SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.ser2 número3Claude Laprade: um escultor provençal na Lisboa de Setecentos“Lisboa dos Italianos”: presença italiana e práticas de nacionalidade nos primeiros trinta anos do século XIX índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Cadernos do Arquivo Municipal

versão On-line ISSN 2183-3176

Cadernos do Arquivo Municipal vol.ser2 no.3 Lisboa jun. 2015

 

ARTIGO

O reformismo pombalino e a Feitoria Britânica de Lisboa

The Marquis of Pombal reformism and the British Factory of Lisbon

Teresa Fonseca*

 

RESUMO

Neste artigo analisámos as consequências da política reformista do marquês de Pombal na atividade económica da Feitoria Britânica de Lisboa. Procedemos em primeiro lugar à caraterização socioeconómica dos membros da Feitoria. Mencionámos os privilégios por estes adquiridos ao longo de séculos em Portugal e o modo abusivo como eram utilizados. Explicámos de que maneira o ministro de D. José e a Câmara de Lisboa procuraram combater tais abusos, no contexto da política de poder absoluto esclarecido. E descrevemos a reação dos britânicos a tais medidas.

 

PALAVRAS-CHAVE

Poder absoluto esclarecido / Rei D. José / Marquês de Pombal / Feitoria Britânica de Lisboa / Comércio anglo- -português

 

ABSTRACT

In this article we analyze the consequences of the Marquis of Pombal reformist politics in the economical activity of the British Factory of Lisbon. In the first place, we proceed to the socioeconomic characterization of the British Factory members. Next, we refer to theirs advantages in Portugal, acquired along of centuries, and the abusive way as they were used. We explain how the king Joseph’s prime minister and the Lisbon Municipal Council tried to reverse those advantages and overuses in the context of the enlightened absolutism politics. We also intend to elucidate the reactions of the British businessmen to the Portuguese initiatives.

 

KEYWORDS

Enlightened absolutism / King D. José / Marquis of Pombal / British Factory of Lisbon / Anglo-Portuguese trade

 

 

1 - A EXPERIÊNCIA DIPLOMÁTICA LONDRINA DO FUTURO MARQUÊS DE POMBAL

Sebastião José de Carvalho e Melo iniciou a carreira política em 1738, com a sua nomeação como enviado extraordinário junto de Jorge II de Inglaterra. A missão em Londres duraria quatro anos e incluiria dois objetivos essenciais: a renegociação, com a menor desvantagem possível para Portugal, dos tratados anglo-lusos de 1654, 1661 e 1703, sobre comércio e navegação; e a recolha, baseada na experiência britânica, dos ensinamentos necessários a uma política nacional de desenvolvimento naquelas duas áreas1.

No decorrer das negociações com o governo inglês, o diplomata foi tomando consciência da verdadeira dimensão da desigualdade marítima entre os dois países. Esta perceção fê-lo convencer-se de que a enorme desvantagem portuguesa jamais se resolveria pelo simples diálogo entre as duas chancelarias. Uma questão de tal natureza e complexidade implicaria, no seu entender, uma alteração estrutural da nossa política externa e interna. A primeira, através de uma reformulação das nossas relações com o estrangeiro, sem no entanto quebrar a aliança luso-britânica. E a segunda, através de uma alteração profunda nas áreas económica e ultramarina2.

Tais propostas3, porém, não encontraram recetividade na corte de Lisboa, nesta fase derradeira do governo de D. João V. Mas a sua concretização ficaria apenas adiada para o reinado seguinte, com a ascensão do enviado à esfera governativa.

Terminada a missão na corte londrina, Carvalho e Melo seria enviado como emissário para Viena de Áustria entre 1745 e 1749. Os anos de atividade diplomática nos dois países proporcionaram-lhe um conhecimento profundo da política europeia da época e uma mais nítida tomada de consciência do enorme atraso do seu país natal relativamente a outras nações. Mas além da experiência política, o futuro conde de Oeiras (1759) e marquês de Pombal (1769) aproveitou estas estadias no estrangeiro para se munir de uma boa preparação teórica. Tal como sucedeu com outros diplomatas portugueses de Setecentos, a permanência em meios ilustrados e livres da censura inquisitorial possibilitaram-lhe novas leituras, cuja influência viria a ser determinante na estruturação do seu pensamento de estadista moderno4.

Constituiu, assim, uma vasta biblioteca, com numerosos livros de cultura geral, mas também com muitos outros sobre ciência política, incluindo diversas obras de teóricos do poder absoluto esclarecido e ainda outras de teor económico, versando finanças, assuntos coloniais, alfândegas, manufaturas e agricultura5. Além disso, as relações com intelectuais e negociantes da comunidade judaica londrina, de origem portuguesa, poderão tê-lo influenciado a valorizar o lucro como princípio do desenvolvimento económico6.

Deste modo, quando em 1750 foi chamado a integrar a primeira equipa ministerial nomeada por D. José7, possuía um conjunto bem definido de ideias sobre as grandes questões dos diversos domínios da governação, que tentaria implementar durante os 27 anos do reinado josefino. De todas essas medidas reformadoras, abordaremos apenas as que tiveram maior impacto na comunidade dos negociantes britânicos de Lisboa.

 

2 - A FEITORIA BRITÂNICA DE LISBOA: UMA BREVE CARATERIZAÇÃO

Os britânicos designavam por “factory”, traduzida na época por “feitoria”, a comunidade de homens de negócio da sua nacionalidade estabelecidos numa determinada localidade. Em Portugal, as feitorias mais importantes localizavam-se em Lisboa e no Porto, embora a de Coimbra e a do Funchal tivessem ainda alguma relevância8.

Por volta de 1770, a Feitoria de Lisboa era constituída por 102 casas de negócio, de acordo com uma relação inserida no códice 692 da Coleção Pombalina da Biblioteca Nacional de Portugal9. Pelo menos 21 desses estabelecimentos eram geridos por sociedades. 20 destas possuíam dois sócios, frequentemente irmãos; e uma três sócios. 69 negociantes aparecem assinalados como solteiros. Aparentemente habitavam sozinhos. E pelo menos alguns destes podiam permanecer apenas temporariamente em Lisboa, como representantes de casas comerciais britânicas. Os restantes viviam na companhia de um ou vários familiares, quase sempre a mulher e os filhos, mas por vezes também irmãos, sobrinhos, netos e mais parentes.

Daqueles, 46 estabelecimentos possuíam entre um a três caixeiros da mesma nacionalidade. As outras casas comerciais poderiam contar com a colaboração de familiares, pois a ausência de tais empregados é mais notória nos agregados com vários elementos masculinos. No entanto, uns e outros teriam ao seu serviço caixeiros portugueses, em exclusivo ou a par dos de origem inglesa. Em 1770, Denis Connell (f. 223v.) possuía um empregado de comércio português, Domingos Lourenço Martins10. E em 1774, a firma Start & Buller possuía pelo menos dois caixeiros: o português Bernardo Gomes e o inglês Guilherme Folliot11.

Algumas unidades familiares eram numerosas. Luís Arnold Majendie vivia com a mulher, cinco filhos e um caixeiro (f. 223); Samuel Barcley, provavelmente viúvo, tinha a companhia do irmão Jorge, da mãe e de dois filhos; e Domingos Joyce, solteiro, coabitava com a irmã e três sobrinhos (f. 224).

A única cabeça de casal feminina deste grupo era a viúva Ana Brown, que morava com dois sobrinhos, em quem provavelmente delegara a gestão do negócio deixado pelo marido (f. 224).

Entre os comerciantes arrolados destacam-se: Francis Ibbetson (f. 224), cônsul britânico na corte portuguesa entre 176412 e pelo menos 177313. O industrial William Stephens (f. 223v.), fundador da fábrica de vidros da Marinha Grande, para a qual a Junta do Comércio, por alvará régio de 7 de julho de 1769, concedeu um subsídio de 8.000 cruzados14. O “comerciante milionário” Gerard de Visme (f. 223v.), que juntamente com o seu sócio David Purry e um terceiro, de apelido Melish15, alugara depois de 1755 a Carvalho e Melo, as casas nobres que este possuía na rua Formosa (hoje rua do Século) para aí estabelecerem o seu negócio, quando o estadista se transferiu para a Ajuda16. Posteriormente, Visme construiria um palácio em S. Domingos de Benfica, famoso na época pelos seus jardins17 e mais tarde adquirido pela infanta D. Isabel Maria, irmã dos reis D. Pedro IV e D. Miguel18 e regente do reino entre 1826 e 1828. Saliente-se ainda outro abastado negociante, Tomás Horne (f. 223v.). Este último, admitido na Feitoria Britânica de Lisboa em 1769, viria a ser agente e banqueiro de William Beckford e frequentaria a corte portuguesa durante o reinado de D. Maria I19.

