determinante para garantir não só um crescimento mais saudável para os seus filhos, como também uma ajuda na sua própria alimentação, muitas vezes deficitária:

No Beato […] havia ali um lactário… uma casinha pequenina […] tinha uma imagenzinha qualquer. […] Era onde a gente levava os meninos ao peso. […] Tínhamos uns cestinhos de arame, trazíamos 5 garrafinhas, daquelas pequeninas de metade de meio litro. Era 1 litro de leite por dia, e pagava naquela altura 7$00, ou 7$50 por semana. O médico para o menino era ali também, dentro da casinha, e a gente ia lá todos os meses com o menino ao peso, a ver aquilo que ele medrava. […] E eu fiquei a trazer o leitinho para casa, mas não era para o meu menino, era para mim, porque o meu menino tinha peitinho. Mas, graças a Deus, vinha aquele leitinho […]49

 

Figura 16

 

 

Figura 17

 

O lactário da alameda do Beato está hoje em dia desativado e já sem nenhum elemento que o identifique, desaparecidos os painéis de azulejo que ainda recentemente aí eram visíveis. O pequeno edifício encontra-se atualmente em estado de abandono, nesta pequena rua que, em princípios do século xx, chegou a ser um afamado passeio público, com “o Tejo desafogado que se desdobrava longamente, em ondulações azuladas que vinham quebrar-se suavemente contra o areal da grande praia […]”50.

É também dos anos de 1920, mais concretamente de 1928, a inauguração da linha de elétrico que, com início no Rossio, terminava no Poço do Bispo51, e que nos anos 50 chegou a ligar toda a zona ribeirinha de Lisboa, de Xabregas a Belém52. Esta linha transportou durante décadas os habitantes da região (que referem ainda a rua do Açúcar como “a rua do elétrico”), assim como os operários das indústrias da zona ribeirinha oriental, tendo sido criado, a partir de 1935, um bilhete diário de ida e volta com tarifa mais baixa, o “bilhete operário”, que permitia alguma redução nas despesas quotidianas destes trabalhadores53.

 

Figura 18

 

Em síntese, estas são algumas das memórias que fizeram o dia-a-dia desta região em boa parte do século xx. Nos testemunhos, no entanto, marca-se claramente um antes e um depois: passa-se dos tempos mais difíceis, mas também animados, de gente que sabia viver os momentos de lazer com algum alento, para a realidade das últimas décadas, em que as referências constantes são as fábricas que encerraram, os comerciantes que desapareceram: “começaram a fechar as portas todas”54. Sem trabalho, muitos antigos bairros operários deixaram de ter razão de ser − quem aqui vivia partiu. E parece não haver razões nem condições para a fixação de novos moradores nos núcleos mais antigos da região.

Quando questionados sobre o que gostariam de ver manter na velha paisagem da sua zona ribeirinha oriental, mais do que os edifícios das velhas fábricas, ou a menção ao rico património histórico das antigas quintas e conventos, as memórias evocadas pelos moradores vão, na sua maioria, para o (rico) tecido humano que se perdeu:

Tenho saudades de chegar à janela e ver as mulheres a correr para a fábrica dos discos [de cortiça], para o Abel [Pereira da Fonseca], para a Fábrica dos Fósforos, para a Borracha, p'rá Tabaqueira: “Ui […] anda depressa!‘Tá quase na hora! [...]”. A vida dantes era muito amarga mas muito alegre. Havia alegria nos bairros. Éramos uma família, tínhamos alegria. Agora não se vê ninguém. É tudo velho55.

Chegamos ao fim deste pequeno percurso pelas memórias de Marvila e Beato, freguesias ribeirinhas de Lisboa. Procurámos neste trabalho descobrir um pouco do que se desenhou além do construído: as histórias e formas de viver daqueles que habitaram os pátios e vilas desta região, tendo como horizonte um futuro que, esperamos, passe pela reabilitação e revivificação destes espaços, que Lisboa parece agora querer redescobrir.

