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e-Pública: Revista Eletrónica de Direito Público

versão On-line ISSN 2183-184X

e-Pública vol.1 no.2 Lisboa jun. 2014

 

DIREITO PÚBLICO

Desigualdades persistentes em prejuízo da mulher

Persistent inequalities because of gender: different faces of violence against women

 

José Raimundo Gomes da Cruz I

Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Alameda da Universidade - Cidade Universitária 1649-014 Lisboa - Portugal. e-mail: jrgcruz@uol.com.br

 

 

RESUMO

Entre as desigualdades que subsistem em prejuízo da mulher, destacam-se a sua mutilação sexual, o homicídio contra ela por falso motivo de honra ou femicídio, a poligamia, o casamento das menininhas e o assédio sexual.

Palavras-Chave: Mutilação sexual. Falso motivo da honra. Femicídio. Poligamia. Casamento. Meninas-noivas. Assédio sexual.

 

ABSTRACT

Sexual mutilation, homicide for alleged motive of honor, femicide, polygamy, marriage of little girls and sexual harassment are among the inequalities which remain against women.

Key-Words: Sexual mutilation. Alleged motive of honor. Femicide. Polygamy. Marriage. Little girl brides. Sexual harassment.

 

Sumário: 1. Introdução. 2. A mutilação da mulher. 3. Homicídio por falso motivo de honra ou femicídio. 4. A poligamia. 5. Casamento das menininhas. 6. O assédio sexual e o crime de assédio sexual. Conclusões. Referências.

 

 

1) Introdução

Quando alguém menciona algum fato mais raro, como a responsabilidade da mulher por pagamento de pensão alimentícia ao marido, ou mesmo os casos de pedofilia feminina (conforme o jornal O Estado de São Paulo, de 17/9/08, – “30% das imagens de pedofilia têm presença de mulher”), percebe-se alguma estranheza. Certa ideia antiga permanece, quanto ao cônjuge habitualmente incumbido do sustento do outro cônjuge ou sobre o autor mais frequente dos abusos sexuais contra crianças.

Se a gente lançar o olhar bem além das nossas fronteiras, porém, vai perceber outros tipos de desigualdades que teimam em sobreviver nos nossos dias. Em países africanos e asiáticos, ainda subsistem mutilações toscas e preconceituosas praticadas contra as mulheres. Também com base em falso conceito de honra familiar, mulheres são vítimas de homicídio, a que se dá o nome de femicídio. A poligamia, principalmente em alguns países árabes, permite ao homem casar com até quatro mulheres. O casamento, no Iêmen, mesmo previsto para mulheres com quinze anos ou mais, na Constituição do país, por motivos tribais ainda é contraído mesmo por meninas de nove ou dez anos de idade. Embora já exista até filme com a belíssima Demi Moore praticando assédio sexual contra o ator Michel Douglas, trata-se de situação em que a mulher figura bem mais como vítima.

Tenho tratado de cada um desses temas em breves comentários, alguns deles publicados. Em razão de superveniência de fatos novos, especialmente mudanças legislativas, cheguei a elaborar novas anotações respectivas.

Talvez a reunião de todos eles permita melhor reflexão a seu respeito.

2) A mutilação da mulher

A mesma publicação que trata de casamentos impostos coativamente à mulher (“The Runaway Bride” ou “Noiva em fuga”) enfrenta o velho e gravíssimo tema da circuncisão feminina ou mutilação intencional da mulher (“The Scars of Tradition” ou “As cicatrizes da tradição” 2). Mesmo morando em países ocidentais, a mulher estrangeira, especialmente a africana, com maior freqüência do que se imagina, vive dramas terríveis. Nos dois casos, crimes gravíssimos são cometidos pelas pessoas da própria família da vítima. Noor Khan, por exemplo, acordou certo dia, aos dezessete anos de idade e ficou sabendo que se casaria naquela data, com noivo que ela desconhecia, sob ameaça de morte feita por Ali, seu próprio irmão.

Nosso comentário, contudo, conforme o título, concentrar-se-á nos casos de mutilação genital feminina, ficando o aspecto do livre consentimento da noiva para outro trabalho.

Há cerca de dez anos, também com base em noticiário da mesma revista norte-americana, publiquei algumas notas sobre o tema 3. Segundo a matéria jornalística, Lydia Oluloro pedira asilo para ela e suas filhas, Lara, com 5 anos, e Shade, com 6. A mãe ingressara nos EUA após casar-se com o pai das duas meninas, nigeriano como ela. Lá as crianças nasceram. Sobrevindo a separação definitiva do casal, a mãe não conseguira, ainda, visto para permanecer no país, estando até em andamento as medidas para sua saída de lá, com as duas meninas. Acontecia que, retornando ao seu país de origem, a mãe temia que elas fossem submetidas à mutilação consistente, pelo menos, na extração do clitóris. Note-se que tal mutilação podia ser mais ampla, conforme o grupo étnico, tratando-se de prática de inspiração tradicional e preconceituosa, em relação à conduta feminina, com freqüentes deformidades, infecções e hemorragias decorrentes, além da penosa atividade sexual da pessoa mutilada.

A discussão sobre tal “asilo cultural” apresentava, então, muitos aspectos. Temia-se que sua concessão viesse a servir de precedente para inúmeros casos. Por outro lado, os congressistas norte-americanos preocupavam-se com a prática da mutilação genital feminina, por imigrantes, mesmo nos EUA. Diante da proposta de sanções econômicas aos países que adotavam tais práticas desumanas, profissionais africanas residentes nos EUA criticavam: além de mutiladas, as vítimas passariam a ter outras aflições resultantes das restrições à ajuda ao seu país. Em face da mobilização das feministas americanas contra a prática da mutilação feminina, as mesmas profissionais africanas reagiam, nos EUA, considerando tais protestos “arrogantes e mal orientados”.

Diante do disposto em nosso Código Penal, artigo 129, § 2º, inciso III, com a pena de reclusão de dois a oito anos, devia-se lamentar que muitas mulheres de 25 países da África (índices variavam entre 75 a 98%) sofressem impunemente agressões graves à sua integridade corporal, com reflexos psíquicos.

Não devia haver qualquer atitude conformista, até porque mudanças tinham sido adotadas em outros setores da atividade humana, nas sociedades afro-asiáticas. Nem se admitia qualquer resquício de falso pudor, na discussão da grave prática de violência à pessoa humana. Sob pena de adotar-se posição idêntica à de Antônio Conselheiro, em Canudos: “Ao saber de caso escandaloso em que a lubricidade de um devasso maculara incauta donzela, teve, certa vez, uma frase ferozmente cínica, que os sertanejos repetiam depois sem lhe aquilatarem a torpeza: ‘Seguiu o destino de todas; passou por baixo da árvore do bem e do mal'.”