Embora Portugal mantivesse com a Inglaterra uma balança comercial desfavorável, este país tinha a vantagem de comprar muito do que produzíamos e de vender aquilo de que precisávamos. Por isso era o nosso parceiro preferencial, com quem traficávamos a maior variedade de produtos. Vigiado e disciplinado por Pombal mas também protegido por razões económicas e políticas, o comércio anglo-luso aumentou ao longo do reinado josefino o volume das transações, apesar dos esforços da França para combater o predomínio da sua rival. A comprovar esta supremacia está o facto de mais de metade dos navios estrangeiros entrados no porto de Lisboa entre 1751 e 1775 serem ingleses20.

Os britânicos dedicavam-se, sobretudo, ao comércio por grosso de importação e exportação, embora por vezes também vendessem a retalho. Exportavam principalmente de Inglaterra mas também de outros países para Portugal: cereais (trigo, milho, cevada e aveia), farinha, vinho, toucinho, carne de vaca, bacalhau da Terra Nova, manteiga, queijo, pescada seca, arroz, arenque, biscoito, feijão, aguardente, favas, ervilhas, vinagre, sebo, óleo, sabão, ferro, garrafas, papel, esparto, casquinha, linho, cânhamo, carvão de pedra, chumbo, cobre, pólvora, panelas, louças, arcos de ferro, aduelas, remos, tecidos, entre outros produtos. Do mesmo modo, importavam de Portugal para Inglaterra, mas também para grande parte da Europa, para os Estados Unidos e o Canadá, vinho, fruta, sal, cebolas, sola, telha, pedra, fazendas e produtos coloniais, que até à abertura dos portos brasileiros ao comércio internacional, ocorrida em 1808, tinham necessariamente de passar por Portugal. Entre estas mercadorias contam-se: o algodão, o açúcar, o tabaco, madeiras, o café, o arroz, carnes secas e salgadas, plantas tintureiras, couros, solas e atanados21.

Alguns especializavam-se em determinados géneros, como Carlos Molloy, negociante de vinhos e vinagres, estabelecido no sítio do Braço de Prata, nos subúrbios da capital22. Em 1770 e em anos anteriores, o negociante Francis Arbwin (f. 223) comerciava principalmente com Londres. Mas mantinha transações regulares com Amiens, Paris, Reims, Sédan, Beauvais, Mans, Lyon, Abeville, Exetter, Londres, Norwick, Amesterdão e Veneza23. A firma Purry & Visme (f. 223v.) conseguira, já depois do terramoto, assegurar o contrato do pau-brasil, com o qual adquirira “uma imensa fortuna”24. E Tomás Horne, também já acima referido, comparticipara, com um primo da mesma nacionalidade, José Still, no contrato oficial para a exploração do óleo de baleia, com o qual por certo também lucrara bastante25.

Os testemunhos dos estrangeiros que por estes anos visitaram Portugal ajudam-nos a conhecer a vida desta comunidade no nosso país, incluindo o seu relacionamento com os naturais. O artista, arqueólogo e arquiteto inglês James Murphy, que permaneceu em Portugal entre 1788 e 1790, antes de estabelecer residência definitiva em Lisboa26, descreve como o típico comerciante britânico passava o tempo: ia à missa às oito horas, à bolsa às onze e almoçava pela uma da tarde; fazia em seguida uma sesta até às 15 horas; depois petiscava “um fruto”; e jantava pelas 21 horas. Nos intervalos, trabalhava no seu gabinete, efetuava visitas ou jogava27. Aos domingos, tanto os homens de negócio ingleses como os estrangeiros em geral, davam “o seu passeio pelo campo (…) com as damas”. Encontravam-se num determinado local previamente combinado, onde haviam encomendado um jantar. Aí comiam, bebiam e dançavam “alegremente”. Jogavam às cartas e regressavam à noite “sem comunicarem com os habitantes”28.

Os portugueses, por seu turno, não tinham o hábito de se reunirem. Encontravam-se raramente e menos ainda com estrangeiros. “As suas maneiras sociais” eram “tristes”. Era difícil a um forasteiro ser acolhido numa casa lisboeta29. Apesar de conviverem pouco, os nacionais mantinham “relações amigáveis” com os indivíduos de outras nações radicados em Lisboa, principalmente com os ingleses, como nos informa Arthur William Costigan. Mas acrescenta que a maioria destes membros da comunidade britânica, apesar de viverem em Portugal há 20 ou 30 anos, apenas conheciam algumas palavras de português30.

O pastor protestante sueco Carl Israel Ruders trata os ingleses com maior dureza. Conta que falavam geralmente dos portugueses “com desprezo”. Mas embora os admire pelas suas qualidades de trabalho, considera-os “altamente ignorantes em tudo o que diz respeito aos outros povos”. Faziam sempre apreciações negativas dos estrangeiros, além de desdenharem as suas línguas, os seus costumes e as suas qualidades31. Esclarece-nos ainda que muitos possuíam em Lisboa casas de comércio, que tinham estabelecido ou herdado de familiares e até de antigos patrões ou recebido por casamento ou por participação na firma. A maioria das heranças, no entanto, processava-se de pais para filhos, muitos dos quais, já nascidos em Portugal, continuavam na administração das casas paternas.

No entanto, a comunidade britânica de Lisboa ultrapassava largamente o número restrito dos membros da Feitoria. Esta escassa centena de famílias não atingiria 30% dos agregados familiares de origem anglo-saxónica residentes na capital portuguesa32. Com efeito, esta elite socioeconómica era servida por uma multidão de compatriotas, entre médicos, cirurgiões, boticários, construtores e carpinteiros navais, engenheiros, guarda-livros, tripulantes de navios, mestres de velas, fornecedores de múltiplos apetrechos náuticos, estalajadeiros, proprietários de casas de pasto, artífices das mais diversas especialidades e prestadores de todo o tipo de serviços, o que tornava esta comunidade praticamente autossuficiente.

Numa exposição da Junta Geral da Feitoria dirigida em 1764 ao então ainda conde de Oeiras, são referidos os compatriotas britânicos estabelecidos em Lisboa com “Casas de Pasto decentes para receberem os Capitaes, Officiaes, e Mestres dos Navios Estrangeiros, em huma Terra onde semelhantes Conveniencias se não encontram estabelecidas pelos Nacionaes della” e que por isso “se fazem tão precisas como a Porta de desembarque” dos navios33.

Estribados nos exuberantes privilégios usufruídos em Portugal, os homens de negócios anglo-saxónicos, até meados de Setecentos, tentaram agir no nosso país como se estivessem em terra ocupada ou sem leis. Esperavam, para o efeito, a condescendência dos governos de D. Pedro II e de D. João V, motivada por imperativos de natureza política. E contavam com a passividade e até cumplicidade do funcionalismo camarário lisbonense, facilmente conquistadas pelo suborno.

Mesmo assim, nem sempre conseguiam os seus objetivos. Pressionado pelas queixas dos mercadores nacionais ou de outras nações, motivado pela necessidade de aumentar as receitas camarárias ou simplesmente desejoso de fazer valer a sua autoridade, o Senado da capital exercia algum controle sobre a atividade dos britânicos, evitando que agissem com total impunidade. Comprovam-no as queixas frequentes dos cônsules e embaixadores do rei de Inglaterra, formuladas àqueles dois monarcas portugueses em nome dos mercadores seus compatriotas, sobre a atuação da Câmara de Lisboa em diversas situações: o impedimento da venda de couros provenientes de Inglaterra, contrariamente ao estabelecido nos tratados de paz celebrados entre os dois países34; a proibição de venderem as suas mercadorias onde quisessem e pelo preço que entendessem35; a apreensão de cereais, praticada pelo juiz do Terreiro do Trigo36; a obrigatoriedade de fazerem os seus seguros na Casa dos Seguros da cidade, tendo assim de pagar a respetiva corretagem37; a proibição do desembarque de certas mercadorias38; a interferência dos oficiais da saúde na descarga do trigo dos seus navios39; a obrigatoriedade de sujeição a certas posturas municipais, reguladoras das taras dos barris da manteiga40; ou a falta de apoio na descarga do sal e do bacalhau41.

 

3 - A REAÇÃO DA FEITORIA AO REFORMISMO ECONÓMICO POMBALINO

A implementação gradual da política de poder absoluto esclarecido, ao atenuar ou eliminar privilégios e ainda conferir maior autoridade ao funcionalismo régio e camarário e aos magistrados judiciais no exercício da sua jurisdição, veio reforçar consideravelmente a ação fiscalizadora em relação aos reinados anteriores, afetando significativamente os interesses da Feitoria Britânica. Habituada a atuar com mais à-vontade e impunidade, esta poderosa e influente comunidade de homens de negócio vai acentuar a arrogância e a hostilidade em face do novo estilo de governação, envolvendo ainda mais na refrega os representantes diplomáticos londrinos.

