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Revista Portuguesa de Medicina Geral e Familiar

versão impressa ISSN 2182-5173

Rev Port Med Geral Fam vol.28 no.4 Lisboa jul. 2012

 

CARTA À DIRECTORA

Anotações, codificações e registos na consulta de Medicina Geral e Familiar

Luiz Miguel Santiago*

*MD PhD, Assistente Graduado Sénior e Consultor de Medicina Geral e Familiar, Centro de Saúde de Eiras e Professor Associado na Universidade da Beira Interior

 


Exma. Senhora

Directora da Revista Portuguesa de Medicina Geral e Familiar

Num recente editorial da Revista Portuguesa de Medicina Geral e Familiar,1 reflecte-se sobre o facto do registo da informação clínica na consulta estar a ser efectuado predominantemente por simples codificação – aposição de chave alfa-numérica de uma classificação (coding) – em detrimento das anotações clínicas (clinical noting) do que foi ouvido, percebido, pensado e realizado na consulta. No fundo, questiona-se se não estaremos a assistir, em Portugal, a uma transição de uma era de múltiplos registos manuscritos, eventualmente inconsequentes, para uma época de primazia da atribuição de códigos ao motivo da consulta, ao diagnóstico e ao plano de procedimentos, também eventualmente inconsequentes. Esta matéria carece ainda de muito trabalho formativo a nível pré e pós-graduado, havendo um estudo que mostrou a validade da formação específica na utilização do ICPC-2 na melhoria da qualidade da codificação.2

O registo clínico (problem-oriented medical record), entendido como o acervo da informação pessoal, familiar, social e analítica, permanentemente modificada ao sabor dos novos conhecimentos, pelo médico, faz parte da gestão integrada de conhecimento dos consulentes, tal como descrito por Weed.3

As questões levantadas neste editorial1 são de grande candência e colocam desde já a necessidade de definição clara do que são anotações clínicas, codificação e registos. O texto obriga à reflexão sobre a importância do registo de informação em cada consulta e sobre a necessidade de melhor avaliar, na prática da Medicina Geral e Familiar (MGF), o cruzamento desta realidade de anotações clínicas e de codificações. Esta avaliação deve fazer parte do estudo habitual da actividade do médico de família, numa atitude deontológica e ética de melhoria da sua prática.4,5

Este editorial espoletou a necessidade do autor, médico de família e orientador de formação específica, e dos seus internos de especialidade em conhecer a frequência de anotações clínicas e de codificações no registo da sua consulta de MGF. Para o efeito, foi realizado um estudo observacional, transversal, descritivo, em amostra aleatória das consultas realizadas entre os meses de Janeiro e Julho de 2012, ambos inclusive, para conhecimento da frequência de codificação e de anotações clínicas por consulta no registo dos vários componentes do SOAP no SAM.

Resumidamente, após o conhecimento do total de consultas (n=2231) e do total de dias efectivos de trabalho (n=118), calculou-se o tamanho da amostra a estudar (n=318), utilizando a tecnologia disponível em http://homepage.cs.uiowa.edu/~rlenth/Power/, para população finita, com um intervalo de confiança de 95% e uma margem de erro de 5%. Assumindo-se um número médio de consultas por dia (n=19), inferiu-se o número de dias necessário estudar (n=18), sendo decidido estudar n=3 dias por mês. Foi feita aleatorização dos dias de trabalho a estudar por cada um dos sete meses em estudo, por meio de sorteio.

Numa amostra de n=544 consultas, sendo 230 (42,3%) do género masculino, n=81 (14,9%) com idade entre 0-6 anos, n=34 (6,3%) com idade entre 7-18 anos, n=318 (58,5%) entre os 19-65 anos e n=111 (20,4%) com idade maior que 65 anos, verificou-se que todas as consultas tinham codificação em S, A e P, com valores médios de 1,6 códigos por consulta em S, 1,5 códigos por consulta em A e 2,8 códigos por consulta em P. Relativamente às anotações clínicas, elas encontravam-se sobretudo em O (66,6% das consultas) e S (40,6%), conforme Quadro I.

 

 

Verifica-se, assim, no presente caso, que a informação transmitida, quer pelo paciente, quer pelo médico, não está devidamente registada para que outros a possam reconhecer e compreender o que foi transmitido, o que, sob o ponto de vista legal, pode ter consequências importantes.4

Este editorial1 e o breve estudo realizado levantam a necessidade de posteriores trabalhos sobre a realidade actual dos registos clínicos no nosso país, bem como a comparação entre diferentes práticas para, em função de indicadores de desempenho ou de resultado clínico, se aquilatar da importância desta actividade, no ambiente de trabalho do especialista em MGF que é, sem dúvida, a consulta.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Braga R. Os registos clínicos e a codificação. Rev Port Med Geral Fam 2012 Mar-Abr; 28 (2): 155-6.         [ Links ]

2. Pinto D, Corte-Real S. Codificação com a Classificação Internacional de Cuidados Primários (ICPC) por internos de Medicina Geral e Familiar. Rev Port Clin Geral 2010 Jul-Ago; 26 (4): 370-82.         [ Links ]

3. Weed LL. Medical records that guide and teach. N Engl J Med 1968 Mar 14; 278 (11): 593-600.         [ Links ]

4. Código Deontológico. Disponível em: https://www.ordemdosmedicos.pt/?lop=conteudo&op=9c838d2e45b2ad1094d42f4ef36764f6 [acedido a 15/08/2012].

5. Queiroz MJ. SOAP Revisitado. Rev Port Clin Geral 2009 Mar-Abr; 25 (2): 221-7.         [ Links ]

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