O noticiário recente fala do dilema de Rahmah Ali Kudar. Cabe-lhe decidir se a filha dela, Huda, de 4 anos de idade, submeter-se-á ou não à chamada circuncisão feminina, prática assustadora para os ocidentais – remoção cirúrgica do clitóris e dos lábios – que continua como rito de passagem para meninas através de quase toda a África. Mas Rahmah não vive na África e sim em Copenhague, onde as informações a respeito contam divulgação capaz de criar manifestações de oposição: “A mutilação genital feminina é especificamente contra a lei na Dinamarca, Inglaterra, Noruega, Suécia e Suíça e sofre reprovação legal em outros países europeus, como a França, na legislação sobre violência contra crianças; mas em março o governo dinamarquês aprovou legislação tornando crime levar meninas ou moças a outro país para serem circuncidadas. Kudar, agora com 32 anos, sofreu a experiência na Somália, quando tinha 9 anos, e provavelmente poupará Huda da operação: ‘Eu mesma enfrento tantos problemas médicos que não os quero para a minha filha'”.

Número crescente dentre os cerca de 17.300 naturais da Somália desaprova a circuncisão feminina, mas muitos outros sentem ainda a forte atração dessa tradição; alguns pais naturais da Somália “contornam a lei levando suas filhas à Somália ou a algum país árabe para a operação”. Segundo Amel Fahmy, estudioso da circuncisão feminina na World Health Organization, na África “é prática muito comum, profundamente arraigada na tradição”, seja como rito de passagem, seja por castidade, seja até por mera higienização.

A nova lei dinamarquesa prevê a pena de 6 a 10 anos de prisão para o pai ou a mãe que levar sua filha ao exterior para a operação, sendo irrelevante se, no país escolhido, tal operação seja legal ou não.

Lei semelhante está em tramitação no Parlamento britânico, como “tema de direitos humanos, tema da mulher”. Mesmo escassas as estatísticas francesas, acredita-se que 30.000 mulheres e meninas tenham sofrido a operação. Certa mulher de origem mauritânia foi condenada a três anos em Paris, em março, por ter conseguido a circuncisão da sua filha francesa na África.

Confirma-se tal prática em 28 países africanos, onde se calcula que 100 milhões de mulheres sofreram a circuncisão. As origens do costume se mostram obscuras. A explicação religiosa é repelida pelos estudiosos muçulmanos. Como os médicos se recusam a atender tais casos, eles acabam nas mãos de “curiosas”, mulheres sem treinamento médico e conhecimento sobre infecção. As mulheres ouvidas falam de dor, sofrimento agudo, no momento da tosca operação, e permanente, pelas lesões incapacitantes e deformantes.

Sabemos que certas leis apresentam séria dificuldade na sua aplicação. No início, salientei que são práticas que ocorrem no próprio seio das famílias. As autoridades sanitárias não podem sair por aí examinando as possíveis vítimas de mutilações genitais, pois se arriscariam a cair no exagero oposto.

Importa, contudo, em matéria de direitos humanos, que não sobrevivam as fronteiras dos países soberanos. A legislação citada de vários países europeus sequer se impressiona com a circunstância de “ser o fato punível também no país em que foi praticado” (Código Penal brasileiro, artigo 7º, § 2º, letra b). Cada especialista deverá sempre aprofundar o estudo comparativo, que melhor assegurará eventuais propostas de modernização da nossa legislação, mesmo aquela de natureza penal.

3) Homicídio por falso motivo de honra ou femicídio

Escrevendo sobre as mutilações impostas pelas famílias às mulheres, principalmente em países africanos e asiáticos, com base em matéria jornalística intitulada “As cicatrizes da tradição”4, observávamos que esta mesma publicação incluía artigo sobre os casamentos impostos coativamente à mulher (“The Runaway Bride” ou “Noiva em fuga”). Preferíamos, então, concentrar a nossa atenção sobre a mutilação genital feminina, deixando para outra oportunidade o aspecto do livre consentimento da noiva5.

Casualmente, porém, examinamos artigo em outra revista, até mais antiga6, e resolvemos alargar o comentário a respeito do tema. Mulheres que não aceitam “casamentos por conveniência estão sendo mortas a tiro ou golpes na cabeça, estranguladas, mutiladas”, segundo o texto de Armstrong, que inclui, sob idêntica violência, as mulheres estupradas e as que são consideradas promíscuas. Na West Bank e em Gaza, mais ou menos 23 palestinas foram vítimas de tais agressões em 1999. O número de mulheres escondidas, contudo, é de centenas.

Certo, mesmo, é que o problema é mais amplo. Talvez seja preferível encaminhá-lo lembrando o conto de Guimarães Rosa intitulado “Famigerado”. Certo dia, um sujeito com aspecto de jagunço, pouquíssimas letras e muitas armas, aproximou-se da casa do mestre-escola ou boticário ou rábula qualquer. Ordenou a três acompanhantes, suas testemunhas, que ficassem atentos por perto. Atendido pelo letrado, o latagão, no linguajar próprio, disse que certo sujeito de algumas letras o chamara de famigerado. Veio consultar a “autoridade” em livros, para saber se fora ofendido, para vingar-se, ou não, tendo trazido as três testemunhas, fosse para lição ao autor da ofensa, fosse para o decreto de desagravo.

O mestre-escola, boticário ou rábula percebeu tudo. Elogiou quem quer que merecesse o título de famigerado, pessoa de prestígio, conhecida e apreciada por todos. E, para arremate, acrescentou:

– Eu mesmo, que o senhor me vê aqui com vantagens, o que eu queria mesmo, numa hora dessas, era ser famigerado!

Neste ponto, o grandalhão armado, tomado de súbito entusiasmo, virou-se para as suas três testemunhas e lhes disse:

– Vocês ouviram a lição? Nada de arrenegar. Vocês podem voltar e espalhar a receita.

Retornando ao artigo de Armstrong, certo médico de Ramallah diz: “Quando me pedem que examine uma jovem e verifique se seu hímen está intacto, sempre digo que está. Como poderia dizer que não, sabendo que a matariam?”

Desnecessário se faz suspeitar de achar-se o bom samaritano da parábola do Cristo disfarçado de gramático ou de médico legista em qualquer dos casos.

Nem sempre, contudo, isso resolve. Samera, aos 15 anos, foi vista por vizinhos da pequena cidade palestina de Salfeet, da West Bank, conversando sozinha com um rapaz. A honra da família corria risco. Logo se arranjou o casamento e dele resultou filho, quando a mulher fez 16 anos. Passados 5 anos, esta não agüentou mais tal casamento forjado e fugiu. Ela passou por vários homens e lugares, segundo se conta. Em julho de 1999, porém, “a família conseguiu alcançá-la. Ela foi encontrada dentro de um poço, com o pescoço quebrado. O pai disse ao médico-legista que a filha se suicidara. Mas todos sabiam que Samera fora vítima de um homicídio em defesa da honra – tinha sido morta pela própria família porque seus atos haviam desonrado seu nome.”

Armstrong salienta que a advogada Nadera Shalhoub-Kevorkian tem-se empenhado na “luta pelos direitos das mulheres palestinas”. No caso de Samera, ela exigiu do legista a autópsia. Não faltavam acusações à mãe e ao irmão de Samera. A advogada sabia que tais acusações não adiantavam, pois, na West Bank, “a legislação da Autoridade Palestina permite que se mate em defesa da honra. Os pais de Samera agora percorrem as ruas de seu bairro de cabeça erguida, aliviados porque a honra da família foi restabelecida.”