Pombal, numa “Observação” sobre os abusos dos estrangeiros42, sem data mas provavelmente produzida nos seus primeiros anos de governo, considerava que os alcaides, meirinhos e outros oficiais de justiça portugueses faltavam frequentemente aos seus deveres. Apontava como razão principal do seu modo de atuação o facto de ganharem “pella Tarifa antiga”43, que considerava manifestamente insuficiente. E de os estrangeiros tirarem todas as vantagens possíveis dessa situação, “corrompendo huns officiaes e enganando outros”, fazendo-lhes acreditar que gozavam de privilégios que os isentavam da sua jurisdição. Por isso agiam “quazi absolutamente sem medo das Justicas”. Exceto no caso de “crime gravíssimo e publico, no mais tem pouco medo ou nada que temer”44.

Em pouco tempo, porém, a situação alterou-se. Como os seus ordenados passaram a consistir numa percentagem das multas aplicadas ou dos géneros apreendidos, os oficiais alfandegários e de justiça tornaram-se bastante mais zelosos no cumprimento do dever. Então, quase de imediato, surgiram as acusações dos comerciantes estrangeiros, principalmente ingleses, sobre a prepotência e a arbitrariedade de tais funcionários, até então bastante mais dóceis e submissos. Passaram a ser acusados de violarem, de forma arrogante e arbitrária, os tratados anglo-lusos e os privilégios dos cidadãos britânicos, que o poder absoluto de Pombal algumas vezes preteria às leis régias e até aos regulamentos camarários.

Todas estas alterações geraram naturalmente uma mudança de atitude por parte dos embaixadores da corte londrina. Pressionados pelas queixas dos compatriotas, não se coibiam de defender “até ao descaramento” os interesses britânicos, através de exposições verbais e escritas apresentadas aos ministros de D. José, “numa atitude arrogantemente intrometida” nos assuntos internos de um Estado soberano45.

O combate às diversas formas de contrabando intensificou-se. Em 1759, o secretário de Estado D. Luís da Cunha ordenou à Câmara o encerramento de uma taberna situada “a borda do Rio” na freguesia de S. Paulo, propriedade de três ingleses, que servia de disfarce a um “pernicioso commercio”, proibindo-os de abrirem outra, na cidade ou nos seus subúrbios46. Por seu turno, os oficiais alfandegários passaram a apreender somas avultadas de dinheiro, achado na posse de tripulantes dos navios britânicos e provavelmente destinado ao comércio ilícito. Os lesados apelaram para os tribunais. Mas contrariamente ao esperado e após demandas demoradas e dispendiosas, em 1758 e em 1759 foram proferidas sentenças no sentido de o dinheiro apreendido ser distribuído em duas partes iguais, uma para a Fazenda Real e outra para os autores da apreensão47.

Tais procedimentos alarmaram os negociantes da Feitoria. Depois de protestarem sem resultado junto das autoridades portuguesas, enviaram em 1760 uma exposição ao secretário de Estado William Pitt, por intermédio do conde de Kinnoull, embaixador britânico em Lisboa. Queixavam-se “da perigosa situação em que se achavam as suas Pessoas e Bens” em face das novas atitudes das autoridades. E avisavam que o comércio com Portugal, “tão vantajoso à nossa Nação”, ficava em risco perante tais “Tomadias” e “Confiscações”. Exprimiam a sua surpresa relativamente aos novos poderes dos oficiais, por eles considerados “pessoas indigentes”, empenhadas nas apreensões por receberem uma parte delas. E apelavam à intervenção do ministro britânico para fazer anular estes precedentes perigosos, de modo a que as sentenças fossem revistas, o dinheiro devolvido e os autores da apreensão punidos48.

Aparentemente, os negociantes anglo-saxónicos não compreendiam ou não queriam compreender a nova realidade com que teriam de passar a conviver. Eram, juntamente com os holandeses, os únicos estrangeiros a possuir juiz privativo, regalia de que outras comunidades tentaram, sem êxito, usufruir. Este magistrado detinha, desde o reinado de D. Fernando, jurisdição exclusiva em todos os casos cíveis e criminais, exceto os que pertencessem à Fazenda Real. O tratado de 1654 acrescentara a proibição de serem passados mandados de prisão, de penhoras, de “casas buscadas” ou de outros atos judiciais contra vassalos do rei de Inglaterra sem a ordem ou o consentimento escrito do juiz conservador. Atribuíra ainda a este oficial a competência para julgar todas as causas relativas aos ingleses, das quais apenas haveria apelação para a Relação, onde as mesmas deveriam ser concluídas em quatro meses. E determinara que nenhum oficial de justiça português poderia prender um súbdito britânico sem ordem escrita do mesmo juiz conservador, a não ser se fosse apanhado em flagrante a cometer algum crime49.

Pombal, na “Observação” que temos vindo a citar, formulava duras críticas aos poderes excessivos de tais magistrados. Como os seus procedimentos estavam dependentes das queixas, informações ou detenções praticadas pelos oficiais subalternos, não as havendo nada podiam fazer. Ora os seus únicos subalternos eram os escrivães, “que não sahem dos seus Escriptorios, onde vivem dos Estrangeiros e das suas desordens”. E assim estes defraudavam sistematicamente as “Leis do Reino”. Além do mau exemplo dado a outros estrangeiros sem as mesmas regalias, tornavam-se “odiosos” aos olhos dos portugueses “com a consequência da discordia”, tão frequente na época entre os súbditos das duas nações50. Por isso entendia que esses juízes, posto que pagos pelos países para os quais trabalhavam, eram “Ministros de El-Rei e naturaes do Reino”. Tinham a obrigação de seguir as “instruçoens e ordens” de Sua Magestade, de usar da sua jurisdição nos termos e limites das leis régias, sendo ainda obrigados, pelos ditames do direito natural e civil, “a promoverem os interesses da Patria e a deffendella (…) das violências e jacturas” dos ingleses51.

Por um decreto de 15 de maio de 1752, os estrangeiros passaram a estar “subordinados” ao Senado da Câmara de Lisboa em tudo o que respeitava a assuntos de polícia. De imediato, os britânicos passaram a considerar-se “muito escandalosamente ultrajados pelos infinitos Officiaes” camarários. Sob as ordens de um “Homem nascido do pó”52, entravam “infinitas vezes” nas suas casas comerciais “a tirar coisas” e a condená-los sob aquilo que consideravam serem “os mais frívolos pretextos”. A resistência a tais inspeções passara entretanto a ser “crime Capital”. Além disso, a invocação dos privilégios de cidadãos britânicos só fazia “augmentar a insolência” destes “Officiaes inferiores”53.

Os procedimentos dos funcionários da saúde designados pela Câmara para inspecionarem a qualidade dos víveres importados eram também alvo de críticas. O tratado de 1654 determinava que no caso de controvérsia sobre o estado do peixe ou de outros produtos comestíveis, esta seria resolvida por dois cidadãos portugueses, designados pelo magistrado que superintendesse na alfândega e pelo cônsul britânico. Todavia, os empregados do “Tribunal da Saude” arrogavam-se o direito de julgar sem apelação a qualidade do peixe e do trigo, “mandando lançar ao Mar como Corruptos” e estabelecendo multas e mais despesas de custas, tudo “para a ruina dos seus donos”54.

Outra lei, de 30 de outubro do mesmo ano, veio limitar os poderes dos juízes conservadores, ao impedi-los de passar contramandados impeditivos da execução de escritos ou ordens passadas pelos juízes comuns, sob pena de seis meses de suspensão da sua atividade. Mesmo as sentenças dos juízes conservadores, quando conseguidas, deixavam na prática de ter efeito, pois as apelações para a Relação, contrariamente aos quatro meses estipulados no tratado de 1654, podiam demorar anos, ficando entretanto a sentença suspensa55. Os membros da Feitoria queixavam-se ainda do aumento considerável das despesas “sobre os navios”, que atingiam o “dobro” das anteriormente praticadas. Tal subida também contradizia o acordo anglo-luso de 1654, que dispensava as embarcações britânicas de ancoragem, despesas dos portos e outros direitos56.

A criação da Junta do Comércio e das companhias monopolistas foram no entanto as iniciativas que mais apreensões causaram aos negociantes britânicos de Lisboa e aos seus representantes diplomáticos. Este tribunal superior foi criado a 30 de setembro de 1755, data da publicação dos seus estatutos. Era constituído por 11 homens de negócio, dotados de bons cabedais. Sendo de nomeação régia, estavam muito mais identificados e envolvidos com os interesses estatais que os membros da entretanto extinta Mesa do Bem Comum, criada no tempo de D. João V57.

