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Cadernos do Arquivo Municipal

On-line version ISSN 2183-3176

Cadernos do Arquivo Municipal vol.ser2 no.2 Lisboa Dec. 2014

 

VARIA

Notas Informativas sobre a documentação contemporânea do Arquivo Municipal de Lisboa

Aurora Almada e Santos

AML – Arquivo Municipal de Lisboa, Direção Municipal da Cultura / Câmara Municipal de Lisboa; IHC – Instituto de História Contemporânea, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas / NOVA, Portugal.

Doutorada em História Contemporânea pela Universidade Nova de Lisboa, onde defendeu a tese intitulada “A Organização das Nações Unidas e a questão colonial portuguesa (1960-1970)”. Autora de várias publicações, tem participado, com a apresentação de comunicações, em encontros científicos nacionais e estrangeiros.

Correio eletrónico: aurora.santos@cm-lisboa.pt

 

 

O Arquivo Municipal de Lisboa dispõe de um acervo documental para o período contemporâneo que não tem sido ainda devidamente explorado. A documentação encontra-se dispersa pelos depósitos existentes no Bairro da Liberdade, no Alto da Eira e no Arco do Cego, estando disponível ao público de acordo com as condições definidas pelo Arquivo. Tematicamente a documentação contemporânea abrange áreas tão diversas como as atividades culturais, o ambiente urbano, a gestão de espaços e equipamentos, a reabilitação urbana, a ação social, a educação, o desporto, os espaços verdes, a fiscalidade ou o funcionamento interno dos órgãos do município ao nível das finanças, das vereações ou da higiene e segurança no trabalho.

Produzido no âmbito das competências da Câmara Municipal de Lisboa ou entregue à sua guarda por outras entidades, o acervo contemporâneo do Arquivo Municipal encontra-se em constante crescimento. A política em matéria de aquisição de documentos tem vindo a ser aperfeiçoada e adaptada às especificidades da produção documental do município. Podem ser identificados diferentes procedimentos, sendo que a incorporação é o processo mais comum pelo qual o Arquivo Municipal adquire a jurisdição, a título definitivo, sobre os documentos produzidos pela Câmara Municipal de Lisboa. Outros meios como o depósito, a doação, a dação, a compra, os legados ou as permutas, são igualmente utilizados para, mediante o cumprimento de determinados requisitos, se obter a posse ou a custódia sobre a documentação produzida por entidades externas mas com interesse para a memória da cidade de Lisboa1.

As incorporações no Arquivo Municipal de Lisboa podem ocorrer mediante a receção e conferência dos documentos ou no seguimento de um processo de avaliação documental. A aplicação de um ou outro procedimento depende do tipo de documentos, sendo a conferência utilizada para os processos referentes às edificações municipais e particulares produzidos pelos serviços com competências na área do urbanismo, enquanto que a restante documentação camarária é sujeita à avaliação documental.

 

1. PROCESSOS REFERENTES A EDIFICAÇÕES

Conhecidos vulgarmente como processos de obra, os documentos referentes à construção, conservação, alteração, demolição e utilização de edificações municipais e particulares de Lisboa são remetidos diariamente pelos serviços de urbanismo ao Arquivo. A documentação encontra-se organizada segundo diferentes tipologias, sendo as mais comuns os EDI (grosso modo são processos de edificações), POL (processos de licenciamento para habitação), I (processos de intimações), ALC (processos de licenciamento para atividades económicas), DOC (processos de reprodução e consulta) ou OTR (processos sobre temas variados). A receção das tipologias obedece aos requisitos definidos para o ingresso de documentos em arquivo e que constam do Manual de regras e procedimentos de envio e incorporação de documentação elaborado em conjunto com os serviços2.