A advogada Nadera vem acompanhando dezenas de casos semelhantes ao de Samera. Ela os leva ao tribunal, “rompendo um código de silêncio que envolve um costume antigo praticado em todo o Oriente Médio, tanto por cristãos quanto por muçulmanos”.

Por outro lado, parece animador o fato de que se tenha formado “uma irmandade de mulheres árabes”, também em desafio à lei, na luta por mudanças. Tal irmandade não escapa da acusação, feita pelos detentores do poder, por exemplo, os chefes tribais, de pregar a promiscuidade e desagregar a família tradicional.

Nadera não aceita o homicídio em defesa da honra: “Essas palavras não combinam. Isso é ‘femicídio', matança de mulheres.” Aliás, a morte é só uma forma de femicídio. Outra forma consiste em passar a vida inteira sob ameaça de morte. Na realidade, para ela há “quatro formas de femicídio. Primeiro, existe o controle velado da ameaça social, como manter a moça fora da escola ou forçá-la ao casamento. A segunda é a ameaça ativa de matar. A terceira é o ato de tentar matar a filha: são muitos os testemunhos trágicos de sobreviventes de ataques assassinos. A quarta é o homicídio” 7.

A luta de Nadera começou quando ela instalou uma linha direta em 1993, logo depois que um dos seus alunos na Universidade Hebraica, em Jerusalém, contou-lhe que a prima tinha sido estuprada. Quando Nadera tentou auxiliar a moça, percebeu que nem a família, nem a equipe do hospital se interessava pelo caso. Para as vítimas não existiam abrigos, qualquer assistência psicológica ou apoio.

Uma das primeiras ligações para a linha direta foi de uma jovem de 15 anos: “Um dia, quando eu tinha 10 anos, estava sozinha em casa e um vizinho, Wajeeh, bateu à porta, querendo açúcar emprestado. Abri a porta porque estamos habituados a esses empréstimos. Mas ele me derrubou no chão, puxou minha saia e a calcinha e me fez algo que doeu muito. Quando ele ia saindo, minha mãe e meu irmão mais velho chegaram. Os dois começaram a me espancar, gritando: ‘É melhor você morrer!'”

A menina tornou-se prisioneira em sua casa até ter seus 14 anos e poder casar com Wajeeh. Nada de amigos nem de escola mais, só se sentindo culpada de ter aberto aquela porta. Este foi um dos casos que inspiraram Nadera a fundar o Centro Feminino para Auxílio Jurídico e Aconselhamentos, em Jerusalém.

Nadera chegou a sofrer agressão física por suas atitudes. Mas não desistiu da sua luta.

Com o nome de perturbação dos sentidos e da inteligência, antes do nosso Código Penal de 1940, ou através de quesitos da legítima defesa da honra, já sob a vigência deste, o nosso júri, principalmente nas regiões mais afastadas dos maiores centros urbanos, costuma mostrar-se sensível ao ponto de absolver os homicidas passionais. De onde viria, remotamente, a justificativa da defesa da honra?

Suas origens são seculares, “datando da era pré-islâmica, quando os homens eram encorajados a enterrar vivas as filhas, para evitar a possibilidade de estas crescerem e virem a desonrar a família. O costume nada tem a ver com o Alcorão e, segundo estudiosos do islamismo, o profeta Maomé quis acabar com ele. Apesar disso, ele prosperou e estendeu tentáculos mortíferos para grande parte da Ásia, onde, no Paquistão, no Afeganistão e no Irã, as mulheres acusadas de infidelidade são apedrejadas até a morte”8.

Não convém esquecer que o Cristo já se empenhara contra a violência absurda9. Quando, deixando de julgar a adúltera, Jesus propõe que aquele entre os seus acusadores que estiver sem pecado atire a primeira pedra, ele está observando a lei, no tocante à pena de lapidação entre os judeus: “A mão das testemunhas será a primeira a feri-lo para o matar, e em seguida a mão de todo o povo. Assim tirarás o mal do meio de ti.” (Deuteronômio, 17/7). Nenhum dos acusadores ousou atirar a primeira pedra. Cristo, o único que poderia fazê-lo, condenou só o pecado, não a mulher, segundo Santo Agostinho.

O medo das mulheres, de qualquer modo, subsiste, onde sua condenação ainda for possível, com certa ambigüidade: ao mesmo tempo que elas são consideradas “frágeis, necessitando de proteção, elas são vistas como jezebéis malignas, das quais a sociedade precisa se proteger. Esse fardo de uma cultura antiga apresenta o macho como o único protetor da fêmea e que, portanto, deve ter controle absoluto sobre ela. Se sua proteção é violada, ele perde a honra, pois deixou de protegê-la ou não a educou corretamente”10.

Cabe observar que, se na West Bank e na Jordânia, subsiste o homicídio da mulher por “princípios da honra”, por incrível que possa parecer, isso só ocorre quando há conhecimento público dos fatos. Se o “crime” permanece sigiloso, a vida da moça deixa de correr perigo.

A impunidade fácil e freqüente conspira a favor da sinistra tradição. Todos sabem que o fato decorreu da defesa da honra, mas consta outra explicação, segundo autoridade do Centro de Medicina Legal para a Autoridade Palestina, em Jerusalém Oriental. O Dr. Hani Jahshan se refere a casos sucessivos de mulheres que chegam à sua mesa de autópsia, vítimas de “homicídio em defesa da honra: As famílias me trazem moças para serem examinadas depois de um ataque sexual. Digo aos pais que elas são inocentes, mas algumas semanas depois elas retornam, mortas. Não se trata de crime de estupro ou morte. O crime é a perda da castidade.”

Em 1999 e 2000, organizações diversas, usando abaixo-assinado com 15 mil assinaturas, entraram em campanha para exigir modificação da lei pelo governo da Jordânia, considerando os supostos crimes contra a vida em defesa da honra homicídios como os demais casos. A Câmara Baixa do Parlamento da Jordânia rejeitou duas vezes tal pretensão. Espera-se, agora, que “a consciência pública e a pressão internacional ajudem a modificar a lei. Entretanto, o consultor jurídico da campanha, o advogado jordaniano Asma Khader, sabe que não basta modificar a legislação. ‘Precisamos enviar ao povo uma mensagem cultural, mostrando que isso não é mais aceitável”11.

O movimento prossegue. As mulheres mantêm encontros na sala de reuniões de um hotel. Sua agenda inclui a criação de abrigos femininos, novas leis e emancipação de mulheres e meninas. Na época do ramadã, o mês mais sagrado do mundo islâmico, enquanto “os muçulmanos jejuam em Ramallah e os cristãos se dirigem de Jerusalém para Belém, as mulheres reunidas naquele hotel lutam pela vida das mulheres cujos homens estão rezando.”

