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Cadernos do Arquivo Municipal

versão On-line ISSN 2183-3176

Cadernos do Arquivo Municipal vol.ser2 no.5 Lisboa jun. 2016

 

ARTIGO

A “Herdade de São Roque” do Convento da Trindade de Lisboa.

A sua origem e urbanização em 1554-1555 integrada no Bairro Alto e análise de um dos seus lotes, o do Palácio dos Condes de Tomar antiga Hemeroteca Municipal

The Herdade de São Roque (Saint Roch's estate) of the Lisbon Trinity Convent

Its origin and urbanization in 1554-1555 integrated the Bairro Alto and analysis of one of its lots, the Palace of the Counts of Tomar, the former municipal newspapers library

João Miguel Ferreira Antunes Simões *

Faculdade de Letras / Universidade de Lisboa. Museu de São Roque da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa; Portugal.

 

RESUMO

Inicialmente, a zona envolvente do Mosteiro da Trindade era um olival na franja urbana da cidade de Lisboa.
No século XIV, a muralha fernandina dividiu-o ficando uma parcela dentro de muros, a qual foi urbanizada nos inícios do século XVI, e uma exterior, denominada de “Herdade de São Roque”, urbanizada mais tarde, em meados do século. O loteamento e a urbanização decorreram de forma rápida e, pela análise das confrontações, foi possível identificar cada um dos lotes e os seus proprietários iniciais. Três destes lotes deram origem ao atual Palácio dos Condes de Tomar, imóvel que recebeu uma grande campanha artística no século XIX, visível na sua escadaria monumental, nos seus estuques interiores e na fachada ao gosto do Barroco italiano, mas preservou nas paredes interiores diversos vestígios da sua fase inicial, de meados do século XVI, e do processo de absorção dos lotes vizinhos.

 

PALAVRAS-CHAVE

Bairro Alto / Arquitetura / Palácio dos Condes de Tomar / Azulejos / Urbanismo

 

ABSTRACT

Initially, the area around the Trinity Monastery was an olive grove in the urban fringe of Lisbon. In the fourteenth century, the Fernandine Wall divided it getting a portion inside walls, which was urbanized in the early sixteenth century, and a portion outside, called Herdade de São Roque (Saint Roch's estate) urbanized much later, by the mid-century. The subdivision and urbanization took place quickly and, by analyzing the confrontation, it was possible to identify each lot and its original owners. Three of these lots have given rise to the current Palace of the Counts of Tomar, property that has received a great artistic campaign in the nineteenth century, visible in its monumental staircase, in its interior stucco works, and in the facade of Italian Baroque taste, but preserved in the interior walls several traces of its initial phase, of the mid-sixteenth century, and of the neighbouring parcels' absorption process.

 

KEYWORDS

Bairro Alto / Architecture / Palace of the Counts of Tomar / Azulejos / Urbanism

 

 

Uma parcela do Bairro Alto, composta por dois quarteirões, a que se chamou nos séculos XVI a XVIII de “Herdade de São Roque”, encontra-se muito bem documentada no arquivo do Convento da Santíssima Trindade de Lisboa (IAN/TT). Coube a Gustavo Matos Sequeira1 e a Hélder Carita2 o trabalho pioneiro de descobrir a importância deste fundo para o entendimento urbano deste bairro emblemático de Lisboa. Já antes, frei Jerónimo de São José (1789) havia vagamente falado neste passado urbano, referindo que a Casa Professa de São Roque havia sido parcialmente construída em terrenos vendidos pela Ordem da Santíssima Trindade à Companhia de Jesus3.

A conquista de Lisboa aos Mouros (1147) e, principalmente, o afastamento da linha de fronteira para sul com a conquista de Alcácer do Sal (1218), levou ao crescimento demográfico e económico da cidade. Consequentemente, as ordens religiosas emergentes na época foram atraídas para esta cidade em crescimento e instalaram-se em bolsas de terreno livres na periferia da cidade, com acesso às principais vias romanas. Foram assim fundados os mosteiros de São Francisco (1217), da Trindade (1218), de São Domingos (1242) e da Graça (1271), todos instalados na cintura peri-urbana da cidade, seguindo o anterior exemplo de São Vicente de Fora (1147).

A Ordem da Santíssima Trindade ou da Redenção dos Cativos foi fundada por S. João da Mata e S. Félix de Valois e confirmada pelo papa Inocêncio III em 11984. O seu principal objetivo era resgatar os cristãos presos na rede oriental de tráfico de escravos, associada aos muçulmanos, estando pois enquadrada no espírito do movimento da Cruzada contra o Islão. Chegaram a Portugal com os cruzados que auxiliavam as monarquias peninsulares na Reconquista, sendo o seu primeiro convento em Portugal o de Santarém, fundado por D. Sancho I em 1208.

Segundo nos conta o cronista da Ordem, a instalação em Lisboa em 1218 decorreu da comemoração da prodigiosa conquista de Alcácer do Sal feita nesse mesmo ano. D. Afonso II terá doado à ordem a Ermida de Santa Catarina, de quem era padroeiro, e o seu território envolvente que englobaria o atual Bairro Alto5. Esta informação, contudo, já não era possível de comprovar documentalmente no século XVIII, havendo apenas vagas referências a ela, citadas por documentos quinhentistas, entretanto desaparecidos.

Segundo outra tradição, parte das terras que o convento possuía na atual Trindade e Bairro Alto provinha de uma doação da rainha Santa Isabel6, ainda no século XIV, embora não tenhamos encontrado provas documentais a este respeito.

Finalmente, de acordo com outra tradição, parte do terreno da cerca onde foi construído o primitivo Convento da Trindade fora conseguido por uma doação de D.ª Brites Pereira, filha única do condestável D. Nuno Álvares Pereira e mulher de D. Afonso, conde de Barcelos e 1.º duque de Bragança, conforme se documentou junto da Câmara Municipal de Lisboa7. Sabemos pelo arquivo deste município que D. João I doou diversos bens imobiliários a D. Nuno Álvares Pereira, entre os quais os terrenos onde foi construído o Convento do Carmo8. É possível que uma parcela deste terreno tenha ficado na posse de D.ª Brites Pereira e sido doado, mais tarde, ao Convento da Trindade, mas a ter acontecido terá sido muito depois da fundação e edificação deste.

De qualquer forma, em 31 de dezembro de 1362, a cerca original foi acrescentada com a doação de um olival contíguo feita pelo mercador Francisco Domingues de Beja9, e, pouco depois, a 24 de março de 1363, com outra doação da sua esposa, Constança Esteves, que impôs a obrigação de doze missas cantadas10. Estas foram as mais antigas benemerências que o Convento da Trindade recebeu e registou no seu cartório com documentos coevos. No século XVIII, ainda chamavam a esta propriedade a “Herdade de São Roque” com total consciência de que era um olival que fora convertido em área urbana11 embora a associação ao orago do santo seja tardia, do século XVI.

Lisboa tornou-se no século XIII e XIV numa cidade dominada por uma burguesia alargada e ativa que incluía mercadores, cambistas, artesãos e profissionais das mais variadas áreas trabalhando por conta própria e com loja aberta. Os topónimos dos vários arruamentos, principalmente do arrabalde de Santa Justa e Santa Rufina, denunciam bem o caráter laborioso e ativo da cidade.

Esta burguesia tinha um espectro social muito alargado, indo desde uma “classe média-alta” composta por ricos mercadores até uma “classe média-baixa” liberal fornecedora de produtos manufaturados e serviços, a chamada arraia-miúda. Para exercer a sua atividade e preservar os seus bens, esta classe necessitava de paz e estabilidade política e, por isso, os arrabaldes onde residia foram considerados desprotegidos e facilmente alvo de pilhagem em caso de assédio castelhano. Este era previsível tendo em conta os maus resultados das campanhas fernandinas na Galiza (1369-1370 e 1372-1373).