No manual são definidas as normas de incorporação em arquivo (NIA), que determinam os elementos essenciais que devem constar dos processos, apresentando uma lista de documentos obrigatórios para cada tipologia3. As NIA também definem regras instrutórias, estabelecendo a forma como os processos referentes a cada tipologia devem ser organizados fisicamente. Nas normas existe um capítulo referente a regras gerais a serem aplicadas a todas as tipologias e capítulos sobre questões específicas destinadas à documentação que constitui uma continuação da anteriormente recebida no Arquivo e a processos referentes a construções novas que serão incorporados pela primeira vez4.

As NIA apresentam uma listagem de processos que, sendo de conservação permanente, podem ser associados à documentação já incorporada referente a uma determinada edificação5. Nestes casos os processos ingressam em “obra”, sendo que esta designação remete-nos para macroprocessos referentes a uma edificação aos quais foi atribuído um determinado número6. Tendo havido uma ponderação da importância da documentação produzida pelos serviços de urbanismo entendeu-se elaborar uma lista de processos, também de conservação permanente, mas que não ingressam em obra7. Para a racionalização da produção documental a incorporar no Arquivo, das NIA consta ainda a enumeração dos processos destinados à eliminação após o cumprimento dos prazos de retenção8.

Segundo as regras gerais das NIA, somente devem ser remetidos para o Arquivo processos encerrados, em que conste o despacho “arquive-se” ou “é de arquivar” e em que os requerentes tenham sido previamente notificados da decisão final9. Os processos devem estar acondicionados em unidades de instalação e identificados, com a indicação do requerente, do número do processo, da tipologia, do ano, do local e do número do volume (ou número total de volumes caso se aplique)10. Em cada processo deverá existir um índice, com a descriminação do conteúdo de cada página. Os duplicados, disquetes, CD’s ou DVD’s devem ser retirados e todas as páginas devem ser numeradas sequencialmente, indicando-se o número do processo, a tipologia e o ano11. Caso sejam suprimidos documentos dos processos devem ser acrescentadas folhas de desagregação preenchidas com a indicação do motivo e do número de páginas retiradas. Especificamente para os processos que serão ingressos em obra e para os que serão incorporados pela primeira vez, as NIA determinam que os serviços de urbanismo devem proceder à sua organização por ordem cronológica12. Os volumes pertencentes aos processos devem ter índices e ser identificados, na lombada, com o número da respetiva obra e volume13.

Conforme o estabelecido, compete aos serviços de urbanismo, antes do envio dos documentos para o Arquivo, proceder à sua organização de acordo com as NIA. Ao se rececionar no Arquivo a documentação proveniente dos serviços, os processos são submetidos à conferência, que consiste na verificação se constam todos os elementos essenciais referentes a cada tipologia e se as regras de organização foram observadas. A conferência está a cargo do Grupo da Aquisição e Captura, que tem como funções incorporar e transferir documentação, conferir, validar e registar processos e controlar as inconformidades. Se no ato da conferência não forem detetadas inconformidades, a documentação é incorporada, sendo organizada nos depósitos do Arquivo. No caso de serem encontradas situações de incumprimento das NIA, o Grupo da Aquisição e Captura solicitará ao serviço a resolução das inconformidades no prazo de 10 dias úteis. Na ausência de resposta ou quando as inconformidades14 não podem ser solucionadas, os processos serão devolvidos, regressando ao serviço produtor15.

Representando a responsabilização dos serviços pela produção documental, a aplicação das NIA apresenta inúmeras vantagens. A mais evidente é o fato de garantir que somente são incorporados no Arquivo processos concluídos e devidamente organizados. Outra grande vantagem advém da uniformização da produção documental, permitindo que, consoante as tipologias, os processos são compostos pelos mesmos documentos e organizados da mesma forma. Não menos relevante é a importância das NIA no facilitar da resposta do Arquivo às solicitações para a consulta e reprodução de documentos, uma vez que torna mais eficaz a disponibilização da informação.