Considerando este trecho bom final para este comentário, até acreditei em mudanças mais recentes. Infelizmente, o Jornal da Tarde desta data, 23/4/2004, traz certa desilusão:

Matou irmã grávida para ‘lavar honra da família'. Uma mulher grávida de oito meses foi assassinada a punhaladas por seu irmão, que
confessou à polícia ter cometido o crime visando ‘limpar a honra da família'. A vítima tinha 25 anos e, de acordo com fontes oficiais jordanianas, estava na cozinha de sua casa com o seu irmão, quando recebeu mais de 20 punhaladas em diferentes partes do corpo Após cometer o crime, o homem ligou para a polícia e esperou que os agentes chegassem na casa para efetuar a prisão. Segundo as primeiras informações, a moça tinha se casado há um ano com um egípcio, sem o consentimento de sua família. A mulher retornou à Jordânia para dar à luz, e quando seu irmão soube que ela estava no país, foi até sua casa e a matou. Na Jordânia, o código penal permite aos juízes ditar sentenças benévolas contra quem comete algum ‘crime de honra'.”

4) A poligamia atual

A normalidade ocidental da monogamia, aspecto básico da nossa experiência, não permite a ignorância sobre o tema da poligamia, evidentemente relativo ao número maior de cônjuges no casamento.

Numerosas sociedades admitem a multiplicidade de cônjuges, prática que pode assumir diversas formas. A que admite “a mulheres ter vários maridos (poliandria) tem sido muito rara, mas não a que tolera que o homem possua várias esposas (poliginia). Mais raro ainda é ocasamento grupal, no qual várias mulheres são casadas na mesma ocasião com vários homens. Temos uma variação de todas essas formas na monogamia serial, na qual pessoas têm um cônjuge de cada vez, mas, devido às altas taxas de divórcio ou mortalidade, casam-se várias vezes durante o tempo de vida. Esses casamentos são monogâmicos em sentido temporal, mas incluem elementos de poligamia na medida em que os indivíduos vivem na expectativa de ter mais de um cônjuge durante suas vidas”12.

Este breve comentário só se refere à poligamia consistente em ter o homem duas ou mais esposas. A raridade e até o tom anedótico sobre a ocorrência de dois ou mais maridos, em qualquer casamento, mostram-se tranqüilos. O chamado eterno feminino se revela até no sonho de Cabíria, depois Sweet Charity, nos palcos e nas telas, e mesmo, no meio da maior promiscuidade, como no caso de “Suely, a prostituta que rifa o próprio corpo, convencida de que é melhor passar a noite, por dinheiro, com um só homem, em vez de vários.”13.

Avulta a distinção entre o casamento e a união estável, entre nós, pela possibilidade de “relações simultâneas” no último caso: “De regra, não é viável o reconhecimento de duas entidades familiares simultâneas, dado que em sistema jurídico regido pelo princípio da monogamia. No entanto, em Direito de Família não se deve permanecer no apego rígido à dogmática, o que tornaria o julgador cego à riqueza com que a vida real se apresenta. No caso, está escancarado que o de cujus tinha a notável capacidade de conviver simultaneamente com duas mulheres, com elas estabelecendo relacionamento com todas as características de entidades familiares. Por isso, fazendo ceder a dogmática à realidade, impera reconhecer como coexistentes duas entidades familiares simultâneas.”14.

Matéria assinada por jornalista15, origem evidente deste comentário, analisa a contribuição da diretora cinematográfica Nia Dinata, natural da Indonésia, que ficou chocada pelo fato de seu pai ter arranjado a segunda esposa. Note-se que esse artigo não se encontra no caderno de artes e diversões, mas na 3ª página do caderno principal.

Perlez começa salientando que Nia Dinata, sem qualquer dúvida, é atualmente a cineasta de maior prestígio do seu país. O sucesso dos seus filmes vem da sua coragem de abordar temas atuais, com ternura e toques de humor. No seu filme mais recente, “Love to share” (ou “Amor para repartir”), que retrata a angústia por trás da cena dos casamentos poligâmicos, a platéia poderá também detectar algo mais: a origem autêntica da experiência.

Quando Nia Dinata tinha dezoito anos, estudando nos EUA, ela foi chamada de repente à sua terra, de onde viera a notícia de que seu pai estava casando-se com uma segunda esposa.

Agora, além da sua experiência pessoal, Dinata, com 36 anos de idade, graduada em cinema pela Universidade de New York, disse que viu o filme como depoimento sobre a sociedade da Indonésia contemporânea. Como uma das orientações conservadoras do Islã domina a Indonésia, a poligamia está em alta, alardeada em público por princesas e políticos.

A cineasta, que vive um casamento monogâmico, agarrou a oportunidade para mostrar aquilo que ela chamou de tristeza e negativas por trás dos sorrisos das esposas que afirmam aceitar ser uma de um grupo.

Ela confirma o choque sofrido ao receber a notícia da sua mãe. Ela então pediu aos pais para obterem o divórcio. Seus pais, por sua vez, ficaram chocados com a reação dela. Para eles, os filhos prefeririam ver os pais juntos, mesmo em circunstâncias difíceis. Dinata reconhece que sua atitude destoava da maioria das famílias, pois ela queria dizer o que sentia.

O pai dela acabou casando-se e sua mãe, médica, adotou a aparência de calma. O mais impressionante para Dinata não foi somente o tumulto íntimo da mãe e sua aparente bravura, mas também a curta duração do segundo casamento, que durou quatro anos. “Os homens” – ela diz – “têm de dividir seu tempo, o que os faz perder toda a graça”.

Muitos dos segundos e terceiros casamentos, dilacerados por tensões do marido tentando acomodar todas as esposas, não duram, e os que duram muitas vezes resultam em abuso doméstico. As tendências e as emoções do relacionamento da sua mãe com o seu pai, combinados com dois anos de pesquisa através da Indonésia – dedicados a entrevistas com mulheres de diferentes classes sociais e visitando abrigos de mulheres – foram a espinha dorsal do filme Love to share. Este filme, dividido em três partes, trata de três casamentos poligâmicos em três famílias com diferentes antecedentes.

Algumas cenas do filme, que são vagamente baseadas nos antecedentes da família Dinata, revelam emoções fortes. A primeira esposa no filme, Salma, uma ginecologista, é logo humilhada quando ela encontra a segunda mulher numa cerimônia pública: “Por que eu tive de encontrá-la diante de tanta gente?” – Salma pergunta ao seu marido quando o casal retorna ao lar. Seu marido, um político com todas os ornamentos de um praticante muçulmano – no filme, a referência a ele se faz como Pak Hajji, título usado para indicar que ele esteve em Meca – diz com absoluta tranqüilidade: “Você é perfeita. Eu só queria evitar adultério.”

Salma, estoicamente, conduz sua vida como médica ocupadíssima, designando um novo clínico, atendendo às mulheres no parto: “Eu tento agir como se nada tivesse mudado”, diz ela. Mas dez anos depois, muita coisa mudou. Salma adotou as vestes muçulmanas, e no final do filme, Pat Hajji arranja a terceira e mais jovem esposa.

