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Da Investigação às Práticas

versión On-line ISSN 2182-1372

Invest. Práticas vol.10 no.1 Lisboa mar. 2020

https://doi.org/10.25757/invep.v10i1.201 

ARTIGOS

 

O género gramatical no nome: dos documentos normativos aos manuais escolares de português do 1.º CEB

 

Grammatical gender in nouns: from normative documents to portuguese teaching textbooks in primary education

 

Genre grammatical dans le nom: des documents normatifs aux manuels scolaires de portugais à l’école élémentaire

 

Ana Sofia LopesI; Celda MorgadoII

I, Universidade de Santiago de Compostela e Escola Superior de Educação do Politécnico do Porto

II Escola Superior de Educação do Politécnico do Porto, CLUP - Centro de Linguística da Universidade do Porto e InED - Centro de Investigação e Inovação em Educação

Contacto

 


Resumo

O género, como formalismo da língua e marca de concordância, existe somente em línguas que possuem concordância nominal, como o Português Europeu (PE). Esta categoria, no PE, corresponde a uma propriedade inerente aos nomes e são múltiplos os processos fonológicos, morfológicos e sintáticos subjacentes à variação em género nos nomes. Neste estudo exploratório pretendeu-se averiguar como é preconizado o tratamento da categoria nominal supracitada nos documentos normativos de Ensino do Português no 1.º Ciclo do Ensino Básico (CEB) e investigar como é apresentado cientificamente e proposto pedagogicamente em manuais escolares do 1.º ao 4.º ano.

Palavras chave: Ensino da gramática; Género; Nome; Processos morfossintáticos; Processos fonológicos

 

Abstract

Gender, such as language formalism and concordance, exists only in languages that have nominal agreement, such as European Portuguese (EP). This category in the EP corresponds to an inherent property of the names and the phonological, morphological and syntactic processes underlying the variation in gender in the names are multiple. In this exploratory study it was sought to find out how the nominal category treatment mentioned above is recommended in the Portuguese Teaching Documents in the 1st Cycle of Basic Education (CEB) and to investigate how it is presented scientifically and pedagogically proposed in school textbooks from the 1st to the 4th years.

Keywords: Grammar; teaching; Gender;Name; Morphosyntactic processes; Phonological processes.

 

Résumé

Le genre, en tant que formalisme linguistique et marque d’accord, n’existe que dans les langues qui ont un accord nominal, comme le Portugais Européen. Cette catégorie, dans le Portugais Européen, correspond à une propriété inhérente aux noms et il existe de multiples processus phonologiques, morphologiques et syntaxiques qui sous-tendent la variation de genre dans les noms. Cette étude exploratoire visait à étudier comment le traitement de la catégorie nominale mentionnée dans les documents normatifs de l’enseignement du Portugais à  l’école élémentaire est recommandé et à étudier comment il est présenté scientifiquement et proposé pédagogiquement dans les manuels scolaires de 1ère à 4éme année.

Mots-clés: Enseignement de la grammaire; genre; Nom; Processus morphosyntaxiques; Processus phonologiques.

 

CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS

O presente estudo teve como objetivos basilares problematizar a abordagem tradicional da categoria género no nome e valorizar os conhecimentos articulados da Linguística Descritiva e Aplicada e da Linguística Educacional na formação quer inicial, quer contínua de professores de Português do 1.º CEB. Agregados a estes objetivos, encontram-se outros mais específicos, designadamente: evidenciar que a categoria género não se realiza por flexão e não se pode colocar a par das categorias número e grau, já de si também distintas em estatuto e funcionamento; demonstrar o funcionamento morfossintático da categoria género e os processos tradicionais de marcação; refletir sobre o modo como a categoria género é proposta para abordagem no Programa e Metas Curriculares de Português do Ensino Básico (Buescu et al., 2015); e problematizar a operacionalização da abordagem do conteúdo gramatical em manuais escolares de Português do 1.º CEB.