 

2. OUTRA DOCUMENTAÇÃO

A restante documentação produzida pela Câmara Municipal de Lisboa, que apresenta um volume considerável, é incorporada no Arquivo mediante um processo de avaliação, seleção e eliminação. Dada a dificuldade em adequar os recursos humanos e materiais existentes à massa documental produzida, a avaliação, seleção e eliminação tem sido realizada a pedido dos serviços, que por vezes deixam a documentação acumular em condições pouco satisfatórias. A metodologia empregue pelo Arquivo tem por base, com as devidas adaptações, o Manual para a gestão de documentos e as Orientações técnicas para a avaliação de documentação acumulada, elaborados pelo Instituto dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo, atual Direção-Geral do Livro, Arquivos e Bibliotecas.

Entre os serviços que ultimamente têm sido intervencionados no âmbito dos processos de avaliação, seleção e eliminação contam-se a Direção Municipal do Ambiente Urbano, a Direção Municipal das Atividades Económicas, o Departamento de Património Cultural, o Cemitério do Lumiar, o Regimento de Sapadores Bombeiros e empresas municipais extintas como a Empresa Municipal de Aguas Residuais de Lisboa (EMARLIS), a Agência para Modernização Económica de Lisboa (AMBELIS) e a Empresa Pública de Urbanização de Lisboa (EPUL). Sendo uma tarefa que está a cargo do grupo encarregue de gerir e implementar mecanismos de avaliação, os procedimentos aplicados consistem em16:

a) Diagnóstico da situação, através da verificação das principais séries existentes, das datas extremas, da dimensão, da localização e do estado de conservação da documentação;

b) Identificação e levantamento das séries através do preenchimento de folhas de recolha de dados;

c) Numeração das unidades de instalação de acordo com as séries identificadas;

d) Determinação do destino final com recurso à tabela de seleção anexa à portaria 1253/2009, de 14 de outubro, e dos critérios enumerados nas Orientações técnicas para a avaliação de documentação acumulada;

e) Seleção das séries a conservar e das a eliminar, com recurso à utilização de etiquetas vermelhas para assinalar a documentação de conservação definitiva, etiquetas verdes para a de eliminação e etiquetas azuis para a que ainda não cumpriu os prazos administrativos;

f) Realização do estudo orgânico-funcional do serviço produtor, abarcando as datas extremas da produção da documentação;

g) Elaboração de autos de eliminação, sendo elaborado um para as séries que estão referenciadas na portaria 1253/2009, de 14 de outubro, e outro para as que estão omissas;

h) Produção de propostas de eliminação das séries não referenciadas na portaria 1253/2009, de 14 de outubro, que apresentam a justificação que fundamenta a destruição da documentação, bem como os prazos de conservação administrativa;

i) Apresentação de uma planificação da eliminação das séries que não poderão ser destruídas de imediato, pois terão de cumprir os prazos de conservação administrativa, que, por vezes, são bastante dilatados;

j) Elaboração da guia de remessa e do auto de entrega, que permitirão a transferência da documentação de conservação permanente, após o cumprimento dos prazos de conservação administrativa, para os depósitos do Arquivo;

k) Solicitação ao serviço produtor de uma lista de conteúdos de cada unidade de instalação de conservação permanente, de forma a facilitar a identificação da documentação;

l) Produção de um relatório, que contempla uma breve apresentação da realidade encontrada no serviço, o estudo orgânico-funcional, a metodologia utilizada, os resultados obtidos e todos os instrumentos elaborados;

m) Destruição da documentação cujos prazos de conservação administrativa tenham sido cumpridos e, para os casos não referenciadas na portaria 1253/2009, de 14 de outubro, em que tenha sido obtido o parecer favorável do Arquivo Distrital de Lisboa;

n) Incorporação no Arquivo Municipal de Lisboa da documentação de conservação permanente.

Necessitando da colaboração dos serviços, o processo de avaliação, seleção e eliminação facilita a racionalização das incorporações e dos recursos humanos e materiais do Arquivo Municipal. Por favorecer o estabelecimento de boas práticas, o processo de avaliação garante que somente será incorporada a documentação cujo destino final é a conservação permanente e que consequentemente tem interesse para a memória da cidade de Lisboa. Como a documentação a eliminar fica nos serviços a aguardar o cumprimento dos prazos administrativos, isso impede que os depósitos do Arquivo sejam desnecessariamente sobrecarregados com massas documentais sem valor secundário.