Quando ele sofre um enfarte, as três esposas correm ao hospital. O filho adolescente, que desaprova tal situação (Dinata tem um irmão mais jovem) diz, com escárnio: “Papai conseguiu o que queria, todas as três esposas estão juntas.”

Dinata, refletindo o ambiente familiar, retrata Pak Hajji cheio de remorso no leito de morte: “É uma confusão terrível” – diz ele ao filho –"quando você se casar, faça-o com uma só esposa”.

Como final irresistível, Dinata mostra a quarta esposa, que só aparece no funeral, trazendo uma criancinha.

Daí a passagem destacada em epígrafe: “O pano de fundo do filme Amor para repartir é muito mais abrangente do que uma história pessoal de tormento e mágoa.”

O Presidente Suharto, influenciado por sua mulher, adversária da poligamia, decretou em 1974 que os servidores civis não poderiam contrair novos casamentos sem a permissão do governo, consentimento raramente concedido.

Mas, como o lslã se tornou mais poderoso lá depois da queda de Suharto em 1998 e o número de casamentos poligâmicos aumentou, Dinata disse que o governo estava temeroso do crescente poder dos líderes religiosos, para fazer alguma coisa sobre o assunto.

Um recente vice-presidente, Hamzah Haz, vangloriou-se da sua poligamia, levando suas três esposas em viagens a Meca. Certo empresário bem conhecido, Puspo Wardoyo, considerou a poligamia obrigação dos homens muçulmanos ricos, que – ele argumenta – tenham bastante dinheiro para circular com várias mulheres. Ele tem quatro – o limite imposto pelo Corão – e serve “suco de poligamia”, mistura de quatro frutas tropicais na sua cadeia de restaurantes de frango. O suco de quatro, segundo ele, representa o número ideal de esposas.

Uma princesa da casa real de Yogyakarta, Sitoresmi Trabuningrat, que é também mulher de negócio, falou recentemente que o fato de ser integrante de um “time” de esposas deu a ela mais independência, porque as mulheres podiam repartir as tarefas domésticas.

“Amor para repartir” teve boa platéia em Jacarta e Bandung, cidade próxima, embora muitos dos espectadores fossem estrangeiros residentes na Indonésia. Nos demais lugares do país, as platéias foram menores: “Eles não querem saber”, disse Dinata, acrescentando: “Mulheres vieram com mulheres no meio da tarde. Elas não queriam que seus maridos soubessem.”

Durante a viagem promocional da Indonésia, as chamadas telefônicas para as entrevistas radiofônicas eram previsivelmente enfurecidas, segundo Dinata. Os homens se mostravam extremamente rudes e diziam: Como você ousa nos criticar? Nós fazemos o bem para as mulheres, desposando mais de uma delas.” Poucas mulheres, contudo, ligaram, fato atribuído por Dinata ao medo delas de discutir o assunto.”

Conhecer a verdade pode contribuir para libertar a mulher das desigualdades mais graves que ainda a angustiam. Escrevi contra a sua mutilação genital, odioso resquício do machismo em vastas regiões do mundo, na atualidade16. Também sobre a agressão e até morte da mulher, por falsos motivos da suposta honra familiar17. Ainda no começo dos anos noventa, discorri sobre o assédio sexual18, também quase exclusivo tema da mulher, no qual insisti mais recentemente, em artigo citado adiante (“O assédio sexual, algumas notas comparativas e o crime de assédio sexual”).

As conquistas e avanços da mulher não permitem a falta de reflexão sobre as graves desigualdades que teimam em sobreviver.

5) Casamento das menininhas

O jornal O Estado de S. Paulo de 13/11/2008 traz notícia oriunda do Iêmen: Menina de 10 anos recebe prêmio por obter divórcio. Acima da fotografia da garota, o texto começa informando: “A jovem iemenita Nujood Ali, de 10 anos, foi escolhida pela revista americana Glamour como uma das ‘mulheres do ano' por ter conseguido, com a ajuda de uma advogada, ‘um divórcio histórico'. Nujood, que se casou no início do ano com um homem com o triplo de sua idade, sofria constantes abusos sexuais. No entanto, ao contrário da maioria de noivas crianças, Nujood procurou ajuda legal e conseguiu se divorciar, tornando-se um símbolo internacional dos direitos das mulheres.”

Em seguida, a matéria do jornal resume o ambiente dos fatos: “De acordo com a tradição tribal do Iêmen, jovens a partir de 9 anos podem se casar, embora a Constituição do país não autorize casamentos antes dos 15 anos. No entanto, o antigo costume se impõe à lei com certa freqüência.”

A notícia se encerra com a premiação: “Nujood recebeu o prêmio em Nova York, juntamente com mulheres que tiveram destaque em outros segmentos – como moda, política e entretenimento. Entre as outras premiadas pela revista estão a senadora Hillary Clinton e a secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice.”

Nosso atual Código Civil (Lei n. 10.406, de 10/1/2002), prevê a nulidade do negócio jurídico, quando o agente for pessoa absolutamente incapaz (por ex., os menores de dezesseis anos, cf. artigo 3º, inciso I, do mesmo Código). Em matéria de família, a regra do mesmo diploma legal, em seu artigo 1.517, é a capacidade para o casamento também aos dezesseis anos, para o homem e a mulher. A relevância do casamento é tal que dispõe de regras na própria Constituição Federal, em seu artigo 226, que prevê o divórcio como meio de dissolução do casamento civil (§ 6º). O nosso Código Civil prevê a nulidade do casamento, dando a impressão de que é apenas anulável o casamento “de quem não completou a idade mínima para casar” (artigo 1.550, inciso I).

O mesmo Código Civil, como o anterior, não regula a inexistência do negócio jurídico, nem, mais especificamente, do casamento civil. No entanto, um dos casos de casamento inexistente era aquele realizado entre pessoas do mesmo sexo. Ao tema, dediquei mais de um estudo 19.

Qual a vantagem de indagar-se previamente se o ato jurídico é existente ou inexistente? Porque, neste caso, nem será exigível o processo judicial, com todo o seu rigor formal, para que se façam as meras correções de registro civil ou outras providências semelhantes e sempre caberá a impugnação do ato. A doutrina dava os exemplos do casamento entre pessoas do mesmo sexo ou o casamento celebrado como mera farsa.

Nos dois estudos citados, lembro que o jurista italiano Enrico T. Liebman, que residiu e trabalhou no Brasil durante a segunda guerra mundial, mencionou passagem das Ordenações Filipinas reconhecendo a categoria do ato processual inexistente: “A sentença, que é por Direito nenhuma, nunca em tempo algum passa em cousa julgada, mas em todo tempo se pode opor contra ela, que é nenhuma e de nenhum efeito, e portanto não é necessário ser dela apelado. E é por Direito a sentença nenhuma, quando é dada sem a parte ser primeiro citada, ou é contra outra sentença já dada, ou foi dada por peita, ou preço, que o Juiz houve, ou por falsa prova, ou se eram muitos Juízes delegados, e alguns deram sentença sem os outros, ou se foi dada por Juiz incompetente em parte ou no todo, ou quando foi dada contra Direito expresso, assim como se o Juiz julgasse diretamente que o menor de 14 anos podia fazer testamento, ou podia ser testemunha, ou outra coisa semelhante, que seja contra nossas Ordenações ou contra Direito expresso.