Por esta razão, entre 1373 e 1375, D. Fernando mandou cercar a cidade de Lisboa12 num perímetro maior que o tecido urbano existente. Foram incluídos dentro da muralha não só todos os arrabaldes que haviam nascido fora da cerca velha (Mouraria, Judiaria Grande, Santa Justa e Santa Rufina e São Vicente de Fora) mas também os cinco mosteiros peri-urbanos (São Francisco, Trindade, São Domingos, Graça e São Vicente de Fora) e parte substancial das suas cercas que ficaram estrategicamente dentro de muros como reserva agrícola e zona de crescimento urbano futuro. A rapidez com que a cidade foi amuralhada leva a crer que este processo foi financiado pela burguesia lisboeta sob a forma de imposto, contribuição voluntária ou empréstimo à Coroa.

As terras do Convento da Trindade ficaram divididas em dois setores, um intramuros, a que se chamou, mais tarde, de “Vila Nova do Olival” e outra extramuros, a que se chamou “Herdade de São Roque”.

Graças a um precioso manuscrito guardado no Arquivo da Câmara Municipal de Lisboa, o Tombo das propriedades foreiras à Câmara desta mui nobre e sempre leal cidade de Lixboa13sabemos que a propriedade da muralha e dos terrenos extramuros que lhe estavam imediatamente adjacentes, nomeadamente aqueles entre a muralha fernandina e uma segunda linha de defesa, a barbacã, passaram a pertencer à Câmara Municipal de Lisboa.
Este documento é datável de c. 1580, mas por vezes transcreve as confrontações de escrituras anteriores, misturando as referências geográficas das duas épocas distintas, o que lhe acresce valor documental. Por ele sabemos que, após a construção da muralha e já no século XVI, os terrenos que separavam as duas parcelas do terreno da Trindade foram aforados ao conde da Vidigueira que aí instalou um pomar de serviço ao seu palácio, o qual foi construído nas casas intramuros que pertenciam à Trindade, através da aquisição consecutiva de vários lotes de casas unifamiliares.

Este setor intramuros foi urbanizado na sequência do alvará de 26 de dezembro de 1500, em que o rei D. Manuel mandou arrancar as oliveiras e urbanizar os terrenos ocupados por olival e que estavam dentro do perímetro da muralha fernandina14. O Convento da Trindade procedeu, logo em 1502, à urbanização das terras que lhe pertenciam15, chamando ao local “Vila do Olival” ou “Vila Nova da Oliveira”. Guarda-se no seu cartório as escrituras de aforamento dos lotes de terreno com as cláusulas que obrigavam o enfiteuta16, a construir uma morada de casas com sobrado (piso térreo e superior). O processo decorreu até meados do século XVI, tendo o convento permanecido como o “directo senhorio” dos terrenos, cobrando o foro (renda devida pelo usufruto da terra) aos diversos enfiteutas que se sucediam, muitas vezes por incapacidade de construir a morada de casas a que estavam obrigados.

O setor extramuros que confrontava a norte, a sul e a poente com herdades da Sé Catedral de Lisboa, foi urbanizado muito mais tarde, permanecendo até meados do século XVI como herdade ligada ao cultivo do azeite. Nas confrontações dos limites deste terreno, incluídas numa escritura celebrada em 3 de novembro de 1573 entre o Cabido da Sé de Lisboa e o Convento da Trindade17, refere-se que as terras da Trindade, na sua vertente ocidental, ficavam a oito metros da Rua da Atalaia e incluíam totalmente a norte a rua que tinha no seu enfiamento a Torre do Relógio de São Roque (atual Rua do Grémio Lusitano) e a sul a rua que tinha no seu enfiamento a torre grande de Álvaro Pais (atual Travessa da Queimada) (Figura 1).

 

 

Como propriedade agrícola ainda ligada à produção de azeite, este terreno foi aforado a João Airas, por três vidas, a 15 de dezembro de 142918. Posteriormente, foi aforado a Álvaro de Queirós e por fim a Bartolomeu de Andrade19. Em 9 de julho de 1554, o aforamento agrícola desta herdade foi anulado, compensando-se Beatriz de Andrade, sucessora no aforamento de Bartolomeu de Andrade, com o objetivo de se proceder à sua urbanização20.

A escritura de anulação do aforamento pôs termo a uma longa quezília que afetava os enfiteutas e o Convento da Trindade. A comunidade monástica queria recuperar a propriedade da herdade antes do término do contrato para proceder ao loteamento e urbanização do terreno, esperando assim um valioso encaixe financeiro. Porém, os enfiteutas não queriam largar mão do terreno graciosamente e queriam ser compensados financeiramente pela sua cedência antecipada. Ainda se tentou a via judicial, mas como esta se afigurava demorada, com a apresentação de um recurso ao vigário diocesano e perspetivando-se outro ao núncio apostólico, a solução foi encontrada com grande pragmatismo: em troca da libertação do terreno, o Convento da Trindade deu a Beatriz de Andrade e ao seu sucessor, enquanto fosse vivo, 25% do rendimento líquido que se conseguisse com os foros dos lotes urbanizados.

O início da urbanização da “Herdade de São Roque” deu-se a 17 de outubro de 1554, com a assinatura das primeiras escrituras de aforamento dos lotes, tendo o processo decorrido de forma muito rápida, com todos os lotes aforados em 30 de janeiro de 1555. As oliveiras foram todas arrancadas e levadas como lenha para a cozinha do Convento da Trindade. No preâmbulo de cada escritura de aforamento define-se a área a ser urbanizada e os motivos financeiros que justificavam a operação urbanística:

E loguo por elles foy dito que antre os bens e propriedades que eles tem assim hé huma tera que foy olival que esta fora dos muros desta cidade junto de San Roque a qual tera parte do norte com rua que vai antre esta tera e chãos do Cabido e do Sul com outra rua que vai antre ela e chãos do dito cabido e do levante com rua que vay de Nosa Senhora do Loreto pera San Roque e do poemte com chãos do cabido; e que ora eles pelo sentirem por proveito e acresentamento das rendas do dito seu musteiro.

Procedemos à leitura de todas as escrituras de aforamento existentes no Livro 2.º das escrituras do Convento da Trindade (1551-155821 e, através da verificação das confrontações de cada um dos lotes desta urbanização, concluímos que a zona urbanizada era constituída apenas pelos dois quarteirões delimitados pelas ruas citadas, separados por uma rua que a percorre no sentido norte-sul, a atual Rua do Diário de Notícias. Após as leituras das várias escrituras concluímos que ambos os quarteirões foram subdivididos em lotes, denominados na documentação por chãos com 20 x 90 palmos, ou seja, 4,4 x 19,8 m. A fachada voltada para a rua tinha apenas 20 palmos, deixando adivinhar que o interior das habitações era composta por 3 módulos de 30 x 20 palmos, um primeiro voltado para a rua, um segundo voltado para as traseiras e um terceiro de logradouro. Tudo meticulosamente programado, como se vê, e de resto nenhum dos lotes foi aforado individualmente, tendo sido todos aforados em múltiplos (2, 3, 4, etc.), o que ilustra bem o “fôlego” com que estas operações eram levadas a cabo, com a expansão fora de muros de Lisboa a fazer-se já segundo preceitos assumidamente modernos.