Além das iniciais funções consultivas relativamente às atividades comerciais, a Junta do Comércio viu gradualmente ampliarem-se as suas competências. Superintendia no comércio; reprimia o contrabando; intervinha na importação de produtos manufaturados; inspecionava a atividade das alfândegas; aprovava a abertura de lojas em Lisboa; concedia licenças para o exercício de atividades fabris; autorizava o estabelecimento na mesma cidade de negociantes; e superintendia na partida de frotas para o Brasil58.

Dotada de tão amplos poderes, passou inevitavelmente a ser incluída nas queixas dos britânicos. Consideravam--na contrária às antigas leis do reino e aos privilégios incluídos no tratado de 1654. Este acordo anglo-luso, no seu artº 5º, facilitava aos britânicos a cobrança de dívidas aos portugueses. Mas este novo tribunal, que também superintendia nas falências, protegia os devedores nacionais. Impedia o confisco de bens previsto no tratado. Concedia aos devedores moratórias que se prolongavam durante anos. E acabava muitas vezes por os absolver do pagamento. Deste modo, os britânicos ficavam privados de “huma grande parte dos seus Capitaes”. Porém, nada adiantava o recurso para o juiz conservador, cujas sentenças nunca eram cumpridas59.

Mas a criação das companhias monopolistas do Grão-Pará e Maranhão (1755) e de Pernambuco e Paraíba (1759)60 alarmou ainda mais os negociantes britânicos de Lisboa. Instituídas com o objetivo de eliminarem a concorrência comercial das grandes potências e assim facilitar o acréscimo da entrada das divisas de que Portugal tanto carecia, tinham o exclusivo do fomento agrícola e do comércio nas respetivas áreas de domínio61. Deste modo, passaram a dificultar a ação dos ingleses. Segundo as suas previsões, o “Comercio clandestino” no Brasil, tão “ avantajoso, e lucroso”, ficaria “infalivelmente perdido” com o monopólio de tais companhias. Os “Negociantes particulares” britânicos extraíam até então “grandes lucros” com esse comércio, que compreendia “huma grande quantidade de géneros” e fazia com que chegassem a Inglaterra “immensas sommas de Prata”, precisamente o que Pombal pretendia evitar. Mais uma vez, os negociantes britânicos invocavam o tratado de 1657, no qual se estabelecia que o comércio inglês com o Brasil seria “geral e livre”. E preconizavam que as companhias fariam “reduzir a Balança do nosso Comercio a huma igualdade da de Portugal”62.

Esse equilíbrio económico tão receado pelos britânicos e do mesmo modo desejado pelas autoridades lusas esteve sempre longe de se concretizar63. Mas a ação das companhias, reforçada pela carta régia de 19 de abril de 1761 sobre as providências a adotar pelos governadores do Brasil para “acautelar os Contrabandos”64, teve pelo menos o mérito de dificultar o contrabando britânico. Podemos comprová-lo pelas frequentes detenções de “marinheiros” e “piratas” desta nacionalidade nos diferentes portos do Brasil. Recambiados para Portugal, ficavam detidos na prisão do Limoeiro. Eram objeto das insistências dos diplomatas britânicos junto do marquês de Pombal, em certos casos para que os mandasse soltar com o argumento da falta de provas, noutros para que fossem entregues às autoridades britânicas, a fim de serem julgados em Inglaterra65.

 

4 - O CASO DE DENIS CONNELL

O episódio ocorrido com o negociante irlandês Denis Connell é um exemplo bastante expressivo do modo como a Feitoria Britânica de Lisboa reagiu ao reformismo do reinado de D. José e da firmeza com que tal política foi defendida pelas autoridades municipais e pelo governo central.

Carl Ruders, na sua Viagem em Portugal já anteriormente citada, informa-nos de que os ingleses não queriam ser confundidos com os irlandeses, embora estes tivessem também nacionalidade britânica. E se havia “muitas casas ricas” entre aqueles, já no respeitante aos irlandeses eram “raros os negociantes com fortuna”66. Denis Connell, sócio da casa Connell & Morroney, incluía-se certamente neste grupo restrito de irlandeses abastados, pois o encarregado de negócios John Hort considerava-o, em carta enviada em 1770 ao marquês de Pombal, “un des principaux des negociants Britaniques etablis dans Lisbonne”67.

Connell foi preso pelo almotacé das execuções camarárias José António de Castro, a 4 de agosto de 1770, por se ter recusado a assinar as verbas do registo geral de géneros que vendera, bem como a pagar a taxa correspondente aos corretores do número68. No mesmo dia, o preso, apoiado pela comunidade dos homens de negócio britânicos estabelecida na capital portuguesa, apresentou uma queixa à Câmara contra a sua detenção69. Na exposição, justificava a recusa em assinar as verbas por dois motivos. O primeiro, por os corretores não terem intervindo nas vendas e as leis lhes proibirem o lançamento das verbas das transações em que não tinham participado. Mas estes oficiais, interessados apenas no recebimento do salário sem se importarem em ser úteis ao comércio, ao tomarem conhecimento posterior das vendas através dos compradores, lançavam-nas na mesma, para auferirem indevidamente o valor correspondente. O segundo motivo, por se achar pendente no juízo da conservatória britânica uma causa interposta pela Feitoria sobre o mesmo assunto, ou seja, a pretensão dos corretores de cobrarem corretagem por todas as vendas, mesmo quando não tivessem participado nelas.

Entendia ainda o detido que o almotacé não possuía jurisdição para o obrigar a assinar e muito menos para o prender, pois apenas poderia fazer uma e outra coisa com autorização do juiz conservador. Até apresentara um mandado emitido pelo mesmo magistrado, a proibir a prisão dos cidadãos britânicos a pedido dos corretores, enquanto não terminasse a demanda acima referida sobre a mesma questão. Mas não conseguira com tal documento demover o almotacé. Considerava por isso a sua detenção atentatória dos privilégios dos súbditos britânicos consagrados nos antigos acordos entre os dois reinos. Acusava ainda José António de Castro de ter ofendido, em audiência pública, toda a nação britânica ao acusar os ingleses de serem “Huma corja de patifes insolentes”70.

Como o Senado lisbonense tivesse indeferido o agravo, Connell, sempre acompanhado pelos seus compatriotas da Feitoria de Lisboa, recorreu para o ministro plenipotenciário John Hort, que por seu turno escreveu a Pombal, denunciando, na língua diplomática, a “injustice criante” da prisão do irlandês71.

Apesar da movimentação de tais influências, Connell continuou detido, o que motivou, a 7 de setembro, nova missiva de Hort para o ministro josefino. O diplomata repetia as razões antes apresentadas pelo preso ao Senado camarário lisbonense. Acusava ainda o almotacé José António de Castro de ter afirmado em tribunal que os privilégios dos cidadãos britânicos eram nulos. E de ter dito, no meio de “insultes” contra a nação anglo-saxónica, que a sua autoridade bastava para os mandar a todos para a prisão, incluindo o próprio juiz conservador. Estranhava que tal pessoa não tivesse ainda sido suspensa de funções, quando o “irrepreensível” cidadão britânico já ia no seu 34º dia de detenção. Alertava para o perigo de tão longa clausura para a saúde do compatriota, devido às péssimas condições sanitárias da cadeia do Limoeiro. Por isso, pedia ao marquês a concessão de uma audiência, para lhe falar pessoalmente sobre este e outros assuntos respeitantes aos seus compatriotas72.

A 2 de outubro, Pombal recebia nova carta, desta feita de Londres, escrita pelo secretário de Estado William Henry Lyttelton. De forma menos diplomática e mais arrogante, o governante britânico emitia praticamente uma ordem ao ministro josefino para que libertasse Connell e castigasse exemplarmente o almotacé73.

Todavia, Carvalho e Melo não se deixou impressionar. Com uma calma esfíngica, escrevia a Hort, a 19 do mesmo mês, comunicando-lhe que ainda o não recebera, pois aguardava a consulta do Senado da Câmara de Lisboa, que teria obrigatoriamente de ser ouvido neste caso74.

Finalmente, a 12 de novembro, chegava às mãos do marquês a consulta da Câmara lisbonense, então presidida pelo seu filho mais velho, o 2º conde de Oeiras, Henrique José de Carvalho e Melo. Os membros do Senado esclareciam que o requerimento de Connell ocultava, sob “pretextos” d'estinados a “confundir a verdade no conceito das pessoas que, ou pela distancia ou pelas profissões, não podem conhecer o que tem passado” no respeitante à violação das leis económicas do reino. Remetiam para a “Resposta” do síndico da Câmara, que acompanhava a consulta. O parecer do jurista municipal merecera a total concordância da Câmara, ao ponto de esta não lhe ter acrescentado mais nada75.

