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Revista Portuguesa de Medicina Geral e Familiar

versão impressa ISSN 2182-5173

Rev Port Med Geral Fam vol.32 no.1 Lisboa fev. 2016

 

REVISÕES

Levedura vermelha do arroz e berberina no tratamento da dislipidemia: qual a evidência?

Red yeast rice and berberine in the treatment of dyslipidemia: what is the evidence?

Catarina Borges,1 Sara China,1 Sofia Carrapa,1 Vânia Teixeira2

1Médica Interna de Medicina Geral e Familiar. Unidade de Saúde Familiar Brás-Oleiro, ACeS de Gondomar.

2Médica Interna de Medicina Geral e Familiar. Unidade de Saúde Familiar São Pedro da Cova, ACeS de Gondomar.

Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence


 

RESUMO

Objetivo: Determinar se a levedura vermelha do arroz (LVA) e a berberina (BBR) são eficazes na redução do colesterol-LDL (C-LDL) e dos triglicerídeos (TG).

Fontes de dados: PubMed e bases de dados de medicina baseada na evidência.

Métodos de revisão: Pesquisaram-se guidelines, meta-análises (MA), revisões sistemáticas (RS), ensaios clínicos aleatorizados controlados (ECAC) e estudos observacionais nas línguas inglesa, portuguesa e espanhola. Utilizaram-se os termos MeSH (cholesterol, LDL, triglycerides, red yeast rice e berberine) e foram selecionados os artigos publicados entre janeiro de 2003 e janeiro de 2014 que incluíssem indivíduos com idade igual ou superior a 18 anos e dislipidemia não familiar. Avaliaram-se os níveis de evidência (NE) e atribuíram-se as forças de recomendação (FR), utilizando a escala Strength of Recommendation Taxonomy (SORT), da American Academy of Family Physicians.

Resultados: Dos 34 artigos obtidos, 10 cumpriam os critérios de inclusão. Uma MA, duas RS, quatro ECAC e um estudo observacional retrospetivo (EOR) evidenciaram a eficácia da LVA na redução dos níveis de C-LDL (NE 3). Os TG também foram eficazmente diminuídos pela LVA na MA, numa das RS e num dos ECAC (NE 3). A BBR demonstrou ser eficaz na redução do C-LDL e dos TG na MA/RS em que foi analisada (NE 3). A associação das duas substâncias, avaliada num ECAC, também reduziu de forma significativa o C-LDL.

Conclusões: A evidência disponível relativamente à redução dos níveis de C-LDL e dos TG com a administração da LVA e/ou BBR foi considerada limitada (FR C). Assim, antes de se recomendarem estas substâncias no tratamento da dislipidemia são necessários mais estudos de elevada qualidade metodológica que demonstrem o seu benefício e segurança, além de uma maior regulamentação da sua produção e comercialização.

Palavras-chave: Colesterol-LDL; Triglicerídeos; Levedura vermelha do arroz; Berberina.


 

ABSTRACT

Aim: To determine if red yeast rice (RYR) and berberine (BBR) are effective in lowering serum levels of LDL-cholesterol (LDL-C) and triglycerides (TG).

Data sources: PubMed and databases of evidence-based medicine.

Review methods: Guidelines, meta-analyses (MA), systematic reviews (SR), randomized controlled trials (RCT) and observational studies in English, Portuguese and Spanish were searched, using the MeSH terms (cholesterol, LDL, triglycerides, red yeast rice and berberine). Articles published between January of 2003 and January of 2014, including patients aged 18 years old and older without familial dyslipidemia were selected. The level of evidence (LE) and the strength of recommendation (SR) were assessed using the Strength of Recommendation Taxonomy (SORT) scale from the American Academy of Family Physicians.

Results: Of the 34 articles found, 10 met the inclusion criteria. One MA, two SR, four RCT and one retrospective observational study described the effectiveness of RYR for the reduction of LDL-C levels (LE 3). Triglycerides were also effectively decreased by RYR in the MA, in one of the SR and in the RCT (LE 3). The MA and SR that analysed BBR showed its benefit in reducing LDL-C and TG (LE 3). The association of both substances, evaluated in a RCT, was also effective in lowering the levels of LDL-C.

Conclusions: The available evidence regarding the reduction of LDL-C and TG levels with administration of RYR and/ or BBR was considered limited (SR C). Thus, before recommending these substances in the treatment of dyslipidemia, more studies of higher quality are needed to demonstrate their beneficial effects and safety. Better control in their production and marketing is also required.