Graças às escrituras notariais é possível reconstituir na íntegra o mapa deste loteamento (Figura 2), sendo que a numeração dada aos lotes é nossa. O quarteirão ocidental foi aforado a Sebastião Delgado (lote n.º 1, 17 de outubro de 1554; 38 x 90 palmos)22; Pero Fernandes (lote n.º 2, 17 de outubro de 1554; 40 x 90 palmos)23; Sebastião Fernandes (lote n.º 3, 17 de outubro de 1554; 40 x 90 palmos)24; Diogo Fernandes e Maria Pinhoa (lote n.º 4, 30 de janeiro de 1555; 60 x 90 palmos)25; padre Filipe Anes (lote n.º 5, 29 de outubro de 1554; 60 x 90 palmos)26; Sebastião Fernandes, barbeiro do Convento da Trindade (lote n.º 6, 17 de outubro de 1554; 60 x 30 palmos)27; Diogo Lopes, barbeiro (lote n.º 7, 19 de dezembro de 1554; 20 x 60 palmos)28; João Gonçalves, barbeiro (lote n.º 8, 19 de dezembro de 1554; 20 x 60 palmos)29; Sebastião Gonçalves, cavaleiro fidalgo da casa d'el rei, e Aleixo Álvares (lote n.º 9, 29 de novembro de 1554; 80 x 90 palmos)30; Gaspar Cardoso, logo substituído por Diogo Delgado de Oliveira, cavaleiro fidalgo da casa d'el rei (lote n.º 10, 11 de julho de 1555; 69 x 90 palmos)31; e Nicolau Fernandes de Carvalho (lote n.º 11, 16 de novembro de 1554; 69 x 90 palmos)32.

 

 

O quarteirão oriental foi aforado ao padre Amador Lopes (lote n.º 12, 29 de outubro de 1554; 60 x 90 palmos)33; Manuel Dias (lote n.º 13, 19 de novembro de 1554; 30 x 90 palmos)34; Fernão Vaz, moço da câmara d'el rei (lote n.º 14, 8 de novembro de 1554; 38 x 90 palmos)35; Francisca Rodrigues (lote n.º 15, 29 de outubro de 1554; 37 x 90 palmos)36; D.ª Maria Manoel de Vilhena (lote n.º 16, 11 de dezembro de 1554; 67 x 106 palmos)37; Diogo Dias, barbeiro do infante D. Luís (lote n.º 17, 18 de junho de 1555; 215 x 90 palmos)ifício da rua da Bica de Duarte Belo nº 61-63 que tem apenas três pisos e dois fogos38; Teresa Pinhoa, Beatriz Pinhoa e Maria Pinhoa (lote n.º 18, 18 de novembro de 1554; 45 x 60 palmos)39; e Jorge Fernandes e Catarina Mendes (lote n.º 19, 5 de novembro de 1554; 45 x 60 palmos)40.

Muitos dos enfiteutas, por não terem construído em tempo útil as casas nos lotes ou por renegociarem a condição do foro, elaboravam novas escrituras, ou cediam a posição nestes lotes a terceiros, existindo pois as escrituras dos novos aforamentos, renúncias e trespasses de Filipe Anes, clérigo de missa (29 de outubro 1554)41, Amador Lopes (29 de outubro de 1554)42, Sebastião Fernandes (16 de novembro de 1554)43, Maria Manoel de Vilhena (11 de dezembro de 1554)44, Mécia Freire (19 de dezembro de 1554)45, Manuel Dias Cordeiro (30 de janeiro de 1555)46, Sebastião Rodrigues, clérigo de missa (18 de outubro de 1555)47, licenciado Lourenço Jorge (21 de outubro de 1555)48 e Catarina de Sá (2 de dezembro de 1556)49.

Cada lote possui uma história própria que é possível reconstituir quase até à atualidade. Escolhemos para este artigo o caso do edifício do Palácio dos Condes de Tomar que corresponde aos lotes n.os 14, 15 e 16. O lote n.º 16 foi aforado a D.ª Maria Manoel de Vilhena, a 11 de dezembro de 1554, sendo o lote descrito com 67 x 106 palmos50 (14,74 x 23,32 m). A fachada voltada para o atual Largo Trindade Coelho é assim descrita com um comprimento muito próximo ao atual (23,16 m).

Anos mais tarde, D.ª Maria Manoel de Vilhena anexou o lote n.º 15, no dia 30 de abril de 156151, e o lote n.º 14, no dia 17 de julho de 156252, ficando desde esta data os três lotes reunidos sob um mesmo proprietário.
Desta forma se formou a área onde se implantou o “Palácio dos Condes de Tomar”, reunindo-se com os três lotes os 142 palmos (31,24 m) que perfazem o comprimento total da fachada do edifício na Rua do Grémio Lusitano, valor muito próximo aos 31,65 m atuais.

O contrato de aforamento era a longo prazo, quase sempre em três vidas, e implicava a construção de casas pelo enfiteuta, sob pena de resolução do contrato. Assim, é natural que ao longo do tempo, os enfiteutas aforassem ao Convento da Trindade os lotes vizinhos e construíssem aí anexos ou ampliações das suas casas, que ficavam mais ou menos marcados na arquitetura existente.

É muito provável que D.ª Maria Manoel de Vilhena tenha construído de acordo com o programa arquitetónico imposto pelo Convento da Trindade: casas para habitação, de dois pisos, sendo o térreo para serviços (loja, oficina ou armazém) e o superior para habitação do proprietário ou inquilino. De outra forma, o contrato teria sido resolvido e teríamos assistido a novo contrato com outro enfiteuta, o que não se verificou. É possível que, com mais investigação no arquivo do Convento da Trindade (IAN/TT), nos livros da décima da cidade (Arquivo Histórico do Tribunal de Contas) e nos livros de cordeamento (Arquivo da Câmara Municipal de Lisboa) se localizem novos documentos que nos informem da evolução deste aforamento, em particular quanto à sucessão dos seus titulares.

Por agora, ficamos com o que a bibliografia nos diz53. Segundo uma tradição pouco fundamentada, em meados do século XVII, o palácio estava ocupado pelo rico armador ligado ao comércio da Índia, Gaspar de Brito Freire, tendo sido abandonado pouco depois pelo seu filho Francisco de Brito Freire, que preferiu residir no palácio que fora do alcaide D. João de Alarcão, na praia da Boavista.

No século XIX, o palácio pertencia ao conselheiro Bartolomeu Dias dos Mártires e Sousa que o doou, com reserva de usufruto, a seu filho Bartolomeu de Oliveira Dias e Sousa, bacharel em direito, em 1877. Ambos residiam no palácio sendo o pai já viúvo. Porém, a 29 de novembro de 1880, o filho morreu de tuberculose e o palácio regressou à propriedade do pai que morreu pouco depois, a 7 de janeiro de 1882. Por decisão do tribunal, o palácio passou para a propriedade da única filha viva do conselheiro, D.ª Sofia Adelaide, condessa de Tomar, casada com António Bernardo da Costa Cabral, 2.º conde de Tomar. Este era filho primogénito de Costa Cabral (1803-1889), importante ministro de D.ª Maria II e figura controversa no período da Monarquia Constitucional. É pois só a partir de 1882 que o palácio adquire a denominação de “Palácio dos Condes de Tomar”.

Pela morte de Maria Dias e Sousa Costa Cabral, a propriedade do palácio sucedeu para os seus sete filhos, sendo administrada pelo pai dos herdeiros, António Maria da Costa de Macedo, que a arrendou a vários inquilinos e procedeu a diversas obras de conservação54. Entre 24 de maio de 1926 e 21 de janeiro de 1966 esteve instalado no palácio o “The Royal British Club”. A 17 de junho de 1969, a Câmara Municipal de Lisboa adquiriu o imóvel aos herdeiros do proprietário, instalando aí a Hemeroteca Municipal de Lisboa em 1973. Funcionaram no palácio muitos outros equipamentos e instituições.