Usei o grifo final para a inclusão de outra hipótese evidente: ou se o Juiz considerasse existente o casamento de menina de dez anos, como pressuposto da concessão de divórcio a ela.

Alguém dirá que os absurdos são ainda maiores. Em face da Constituição do país da menina divorciada, de modo algum poderia prevalecer qualquer outra norma jurídica servindo de base a casamentos de criança de nove ou dez anos.

A Constituição brasileira, em seu artigo 227, que nenhuma outra norma jurídica nossa pode contrariar, prevê: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”

O nosso Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069, de 13/7/1990) pormenoriza cada uma dessas garantias, sabendo-se que, pelo disposto em seu artigo 2º, aos doze anos a criança passa a ser adolescente, com os mesmos direitos, incluindo-se, no Capítulo II, Do Direito à Liberdade, ao Respeito e à Dignidade, o aspecto de “brincar, praticar esportes e divertir-se” (artigo 16, inciso IV).

Nosso Código Penal prevê crimes sexuais praticados mediante violência ou grave ameaça (artigos 213, 214 e 219). Pois seu artigo 224 dispõe: “Presume-se a violência, se a vítima: a) não é maior de 14 (catorze) anos”.

Não podemos, no nosso ordenamento jurídico, sequer entender que uma menina de dez anos possa ser considerada casada, pois sem tal estado civil ela não poderia divorciar-se, e que, em algum lugar do nosso tempo, ela receba prêmio pela obtenção do divórcio, com a maior publicidade possível. O artigo 17 do nosso citado Estatuto da Criança e Adolescente estabelece: “O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.”

6) O assédio sexual e o crime de assédio sexual

Por força da Lei n. 10.224, de 15/5/2001, o nosso Código Penal passou a contar o seguinte dispositivo: “Art. 216-A. Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função. Pena – detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos.”

Escrevendo sobre o tema há mais de uma década (CRUZ, 1992, p. 2), observei que o mundo inteiro acompanhara, pelos meios de comunicação, a acusação feita por Anita Hill, advogada, então com 35 anos de idade, ao novo ministro da Suprema Corte dos EUA, Clarence Thomas, que na época contava 43 anos de idade. O Senado americano, segundo tal acusação, não deveria aprovar a nomeação feita pelo Presidente Bush, pai do atual Presidente, porque, cerca de dez anos antes, trabalhando sob as ordens de Thomas, a autora da acusação teria sofrido assédio sexual (sexual harassment) por parte do novo ministro, isto é, este teria feito naquela época referência explícita a detalhes anatômicos mais íntimos e proezas de que ele seria capaz, em matéria de sexualidade. O julgamento do Senado teve resultado favorável ao novo ministro, por escassa maioria.

As possíveis repercussões teóricas e práticas de tal caso sugeriam alguma análise. Observe-se que a reportagem da revista TIME, de 21/10/91, ouvindo jurista do elevado nível de Judith Resnick, professora da University of Southern California, obteve a informação de que esse caso constituía “paradigma de assédio sexual”.

O tema, apesar da clareza da linguagem legal, era complexo, envolvia os limites entre a moral e o direito, sendo sua incidência difícil de ser medida. Sob o critério da EEOC (Equal Employment Opportuniry Commission – Comissão de Igual Oportunidade de Emprego), desde 1980, confirmado, unanimemente, pela Suprema Corte dos EUA, em 1986, assédio sexual incluía não apenas o abuso físico, mas também o verbal e circunstancial, ou relativo ao ambiente hostil de trabalho. O verdadeiro problema não residia na importunação ofensiva ao pudor (prevista como contravenção no artigo 61 da nossa Lei das Contravenções Penais). Tratava-se, antes, “de abuso de poder, quando a trabalhadora dependia para sua sobrevivência profissional da boa vontade de seu superior e, por isso, sentia-se vulnerável”. Não era, automaticamente, questão relativa aos dois sexos, mas, como salientara certa autoridade ouvida, “questão de intimidação econômica'.

Havia até advogados norte-americanos especializados em casos de assédio sexual, em geral, relativos a mulheres em empregos inferiores, nas chamadas white-collar professions.

Certa Corte de Justiça da Califórnia adotara como critério para a devida proteção contra o assédio sexual a condenação de expressões e gestos que parecessem problemáticos a uma reasonable woman, acrescentando-se que a percepção dessa “mulher razoável” distinguia-se daquela do homem.

Tanto na opinião de psicólogos, quanto na de sociólogos, existia em tudo a tentativa de enfraquecer o poder da mulher.

Claro que não faltava certa visão unilateral do problema, com a objeção consistente em que os homens manipulavam o poder profissional, mas as mulheres tinham o poder sexual.

Os casos exemplificados pela reportagem eram diversos. Saliente-se que, por força do U. S. Civil Rights Act de 1964, a mulher que vencesse a demanda ficava reintegrada no emprego com pagamentos dos atrasados.

Havia leis estaduais mais generosas, mas não existia punição, ainda, no âmbito federal.

Quando escrevi essas notas, a nossa atual Constituição da República era bem recente. Sem dúvida, ela se mostrava pródiga com normas de direitos sociais. De interesse para o tema examinado, podíamos lembrar seu artigo 7º, inciso XX, que prevê, entre os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, a “proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei”. Some-se a isto o disposto no inciso XXX do mesmo dispositivo constitucional: “proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil”.

Concluindo, tentei profetizar: “A experiência americana apenas esboçada nas linhas precedentes poderá servir de modelo, quando surgirem controvérsias sobre certas condutas relativas à mulher trabalhadora em sua atividade profissional.”

Em termos comparativos, cabe o exame dos dispositivos mais recentes do Código Civil do Estado da Califórnia20. Tal diploma em seu § 51.9, sob a rubrica Assédio Sexual – Elementos de Causa de Ação ( Sexual Harassment – Elements of Cause of Action) estabelece:

a) Aquele que for demandado por assédio sexual será responsabilizado se o autor da ação provar todos os seguintes requisitos:

(1) Existência de atividade, serviço ou relacionamento profissional entre o autor e o réu. Tal relacionamento pode existir entre o demandante e, entre outras, as seguintes pessoas: A) Médico, psicoterapeuta ou dentista... (B) Advogado, assistente social, agente do registro de imóveis, contador, banqueiro, construtor; C) Administrador; D) Hospedeiro; E) Professor; F) Relacionamento que seja substancialmente assemelhado a qualquer daqueles acima.

(2) O demandado ter feito avanços sexuais, solicitações, propostas sexuais, ou pedidos de concordância sexual do demandante indesejáveis e persistentes ou rigorosos, continuando após o apelo do demandante para parar...