Keywords: Cholesterol-LDL; Triglycerides; Red Yeast Rice; Berberine.


 

Introdução

A dislipidemia deve-se a alterações no metabolismo das lipoproteínas e caracteriza-se por níveis plasmáticos elevados de colesterol total (CT), colesterol LDL (C-LDL), triglicerídeos (TG) e por níveis diminuídos de colesterol-HDL (C-LDL), constituindo assim um importante fator de risco para doenças cardiovasculares. Apesar dos avanços diagnósticos e terapêuticos ocorridos nas últimas décadas, as doenças cardiovasculares continuam a ser a principal causa de morte a nível mundial, contribuindo com cerca de 30% do número total de óbitos.1

No tratamento da dislipidemia devem ser implementadas alterações no estilo de vida, baseadas na modificação dos hábitos alimentares e exercício físico, antes ou simultaneamente, ao tratamento farmacológico. Embora as estatinas sejam os fármacos recomendados, as taxas de interrupção da terapêutica são elevadas e quase um terço dos doentes interrompe o tratamento dentro de um ano após o seu início.2 As razões económicas, o género, a idade, a polimedicação, a raça e a (in)tolerância são os principais determinantes.2

Em contraste com as terapêuticas farmacológicas convencionais, os produtos à base de plantas são vistos como medicamentos “naturais”. Portanto, são geralmente considerados seguros no que diz respeito aos efeitos adversos e interações com outros componentes. Cada vez mais se encontram pessoas a usar produtos à base de plantas com objetivos preventivos e/ou terapêuticos, incluindo na dislipidemia.3

A levedura vermelha do arroz (LVA) e a berberina (BBR) têm sido algumas das substâncias utilizadas em produtos complementares e alternativos, comercializados em Portugal, com o propósito de regular os níveis de lípidos. A LVA resulta da fermentação do arroz pelo fungo Monascus purpureus e é um medicamento chinês (Hong Ou) desenvolvido há cerca de 1000 anos atrás para a indigestão, diarreia e dor abdominal.4 Este produto contém quantidades variadas de uma família de substâncias naturais, designadas monacolinas, que inibem a atividade da HMG-CoA redutase, além de outros ingredientes ativos que também podem influenciar os níveis de colesterol: esteróis, isoflavonas e ácidos gordos monoinsaturados.5 A LVA foi recentemente recomendada numa guideline para a prevenção da dislipidemia em adultos chineses.6 A BBR é uma isoquinolina derivada de alcaloides, extraída de muitas plantas medicinais chinesas que possui uma grande variedade de atividades farmacológicas e bioquímicas, incluindo atividade antidislipidémica.7-8 Esta substância interfere no metabolismo dos lípidos através da regulação da função dos recetores hepáticos de LDL.2-3,8

Embora vários estudos clínicos tenham demonstrado o efeito benéfico destas substâncias no perfil lipídico, a evidência permanece inconsistente. Assim, esta revisão baseada na evidência pretende determinar se a LVA e a BBR, potenciais alternativas às estatinas, são eficazes na redução dos níveis séricos de C-LDL e dos TG quando usadas de forma isolada ou em associação.

Métodos

Foi realizada uma pesquisa de guidelines, meta-análise (MA), revisão sistemática (RS), ensaio clínico aleatorizado controlado (ECAC) e estudos observacionais nas bases de dados National Guideline Clearinghouse, National Electronic Library NHS, Canadian Medical Association, The Cochrane Library, DARE, Bandolier e PubMed, publicados entre janeiro de 2003 e janeiro de 2014, nas línguas inglesa, portuguesa e espanhola. Na realização da pesquisa, os termos MeSH foram utilizados da seguinte forma: ((Red Yeast Rice OR Berberine) AND (Cholesterol, LDL OR Triglycerides)).

Como critérios de inclusão consideraram-se os artigos cuja população alvo fosse constituída por indivíduos com idade igual ou superior a 18 anos, com dislipidemia não familiar e nos quais a intervenção fosse a toma de BBR e/ou LVA comparativamente ao uso de placebo, ausência de intervenção ou tratamentos farmacológicos e não-farmacológicos antidislipidémicos. O outcome avaliado foi a diminuição dos níveis séricos de C-LDL e TG. Para avaliação dos Níveis de Evidência (NE) e atribuição de graus de Força de Recomendação (FR) foi utilizada a escala Strength of Recommendation Taxonomy (SORT), da American Academy of Family Physicians.