Entendiam por isso que o requerimento devia ser objeto de indeferimento régio. Acusavam o preso de ter engendrado “um visível e artificioso plano de fraudes e de monopólios em generos comestíveis”. Com ele punha em causa o sustento quotidiano de nacionais e de estrangeiros residentes na capital portuguesa. Além disso, “as vendas clandestinas, cautelosas e ocultas” de tais géneros prejudicavam os negociantes “de todas as outras praças da Europa” que apercebendo-se de tais fraudes deixariam de enviar a Lisboa os seus comissários76.

Quanto ao síndico, na sua bem estruturada e fundamentada “Resposta”, começava por contestar a opinião de Connell sobre os corretores do número77. Não eram, no entender do jurista municipal, “plebeos mercenários e simples Agentes das compras e das vendas dos Negociantes”, mas antes “huns officiaes nobres com o caracter de Cidadoens, e Pessoas de Authoridade”78. Os negociantes não deviam incumbi-los de lhes arranjar compradores para os seus géneros nem de efetuar quaisquer outras diligências, pois não eram eleitos por eles mas antes representantes “do Corpo do Senado da Camara de Lisboa”, o qual lhes dera sempre “Regimentos uteis para a economia das Mercadorias” que entravam na cidade79.

Como inspetores do Senado, competia-lhes a elaboração do registo público e geral dos comestíveis introduzidos em Lisboa, das pessoas que os compravam, de quando eram vendidos e por que preço. Este controle era vantajoso para os consumidores e para os negociantes por grosso, incluindo os estrangeiros. Deste modo ficava a todos garantida a qualidade dos géneros e o seu preço de venda. Evitavam-se o monopólio, o açambarcamento e a especulação80. Além disso, assegurava-se a retenção da terça parte desses géneros de “primeira necessidade”, para serem vendidos no “Mercado Publico em beneficio da' Cidade”81.

Os exportadores estrangeiros só teriam a beneficiar com esta fiscalização. Ficavam a saber exatamente por que preço eram os seus produtos vendidos, evitando-se assim as fraudes dos seus comissários. Estes, sem tal controle, dariam conta das vendas por um preço inferior ao real, ficando com o lucro pertencente de direito ao exportador. Omitida a ação dos corretores, “a cidade pereceria à fome”. O “Commercio se reduziria a confusão de pleitos entre compradores e devedores”82. As importações diminuiriam, pelo receio dos exportadores das “más contas dos seos Commissarios”83. Mesmo a “Bolsa de Londres” sairia prejudicada “com fraudes sobre os géneros, que os bons e legítimos Mercadores dela” enviavam para Lisboa84.

O síndico rebatia também a afirmação do irlandês acerca do almotacé, considerado por este “outro baixo Individuo da Plebe da Cidade”, quando na realidade estes oficiais camarários eram “Magistrados (…) Nobres e Cidadoens (…) os mais consideráveis entre eles”. Invocava as Ordenações do reino85 para explicar que na maior parte dos concelhos o cargo era exercido pelos vereadores e o procurador que acabavam o mandato anual. Só não se passava o mesmo em Lisboa, pois os membros da governança eram insuficientes para o grande trabalho exigido aos almotacés da capital. Mas enquanto cidadãos nobres “escolhidos pelos seos bons costumes”, equiparava-os aos edis da República de Roma e aos xerifes de Londres86. Tal como estes possuíam “huma completa jurisdição económica executiva”, para “tirarem Devassas contra todos os transgressores das Leys da cidade”; e para os “fazerem prender”, quando transgredissem essas leis87.

E concluía a sua extensa exposição, argumentando que Lisboa, tal como todas as cidades regidas por leis de polícia88, não poderia deixar de ter magistrados “com jurisdição para vigiarem sobre a execução das suas Leys económicas, e para cohibirem os transgressores delas”. Finalmente, em nome da “necessidade publica”, considerada “Ley Suprema”, justificava o facto de nenhum privilegiado poder ficar isento do juízo da almotaçaria89.

Quando o marquês de Pombal recebeu finalmente John Hort em sua casa, a 12 de novembro, deu-lhe a ler a consulta da Câmara e o parecer do síndico. O diplomata compreendeu-os perfeitamente “em toda a sua força”90. No dia seguinte, o ministro de D. José escreveu uma carta ao congénere londrino Lord Lyttelton, por cujos termos dava a entender considerar encerrada a questão. Anexava-lhe uma cópia da consulta da Câmara. Explicava as deturpações da verdade contidas na queixa de Connell. Demonstrava de que modo pretendia o irlandês subtrair--se à jurisdição económica municipal, da qual nenhuma nação nem pessoa da mais elevada categoria poderiam ser isentas. Por fim, justificava o afastamento do juiz conservador do processo, com o facto de os assuntos de economia interna pertencerem exclusivamente aos almotacés, enquanto delegados do Senado camarário lisbonense, à semelhança do que era praticado “dans toutes les grandes villes de l’Europe”91.

Contudo, o poder central nem sempre dava razão ao Senado nos seus múltiplos conflitos com estrangeiros, censurando até o excesso de zelo dos almotacés92. Por isso, a firmeza do seu apoio às decisões municipais neste caso concreto, apesar de tal atitude implicar um conflito diplomático com a “velha aliada” que conduziu ao envolvimento direto do ministro de D. José, só reforça a suposição da gravidade das transgressões praticadas pelo irlandês.

Denis Connell acabaria por ser solto em data que não conseguimos precisar, mas certamente sem cedências da parte das autoridades camarárias. O seu caso, pela visibilidade atingida e pelo envolvimento de diplomatas e de membros do governo de ambos os países, representou um exemplo para os negociantes britânicos e de outras nações radicados em Lisboa e no país em geral. Constituiu, ainda, uma oportunidade para o marquês de Pombal demonstrar, perante os seus poderosos e arrogantes aliados, quem ditava as regras em território luso.

Ultrapassado o impasse, Connell continuou a trabalhar e a viver entre nós durante muito tempo, o que nos ajuda a confirmar o exagero das suas queixas. Habitou longos anos em umas casas nobres com quintal, na rua Fresca, junto à rua de S. Bento, na freguesia de Santos-o-Velho. O edifício constava de loja de entrada e dois armazéns no andar térreo, por cima do qual ficava o andar onde morava. Em 1801 comprou-as à antiga senhoria, para aí continuar a residir93.

 

5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em nome da dignificação e reforço do poder da Coroa, Sebastião José de Carvalho e Melo passou a conferir, desde o início do reinado de D. José, mais autoridade ao funcionalismo régio e camarário que servia na justiça, na administração pública, nas alfândegas e na fazenda real94. Estes, por seu turno, passaram a empenhar-se mais na vigilância do cumprimento das leis, atalhando abusos e combatendo irregularidades até então impunes, praticadas muitas delas por estrangeiros, incluindo os negociantes britânicos de Lisboa.

Os tratados anglo-lusos estabelecidos entre 1640 e 1703, assinados em troca do apoio britânico à nossa recém- -conquistada e ainda frágil independência, conferiam enormes vantagens económicas aos ingleses, acompanhadas de exuberantes prerrogativas nunca conseguidas por outras nações.

Ao pretender disciplinar e modernizar a sociedade portuguesa, atalhando muitas das prerrogativas do clero95 e da nobreza96, o ministro josefino não podia deixar impunes os privilégios dos estrangeiros nem tolerar-lhes abusos proibidos aos nacionais.

O reforço do poder do Estado dependia principalmente do aumento das suas receitas. Este foi, por isso, um dos principais desígnios de Pombal, incentivado ainda pela quebra das remessas do ouro do Brasil. Com esse objetivo, aumentou as taxas alfandegárias; aboliu as isenções ainda existentes ao seu pagamento por parte das embarcações inglesas; e tomou medidas rigorosas no respeitante à cobrança de impostos e ao combate ao contrabando97. Criou a Junta do Comércio e as companhias monopolistas com vista à defesa do comércio nacional, incluindo o ultramarino98. E impulsionou o desenvolvimento manufatureiro, de modo a diminuir as importações99. Todas estas medidas afetaram ainda que temporariamente a Inglaterra, a nossa principal parceira económica. Mas a proibição imposta aos britânicos de comerciarem com o Brasil acabou por trazer a Portugal mais comerciantes dessa nacionalidade e fazer afluir aos nossos portos um maior número de navios anglo-saxónicos.

Sobre as vantagens atribuídas aos ingleses no tratado de 1654 e sistematicamente invocadas pelos súbditos britânicos, Pombal, nas suas reflexões, considerava que era habitual, por direito e costume “derrogarem os Senhores Reyes semelhantes Privilegios quando assim o pede a necessidade ou o interesse publico do seu Reyno”. Por isso, seria “couza nunca vista” pretenderem os ingleses em Portugal ter regras contrárias às da sociedade civil e contra o que se praticava em Inglaterra com os vassalos do rei português100.