 

 

 

 

Com a reabilitação, procura-se antes de mais garantir uma “atualização” do espaço urbano, preparando-o para as novas exigências e modos de vida, não podendo, no entanto, esquecer-se que os núcleos antigos não se fazem apenas de edificado. Tal como os arquitetos e os engenheiros se ocupam em conhecer as técnicas e materiais dos antigos edifícios, por forma a mais eficazmente os fundirem com os mais recentes, criando um corpo mais sólido, também nos compete, na cidade, garantir que se conheça a sua história e o tecido social que lhe serviu de base, sob pena de lhe impor novas realidades desajustadas, e uma irremediável desagregação. Planear a reabilitação urbana de núcleos antigos só fará sentido se acompanhado de um estudo aprofundado daquilo que justamente diferencia estes aglomerados: o seu percurso histórico, e antes de mais, os seus habitantes. A história da cidade não se faz sem as pessoas, sem a presença das quais o espaço urbano definha. Só conhecendo os atores locais, que dominam o espaço por vezes há gerações, se poderá conhecer as velhas centralidades ou os referentes escondidos no edificado, entendendo assim a forma como estes se compõem, sempre decorrente do modo como foi vivido. Não que o futuro tenha de imitar forçosamente o passado. Conhecer a história não significa viver cristalizado nela, mas esta deverá ser o ponto de partida, ou não se conhecerá o material original que se pretende trabalhar.

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FONTES

 

Câmara Municipal de Lisboa/Centro de documentação

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Joshua Benoliel, O presidente Sidónio Pais, visita o asilo Dona Maria Pia onde está instalada a sopa dos pobres. 8 de Julho de 1918. PT/AMLSB/JBN/001727.

Vasco Gouveia de Figueiredo, Lavadouro, década de 1960. PT/AMLSB/VGF/S01565.

Vasco Gouveia de Figueiredo, Casa degradada, 1967. PT/AMLSB/VGF/S00860.

Vasco Gouveia de Figueiredo, Rua Direita de Marvila, 1967. PT/AMLSB/VGF/S00863.

Vasco Gouveia de Figueiredo, Cinema Popular, 1972. PT/AMLSB/VGF/S02045.

 

Fontes orais

Informações de vários moradores. Lisboa, 2010/2013.

Testemunho de Fernando Nabais, Lisboa, 16/06/2011.

Testemunho de Maria Isilda Pereira Dias, Lisboa, 20/05/2011.

Testemunho de América Cardoso Nabais, Lisboa, 17/06/2011.

Testemunho de Maria Augusta Carrajola, Lisboa, Lisboa, 17/06/2011.

 

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Submissão/submission: 29/01/2016

Aceitação/approval: 16/06/2016

 

 

NOTAS

* Maria Margarida de Almeida Reis e Silva é doutoranda em História, Programa Interuniversitário de Doutoramento (PIUDHist): Instituto de Ciências Sociais e Faculdade de Letras Universidade de Lisboa, Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL), Universidade Católica Portuguesa (UCP) e Universidade de Évora (2015-). Pós-graduada em História Medieval pela Universidade Nova de Lisboa (UNL), em 2015. Mestre em História Moderna e Contemporânea, especialidade Cidades e Património: ISCTE-IUL (2013). Licenciada em Comunicação Cultural: UCP (1999). 1999 – Fez o estágio de licenciatura no Museu de Lisboa. Desde 2010 participa em projetos de investigação: ISCTE-IUL, FCSH/UNL, IGOT/UL, entre outros. Entre 2005-2007 fez o levantamento do estado de conservação dos edifícios da Baixa-Chiado, para elaboração do documento estratégico. Correio eletrónico: mreisesilva@gmail.com

1 Este artigo constitui uma parte da dissertação de mestrado, com o título Pátios e vilas da zona ribeirinha Oriental: materialidade, memória e recuperação urbana [Em linha]. Lisboa: [s.n.], 2013. Dissertação de mestrado em História Moderna e Contemporânea, apresentada ao Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa. [Consult. 10.01.2006]. Disponível em: https://repositorio.iscte-iul.pt/handle/10071/6967?mode=simple.