 

3. ESPÓLIOS E COLEÇÕES PARTICULARES

Entre as atribuições e competências do Arquivo Municipal contam-se a aquisição de espécies e coleções com interesse para o município e a recolha de documentos produzidos por instituições extintas, cujas funções podem ou não ter sido transferidas para a Câmara Municipal de Lisboa17. Designados como ingressos extraordinários, a entrada de documentação não produzida pelos serviços municipais pode ocorrer por depósito, doação, dação, compra, legados ou permutas18. Sendo as doações o método mais comum, os ingressos extraordinários têm sobretudo incidido sobre fundos de instituições, espólios arquitetónicos ou coleções e material fotográfico. Alguns exemplos são a documentação da Irmandade de São José dos Carpinteiros, o espólio arquitetónico de Cassiano Branco ou as coleções fotográficas referentes à exposição Lisboa 94 e à Parque Expo.

Realizados mediante um acordo entre a Câmara Municipal de Lisboa e as entidades detentoras dos documentos, os ingressos extraordinários devem obedecer a alguns procedimentos. Segundo o definido na proposta de regulamento do Arquivo Municipal, tais ingressos ficam sujeitos ao parecer de um técnico para aferir a pertinência da documentação para a memória da cidade e o seu estado de conservação19. Efetuada a apreciação, com a elaboração de uma listagem do conjunto documental, procede-se à formalização da intenção de ingresso. O processo culmina com a assinatura de um contrato entre as partes, estabelecendo as condições do depósito, doação, dação, compra, legado ou permuta, que podem ser as mais variadas20.

Estando os ingressos extraordinários sobre a supervisão dos grupos de gestão de parcerias e redes de trabalho e da definição de políticas de arquivo, para que os documentos possam ser recebidos devem ser devidamente acondicionados em unidades de instalação apropriadas21. Como tem vindo a ser realizado um esforço para a uniformização de procedimentos e a definição das condições de receção da documentação, ainda que seja necessário de futuro fazer alguns ajustamentos, os ingressos extraordinários têm permitido aumentar o acervo do Arquivo Municipal de Lisboa, enriquecendo-o.

 

NOTAS

1Para a definição dos conceitos de depósito, doação, dação, compra, legado ou permuta vide PORTUGAL. Direção Geral de Arquivos – Orientações para a descrição arquivística. Lisboa: DGARQ, 2007. p. 78.

2LISBOA. Câmara Municipal. Divisão de Arquivo Municipal - Manual de regras e procedimentos de envio e incorporação de documentação em arquivo. Lisboa: DAM, 2013.

3Idem. p. 3.

4Idem. p. 4-9.

5 Idem. p. 11.

6 Idem. p. 3.

7Idem. p. 11.

8Ibidem.

9 Idem. p. 5.

10 Idem. p. 4.

11 Idem. p. 5.

12 Idem. p. 7.

13 Idem. p. 8.

14LISBOA. Câmara Municipal. Divisão de Arquivo Municipal – Cadeia de valor. Lisboa: DAM, 2014. p. 3.

15 LISBOA. Câmara Municipal. Divisão de Arquivo Municipal - Manual de regras e procedimentos de envio e incorporação de documentação em arquivo. p. 7.

16Para mais informações vide http://arquivomunicipal.cm-lisboa.pt/pt/servicos/avaliacao-selecao-eliminacao/

17LISBOA. Câmara Municipal. Divisão de Arquivo Municipal - Proposta de regulamento do Arquivo Municipal. Lisboa: DAM, 2013. Artigo 2, alínea j) e k).

18 Idem. Artigo 8, § 1.

19Ibidem.

20Ibidem.

21Ibidem.

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