Considerava, assim, que os ingleses tinham sido os primeiros a violar os tratados anglo-lusos. No reinado de Carlos II proibira-se a entrada dos navios e géneros estrangeiros nos portos das colónias inglesas, debaixo de graves penas. Por isso, se os portugueses não podiam navegar para as colónias de Inglaterra e nelas comerciarem, do mesmo modo também os ingleses não seriam autorizados a navegar para as colónias e domínios de Portugal e aí introduzirem as suas mercadorias101.

Apesar da sua firmeza face às pretensões britânicas, Pombal não pretendia o equilíbrio da nossa balança comercial com a Inglaterra, como exageradamente temiam os negociantes ingleses de Lisboa. O nosso estadista sabia bem que tal igualdade seria impossível de concretizar, face à debilidade estrutural da nossa economia e à inexistência de um grupo mercantil forte, capaz de assegurar o desenvolvimento manufatureiro e o comércio marítimo. Mas além de impraticável, essa situação também não era desejável, pois Portugal continuava a necessitar do apoio político da Grã-Bretanha para manter o império colonial e em períodos mais críticos a própria independência.

O que o ministro josefino pretendia (e em parte conseguiu) era atenuar o enorme desequilíbrio comercial entre as duas nações; diminuir a dependência económica portuguesa face à Grã-Bretanha; e extinguir os enormes privilégios dos britânicos em Portugal. Os seus direitos “exuberantes” geravam abusos e irregularidades de toda a espécie. Punham em causa a autoridade do oficialato régio e camarário e por conseguinte a das próprias instituições que estes serviam. E colocavam os nacionais em situações de humilhante desvantagem. Em suma, eram incompatíveis com a política absolutista de disciplina e contenção social e de dignificação da autoridade régia que o marquês de Pombal tanto se esforçava por consolidar.

 

FONTES E BIBLIOGRAFIA

Fontes manuscritas

 

Arquivo Municipal de Lisboa

Livro 9º de consultas e decreto de D. Pedro II.

Livro 18º de consultas e decretos de D. Pedro II.

Livro 3º de consultas e decretos de D. João V do Senado Ocidental.

Livro 9º de consultas e decretos de D. João V do Senado Oriental.

Livro 13º de consultas e decretos de D. João V do Senado Ocidental.

Livro 1º de consultas e decretos de D. João V do Senado Oriental.

Livro 5º de consultas e decretos de D. João V do Senado Oriental.

Livro 9º de consultas e decretos de D. João V do Senado Oriental.

Livro 6º de registo de consultas e decretos de D. José I.

Livro 11º de consultas, decretos e avisos de D. José I.

Livro 12º de consultas, decretos e avisos de D. José I.

 

Arquivo Nacional da Torre do Tombo

Desembargo do Paço – Repartição da Corte, Estremadura e Ilhas

Maços 224, 261, 1600 e 1862.

 

ABiblioteca Nacional de Portugal

Coleção pombalina

Códices 93, 637 e 692.

 

Fontes Impressas

ALEXANDER, Boyd (introd. e notas) – Diário de William Beckford em Portugal e Espanha. 3ª ed. Lisboa: Biblioteca Nacional de Portugal, 2009.

RATTON, Jácome - Recordações e memórias sobre ocorrências do seu tempo, a estátua equestre de D. José e as fábricas de papel, caixas, fiação, chitas, pentes e relógios. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1920.

RUDERS, Carl Israel - Viagem em Portugal: 1798-1802. Lisboa: Biblioteca Nacional, 1981.

 

Estudos

ABREU, Laurinda – Pina Manique: um reformador no Portugal das Luzes. Lisboa: Gradiva, 2013.         [ Links ]

DIAS, José Sebastião da Silva – Pombalismo e projecto político. Lisboa: Centro de História da Cultura da Universidade Nova, 1984.         [ Links ]

FONSECA, Teresa – Absolutismo e municipalismo: Évora, 1750-1820. Lisboa: Colibri, 2002.         [ Links ]

FONSECA, Teresa – Relações de poder no Antigo Regime: a administração municipal em Montemor-o-Novo (1777-1816). Montemor-o-Novo: Câmara Municipal, 1995.         [ Links ]

LISBOA. Câmara Municipal - Livro das posturas antigas. Lisboa: C.M., 1974.         [ Links ]

MACEDO, Jorge Borges de – Companhias comerciais. In SERRÃO, Joel (coord.) - Dicionário de História de Portugal. Porto: Livraria Figueirinhas, [19--]. vol. 2, p. 122-130.         [ Links ]

MACEDO, Jorge Borges de - A situação económica no tempo de Pombal. 3ª ed. Lisboa: Gradiva, 1989.         [ Links ]

MADUREIRA, Luís Nuno – A sociedade civil do Estado: instituições e grupos de interesses em Portugal (1750-1847). Análise Social. Lisboa. Vol. 32 Nº 142 (1997), p. 603-624.         [ Links ]

MARCOS, Rui Manuel de Figueiredo – A legislação pombalina: alguns aspectos fundamentais. Coimbra: Almedina, 2006.         [ Links ]

MELO, Sebastião José de Carvalho e - Escritos económicos de Londres: 1741-1742. Lisboa: Biblioteca Nacional, 1986.         [ Links ]

MONTEIRO, Nuno Gonçalo – D. José. Lisboa: Círculo de Leitores [etc.] 2006.         [ Links ]

RAMALHO, Margarida de Magalhães – Os criadores da Pena: D. Fernando II e a condessa d’Edla. Sintra: Parques de Sintra – Monte da Lua, 2013.         [ Links ]

RIBEIRO, Jorge Martins – A comunidade britânica do Porto durante as invasões francesas (1807-1812). Porto: Fundação Eugénio de Almeida, 1990.         [ Links ]

RODRIGUES, Maria Teresa Campos (leitura e transcrição) – Livro das posturas antigas. Lisboa: Câmara Municipal, 1974.         [ Links ]

SAMPAIO, Francisco Coelho de Sousa e – Prellecções de direito patrio publico e particular, offerecidas ao serenissimo senhor D. João principe do Brasil. Coimbra: na Real Imprensa da Universidade, 1793.         [ Links ]

SANTOS, Piedade Braga; RODRIGUES, Teresa; NOGUEIRA, Margarida Sá - Lisboa setecentista vista por estrangeiros. 2ª ed. Lisboa: Livros Horizonte, 1996.         [ Links ]

SIDERI, Sandro - Comércio e poder. Lisboa: Cosmos, 1978.         [ Links ]

SILVA, Francisco Ribeiro da – Absolutismo esclarecido e intervenção popular: os motins do Porto de 1757. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1990.         [ Links ]

SILVA, Francisco Ribeiro da - Pombal e os Ingleses: incidências económicas e relações internacionais. In CONGRESSO O MARQUÊS DE POMBAL E A SUA ÉPOCA, Pombal, 1999; COLÓQUIO O SÉCULO XVIII E O MARQUÊS DE POMBAL, Oeiras, 1999 - [Atas]. Oeiras: Câmara Municipal; Pombal: Câmara Municipal, 2001. p. 137-157.         [ Links ]

SILVA, Francisco Ribeiro da – O Porto e o seu termo (1580-1640): os homens, as instituições e o poder. Porto: Câmara Municipal, 1988.         [ Links ]

SUBTIL, José – Atores, territórios e redes de poder, entre o Antigo Regime e o Liberalismo. Curitiba: Juruá Editora, 2011.         [ Links ]

TORRES, Rui d’Abreu – Stephens, Guilherme. In SERRÃO, Joel (dir.) – Dicionário de História de Portugal. Lisboa: Iniciativas Editoriais, 1971. vol. 4.         [ Links ]

 

submissão/submission: 12/01/2015

aceitação/approval: 09/04/2015

 

 

NOTAS

* Maria Teresa Couto Pinto Rios da Fonseca é doutora em História das Ideias Políticas pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Atualmente é investigadora independente. Tem mais de três dezenas de artigos e 11 livros publicados nas áreas da História Moderna e Contemporânea de Portugal. Correio eletrónico: mtcprfonseca@gmail.com

1 DIAS, José Sebastião da Silva – Pombalismo e projecto político. Lisboa: Centro de História da Cultura da Universidade Nova, 1984, p. 18, 21 e 159.

2 Idem, ibidem, p. 2-150.

3 MELO, Sebastião José de Carvalho e - Escritos económicos de Londres: 1741-1742. Lisboa: Biblioteca Nacional, 1986.

4 Sobre as ideias reformistas da elite política joanina oriunda da diplomacia, veja-se MONTEIRO, Nuno Gonçalo – D. José. Lisboa: Círculo de Leitores [etc.] 2006. p. 47-50.