(3) Não estar o demandante em condição de encerrar facilmente o relacionamento sem grave prejuízo.

(4) O demandante ter sofrido ou estar para sofrer perda econômica, desvantagem ou prejuízo pessoal como resultado da conduta descrita no parágrafo (2).

(b) Numa ação decorrente desta seção, os danos serão concedidos de acordo com a seção 52.

(c) Nada neste dispositivo será interpretado para limitar a aplicação de qualquer outra providência conforme a lei.

(d) A demanda e resposta sob este dispositivo observarão o disposto nas seções 446 e 447 do Código de Processo Civil.

O mencionado artigo 52 do Código Civil do Estado da Califórnia regula a indenização por atitudes discriminatórias (§§ 51 e 51.5 do mesmo Código californiano), sendo, como consta acima, aplicável para indenizações decorrentes de assédio sexual21.

No tocante ao Canadá, Estado Federal cujas unidades locais – as suas Províncias – também possuem, como ocorre com aquelas que integram os EUA, autonomia bem mais acentuada do que a dos nossos Estados-membros (cf. meu artigo sob o título “Canadá: Direito e Processo”. Revista Forense. v. 351. pp. 117 e ss.), encontra-se definição de assédio sexual na seção 3 do Human Rights Act da Nova Scotia de 1989, conforme emenda de 1991: “(i) significa ‘conduta sexual constrangedora ou comentário que se presume razoavelmente indesejável, (ii) uma solicitação ou investida sexual feita por uma pessoa a outra pessoa, quando aquela pessoa está na posição de conceder ou negar benefício à pessoa a quem a solicitação ou investida é feita, quando a pessoa que faz a solicitação ou investida saiba ou deva razoavelmente saber que é indesejável, ou (iii) uma represália ou ameaça de represália contra certa pessoa por rejeitar uma solicitação ou investida sexual”22.

Também se encontra a seguinte informação relativa ao vocábulo harassment 1.: “Fazer comentário ou adotar conduta vexatória, que se
sabe ou se deve razoavelmente saber indesejável.” (Human Rights Code, 1990) “2.: Geralmente no contexto de raça ou sexo... um padrão de indesejável conduta física ou verbal, que, intencionalmente ou não, humilha um empregado ou cria um ambiente de trabalho ‘envenenado' – literalmente, “poisoned” work environment – ou outras conseqüências adversas para ele ou para ela...”23.

Retornando ao artigo 216-A, introduzido pela Lei n. 10.224, de 15/5/2001, no nosso Código Penal, poderia desenvolver considerações penais e mesmo processuais penais, embora com menor segurança e harmonia de convicções do que conseguiram Damásio Evangelista de Jesus 24 e Luiz Flávio Gomes25. Note-se que, mesmo aí, seu consenso, por exemplo, sobre a possibilidade da tentativa do assédio26, não coincide com a opinião de outros27.

Jesus e Gomes lamentam o veto, que suprimiu o projetado parágrafo único do artigo 216-A do Código Penal: “Incorre na mesma pena quem cometer o crime: I – prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade; II – com abuso ou violação de dever inerente a ofício ou a ministério.” Para o primeiro, com o veto, “subsistiu somente o assédio laboral (caput). Os outros tipos de assédio são atípicos” 28. Para Gomes, o veto excluiu cinco modalidades de assédio (o doméstico, o decorrente de coabitação, de hospitalidade, de abuso inerente a ofício ou a ministério), a pretexto da sua previsão no artigo 226 do Código Penal como causas especiais de aumento da pena, daí resultando sua impunidade29.

Ataliba Pinheiro Espírito Santo se mostra crítico, ante a natureza polêmica da matéria, a “imprecisão do injusto, a distorção da pena, a indefinição de termos do tipo, a complexidade processual do delito e a inadequada tentativa de educar criminalizando a conduta”, além da possibilidade de que certos ilícitos não sejam criminalizados, pela própria “necessidade de não-banalização do crime”30.

Concordo com Rômulo de Andrade Moreira: o constrangimento exigido pelo artigo 216-A do Código Penal pressupõe perseguir com insistência, molestar, não bastando “simples palavras elogiosas ou meros gracejos” 31.

Contudo, retomando o caso considerado pela jurista Judith Resnick “paradigma de assédio sexual”, parece-me que o nosso legislador ignorou quase completamente a essência da matéria, que não se caracteriza pela intimidade sexual, mas pela intimidação econômica.

7) Considerações conclusivas

Alguns dos tópicos anteriores, num primeiro momento, poderão parecer de remoto ou quase nenhum interesse em nosso meio jurídico, que não adota, por exemplo, a poligamia, nem casamentos de meninas com nove ou dez anos de idade. No entanto, como seres humanos, não julgamos alheio a nós nada do que é humano (Homo sum: humani nihil a me alienum puto, segundo Paulo Rónai, verso de Terêncio32. E, ainda mais, como estudiosos do Direito, contemplaremos, sempre, a normas divergentes das nossas e dos sistemas ocidentais mais familiares. Note-se que o grande comparatista René David usava a expressão família, para classificar os principais conjuntos de sistemas jurídicos contemporâneos: a família romano-germânica, a dos direitos socialistas, a do common law e a das outras concepções da ordem social e do Direito (o Direito muçulmano, o da Índia, os Direitos do extremo oriente e os Direitos da África e Madagáscar33.

Por outro lado, jamais convém esquecer a noção de ordem pública internacional: “Noção particularista de um Estado, tendo por efeito eliminar toda regra jurídica estrangeira que acarrete o nascimento de uma situação contrária aos princípios fundamentais do Direito nacional”34. Em matéria do chamado conflito das leis, expressão tão criticada por Amílcar de Castro, o juiz brasileiro “pode abrigar-se atrás da ordem pública para afastar uma lei estrangeira normalmente aplicável, quando sua aplicação ofender os fundamentos jurídicos, econômicos e sociais da sociedade” brasileira35. A expressão ordem social, diversa da ordem jurídica da nossa Lei de Introdução, artigo 17, é preferida entre nós36. Ele exemplifica com muçulmano que viesse para o Brasil com suas 4 esposas, destacando ainda a relevância da fixação dos limites da maioridade).

Assim, não serão aplicáveis no Brasil regras jurídicas estrangeiras sobre poligamia e casamentos de meninas de nove ou dez anos de idade. No primeiro caso, se a mulher for maior de idade, nenhuma providência caberá em seu favor, enquanto cônjuge, já que a poligamia ofende à nossa ordem social, quer dizer, não prevalece perante o nosso direito objetivo. Já o casamento de meninas abaixo de quatorze anos de idade será totalmente inexistente até para o fim de condenação do parceiro por violência sexual presumida. No Brasil, a vítima gozará de toda proteção assegurada pela legislação penal e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Assim, a identidade e a imagem da menina que se case com idade abaixo da mínima legal, não poderão ser divulgadas. O possível divórcio por tal criança obtido nenhum reflexo terá sobre o relacionamento sexual com o ex-marido ou novos parceiros que com ela coabitem.