Resultados

Da pesquisa realizada foram encontrados 34 artigos, 10 dos quais cumpriam os critérios de inclusão. O processo de seleção dos estudos incluídos está representado na figura 1. A LVA foi avaliada numa MA, duas RS, quatro ECAC e num estudo observacional retrospetivo (EOR). A BBR foi avaliada numa MA/RS. Um ECAC avaliou a LVA e BBR, simultaneamente. Todos os estudos se encontram sumariados nos quadros I, II e III.

 

 

 

 

 

1. LVA

Na MA de Liu et al.9 verificou-se uma redução significativa dos níveis de C-LDL (-0,73 mmol/L; intervalo de confiança (IC) 95% (-1,02 a -0,043)) e de TG(-0,41 mmol/L; IC95% (-0,6 a -0,22)) com a LVA, em comparação com o placebo. Os efeitos desta substância nos lípidos também foram superiores ao grupo sob nicotinato de inositol (NI) e óleos de peixe. Em comparação com as estatinas, a LVA teve um efeito semelhante e, em comparação com os fibratos, um efeito semelhante ou inferior. Os autores concluem que esta MA evidencia os efeitos benéficos, a curto prazo, de três preparações diferentes de LVA na alteração do perfil lipídico. No entanto, são necessários estudos mais rigorosos antes de a LVA ser recomendada como tratamento alternativo na dislipidemia primária. A qualidade metodológica dos estudos incluídos foi, de uma forma geral, baixa, principalmente em termos de aleatorização e dupla ocultação. Além disso, estes estudos eram orientados para a doença, pelo que se atribuiu um NE 3.

Shang et al.6 e Lan et al.3 avaliaram, em duas RS, um extrato parcialmente purificado da LVA, a xuezhikang (XZK). Na primeira (Shang et al.6), a XZK foi eficaz na redução dos níveis de C-LDL e TG, quando comparada com a ausência de tratamento (C-LDL: -0,78 mmol/L, IC95% (-1,19 a -0,38); TG:-0,49 mmol/L, IC95% (-0,58 a -0,39)) com o grupo placebo (C-LDL: -0,57 mmol/L, IC95% (-0,62 a -0,52) e -1,82 mmol/L, IC95% (-2,01 a -1,63); TG:-0,17 mmol/L, IC95% (-0,22 a -0,12) e -1,29 mmol/L, IC95% (-1,57 a -1,01)) e com o grupo sob NI (C-LDL: -0,88 mmol/L, IC95% (-1,27 a -0,48); TG: -0,60 mmol/L, IC95% (-0,95 a -0,25)). Neste estudo foram avaliados outcomes primários (todas as causas de mortalidade, mortalidade por doença coronária, incidência de enfarte agudo do miocárdio, revascularização e re-hospitalização por angina instável) e outcomes secundários (CT, TG, C-LDL e C-HDL) em indivíduos com doença coronária previamente conhecida e com dislipidemia. Os resultados apresentados correspondem apenas à avaliação dos outcomes secundários, o que vai de encontro ao objetivo deste estudo. Além disso, dos 22 ECAC incluídos, 21 apresentavam resultados relativamente aos outcomes secundários e apenas cinco avaliavam os outcomes primários. Na segunda RS (Lan et al.3), a XZK foi igualmente superior na diminuição do C-LDL, em comparação com o grupo NI (-0,58 mmol/L, IC95% (-0,93 a -0,23)) e TG marinhos (-0,40 mmol/L, IC95% (-0,80 a -0,00)). Os TG não foram reduzidos de forma significativa. Em ambas as revisões, a XZK foi semelhante ao grupo das estatinas na diminuição do C-LDL. Apesar de Shang et al.6 concluírem que a XZK teve um efeito regulador dos lípidos, todos os estudos incluídos apresentavam um elevado risco de vieses. O facto de terem sido analisados resultados relativamente a outcomes secundários exige precaução adicional na sua interpretação. Além disso, na maioria dos estudos a aleatorização e a dupla ocultação não foram aplicadas ou não estavam descritas de forma clara. O pequeno tamanho amostral de alguns dos estudos incluídos, as diferentes formulações e dosagens utilizadas e os diferentes tempos de seguimento dos doentes foram também algumas das limitações apontadas nestes estudos, pelo que se atribuiu um NE 3. Por sua vez, os autores da segunda RS chegaram à conclusão de que a eficácia e segurança da XZK no tratamento da dislipidemia era inconclusiva devido ao elevado risco de vieses de muitos dos ECAC incluídos (nomeadamente, a aleatorização e a dupla ocultação não foram aplicadas ou não estavam descritas de forma clara). A heterogeneidade dos critérios de diagnóstico de hipercolesterolemia e/ou hipertrigliceridemia e a ampla variedade de formulações e dosagens foram os principais parâmetros apontados para a baixa qualidade do estudo. Assim, e por se tratar de uma RS orientada para a doença atribuiu-se um NE 3. De notar que seis dos estudos incluídos nesta RS foram também incluídos e analisados previamente na MA de Liu et al.9 Contudo, os resultados globais da RS de Lan et al.,3 publicada mais recentemente, são semelhantes e corroboram os resultados da referida MA.9