Em 1993 foi recuperada apenas a fachada do edifício no âmbito da “Lisboa 94 Capital Europeia da Cultura”, mantendo-se a falta de obras de manutenção, o que levou a que, em 1997, fosse instalado um telhado de zinco. Em 2000 iniciaram-se obras de manutenção mais profundas, tendo a Hemeroteca reaberto em 19 de março de 2001. Alguns problemas persistiram, tendo a Câmara Municipal optado em 2004 por retirar o equipamento do Palácio dos Condes de Tomar55, decisão que foi sendo adiada até 2013, data em que se efetivou a transferência do espólio. Neste mesmo ano vendeu-se o edifício à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, sua atual proprietária, que aí pretende instalar o Arquivo e Biblioteca da Revista Brotéria da Companhia de Jesus, sob projeto de José Pedro Neuparth, Arquitecto Lda.

A documentação informa-nos que, em 1554, D.ª Maria Manoel de Vilhena aforou um lote com a obrigação de aí construir a sua habitação. Posteriormente, em 1561 e 1562, anexou dois lotes vizinhos reunindo assim os três lotes da “Herdade de São Roque do Convento da Santíssima Trindade” que compõem hoje a área do “Palácio dos Condes de Tomar”. Estes factos dizem-nos que a génese construtiva do palácio é de 1554 e que deve ter sido aumentado em 1561-1562. Não é espectável qualquer vestígio humano anterior porque sabemos que, antes do processo de loteamento e urbanização, o terreno era ocupado por um olival. O facto de algumas paredes coincidirem com os limites dos lotes originais (Figura 3) leva-nos a crer que, em 1561-62, D.ª Maria Manoel de Vilhena absorveu com os lotes vizinhos as construções concretizadas pelos anteriores enfiteutas que depois integrou na sua habitação, uniformizando o conjunto.

 

 

São essas paredes:

a) a parede que se desenvolve no sentido norte-sul que separa a cozinha da escadaria monumental e que corresponde à linha de divisão original entre o lote n.º 16 e o lote n.º 15;

b) a parede que se desenvolve no sentido norte-sul que corresponde à linha de divisão original entre o lote n.º 14 e o lote n.º 15.

Quanto à planta original dos edifícios quinhentistas (o I de 1554 e o II de 1562), parece-nos possível apresentar uma proposta de reconstituição, tendo em conta a tipologia arquitetónica da época e a análise do levantamento atual, dando especial atenção às paredes de grande espessura, que devem ser ainda as originais.

O edifício I, iniciado em 1554 (Figura 4), teria de se circunscrever ao terreno aforado nessa data por D.ª Maria Manoel de Vilhena. O facto de haver no interior diversas paredes de avultada espessura, que normalmente são exteriores, leva-nos a considerar que houve um pátio interior, solução comum nesta época e tipologia arquitetónica, o qual terá sido ocupado, no século XIX, pela escadaria monumental. O edifício I seria assim uma habitação com planta em U, modelo frequente na arquitetura palaciana lisboeta. Haveria duas fachadas, estando a principal voltada para o Largo de São Roque, onde seriam visíveis três corpos, eventualmente marcados com três telhados de tesoura. O corpo central corresponde ao atual átrio e possuía uma planta longitudinal, sendo ladeado por dois corpos mais pequenos.

 

 

Na planta que apresentamos marcámos cinco portas nesta fachada, mas não nos surpreenderia se fossem apenas três, uma para cada corpo, ou mesmo apenas uma, sem qualquer correspondência com os atuais vãos, pois, segundo a mentalidade da época, o acesso ao interior era restrito pelo menor número de portas possível. Também não sabemos se os corpos laterais teriam a mesma altura que o corpo central ou se seriam ligeiramente mais altos, a modo de torres.

A fachada da Rua do Grémio Lusitano seria secundária. Possuiria apenas dois corpos com uma porta que permitiria o acesso ao interior do palácio, que poderá corresponder ao vão que ainda hoje existe. As restantes três portas – hoje convertidas em janelas, mas ainda marcadas no interior – dariam acesso a três espaços que seriam autónomos e que poderiam ser lojas ou oficinas arrendadas a artífices ou usadas para vender os produtos da casa. Teriam paredes que as separavam entre si e não teriam acesso direto ao interior da casa. As aberturas que as ligam à casa principal foram abertas posteriormente com sacrifício da parede principal.

A divisão que estava a sul do pátio, no logradouro, porque estava rodeada de paredes cegas e interiores, e tinha a sua única fachada voltada a norte, não tendo por isso qualquer exposição solar, tinha as condições ideais para ser o armazém da casa. Provavelmente, apenas teria um piso, porque como estava no logradouro e não estava voltada para a rua, não necessitava de obedecer ao programa imposto pelos frades da Trindade. A ser o armazém da casa, como supomos, não teria janelas mas apenas uma porta que daria acesso para o pátio interior.

O pátio interior providenciava espaço exterior e ar fresco para todas as divisões (sem com isso permitir a devassa pelos olhares alheios dos transeuntes) e fácil acesso entre todas as divisões da casa (a modo de “praça de armas” na arquitetura militar), funcionando assim, simultaneamente, como área de lazer, higienização e comunicação.

Sabemos que, originalmente, o edifício estava obrigado por disposição contratual do aforamento a ter dois pisos, pelo menos nas fachadas exteriores. Este piso superior seria acessível por uma escada que ainda hoje existe (embora tenha havido uma natural substituição de materiais), com apenas um lanço, que se projetava sobre uma das lojas. O piso superior repetiria a mesma estrutura, mas era inteiramente dedicado a zonas de habitação, divisões que comunicavam entre si e que funcionavam como salas e quartos, cada vez mais restritos a terceiros conforme se avançava na casa.

Tal como D.ª Maria Manoel de Vilhena, também os outros enfiteutas tiveram de construir as suas habitações, as quais foram absorvidas e integradas no edifício principal, compondo assim o edifício II (Figura 5). Essas casas pré- -existentes devem corresponder às três divisões que estão voltadas para a Rua do Grémio Lusitano. De qualquer forma, D.ª Maria Manoel de Vilhena parece ter abdicado da forma em U do seu edifício e optado pela forma de quadrado com pátio ao centro. A oeste repetiu a métrica da fachada voltada para o Largo Trindade Coelho, fazendo porém quatro divisões voltadas para o logradouro. Abriu para isso vãos de passagem na antiga parede de divisão da propriedade. Porque já estava construído, manteve o corpo mais a poente que permaneceu como um “apêndice” em relação ao quadrado arquitetado como edifício principal. Este corpo poente tomaria certamente partido da vista sobre o Tejo e da exposição solar no seu alçado posterior, voltado a sul. A fachada posterior, apesar de mascarada por anexos do século XX, deixa ver óculos de iluminação e uma varanda de pedra corrida, suportada por mísulas, numa solução possivelmente de finais do século XVIII ou início do XIX, que demonstra bem que esse alçado foi valorizado pelo proprietário, pelas características já enumeradas.

 

 

Ainda em época antiga, as três lojas foram suprimidas e convertidas numa divisão da casa e foi feita uma parede no interior da divisão cega (a que chamámos de armazém) que permitiu a comunicação interior entre o lado este e oeste do edifício sem passar pelo pátio.

