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Revista Crítica de Ciências Sociais

versão On-line ISSN 2182-7435

Revista Crítica de Ciências Sociais  no.107 Coimbra set. 2015

 

RECENSÕES

Aragón, Luis E. (2013), Amazônia: conhecer para desenvolver e conservar. Cinco temas para um debate

 

Hisakhana Pahoona Corbin

Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, Universidade Federal do Pará Cidade Universitária Professor José da Silveira Netto, Rua Augusto Corrêa, 1, Guamá – 66075-110 Belém, Pará, Brasil drcorbin7@gmail.com

 

Aragón, Luis E. (2013), Amazônia: conhecer para desenvolver e conservar. Cinco temas para um debate. São Paulo: Hucitec Editoria, 324 pp.

 

Neste livro discutem-se cinco questões, cada uma num capítulo, com o propósito de incitar debates sobre os grandes desafios ambientais, sociais e econômicos que envolvem o desenvolvimento da Amazônia: 1. Amazônia, conceito polissêmico?; 2. Amazônia vazio demográfico?; 3. Amazônia, terra incógnita?; 4. Migração internacional, nova descoberta da Amazônia?; 5. Há futuro para o desenvolvimento sustentável na Amazônia? Esses questionamentos, argumenta o autor, “alicerçam-se na premissa de que o conhecimento da região é condição essencial para alcançar o desenvolvimento socialmente includente, ecologicamente sustentável e economicamente sustentado” (p. 286).

Na discussão dessas questões vários temas são tratados, destacando-se: a conservação da biodiversidade, o desmatamento, os povos tradicionais, a socioeconomia, a demografia, a energia, a mineração, a água, a cooperação internacional e a migração. Analisar a formação histórica da Amazônia, uma região extremamente heterogênea de mais de 7,5 milhões de quilômetros quadrados e mais de 35 milhões de pessoas, compartilhada por nove países (Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname, Venezuela e França/Guiana Francesa) não é nada fácil. Contudo, o autor consegue superar entre outras limitações a falta de dados padronizados, a diversidade de definições, os diferentes interesses políticos e econômicos com que é vista a região pelos diversos países e os períodos divergentes que acompanham a história de cada país.

O primeiro capítulo, “Amazônia, conceito polissêmico?”, aborda a invenção e reinvenção da Amazônia conforme as circunstâncias e os interesses que ela desperta. Analisam-se as controvérsias relacionadas com as diferentes formas de definir fisicamente a Amazônia, discute-se a Amazônia como uma área de intervenção, e debate-se a visão da Amazônia como uma marca para fidelizar consumidores. Conclui-se que a Amazônia converteu-se, por isso, num conceito polissêmico com múltiplos significados que servem propósitos diversos.

O segundo capítulo trata da questão: “Amazônia, vazio demográfico?”. Para o autor, “o mito do vazio amazônico é a visão do conquistador, que vê a região como uma terra de ninguém e sem ninguém, pronta para ser ocupada e apropriada” (p. 54). Essa visão permite a negação do homem amazônico e de sua cultura; o homem torna-se invisível, e, portanto, nada ou pouco representa. O atraso que vive a Amazônia em relação às outras regiões dos países que têm territórios na região é reflexo dessa concepção, que considera a região como a grande reserva de recursos naturais para alavancar o progresso dos países, sem dar valor ou potenciação ao conhecimento, às práticas, e às capacidades ali presentes.

Conclui-se que na Amazônia se processa uma intensa dinâmica demográfica onde se vivem piores condições de vida em relação aos respectivos países, fruto da exploração da região como simples fornecedora de matérias-primas, do pouco atendimento às necessidades de sua população, e da percepção da região como válvula de escape dos problemas nacionais.

O terceiro capítulo é o mais extenso. Discute-se a questão: “Amazônia, terra incógnita?”. De forma metafórica, o autor utiliza esse termo para analisar a história da Amazônia a partir do contato europeu e suas principais transformações demográficas e espaciais ocorridas em cada país. Aragón buscou demonstrar que a região sempre foi vista como área de exploração e de ocupação, que era necessário integrar ao domínio das potências ou países que a disputaram, desconhecendo-se suas próprias potencialidades de desenvolvimento. E que ela é ainda vista como uma área distante, uma fronteira de recursos, um Eldorado, cujas riquezas fabulosas estariam à espera de sua exploração. E que sobre esse mito baseiam-se as políticas de desenvolvimento, resultando em constantes conflitos violentos.

O quarto capítulo, “Migração internacional, nova descoberta da Amazônia?”, revela a importância que a migração internacional vem desempenhando na região nos últimos anos. A visibilidade que alcançou a Amazônia em nível global, a abertura de rotas de trânsito integrando fisicamente toda a América do Sul, a abertura das riquezas da região ao mercado mundial, o fomento ao turismo ecológico, e o próprio processo de globalização permitem ver a relevância da migração internacional no futuro da região. E já se conseguem perceber importantes processos relacionados com a migração internacional na região que demandam tratamento urgente, como, por exemplo, a fuga de capital humano que assola a Guiana e o Suriname; a migração de garimpeiros às Guianas; o tráfico internacional de seres humanos e redes de prostituição que circulam na Amazônia; o surgimento de novos fluxos, como o dos haitianos, e a mobilidade transfronteiriça com pouca fiscalização. E também os impactos econômicos e sociais das remessas do exterior; a herança deixada por imigrantes europeus, japoneses e de outras nacionalidades que hoje representa importante fator de desenvolvimento econômico, social e cultural da região; e o surgimento da Guiana Francesa como polo de atração, por sua condição de território europeu na região. Nesse sentido, o tocante à livre mobilidade de mão de obra no contexto de blocos regionais merece atenção especial, pouco abordada por Aragón. Sendo a Guiana e o Suriname membros da Comunidade Caribenha (CARICOM), e outros países amazônicos membros do Mercado Comum do Sul (MERCOSUL), esse fenômeno pode tornar-se crucial na redistribuição da mão de obra na região. A livre circulação de mão de obra pode afetar negativamente as regiões mais pobres, pelo aumento da emigração, sobretudo dos mais preparados, como é demonstrado no caso da Guiana e do Suriname.

Por último, o quinto capítulo expõe a pergunta “Há futuro para o desenvolvimento sustentável na Amazônia?”. Discutem-se aqui as grandes problemáticas abordadas nos mais importantes foros mundiais que atingem a Amazônia, destacando-se o uso da água, as novas fontes de energia, o desmatamento, as áreas protegidas, a cooperação e a integração regional, e a capacidade científica regional, analisando-se os grandes desafios e oportunidades que tais problemáticas representam na busca do desenvolvimento sustentável na região.

Finalmente, o livro de Aragón representa uma obra informativa e instigante que deixa em aberto, como era seu objetivo, muitas perguntas sem resposta, para que o leitor faça sua avaliação e busque suas próprias respostas. E deixa um recado: “torna-se necessário reinventar a Amazônia num contexto novo, começando pelo conhecimento de sua realidade no atual contexto internacional, suas transformações ao longo da história e seu papel relevante na geopolítica ambiental e econômica do mundo contemporâneo, sem esquecer as pessoas, as comunidades, a gente que habita a região, com sua cultura, organização social e conhecimentos.” (p. 53).

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