Ogier et al.,10 no seu ECAC, conseguiu uma diminuição do C-LDL em 21,4% (IC95% (-13,3 a -24,9%); p<0,001) e dos TG em 12,2% (IC95% (-24,4 a -0,1%); p<0,05) através da administração de um suplemento dietético com 500mg de LVA, três vezes por dia. Os autores concluíram que o consumo diário deste nutracêutico é uma ajuda útil na abordagem da hipercolesterolemia ligeira a moderada. No ECAC de Lee et al.11 a LVA (1110mg, uma vez por dia) foi efetiva na redução do C-LDL, em comparação com o placebo ((-0,7±0,6) vs (0,0±0,6) mmol/L; p<0,001), em doentes com síndroma metabólica. Bogsrud et al.12 investigaram o efeito de um produto que continha LVA. Detetou-se uma redução de 23% no C-LDL (p<0,001) com a administração de quatro cápsulas por dia desse produto, em comparação com o placebo. Assim, apesar de a LVA não poder ser aconselhada em substituição das estatinas ou outros fármacos antidislipidémicos, os autores concluem que pode ser uma alternativa razoável em casos selecionados. No ECAC conduzido por Halbert et al.13 comparou-se o efeito da toma de 2400mg de LVA, duas vezes por dia, com a toma de pravastatina 20mg, duas vezes ao dia. Embora não possam ser retiradas conclusões definitivas, a LVA foi eficaz na redução do C-LDL (30,2%±10,5) e dos TG (7,8%±30,5%) para níveis clinicamente significativos e semelhantes à pravastatina ((C-LDL: 27,0%±15,4); (TG:7%±32,2%)), numa população previamente intolerante às estatinas. O pequeno tamanho amostral (Bogsrud et al.,12 Halbert et al.13 e Ogier et al.10), a elevada taxa de abandono (Lee et al.),11 a heterogeneidade da amostra (Lee et al.11 e Halbert et al.13), a ausência de dupla-ocultação (Halbert et al.)13 e o facto de se tratarem de estudos orientados para a doença determinaram a atribuição de um NE 3 aos quatro ECAC incluídos.

O EOR, conduzido por Venero et al.,14 mostrou que a LVA, na dose de 1200mg uma vez por dia, diminuiu eficazmente o C-LDL (21%±14; p<0,001). Os autores consideraram a LVA uma alternativa aceitável em doentes intolerantes às estatinas, se produzida sob condições controladas. O pequeno tamanho amostral, a heterogeneidade da amostra, uma metodologia pouco esclarecedora e o facto de se tratar de um estudo orientado para a doença são algumas das limitações apontadas para este estudo. A tipologia do estudo em questão, EOR, leva à atribuição de um NE 3.

2. BBR

Dong et al.7 avaliaram, na sua MA/RS, os efeitos da BBR no perfil lipídico, tendo verificado uma redução significativa dos níveis de C-LDL (-0,65 mmol/L; IC95% (-0,76 a -0,54)) e de TG (-0,50 mmol/L; IC95% (-0,69 a -0,31)) com esta substância. No entanto, o número de ECAC incluídos foi relativamente baixo, sendo que a maioria apresentava baixa qualidade relativamente ao seu desenho de estudo e à sua metodologia (método de randomização, dupla-ocultação e taxas de abandono) pelo que são necessários mais estudos de grande escala antes de a BBR ser recomendada no tratamento da dislipidemia. Além disso, eram estudos orientados para a doença, pelo que se atribuiu um NE 3.

3. LVA e BBR

Affuso et al.2 estudaram um produto que continha simultaneamente 200mg de LVA e 500mg de BBR, tendo-se verificado uma descida, estatisticamente significativa, dos níveis séricos de C-LDL ((-1,06±0,75) vs (-0,04±0,54) mmol/L; p<0,001), em comparação com o placebo. Assim, os autores concluíram que esta combinação parece ser uma abordagem válida na redução dos níveis de lípidos em doentes com dislipidemia ligeira a moderada. O pequeno tamanho amostral, a baixa qualidade metodológica (método de randomização e dupla-ocultação descritos de forma pouco clara) e pelo facto de se tratar de um estudo orientado para a doença atribuiu-se um NE 3.