O logradouro deste edifício II ficou circunscrito ao canto sudoeste do conjunto onde foi construída uma cisterna de captação de águas pluviais, como era frequente existir na zona ocidental de Lisboa, dado que essa parte da cidade não possuía fontes naturais nem abastecimento por aqueduto, lacuna que só foi suprimida no século XVIII com o Aqueduto do Loreto, subsidiário do Aqueduto das Águas Livres. Esta cisterna foi construída como uma “caixa” de alvenaria elevada que preenche totalmente o logradouro disponível. Além de usar o princípio dos vasos comunicantes para conduzir a água, elevou também a cota original do chão, proporcionando uma maior exposição solar e salubridade ao local.

Complementares à cisterna, existem ainda um respirador, duas cubas de pedra mármore e várias estruturas que merecerão um estudo especializado em hidráulica. É possível que esta cisterna seja aquela que, em inícios do século XVII, os padres jesuítas da Casa Professa de São Roque afirmavam existir numa casa privada nas imediações e que abastecia a sua casa56, complementando assim o abastecimento das duas cisternas existentes no claustro grande.

Em torno da cisterna, pelos lados norte e este, foi feito um corredor com pavimento de pedra, que vai descendo em patamares, passando por um pequeno túnel de quatro arcos abatidos, cobertos por lajes de pedra, que sustenta hoje uma varanda do piso 1, desembocando num arco com um peitoril em pedra, que pensamos ser um antigo poço. Este corredor, arcos e poço compõem um pequeno conjunto arquitetónico, próprio de um capricho palaciano para lazer dos seus proprietários, que celebra a água como elemento essencial à vida e o seu domínio artificioso, o que demonstra bem o requinte artístico e intelectual do proprietário. Esta estrutura pode ser datada ainda da segunda metade do século XVI, graças aos azulejos que ostenta nas suas paredes e que nos relatam a evolução do local (Figura 6).

 

 

Estes azulejos foram sumariamente descritos por Hélder Carita em 1994 como um conjunto de azulejaria do século XVII de rara qualidade estética, em padronagem azul e amarelo, e barras com desenhos de meninos57.

Neles podemos identificar os padrões P-67 (Figura 7), visto por Santos Simões na Sala dos Reis do Convento de Cristo de Tomar, cujo revestimento data de 1618; o P-85 (Figura 8) visto na região de Coimbra, na Capela de Nossa Senhora das Neves do Pinheiro em Avelãs de Cima (Anadia); uma variante inédita do P-84; um padrão inédito próximo do P-387, P-388 e P-389; a guarnição C-61 decorada com meninos e localizada também na Igreja de Nossa Senhora dos Remédios de Peniche e a guarnição C-71, uma das mais frequentes no nosso país58.

 

 

Porém, a aplicação dos azulejos foi feita em várias épocas, levando a que tivéssemos identificado quatro momentos distintos e elaborado uma proposta de cronologia da sua aplicação no espaço.

Os mais antigos são os azulejos brancos lisos que assumem a função de pilastras dos quatro arcos do túnel (Figura 9). São os únicos que, de forma contínua, vão até ao pavimento de pedra pelo que estão associados com os arcos e com o pavimento, ou seja, com a campanha arquitetónica. São azulejos datáveis da segunda metade do século XVI, onde foram muitas vezes utilizados nas composições de azulejos (Figura 10) esta cota mais elevada, foram aplicados os painéis seiscentistas com os padrões P-85, a variante do P-84, o padrão inédito e as guarnições C-61 e C-71 (Figura 11 e 12).

 

 

 

 

Mais tarde, já no século XIX e baseando-se no pavimento mais elevado, foi aplicado o padrão seiscentista P-67 (Figura 13) mas com uma cercadura do século XVIII/XIX, o que denuncia a incongruência cronológica da sua aplicação. Por outro lado, os azulejos deste padrão apresentam diversas falhas nas arestas do vidrado, patologia que normalmente vemos em painéis de azulejos retirados do seu local original e reaplicados noutro local. O facto do padrão P-67 existir na Sala dos Reis do Convento de Cristo de Tomar e da família Costa Cabral ter sido a proprietária deste mosteiro após a sua extinção, leva-nos a propor a hipótese que dos azulejos do padrão P-67 existentes no Palácio dos Condes de Tomar, em Lisboa, sejam provenientes do Convento de Cristo de Tomar tendo sido trazidos para aqui pela família Costa Cabral no século XIX. Nesta época foram também aplicados azulejos pombalinos (Figura 14).

 

 

Finalmente, num quarto momento, provavelmente já no início do século XX, o pavimento mais elevado foi retirado, pôs-se a descoberto o pavimento original de lajes de pedra e preencheram-se as lacunas existentes entre os painéis de azulejos seiscentistas e o pavimento quinhentista com uma amálgama de azulejos dos séculos XVII, XVIII e XIX (Figura 15).

 

 

Para o século XVIII, o Palácio dos Condes de Tomar não apresenta qualquer vestígio de campanhas de obras relevante. A fachada que apresenta e a decoração interior, onde abundam os estuques de grande qualidade, são já de meados e da segunda metade do século XIX, embora haja uma evocação do gosto do Barroco italiano.

A linha de separação do edifício no seu limite sul possui uma inclinação relativamente ao Largo Trindade Coelho, mas corre paralela à fachada da Rua do Grémio Lusitano. Essa linha diagonal corresponde ainda aos limites do loteamento quinhentista, pelo que as pequenas salas com forma triangular que parecem ter sido anexadas ao edifício vizinho são na verdade (e sempre foram) parte integrante do Palácio dos Condes de Tomar. A ilusão de que poderiam ter sido “roubadas” ao edifício vizinho resulta do tratamento da fachada do Largo Trindade Coelho, feita já em meados no século XIX. Por qualquer razão, quis dar-se a ilusão ao transeunte que essa porta dava acesso ao palácio vizinho, quando na verdade dava acesso ao Palácio dos Condes de Tomar.

O tratamento destas fachadas, a do Palácio dos Condes de Tomar e do edifício vizinho, bem como dos restantes edifícios do Largo Trindade Coelho, resulta da implementação de um plano de remodelação urbana conjunto que envolveu os esforços da Câmara Municipal de Lisboa e da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, que pretendeu reordenar o Largo de São Roque, de planta irregular, marcado pelas ruínas da Torre de Álvaro Pais e palco de um flagelo social que marcava a zona: a prostituição.

Em meados do século XIX, o largo foi reformulado: demoliram-se as ruínas da muralha fernandina; deu-se-lhe uma planta quadrada e regular; construiu-se uma fachada falsa que impediu o acesso do público ao “Pátio do Patriarca” e às traseiras do Palácio dos Marqueses de Nisa, arruamentos muito conotados com a prostituição, onde foi instalada a sede da Companhia das Carruagens Lisbonenses; projetou-se uma nova fachada neo-clássica para a Misericórdia (nunca construída) da autoria de Pierre Jozeph Pezerat, a quem se pediu «que tenha em consideração toda a simetria e regularidade do frontispício, e a sua devida correspondência com o largo, que deve vir a ser um dos mais formosos da Cidade»59; e erigiu-se um monumento ao centro, evocativo do casamento régio entre o rei D. Luís e D.ª Maria Pia60. O reordenamento da fachada do Palácio dos Condes de Tomar (e do palácio vizinho) deve ter feito parte deste esforço de tornar o Largo de São Roque num dos “mais formosos da cidade”. A decisão de se dar a ilusão que 1,33m da sua fachada pertenciam à fachada do edifício vizinho (Figura 16) pode decorrer de opções estéticas de arquitetura (para se dar uma simetria e equilíbrio entre ambas as fachadas) ou de questões sociais e/ou políticas (desejava-se que o transeunte julgasse que as pessoas que entravam por aquela porta se dirigiam ao palácio vizinho e não ao Palácio dos Condes de Tomar). O facto de existir, no piso nobre, uma porta dissimulada (Figura 17), que dá acesso a um pequeno gabinete onde está um armário encastrado (Figura 18), revela que o espaço foi usado também como esconderijo para a guarda de valores.