5 DIAS, José Sebastião da Silva – Pombalismo e projecto político, p. 220-228.

6 Idem, ibidem, p. 112-114 e 213.

7 Acerca do contexto político da ascensão de Carvalho e Melo à esfera governativa, veja-se MONTEIRO, Nuno Gonçalo – D. José, p. 51-56.

8 SILVA, Francisco Ribeiro da - Pombal e os Ingleses: incidências económicas e relações internacionais. In CONGRESSO O MARQUÊS DE POMBAL E A SUA ÉPOCA, Pombal, 1999; COLÓQUIO O SÉCULO XVIII E O MARQUÊS DE POMBAL, Oeiras, 1999 - [Atas]. Oeiras: Câmara Municipal; Pombal: Câmara Municipal, 2001. p. 137.

9 Biblioteca Nacional de Portugal (BNP), Coleção Pombalina, Códice 692, “Lista das Pessoas Vassallos de Sua Magestade Britanica que tem Cazas de Negocio nesta Corte y assistem nella com as suas familias e caixeiros”, f. 223-224. A lista não é datada, mas pelas pessoas nela incluídas foi seguramente elaborada durante o reinado de D. José, sendo essa também a opinião de João Lúcio de Azevedo. V. AZEVEDO, João Lúcio de – Épocas de Portugal económico. 3ª ed. Lisboa: Livraria Clássica Editora, 1973. p. 427-428. E a inclusão de Thomas Horne, admitido na Feitoria em 1769, como referiremos mais à frente, faz avançar a data pelo menos para 1770.

10 BNP, Coleção Pombalina, Códice 637, f. 35, Carta de John Hort para o marquês de Pombal de 12 de outubro de 1770.

11 Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT), Desembargo do Paço (DP) – Repartição da Corte, Estremadura e Ilhas (CEI), maço 1862, doc. 6.

12 BNP, Coleção Pombalina, Códice 93, f. 64-88.

13 V. ANTT, DP – CEI, maço 1600, doc. 12.

14 TORRES, Rui d’Abreu – Stephens, Guilherme. In SERRÃO, Joel (dir.) – Dicionário de História de Portugal. Lisboa: Iniciativas Editoriais, 1971. vol. 4, p. 86.

15 ALEXANDER, Boyd (introd. e notas) – Diário de William Beckford em Portugal e Espanha. 3ª ed. Lisboa: Biblioteca Nacional de Portugal, 2009. p. 181, nota 38 (do editor).

16 RATTON, Jácome - Recordações e memórias sobre ocorrências do seu tempo, a estátua equestre de D. José e as fábricas de papel, caixas, fiação, chitas, pentes e relógios. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1920. p. 142. Melish não aparece na nossa relação, talvez por já ter nessa altura falecido ou regressado a Inglaterra. Também citado por MACEDO, Jorge Borges de - A situação económica no tempo de Pombal. 3ª ed. Lisboa: Gradiva, 1989. p. 102.

17 ALEXANDER, Boyd (introd. e notas) – Diário de William Beckford em Portugal e Espanha, p. 42; e p. 181, nota 38 (do editor).

18 RAMALHO, Margarida de Magalhães – Os criadores da Pena: D. Fernando II e a condessa d’Edla. Sintra: Parques de Sintra – Monte da Lua, 2013. p. 48.

19 ALEXANDER, Boyd (introd. e notas) – Diário de William Beckford em Portugal e Espanha, p. 39; e p. 180 (nota do editor).

20 MACEDO, Jorge Borges de – A situação económica no tempo de Pombal, p. 89-93.

21 Idem, ibidem, p. 97-129. RIBEIRO, Jorge Martins – A comunidade britânica do Porto durante as invasões francesas (1807-1812). Porto: Fundação António de Almeida, 1990. p. 26-28.

22 ANTT, DP - CEI, maço 224, doc. 7. Viria a falecer em Lisboa no início de 1786.

23 ANTT, DP - CEI, maço 1600, doc. 12.

24 RATTON, Jácome - Recordações e memórias sobre ocorrências do seu tempo, a estátua equestre de D. José e as fábricas de papel, caixas, fiação, chitas, pentes e relógios, p. 142.

25 ALEXANDER, Boyd (introd. e notas) – Diário de William Beckford em Portugal e Espanha, p. 180 (nota do editor).

26 SANTOS, Piedade Braga; RODRIGUES, Teresa; NOGUEIRA, Margarida Sá - Lisboa setecentista vista por estrangeiros. 2ª ed. Lisboa: Livros Horizonte, 1996. p. 97.

27 Idem, ibidem, p. 43.

28 Idem, ibidem, p. 44.

29 Idem, ibidem, p. 79.

30 Idem, ibidem, p. 95.

31 RUDERS, Carl Israel - Viagem em Portugal: 1798-1802. Lisboa: Biblioteca Nacional, 1981. p. 38.

32 Além desta lista existem mais três no mesmo códice (f. 224v.-227v.), compostas por britânicos de menor estatuto social, num total de 349 agregados familiares. Mas a estes haveria ainda que acrescentar os conventos de religiosas e provavelmente muitos mais súbditos do rei de Inglaterra que terão escapado ao arrolador, de forma deliberada ou involuntária.

33 BNP, Coleção Pombalina, Códice 93, Exposição de 29 de novembro de 1764, f. 85v.-87.

34 Arquivo Municipal de Lisboa (AML), Livro 9º de consultas e decretos de D. Pedro II, Consulta de 29 de janeiro de 1687, f. 190-203.

35 AML, Livro 18º de consultas e decretos de D. Pedro II, Consulta de 1 de junho de 1703, f. 99-104.

36 Idem. Livro 13º de consultas e decretos de D. João V do Senado Ocidental, Consulta de 13 de novembro de 1706, f. 197-214.

37 Idem. Livro 1º de consultas e decretos de D. João V do Senado Oriental, Consultas de 13 de março de 1706, f. 170-173, e de 31 de maio de 1707, f. 196-199.

38 Idem. Livro 3º de consultas e decretos de D. João V do Senado Ocidental, Aviso de 6 de maio de 1721, f. 227-280.

39 Idem. Livro 3º de consultas e decretos de D. João V do Senado Ocidental, Aviso de 5 de maio de 1724, f. 249-256. Idem. Livro 9º de consultas e decretos de D. João V do Senado Oriental, Consulta de 19 de junho de 1728, f. 22-31.

40 Idem. Livro5º de consultas e decretos de D. João V do Senado Oriental, Consulta de 23 de dezembro de 1711, f. 369-379.

41 Idem. Livro 9º de consultas e decretos de D. João V do Senado Ocidental, Consulta de 7 de novembro de 1732, f. 218-229.

42 BNP, Coleção Pombalina, Códice 637, f. 16-19.

43 Idem, ibidem, f. 16.

44 Idem, ibidem, f. 17.

45 SILVA, Francisco Ribeiro da – Pombal e os Ingleses…, p. 142.

46 AML, Livro 11º de consultas, decretos e avisos de D. José I, Aviso de 6 de fevereiro de 1759, f. 191-192.

47 BNP, Coleção Pombalina, Códice 93, f. 5-5v.

48 Idem, ibidem, f. 6-7, Exposição de 19 de julho de 1760.

49 Idem, ibidem, f. 65-66, Memorial do cônsul britânico Francis Ibbetson, de 29 de novembro de 1764.

50 Idem, Coleção Pombalina, Códice 637, f. 17-17v.

51 Idem, ibidem, f. 18-18v.

52 Referia-se a um dos almotacés, uma categoria superior de oficiais camarários, muitos deles de origem nobre e na generalidade das câmaras do reino pertencentes ao núcleo restrito da governança das terras. V. FONSECA, Teresa – Absolutismo e municipalismo: Évora, 1750-1820. Lisboa: Colibri, 2002. p. 217-227.

53 BNP, Coleção Pombalina, Códice 93, Memorial do cônsul britânico Francis Ibbetson, de 29 de novembro de 1764, f. 66v.-67.

54 Idem, ibidem, Exposição de 10 de setembro de 1760, dirigida pelo cônsul geral e pelos membros da Feitoria Britânica ao conde de Kinnoull, embaixador do rei de Inglaterra na corte portuguesa, f. 14v.-15v.

55 Idem, ibidem, f. 67v.-68v.

56 Idem, ibidem, f. 12v.-13.

57 SILVA, Francisco Ribeiro da – Absolutismo esclarecido e intervenção popular: os motins do Porto de 1757. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1990. p. 24-25.

58 MADUREIRA, Luís Nuno – A sociedade civil do Estado: instituições e grupos de interesses em Portugal (1750-1847). Análise Social. Lisboa. Vol. 32 Nº 142 (1997), p. 614.