2 A designação Xabregas, utilizada para parte da zona ribeirinha oriental, compreende áreas da atual freguesia do Beato. Os principais marcos cronológicos das freguesias em estudo serão os seguintes: em 1379 foi criada a grande freguesia limítrofe de Santa Maria dos Olivais (concelho entre 1852 e 1886) que compreendia os atuais territórios de Marvila e Beato. A freguesia do Beato autonomizou-se legalmente em 1770 (com algumas alterações de “fronteiras” até aos nossos dias) e Marvila (apesar de existir como topónimo lisboeta pelo menos desde o século XII) nasceu como freguesia apenas em 1959.

3 LAINS, Pedro; SILVA, Álvaro Ferreira da, org. - O século XX. In História económica de Portugal: 1700-2000. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2005. vol. 3.

4 MATOS, José Sarmento de - Prólogo. In FOLGADO, Deolinda; CUSTÓDIO, Jorge - Caminho do oriente: guia do património industrial. Lisboa: Livros Horizonte, 1999. p. 5.

5 Informações de vários moradores, Lisboa, 2010/2013. Também DELGADO, Ralph - A antiga freguesia dos Olivais. Lisboa: Câmara Municipal, 1969. p. 18.

6 Leiam-se igualmente as conclusões da Divisão de Reabilitação Urbana dos Pátios e Vilas (DRUPV), constantes do seu Plano de pormenor e salvaguarda para pátios e vilas: “normalmente, a população residente [...] circunscreve-se às relações de vizinhança no estabelecimento de redes de sociabilidade e no combate ao isolamento urbano, cujo cenário é de forte investimento afetivo, e onde o significativo índice de enraizamento local encontra a sua explicação no longo tempo de ocupação dos fogos, nos laços de parentesco originais e nos que ali se estabeleceram, bem como a similitude das origens sociais, factores estes que conferem um carácter único à vivência humana que se estabelece nos Pátios e Vilas” – Câmara Municipal de Lisboa (CML), Centro de Documentação, Espólio da DRUPV - Plano de pormenor de salvaguarda para pátios e vilas: regulamento. Lisboa: DRUPV, 1993. vol. 3, p. 1-2. Atender também a informações de vários moradores. Lisboa, 2010/2013.

7 Testemunho de Fernando Nabais, Lisboa, 16/06/2011. Ver também LEITE, Cristina; VILHENA, João Francisco - Pátios de Lisboa: cidades entre muros. Lisboa: Gradiva, 1991. p. 114-115 ou CML, Centro de Documentação, Espólio da DRUPV. - Plano de pormenor de salvaguarda para pátios e vilas: estudos sectoriais. Lisboa: DRUPV, 1993. vol. 1, p. 37-38.

8 Testemunho de Maria Isilda Pereira Dias, Lisboa, 20/05/2011.

9 Testemunho de América Cardoso Nabais, Lisboa, 17/06/2011.

10 Testemunho de Maria Isilda Pereira Dias, Lisboa, 20/08/2011.

11 Testemunho de Fernando Nabais, Lisboa, 16/06/2011.

12 RODRIGUES, Maria João Madeira - Tradição, transição e mudança: a produção do espaço urbano na Lisboa oitocentista. Lisboa: Assembleia Municipal, 1979. Separata, p. 47.

13 LEITE, Cristina; VILHENA, João Francisco - Pátios de Lisboa: cidades entre muros. Lisboa: Gradiva Publicações, 1991. p. 105-106.

14 FURTADO, Mário - Do antigo sítio de Xabregas. Lisboa: Vega, 1997. p. 121.

15 Sobre os diferentes usos funcionais dos pátios de Lisboa em 1992/93, a DRUPV promoveu um levantamento exaustivo no âmbito da sua atividade. Ver CML, Centro de Documentação, Espólio da DRUPV - Plano de pormenor de salvaguarda para pátios e vilas: estudos sectoriais. Lisboa: DRUPV, 1993. vol. 1, p. 77-86. Atender também a informações de vários moradores, Lisboa, 2010/2013.