Conclusões

Considera-se que existe uma evidência limitada relativamente à diminuição dos níveis séricos de C-LDL e de TG com a administração de LVA e/ou BBR, a qual deriva de vários estudos com NE 3. Estes apresentam, de uma forma global, limitações no âmbito do tamanho amostral, dupla ocultação, taxas de abandono e evidência orientada para a doença. Além disso, as doses utilizadas foram muito heterogéneas e variaram entre os 1200mg - 4800mg/dia de LVA e os 600 - 1500mg/dia de BBR. Desta forma, foi atribuída uma Força de Recomendação (FR) C.

Salienta-se que, nos estudos analisados, houve o predomínio da população chinesa, o que pode limitar a aplicabilidade destas intervenções noutros grupos populacionais. Aponta-se, também, a ausência de estudos que demonstrem os efeitos destas substâncias a longo prazo. A maioria dos estudos abrange um período compreendido entre as quatro e as 24 semanas.

A generalidade dos produtos naturais comercializados são constituídos por várias substâncias e, para a mesma substância, existem diferentes preparações comerciais. Num estudo15 em que se avaliaram 12 preparações de LVA disponíveis no mercado, a quantidade total de monacolina variou entre 0,31 a 11,15mg por cápsula, embora cada uma destas preparações estivesse rotulada como contendo 600mg por cápsula. Assim, um problema significativo na recomendação destes nutracêuticos é a inexistência de padronização entre os produtos comercializados, não havendo regulamentação da sua produção e comercialização.

No mercado nacional existe, pelo menos, uma formulação contendo LVA (200mg) e BBR (500mg), entre outros componentes, e outra constituída apenas pela LVA (300mg), além de outros componentes. Ambos são comercializados como suplementos alimentares aconselhados no tratamento da dislipidemia, não sendo regulamentados pela Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde (INFARMED). Recentemente, o nutracêutico comercializado em Portugal que contém LVA e BBR foi comparado com a pravastatina 10mg numa população italiana com risco cardiovascular moderado, verificando-se uma redução do CT e do C-LDL semelhante em ambos os grupos.16 De facto, todos os estudos analisados nesta revisão que compararam a LVA com as estatinas3,6,9,13 demonstraram também uma melhoria dos níveis do C-LDL de forma semelhante. Desta forma, a LVA pode ser considerada, segundo alguns autores,12,14,16 uma alternativa aceitável no tratamento da dislipidemia em casos selecionados, nomeadamente em doentes com um risco cardiovascular reduzido a moderado e/ou intolerantes às estatinas (e.g., por mialgias). Aponta-se ainda que, em comparação com as estatinas, estes suplementos alimentares apresentam preços muito elevados (cerca de 10 vezes mais o custo mensal de algumas estatinas). Dada a conjuntura económica atual, o elevado preço destes suplementos, além de todos os outros fatores referidos anteriormente, constitui uma limitação relevante à sua utilização no nosso país.

Apesar de não ser objetivo desta revisão, não se verificou, na maioria dos estudos analisados, a ocorrência de efeitos laterais importantes com nenhuma das substâncias em estudo. A LVA mostrou ser efetiva na redução dos eventos cardiovasculares numa RS.6 No entanto, devem ser realizados mais estudos no sentido de se apurar o impacto destas substâncias em termos de morbimortalidade e de efeitos laterais.

Assim, antes de se recomendarem estas substâncias no tratamento da dislipidemia são necessários mais estudos de elevada qualidade metodológica que demonstrem o seu benefício e segurança, além de uma maior regulamentação da sua produção e comercialização.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence

Vânia Teixeira

R. Serafim da Silva Lopes, 32 - 2.o dto, 4465-261 São Mamede de Infesta

E-mail: vaniafteixeira@gmail.com

 

Agradecimentos

Os autores gostariam de agradecer ao Dr. Tiago Morais, Médico Interno de Formação Específica em Medicina Geral e Familiar, da Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados de Lamego, ACeS Douro Sul, pela sua contribuição na tradução para inglês do resumo deste artigo.

Conflito de interesses

Os autores declaram não ter conflitos de interesses.

 

Recebido em 03-09-2014

Aceite para publicação em 18-01-2016

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