 

 

A nova fachada (Figura 19) teve, acima de tudo, preocupações estéticas, valorizando a simetria e a sobriedade, mas ao mesmo tempo uma vocação palaciana dada pela escala, pelo desenho das molduras e pela animação dos estuques nas paredes exteriores, o que levou a que se visse nela um Barroco joanino de inspiração italiana. Contudo, é uma fachada da segunda metade do século XIX, que não atribuímos a Pierre Jozeph Pezerat, por este arquiteto possuir uma linguagem estética neoclássica, apesar de ter sido ele o responsável pela remodelação arquitetónica do atual Largo Trindade Coelho, projetando para aí diversos edifícios. Terá a presença da Capela de São João Baptista61, existente na próxima Igreja de São Roque, muito valorizada na segunda metade do século XIX62, sido determinante para a escolha da linguagem estética da fachada do Palácio dos Condes de Tomar? Não o sabemos.

 

 

A porta principal é marcada por um portal que dá acesso a um átrio que deixa antever de imediato a escadaria monumental, a qual, por sua vez, leva o visitante diretamente ao piso 2, o andar nobre. Fica assim o piso 1 resguardado para os residentes. Esta escadaria monumental foi construída no antigo pátio do edifício e o piso 2 construído sobre o existente. De facto, entre o piso 2 e o piso 1 há um friso na fachada que pode marcar a diferenciação entre o edifício existente, quinhentista, e o piso nobre construído sobre aquele.

Há outro pormenor que pode comprovar que o atual edifício resulta do acréscimo no século XIX dos pisos 2 e 3 diretamente sobre os pisos 0 e 1, pré-existentes e, muito provavelmente, ainda quinhentistas. A sala que denominámos de “armazém” do edifício I foi, em data incerta, abobadada. O tipo de abóbada, abatida e em tijolo, parece ser já do século XIX. Porém, a dada altura, houve a necessidade de se fazer uma parede de reforço que truncou a abóbada mas denuncia que houve um acréscimo de carga que a parede ou a abóbada não suportou.

Ainda no piso térreo, as várias salas que abrem para a rua têm autonomia, podendo ser lojas para arrendamento ou escritórios de atendimento dos serviços do proprietário. Algumas destas lojas viram a sua entrada principal fechada, outras foram abertas para o interior da casa. Duas destas divisões têm mais dependência com o palácio: a sala 1, que é acedida pela “entrada secreta” – a porta que, aparentemente, daria acesso ao edifício vizinho; e a sala 2, que permite acesso ao átrio. O átrio também dá acesso, através de entradas colaterais, a duas áreas de circulação que rodeiam a escadaria monumental. Uma delas, a do lado esquerdo, dá acesso ao piso 1 que era a zona privativa dos residentes, ocupado pelos quartos e escritórios privativos, onde não se franqueava a entrada aos visitantes.

O piso 2 era o andar nobre para utilização nos eventos sociais dos residentes, com salas amplas, decoradas com tetos estucados e com uma capela. Segundo a estética da época, estas divisões seriam totalmente preenchidas por pintura mural com motivos pompeianos, neo-clássicos ou românticos com folhagens, ruínas e paisagens. A questão residirá em saber se foram totalmente destruídas ou se ainda se preservam, como é frequente, por baixo de diversas camadas de cal. Mesmo que se preservem, é frequente estarem em muito mau estado, o que justificou, logo de início, a sua ocultação pela cal.

Foi nesta época que se deu ao corpo oeste autonomia em relação ao edifício principal, a qual se encontra claramente na fachada pois, aparentemente, não existe qualquer ligação com o palácio. A razão desta autonomia poderá ser justificada pela intenção de se vir a arrendar a terceiros este corpo ou de criar aqui um “refúgio” social para o proprietário. A comprovar esta última hipótese temos a extraordinária sala de jantar, revestida a madeira e couro decorado com as insígnias da família Cabral (cabras rampantes) (Figura 20) e com uma lareira em pedra decorativa negra. Trata-se de um “salão de fumo”, ou seja, uma sala de jantar restrita a homens onde o proprietário e os seus convidados poderiam ter um banquete mais animado e liberto de algumas das restrições sociais impostas pela presença das damas, podendo-se fumar, beber álcool, debater política e outros assuntos considerados “mais elevados” ou mais brejeiros, num evento conhecido como “sarau” ou “tertúlia” como são descritos nos romances queirosianos.

 

 

Esta sala de jantar era servida por uma cozinha própria, que ainda hoje existe, e lhe ficava por baixo, sendo o acesso feito de forma rápida por uma escada e um corredor que abre diretamente para a sala de jantar. A cozinha mantém a chaminé, o armário da despensa, a pia de despejo, a escada de acesso à sala de jantar que lhe está por cima e um revestimento azulejar.

No sótão do Palácio dos Condes de Tomar, existiam diversas salas que funcionavam como quartos da criadagem, com cozinha privativa e eram aquecidos pelas chaminés das lareiras do piso nobre.

 

CONCLUSÃO

O Palácio dos Condes de Tomar teve a sua origem nas décadas de 1550-1560 enquanto palácio de D.ª Maria Manoel de Vilhena. As suas paredes interiores denunciam um palácio com planta quadrada com um pátio no centro, acrescido de um corpo longitudinal que acompanhava a rua. No logradouro, elevou-se a cota para se beneficiar da exposição solar, recorrendo-se, possivelmente, a uma cisterna que urge descobrir. Aplicaram-se pequenos caprichos arquitetónicos revestidos a azulejos que ainda hoje se preservam.

Na segunda metade do século XIX, fez-se uma intervenção que incidiu sobre a fachada - animada com estuques, cantarias de gosto italiano e grades decorativas - e o interior – com a introdução da escadaria monumental no antigo pátio e de diversos tetos estucados. Esta intervenção não abrangeu deliberadamente o prolongamento oeste, dando-lhe assim autonomia como edifício desligado do principal.

 

FONTES E BIBLIOGRAFIA

Fontes manuscritas

 

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Livro 2.º de D. João I, doc. 9 e 10.

Obra n.º 552.

Tombo das propriedades foreiras à Câmara.

 

Arquivo Nacional da Torre do Tombo

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Convento da Santíssima Trindade de Lisboa:

Livro 65.

Livro 75.

Livro 78.

Livro 97.

Livro 107.

Maço 1, n.º 30.

Maço 2, n.os 77 e 78.

Maço 3, n.º 31.

Maço 4, n.º 47.

 

Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, Arquivo Histórico

Órgãos de Administração, Deliberações da Mesa, Livro SCML\OA\MS\04\Lv 002.

 

Fontes Impressas

Livro primeiro de tombo das propriedades foreiras à Câmara desta muy insigne cidade de Lisboa: documentos para a história da cidade de Lisboa. Lisboa: Câmara Municipal, 1950-1952. 2 vol.