16 Testemunho de Maria Augusta Carrajola, Lisboa, 17/06/2011.

17 LEITE, Cristina; VILHENA, João Francisco - Pátios de Lisboa: cidades entre muros. Lisboa: Gradiva Publicações, 1991. p. 119.

18 ARAÚJO, Norberto - Peregrinações em Lisboa. 2.ª ed. Lisboa: Vega, 1993. vol. XV, p. 55.

19 FURTADO, Mário - Do antigo sítio de Xabregas. Lisboa: Vega, 1997. p. 125.

20 CONSIGLIERI, Carlos; ABEL, Marília - O formoso sítio de Marvila. Lisboa: Junta de Freguesia de Marvila, 2004. p. 39.

21 CONSIGLIERI, Carlos… [et al.] - Pelas freguesias de Lisboa: São João, Beato, Marvila, Santa Maria dos Olivais. Lisboa: Câmara Municipal, 1993. p. 21.

22 Testemunho de Fernando Nabais, Lisboa, 16/06/2011. Carlos Consiglieri encontrou referências a esta escola desde finais do século XIX. CONSIGLIERI, Carlos; ABEL, Marília - O formoso sítio de Marvila. Lisboa: Junta de Freguesia de Marvila, 2004. p. 34. De referir também a existência de uma escola na quinta das Pintoras, cujo proprietário, o suíço Henry Chatelanat, criara aulas gratuitas para as crianças da região - Testemunho de América Cardoso Nabais, Lisboa, 17/06/2011.

23 Originalmente “Grupo Desportivo do Pessoal da Companhia dos Fósforos”, na Companhia Portuguesa de Fósforos, grande empregadora da região, existiu o grupo desportivo na década de 1930, entre outras estruturas para os empregados, tais como balneário, refeitório, creche, cooperativa e um serviço médico: FOLGADO, Deolinda; CUSTÓDIO, Jorge - Caminho do oriente: guia do património industrial. Lisboa: Livros Horizonte, 1999. p. 145-147.

24 FERREIRA, Paula Cristina; SANCHEZ, Paula; FIGUEIREDO, Sandra - A freguesia do Beato na história. Lisboa: Junta de Freguesia do Beato, 1995; CONSIGLIERI, Carlos… [et al.] - Pelas freguesias de Lisboa: São João, Beato, Marvila, Santa Maria dos Olivais. Lisboa: Câmara Municipal, 1993. p. 78.

25 Testemunho de Fernando Nabais, Lisboa, 16/06/2011.

26 Testemunho de Maria Augusta Carrajola, Lisboa, 17/06/2011.

27 Testemunho de Fernando Nabais, Lisboa, 16/06/2011.

28 Testemunho de América Cardoso Nabais, Lisboa, 17/06/2011.

29 É fácil encontrar, nas letras das marchas de ambos os bairros, as marcas do seu passado industrial. Leiam-se as estrofes de uma das marchas tradicionais de Marvila: “Marvila tem gosto e garbo […] / Tem até sabão / Para ensaboar / O juízo a alguém”, ou, já em 2012: “Com pés negros de, carvão / Com as mãos brancas, de sal / Do trabalho se, faz pão / E assim se, faz a, capital”. Já o Beato, estreou-se em 2003 com a marcha “Os algodões”.

30 Testemunho de Maria Augusta Carrajola, Lisboa, 17/06/2011.

31 Testemunho de Fernando Nabais, Lisboa, Lisboa, 16/06/2011.

32 PINHÃO, Carlos - Fantasia lisboeta. Amadora: NAOrion, [19--]. p. 10. Carlos Pinhão, jornalista desportivo e escritor recordou, neste livrinho de poemas sobre Lisboa, este trecho da sua infância no Beato.