Infelizmente, a regra jurídica recente de alguns países europeus, considerando crime, por exemplo, a mutilação intencional da mulher, mesmo quando praticada em país alienígena que não considere crime tal conduta, esbarra no disposto no artigo 7º, § 2º, letra b do nosso Código Penal.

Lesões corporais e homicídios intencionais constituem crime entre nós, sendo irrelevantes falsos motivos de honra familiar. Também o estupro e o atentado violento ao pudor, presumida a violência se a vítima não é maior de quatorze anos. Contrair alguém, sendo casado, novo casamento constitui o crime de bigamia no Brasil. Enfim, constou a figura típica do crime de assédio sexual, que não corresponde às condutas com semelhante denominação do Direito estrangeiro pesquisado, onde, de resto, o assédio não constitui crime. Logo, ao lado das observações já feitas, destaca-se a de que o nosso ordenamento jurídico condena com a tutela penal as cinco condutas referidas nos tópicos anteriores, não podendo, contudo, condenar, por tais condutas, os acusados que as cometam nos países em que elas não sejam fatos puníveis.

 

1 Procurador de Justiça aposentado (SP). Mestre e Doutor em Direito (USP). Titular da Cadeira n. 48 da Academia Paulista de Direito.
2 “The Runaway Bride” (ou “Noiva em fuga”). Time, 5/5/2003. pp. 38/40.         [ Links ]
3 CRUZ, José Raimundo Gomes da , “Com risco de mutilação”. CPPG Noticias. São Paulo, Ano III, v. 8, p. 2. 1994.         [ Links ]
4 The Scars of Tradition”, Time, 5/5/2003
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6 ARMSTRONG, Sally. “Morrendo de vergonha”. Seleções. julho/2001. pp. 33/37.         [ Links ]
7 ARMSTRONG, Sally. “Morrendo de vergonha”. Seleções. julho/2001. pp. 36.         [ Links ]
8 ARMSTRONG, Sally. “Morrendo de vergonha”. Seleções. julho/2001. pp. 35.         [ Links ]
9 São João, 8/3-11).
10 ARMSTRONG, Sally. “Morrendo de vergonha”. Seleções. julho/2001. pp. 35/36.         [ Links ]
11 ARMSTRONG, Sally. “Morrendo de vergonha”. Seleções. julho/2001. pp. 37.         [ Links ]
12 JOHNSON, Allan G. “Regras de casamento”. Dicionário de sociologia. Trad. Ruy Jungmann. Rio de Janeiro : Zahar, 1997. p. 192
Links ] Arial, Helvetica, sans-serif">13 MERTEN, Luiz Carlos. “Charlotte, ainda no clima de 68”. O Estado de S. Paulo. 30/9/06.         [ Links ]
14 TJRS – 4º Grupo Cível – EI nº 70013876867 – Porto Alegre – RS – j. 10/3/2006. Boletim AASP – n. 2509 – 5 a 11/02/2007.
15 PERLEZ, Jane. “Indonesian Filmmaker's Personal Take on Poligamy” (ou “Realização da cineasta da Indonésia sobre a poligamia”). The New York Times, 21/8/2006, p. 3
Links ] Arial, Helvetica, sans-serif">16 CRUZ, José Raimundo Gomes da _. Mutilação da mulher, crime sem fronteiras”. Revista Forense, Rio de Janeiro, ano 99, v. 370, p. 451-452, nov./dez. 2003.         [ Links ]
17 CRUZ, José Raimundo Gomes da “Femicídio”. Revista Forense. Rio de Janeiro, ano 101, v. 377. p. 447/450, jan./fev. 2005.         [ Links ]
18 CRUZ, José Raimundo Gomes da Assédio sexual sexual harassment”. CPPG Notícias. São Paulo, Ano I, v. 2, p. 2, 1992.         [ Links ]
19 CRUZ, José Raimundo Gomes da. “Admissibilidade dos recursos e efetividade do processo civil”. Estudos sobre o processo e a Constituição de 1988. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1993. pp. 187 e ss., especialmente pp. 189/194.         [ Links ] Do mesmo Autor, “Pressupostos processuais, condições da ação e instrumentalidade do processo. Uma vida dedicada ao direito – Homenagem a Carlos Henrique de Carvalho, o editor dos juristas. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1995.         [ Links ]
20 Cfr. CRUZ, José Raimundo Gomes da “Femicídio”. Revista Forense. Rio de Janeiro, ano 101, v. 377. p. 447/450, jan./fev. 2005.         [ Links ]
21 Standard California Codes . New York-San Francisco : Mathew Bender, 1998. pp. 18 e ss.         [ Links ]).
22 Cfr. Janzen v. Platy Enterprises Ltd. (1989), citado por YOGIS, John A. Canadian Law Dictionary. 5. ed. New York : Barron's, 2003.         [ Links ]
23 Cfr. Silzer v. Chaparral Industries (86) Inc. (1993)” citado por YOGIS, John, op cit., p. 124.         [ Links ]
24 JESUS, Damásio E. de., “Crime de assédio sexual”, in Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 91, n. 796, p. 477-483, fev. 2002.         [ Links ]
25 GOMES, Luiz Flávio. “Lei do assédio sexual (10.224/01)”, in. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 90, n. 793, p. 455-462, nov. 2001, pp. 455/462.         [ Links ]
26 JESUS, Damásio E. de, op. cit., pp. 482 e GOMES,         [ Links ] Luiz Flávio, op. cit., pp. 461.         [ Links ]
27 DELMANTO, Celso et alii. Código Penal comentado. 6. ed. Rio de Janeiro : Renovar, 2002, p. 471.         [ Links ]
28 JESUS, Damásio E. de, op. cit., pp. 483.
29 GOMES, Luiz Flávio, op. cit., pp. 460/461.
30 ESPÍRITO SANTO, Ataliba Pinheiro, “Crítica à Lei n. 10224, de 15.05.2001: assédio sexual”, in Revista jurídica, São Paulo, v. 49, n. 284, , jun. 2001, p. 79-89.         [ Links ]
31 MOREIRA, Rômulo de Andrade, “O novo delito de assédio sexual : Lei n. 10.224/2001”, in Revista Síntese de Direito Penal e Processual Penal, v. 2, n. 10, p. 45-58, out./nov. 2001, p. 51.         [ Links ]
32 RÓNAI, Paulo, Não perca o seu latim. 3. ed., Rio de Janeiro : Nova Fronteira, 1984, p. 81.         [ Links ]
33 DAVID, René. Os grandes sistemas do direito contemporâneo. trad. Hermínio A. Carvalho. São Paulo : Martins Fontes, 1986, pp. 16 e ss.         [ Links ]
34 GUILLIEN, Raymond et alii. Termes juridiques. 10. ed. Paris : Dalloz, 1995.         [ Links ]
35 Idem.
36 ROCHA, Osiris, “Ordem social (Direito internacional privado)”, in: FRANÇA, R. Limongi (Coord.). Enciclopédia Saraiva do Direito- v. 56. São Paulo: Saraiva, 1981, p. 275-277.         [ Links ]