 

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submissão/submission: 14/01/2016

aceitação/approval: 21/03/2016

 

 

NOTAS

* Licenciado e mestre em História de Arte pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, onde frequenta o curso de doutoramento. Foi historiador no Município de Borba, onde publicou diversos estudos sobre o património local. Colaborou com instituições públicas e privadas do Alentejo, Algarve e Lisboa, publicando estudos sobre arquitetura e história da arte, economia e sociedade em contextos locais. É atualmente investigador no Museu de São Roque da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. Correio eletrónico: fabricadahistoria@gmail.com

1 Cf. SEQUEIRA, Gustavo de Matos - O Carmo e a Trindade. Lisboa: Câmara Municipal, 1939. vol. 1, p. 162 e ss.

2 Cf. CARITA, Hélder - Lisboa manuelina e a formação de modelos urbanísticos da época moderna: 1495-1521. Lisboa: [s.n.], 1998. p. 60-72. Dissertação de mestrado apresentada à Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. CARITA, Hélder - Lisboa manuelina e a formação de modelos urbanísticos da época moderna: 1495-1521. Lisboa: Livros Horizonte, 1999. p. 91-108. CARITA, Hélder - A igreja, a rua larga e o Bairro Alto de São Roque. In MORNA, Teresa; MANTAS, Helena Alexandra - Património arquitectónico: Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. Lisboa: Santa Casa da Misericórdia de Lisboa; Museu de São Roque, 2006. vol. 1, p. 25-27.

3 Cf. SÃO JOSÉ, Frei Jerónimo - História cronológica da Santíssima Trindade. Lisboa: Oficina de Simão Tadeu Ferreira, 1789. p. 179.

4 Cf. ALBERTO, Edite - Trinitários. In AZEVEDO, Carlos Moreira - Dicionário de história religiosa de Portugal. Rio de Mouro: Círculo de Leitores, 2001. vol. 4, P-V, apêndices, p. 305-307.

5 Cf. SÃO JOSÉ, Frei Jerónimo de – op. cit., p. 174.

6 Numa anotação existente no documento: Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT), Convento da Santíssima Trindade de Lisboa, Maço 3, n.º 31, refere-se que a terra de São Roque foi doada pela rainha Santa Isabel, remetendo para o livro 3.º de escrituras, f. 38 e 188.

7 Cf. Declaração deste Convento ao Senado [da Câmara Municipal de Lisboa] sobre os campos que nos deixou D.ª Brites Pereira em que se havia de fundar o Convento, documento que estava trasladado no Tomo 1.º dos Breves Pontificiais no f. 357. Cf. ANTT, Convento da Santíssima Trindade de Lisboa, Livro 97, f. 190.

8 Cf. Arquivo Municipal de Lisboa (AML), Chancelaria Régia, Livro 2.º de D. João I, docs. 9 e 10.

9 A escritura original em pergaminho encontra-se em ANTT, Convento da Santíssima Trindade de Lisboa, Maço 2, n.º 78, tendo sido trasladada por notário em 1752, encontrando-se esta versão em ANTT, Convento da Santíssima Trindade de Lisboa, Livro 107, f. 2.

10 A escritura original em pergaminho encontra-se em ANTT, Convento da Santíssima Trindade de Lisboa, Maço 2, n.º 77, tendo sido trasladada por notário em 1752, encontrando-se esta versão em ANTT, Convento da Santíssima Trindade de Lisboa, Livro 107, f. 3v.

11Cf. ANTT, Convento da Santíssima Trindade de Lisboa, Livro 97, Index Geral do Cartório deste Convento da Ordem da Santíssima Trindade de Lisboa, s.d. [séc. XVIII], f. 143v.

12Cf. LOPES, Fernão - Crónica do Senhor Rei Dom Fernando nono rei destes reinos. 4.ª ed. Porto: Livraria Civilização, 19--. p. 233-235.

13Cf. AML, Tombo das propriedades foreiras à Câmara, f. 213v.-214v. Publicado em Livro primeiro de tombo das propriedades foreiras à Câmara desta muy insigne cidade de Lisboa. Documentos para a História da Cidade de Lisboa, 2 vols. Lisboa: Câmara Municipal, 1950-1952.

14Cf. ANTT, Chancelaria Régia, D. Manuel I, Livro 1, f. 160. SEQUEIRA, Gustavo Matos - op. cit., vol. 1, p. 166. CARITA, Hélder – op. cit., 2006, p. 20.

15Cf. ANTT, Convento da Santíssima Trindade de Lisboa, Livro 65, f. 50v.

16Pessoa privada, viva, livre, maior de idade ou emancipada, que adquiria a longo prazo (por uma, duas ou três vidas) o usufruto da propriedade (urbana ou rústica) à instituição proprietária (convento, colegiada, Coroa, capela pia, confraria), mediante o pagamento de um foro anual fixo, que podia ser em dinheiro ou bens. O enfiteuta tinha total poder e, por vezes, a obrigação de valorizar a propriedade mediante a realização de benfeitorias como, por exemplo, a construção ou ampliação de uma habitação. A transmissão do aforamento era feita pelo enfiteuta que, perto da morte, nomeava o novo, que podia ser a mulher, um filho, um neto ou até mesmo um estranho. Em caso de não nomeação, aplicava-se a lei sucessória. Findo o contrato de aforamento pela morte do último enfiteuta, a terra com as suas benfeitorias regressavam livres (sem direito a qualquer indemnização aos herdeiros do enfiteuta) à instituição que fazia novo aforamento com um valor mais atualizado. Normalmente, o último enfiteuta, muito antes da sua morte, renegociava com a instituição um novo aforamento por três vidas, atualizando o valor do foro.

17Cf. ANTT, Convento da Santíssima Trindade de Lisboa, Maço 3, n.º 31 (original) e ANTT, Convento da Santíssima Trindade de Lisboa, Maço 4, n.º 47 (treslado setecentista). Segue a transcrição do original: Item, da parte do norte partem com rua que vay da rua d Atallaya pêra o Rellogio de Sam Roque a quall Rua he da Trindade convem a saber que vay pêra Sam Roque e tem trynta e dous palmos e meo. E da parte do sull comffronta com Rua que vai da dita Rua d Atallaya ffronteira ha tore grande que está no muro da cidade a par do postyguo de Sam Roque e tem hoyto varas que san corenta pallmos e da parte do llevante se conffronta contynuamente com propyadades da Tryndade e tem trynta e cynquo varas e hum pallmo e sam cento e sesenta seis pallmos e da parte do ponente comffronta com a Rua d Atallaya e tem de canto dos casas de Graciall Piriz mulher que foy de Antonyo da Veyga, outro das casas que forão de Vicente Regão que hora trás Guiomar Vaz sua mulher.

18Cf. ANTT, Convento da Santíssima Trindade de Lisboa, Maço 1, n.º 30.

19Emprasamento que se fez a Álvaro de Queirós e a Bartolomeu de Andrade de uma herdade por detrás da Torre de Álvaro Pais, documento que se guardava no Tomo 1.º dos Breves Pontificiais nos fólios 354 e 361. Cf. ANTT, Convento da Santíssima Trindade de Lisboa, Livro 97, f. 190.

20Cf. ANTT, Convento da Santíssima Trindade de Lisboa, Livro 78, f. 74-76v.

21Cf. ANTT, Convento da Santíssima Trindade de Lisboa, Livro 78.

22Cf. Ibidem, f. 87-88v.

23Cf. Ibidem, f. 84v-86v.

24Cf. Ibidem, f. 89-90v.

25Cf. Ibidem, f. 136v-139v.

26Cf. Ibidem, f. 91-93.

27Cf. Ibidem, f. 140-142.

28Cf. Ibidem, f. 120v-123.

29Cf. Ibidem, f. 123v.-125v.

30Cf. Ibidem, f. 113v.-116v.

31Cf. Ibidem, f. 152-154v.

32Cf. Ibidem, f. 148v.-150v.

33Cf. Ibidem, f. 93v.-94v.

34Cf. Ibidem, f. 110-113.

35Cf. Ibidem, f. 104v.-107.