33 Testemunho de América Cardoso Nabais, Lisboa, 17/06/2011.

34 FURTADO, Mário - Do antigo sítio de Xabregas. Lisboa: Vega, 1997. p. 145.

35 VIEIRA, Alice; FERREIRA, António Pedro - Esta Lisboa. Lisboa: Editorial Caminho, 1993. p. 126.

36 O Clube Oriental de Lisboa teve durante décadas uma secção de Vela, que terá chegado a formar atletas olímpicos. De momento essa secção do clube encontra-se inativa.

37 Testemunho de Fernando Nabais, Lisboa, Lisboa, 16/06/2011.

38 “A fabrica luta com falta de operarios habilitados, embora haja sempre um movimento de operarios fluctuante que apparecem e desapparecem em epochas determinadas, por exemplo no tempo da castanha e da melancia”. Ver Inquérito industrial 1881: inquérito direto: visita às fábricas. Lisboa: Imprensa Nacional, 1881. 2º parte, p. 120.

39 FURTADO, Mário - Do antigo sítio de Xabregas. Lisboa: Vega, 1997. p. 112.

40 Testemunho de América Cardoso Nabais, Lisboa, 17/06/2011.

41 FURTADO, Mário - Do antigo sítio de Xabregas. Lisboa: Vega, 1997. p. 111-112.

42 FURTADO, Mário - Do antigo sítio de Xabregas. Lisboa: Vega, 1997. p. 111.

43 CONSIGLIERI, Carlos; ABEL, Marília - O formoso sítio de Marvila. Lisboa: Junta de Freguesia de Marvila, 2004. p. 35.

44 Testemunho de América Cardoso Nabais, Lisboa, 17/06/2011 e outros. A Sopa de Assistência 5 de Dezembro terá encerrado em Marvila nos anos de 1980. A partir da década de 60 já só manteria a distribuição de pão.

45 Testemunho de América Cardoso Nabais, Lisboa, 17/06/2011.

46 A assistência de 5 de Dezembro, Ilustração portuguesa. Lisboa: [s.n.]. N.º 646 (8 de Julho de 1918), p. 26 e CONSIGLIERI, Carlos; ABEL, Marília - O formoso sítio de Marvila. Lisboa: Junta de Freguesia de Marvila, 2004. p. 78.

47 Obra fundada em 1901. MATOS, José Sarmento de; PAULO, Jorge Ferreira - Caminho do oriente: guia histórico. Lisboa: Livros Horizonte, 1999. vol. I, p. 31.

48 CONSIGLIERI, Carlos… [et al.] - Pelas freguesias de Lisboa: São João, Beato, Marvila, Santa Maria dos Olivais. Lisboa: Câmara Municipal, 1993. p. 20. Não obstante, terá pelo menos sofrido uma reconstrução na segunda metade do século XX, da qual há o registo fotográfico do Arquivo Municipal de Lisboa, certamente posterior a 1929.

49 Testemunho de Maria Isilda Pereira Dias, Lisboa, 20/05/2011.

50 VIDAL, Angelina - Lisboa antiga e Lisboa moderna. 2.ª ed. Lisboa: Vega, 1994. p. 265. O interior do fronteiro do convento do Beato, depois fábrica Nacional, foi reabilitado e atualmente é palco de vários eventos, sem que essa nova rendibilização e fruição do espaço transpareça para o exterior, que se mantém em degradação e abandono.

51 CONSIGLIERI, Carlos… [et al.] - Pelas freguesias de Lisboa: São João, Beato, Marvila, Santa Maria dos Olivais. Lisboa: Câmara Municipal, 1993. p. 19.

52 CONSIGLIERI, Carlos; ABEL, Marília - O formoso sítio de Marvila. Lisboa: Junta de Freguesia de Marvila, 2004. p. 35.

53 CONSIGLIERI, Carlos… [et al.] - Pelas freguesias de Lisboa: São João, Beato, Marvila, Santa Maria dos Olivais. Lisboa: Câmara Municipal, 1993. p. 109.

54 Testemunho de Maria Isilda Pereira Dias, Lisboa, 20/05/2011.

55 Testemunho de América Cardoso Nabais, Lisboa, 17/06/2011. Década de 1940 em Portugal, determinada pelo ambiente político e ideológico então dominante no país.

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