59 BNP, Coleção Pombalina, Códice 93, Exposição de 10 de setembro de 1760, dirigida pelo cônsul geral e pelos membros da Feitoria Britânica ao conde de Kinnoull, embaixador do rei de Inglaterra na corte portuguesa, f. 9v.-11.

60 A Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro provocou vivas reações da parte dos comerciantes ingleses radicados no Porto e no Alto Douro e gerou veementes protestos dos diplomatas da corte londrina na capital portuguesa, mas afetou apenas indiretamente a Feitoria de Lisboa. Sobre o impacto da criação desta companhia veja-se SILVA, Francisco Ribeiro da – Pombal e os Ingleses: incidências económicas e relações internacionais. Idem, Absolutismo esclarecido e intervenção popular: os motins do Porto de 1757. SIDERI, Sandro - Comércio e poder. Lisboa: Cosmos, 1978. p. 145-149.

61 MACEDO, Jorge Borges de – Companhias comerciais. In SERRÃO, Joel (coord.) - Dicionário de História de Portugal. Porto: Livraria Figueirinhas, [19--]. vol. 2, p. 128-129.

62 BNP, Coleção Pombalina, Códice 93, “Demonstração dos prejuízos resultantes do Comercio com o Brasil, da criação das Companhias de Comercio”, de 24 de maio de 1760, dirigida ao conde de Kinnoull, f. 24.

63 Sobre o tema veja-se MACEDO, Jorge Borges de - A situação económica no tempo de Pombal, que temos vindo a citar.

64 BNP, Coleção Pombalina, Códice 637, f. 23-23v.

65 Idem, ibidem, Cartas do diplomata britânico John Hort dirigidas ao marquês de Pombal, de 18 de agosto de 1770, f. 26-27, e de 10 de outubro de 1770, f. 33-34v.

66 RUDERS, Carl Israel - Viagem em Portugal: 1798-1802, p. 141.

67 BNP, Coleção Pombalina, Códice 637, Carta de 4 de agosto de 1770, f. 25-25v.

68 BNP, Coleção Pombalina, Códice 692, f. 84-95.

69 AML, Livro 6º de registo de consultas e decretos de D. José I, f. 269.

70 Idem, ibidem.

71 BNP, Coleção Pombalina, Códice 637, Carta de 4 de agosto de 1770, f. 25-25v.

72 Idem, ibidem, f. 28-29v.

73 Idem, ibidem, f. 31-32.

74 Idem, ibidem, f. 38-39.

75 AML, Livro 6º de registo de consultas e decretos de D. José I, Consulta de 10 de novembro de 1770, f. 267.

76 Idem, ibidem.

77 Os corretores integravam a oficialidade camarária lisbonense desde a Idade Média. Eram pessoas da inteira confiança da Câmara e por ela nomeados, apenas podendo exercer o ofício mediante carta probatória passada pela edilidade. Eram os intermediários obrigatórios em todas as operações comerciais efetuadas entre estrangeiros e portugueses. Sobre as suas importantes funções veja-se RODRIGUES, Maria Teresa Campos – Aspectos da administração municipal de Lisboa no século XV. Lisboa: Câmara Municipal, [19--]. p. 104-109. E ainda LISBOA. Câmara Municipal - Livro das posturas antigas. Lisboa: C.M., 1974. p. 76-77.

78 BNP, Coleção Pombalina, Códice 692, f. 90v.

79 Idem, ibidem, f. 91.

80 Idem, ibidem, f. 91v.

81 As posturas municipais permitiam às câmaras a retenção da terça parte dos bens essenciais (como cereais, carne, azeite e vinho) produzidos no concelho para serem vendidos à população local, podendo os outros dois terços ser vendidos livremente para fora. Mas os governos municipais tiveram sempre bastante dificuldade em fazer cumprir esta lei, pois as coimas aplicadas a quem era apanhado em transgressão, o que sucedia raramente, compensavam bem o risco. Veja-se FONSECA, Teresa – Relações de poder no Antigo Regime: a administração municipal em Montemor-o-Novo (1777-1816). Montemor-o--Novo: Câmara Municipal, 1995. p. 68-69. E ainda FONSECA, Teresa – Absolutismo e municipalismo: Évora, 1750-1820, p. 313-315. Em Lisboa praticava-se o mesmo relativamente a produtos importados, como o trigo, embora as dificuldades em fazer cumprir estas determinações face à ousadia dos grandes traficantes, designadamente britânicos, não fossem inferiores às verificadas nos outros municípios do reino.

82 BNP, Coleção Pombalina, Códice 692, f. 92.

83 Idem, ibidem, f. 92v.

84 Idem, ibidem, f. 93.

85 O cargo de almotacé era um dos mais antigos e prestigiados ofícios municipais, sendo já referido no foral de Lisboa de 1179. Veja-se RODRIGUES, Maria Teresa Campos – Aspectos da administração municipal de Lisboa no século XV, p. 57. As Ordenações Filipinas, no Livro 1º, Título 67, § 13 e 14, determinam o modo de escolha dos almotacés. E no Título 68, § 1 a 12, estabelecem as suas amplas funções. No entanto, o seu processo de nomeação foi-se alterando ao longo dos séculos, divergindo também um pouco consoante os concelhos. Veja-se SILVA, Francisco Ribeiro da – O Porto e o seu termo (1580-1640): os homens, as instituições e o poder. Porto: Câmara Municipal, 1988. vol. II, p. 567-574. E ainda FONSECA, Teresa – Absolutismo e municipalismo: Évora, 1750-1820. Lisboa: Colibri, 2002. p. 217-227 e a bibliografia aí citada.

86 BNP, Coleção Pombalina, Códice 692, f. 93-93v.

87 Idem, ibidem, f. 93v.- 94.

88 O termo polícia possuía, no Antigo Regime, uma abrangência bastante superior à atual. Significava “a autoridade que os Príncipes têm para estabelecerem e proverem os meios e subsídios que facilitem e promovam a observância das suas Leis” e “o aumento da População a saúde dos Povos, o Comércio, a Agricultura e as Manufaturas”. SAMPAIO, Francisco Coelho de Sousa e – Prellecções de direito patrio publico e particular, offerecidas ao serenissimo senhor

D. João principe do Brasil. Coimbra: na Real Imprensa da Universidade, 1793. p. 138-140. Veja-se ainda sobre o tema SUBTIL, José – Atores, territórios e redes de poder, entre o Antigo Regime e o Liberalismo. Curitiba: Juruá Editora, 2011. p. 265-268. E ABREU, Laurinda – Pina Manique: um reformador no Portugal das Luzes. Lisboa: Gradiva, 2013. p. 107-283.

89 BNP, Coleção Pombalina, Códice 692, f. 94-94v.

90 Idem, ibidem, Códice 637, f. 41v.

91 Idem, ibidem, Códice 637, Carta do marquês de Pombal para Lord Lyttelton de 13 de novembro de 1770, f. 46-46v.

92 Em 1761, o almotacé das execuções ordenara a prisão de Jácome António Galianarte, fabricante de candeeiros de estanho com copos de vidro, bem como dos três oficiais que com ele trabalhavam. Além disso teve de pagar uma multa de 8.000 réis e foram-lhe apreendidos as manufaturas e os instrumentos de trabalho. Nessa ocasião, tanto a Câmara como o almotacé foram repreendidos, pois Galianarte, além de possuir autorização da Junta do Comércio para o exercício da sua atividade, estava abrangido pelo decreto de 18 de abril desse ano, que alargava aos estrangeiros a atribuição de licenças para trabalhar obras vazadas em estanho, latão e outros metais. AML, Livro 12º de consultas, decretos e avisos de D. José I, Decreto de 18 de junho de 1761, f. 162-163; e Aviso de 7 de maio de 1761, f. 164.

93 ANTT, DP - CEI, maço 261, doc. 13.

94 Sobre este tema existe legislação abundante. Veja-se MARCOS, Rui Manuel de Figueiredo – A legislação pombalina: alguns aspectos fundamentais. Coimbra: Almedina, 2006. FONSECA, Teresa – Absolutismo e municipalismo: Évora, 1750-1820, p. 162 e 276-277. MACEDO, Jorge Borges de - A situação económica no tempo de Pombal, p. 49-54 e 59.

95 FONSECA, Teresa – Absolutismo e municipalismo: Évora, 1750-1820, p. 571-577.

96 Idem, ibidem, p. 578-581.

97 MACEDO, Jorge Borges de - A situação económica no tempo de Pombal, p. 47-62.

98 Idem, ibidem, p. 63-117.

99 Idem, ibidem, p. 141-184.

100 BNP, Coleção Pombalina, Códice 637, f. 14.

101 Idem, ibidem, f. 107.

Creative Commons License Todo o conteúdo deste periódico, exceto onde está identificado, está licenciado sob uma Licença Creative Commons