36Cf. Ibidem, f. 101v.-104v.

37Cf. Ibidem, f. 95-96v.

38Cf. Ibidem, f. 146v.-148v.

39Cf. Ibidem, f. 98v.-101v.

40Cf. Ibidem, f. 96v.-98.

41Cf. Ibidem, f. 132v.-134v.

42Cf. Ibidem, f. 134v.-136v.

43Cf. Ibidem, f. 107v.-110.

44Cf. Ibidem, f. 130-132.

45Cf. Ibidem, f. 126-129v.

46Cf. Ibidem, f. 151-152.

47Cf. Ibidem, f. 161v.-163v.

48Cf. Ibidem, f. 167-168v.

49Cf. Ibidem, f. 174v.-177.

50Cf. Ibidem, f. 95-96v.

51Cf. ANTT, Convento da Santíssima Trindade de Lisboa, Livro 75, f. 80-83. O lote 15 foi originalmente aforado a Francisca Rodrigues no dia 29 de outubro de 1554 e é descrito com 37 x 90 palmos (8,14 x 19,80 m). Cf. ANTT, Convento da Santíssima Trindade de Lisboa, Livro 78, f. 101v.-104v.

52Cf. ANTT, Convento da Santíssima Trindade de Lisboa, Livro 75, f. 126-128. O lote 14 foi originalmente aforado a Fernão Vaz, moço da câmara d'el rei e guarda da Casa da Índia, em 8 de novembro de 1554 e é descrito com 38 x 90 palmos (8,36 x 19,80 m). Cf. ANTT, Convento da Santíssima Trindade de Lisboa, Livro 78, f. 104v.-107.

53Cf. Archivo Pittoresco: semanário ilustrado. Lisboa: Typographia de Castro e Irmão, 1864. T. 7, N.º 39. A Propriedade Urbana. 3ª Série. Lisboa: Associação Lisbonense de Proprietários, 1970. Ano LVI, N.º 185. ATAÍDE, M. Maia, coord. - Monumentos e edifícios notáveis do distrito de Lisboa. Lisboa: Junta Distrital, 1975. vol. 5, t. 2, p. 55. CARITA, Hélder - Palácio Brito Freire – Tomar. In FRANÇA, José-Augusto, coord. - A Sétima Colina: roteiro histórico-artístico. Lisboa: Livros Horizonte, 1994. p. 72-73. CARITA, Hélder - Bairro Alto: tipologia e modos arquitectónicos. 2.º ed. Lisboa: Câmara Municipal, 1994. Instituto Tecnico Statale per Geometri “Antonio da Sangallo il Giovanni” – Il Palazzo del Marchese di Tomar: Bairro Alto di Lisbona. Terni: MPI – Direzione Generale Scambi Culturali, [1994?]. VALE, Teresa; FERREIRA, Maria; COSTA, Sandra - Palácio dos Marqueses de Tomar / Hemeroteca Municipal. SIPA: Sistema de Informação para o Património Arquitectónico [Em linha]. (2001) [Consult. 26.11.2013]. Disponível na internet: http://www.monumentos.pt/Site/APP_PagesUser/SIPA.aspx?id=20220 Condes de Tomar (Palácio dos). RevelarLX [Em linha]. [Consult. 26.11.2013]. Disponível na internet: http://revelarlx.cm-lisboa.pt/gca/?id=1348

54Cf. AML, Obras Particulares, Obra n.º 552.

55Cf. PEREIRA, Micael - Palácio espera telhado. A Capital. (5 ago. 1999) p. 6. BARATA, Clara - Hemeroteca à espera de uma biblioteca. Público. (6 dez. 1993) p. 37. HENRIQUES, Ana - Hemeroteca de Lisboa fechada até Janeiro. Público. (29 nov. 2000) p. 54. LUIS, Sara Belo - Hemeroteca de Lisboa: a babel do efémero. Visão. (mar. 2001) 418, p. 15-21. AMARAL, Francisco Keil do - Hemeroteca Municipal de Lisboa: obras e novos serviços. Biblioteca: revista das bibliotecas municipais de Lisboa. Lisboa: Câmara Municipal. N.º 9-10 (2002), p. 72-73. HENRIQUES, Ana - Hemeroteca de Lisboa muda de casa no ano que vem. Público. (3 out. 2004) p. 52. FERREIRA, Ana Dias - Hemeroteca fechada por falta de condições. Diário de Notícias. (08 dez. 2005) p. 43. HENRIQUES, Ana - Hemeroteca de Lisboa passa para Benfica. Público. (13 jan. 2006) p. 55.

56Cf. ANTT, Armário Jesuítico, Livro 5, p. 119-133.

57Cf. CARITA, Hélder, op. cit., 1994, p. 73.

58Cf. SIMÕES, João Miguel dos Santos - Azulejaria em Portugal no século XVII – Tipologia. 2.ª ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997. p. 34, 35, 38, 39, 149, 150 e 154.

59Cf. Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, Arquivo Histórico, Órgãos de administração, deliberações da mesa, Livro SCML\OA\MS\04\Lv 002, Sessão de 2 de junho de 1853, f. 10.

60 Cf. SIMÕES, João Miguel - A Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e o Bairro Alto em meados do século XIX: problemas sociais e políticas de contenção. Cidade Solidária. Lisboa: Santa Casa da Misericórdia. N.º 29/30 (2013), p. 150-161.

61Projeto de Luigi Vanvitelli e Nicola Salvi com adições de João Frederico Ludovice, de 1743-1744, foi um modelo arquitetónico e artístico fundamental, principalmente a partir de 1755, com o desaparecimento da Igreja Patriarcal, inspirando diversas capelas e igrejas em todo o país, principalmente no reinado de D. Maria I (1777-1816).

62A Capela de São João Baptista da Igreja de São Roque era visita obrigatória dos viajantes estrangeiros, a par de Mafra ou Sintra, evocando-se o extraordinário dispêndio e capricho de D. João V na sua encomenda a Roma (veja-se o relato de Lady Catherine Charlote Jackson que a visitou em 1873). Na segunda metade do século XIX, esta capela foi alvo de grande interesse, pelo facto de ser um exemplar da melhor arte italiana existente em Lisboa, sendo representada em pinturas a óleo por James Holland (MNAA, inv. 1739, pintura atualmente exposta no Museu de São Roque) e a aguarela por Roque Gameiro (Museu de São Roque, em reserva) publicando-se para venda diversas gravuras, entre as quais a de João Pedro Ribeiro (1847) (disponível em http://purl.pt/7097), cópias coloridas da aguarela de Roque Gameiro e por fim fotografias de Francesco Rocchini (1893) e Augusto Bobone (1900). Algumas das peças do seu tesouro foram expostas na Exposição Retrospectiva de Arte Ornamental Portuguesa e Espanhola (1882). Eça de Queirós cita-a n'A Relíquia (1887) como uma das grandes realizações artísticas e culturais de Portugal. Em 1893, foi publicado o primeiro estudo monográfico da autoria de Vicente de Almeida e Sousa Viterbo. A rainha D.ª Amélia requisitou algumas das peças do seu tesouro, em 1899, para as desenhar. A Casa Leitão&Irmão lançou o Serviço de Chá D. João V, composto por peças de ourivesaria baseadas no tesouro da capela (Palácio Nacional da Ajuda, inv. 10737 e 10738). O interesse oitocentista culminou com a exposição do seu tesouro, patrocinada pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, na sacristia da Igreja de São Roque, em 1898-1905, e por fim com a criação do Museu do Tesouro da Capela de São João Baptista, inaugurado pela família real, a 11 de janeiro de 1905 e génese do atual Museu de São Roque.

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