Posto isto, importa começar por sublinhar que o género é uma propriedade inerente aos nomes, contrariamente ao que se verifica com os adjetivos, visto que estes ganham um género sintaticamente (Villalva, 2000). Logo, o género nos nomes é uma categoria intrínseca aos radicais (atribuída no léxico ou na sintaxe), obrigatória e idiossincrática; e, nos adjetivos, a categoria é transmitida pelo nome, sendo funcional e não lexical, na medida em que é apenas necessária para a concordância morfossintática nos sintagmas e nas frases (Baptista et al., 2013b). Assim, no sentido de clarificar a noção da classe de palavras à qual o género é uma propriedade inerente, é de mencionar que, segundo o Dicionário Terminológico em linha (2008), o nome corresponde a uma “palavra pertencente a uma classe aberta de palavras, que permite variação em género, em número e, em alguns casos, em grau” (B.3.1.). A esta definição acresce referir que o nome, núcleo do Sintagma Nominal (SN), é uma classe lexical universal às línguas do mundo e que corresponde a uma categoria linguística caraterizável semanticamente por possuir um potencial de referência. Ou seja, é, geralmente, utilizada numa situação concreta de comunicação, com uma função designatória ou de nomeação (Brito, 2003; Duarte & Oliveira, 2003). A designação de uma infimidade de entidades implica a existência de diferentes subclasses: nome próprio (como Portugal e João); nome comum não animado (como lápis, pensamento e felicidade); nome comum animado humano (como pessoa e menino); nome comum animado não humano (como cão e panda); e nome comum coletivo (como fauna e cardume).

Neste quadro, assume relevância a referência às três categorias – género, número e grau – que, conforme sublinhado, correspondem a propriedades do nome. Há que realçar o facto de nenhuma destas três categorias ser universal às línguas e, nas línguas em que existem, se manifestarem de formas diversas. A título de exemplo, parece que apenas as línguas que têm uma sintaxe altamente flexionada e baseada na concordância possuem género gramatical idêntico ao que o PE e o Francês, por exemplo, têm. Mas mesmo nas línguas que o possuem, os valores podem variar, pois se no PE os valores de género são masculino/feminino, noutras línguas podem encontrar-se valores como: animado/não animado, racional/não racional, forte/fraco, aumentativo/diminutivo e macho/outro (Corbett, 1991). Ademais, e focando o ensino do Português, tende-se a dar um tratamento similar às três categorias tanto nos documentos normativos, como nos manuais e nas gramáticas; bem como a considerá-las de igual forma para o nome e para o adjetivo. Contudo, se, por um lado, o género e o número são categorias significativas na concordância, o grau, embora também possa ser realizado por processos morfossintáticos, é motivado pragmática e semanticamente (Costa et al. 2015). Urge também compreender que, se os processos de atribuição de género e expressão de grau (este apenas em alguns nomes) integram o que podemos denominar de variação, o mesmo não acontece no caso do número, em que o processo de marcação é flexional, um processo marcado pela sua obrigatoriedade e sistematicidade (Villalva, 2003; 2008), contrariamente à variação. Relativamente ao mesmo tratamento dado no Ensino Básico ao nome e ao adjetivo, no sentido de contrariar esse aparente princípio defendido pelos documentos normativos de Ensino do Português e por manuais/gramáticas escolares, apresente-se o exemplo da categoria género. Esta categoria é uma propriedade inerente aos nomes, mas não o é em relação aos adjetivos, ganhando estes últimos um valor de género sintaticamente (Villalva, 2000).

Em termos estruturais, este texto encontra-se dividido em duas partes. Na primeira, far-se-á uma clarificação da noção de género linguístico, bem como uma reflexão acerca da correlação, ou não, entre género linguístico e sexo biológico e um esclarecimento dos processos de marcação e atribuição de género, servindo estes tópicos como uma sustentação teórica ao estudo desenvolvido. A segunda parte refere-se ao estudo realizado, tendo como propósito descrever a metodologia de investigação utilizada, apresentar e analisar os dados recolhidos e, por último, expor algumas propostas de abordagem do género linguístico para o 1.º CEB, de acordo com uma sequência de progressão, no âmbito do Português. Por fim, elencar-se-ão algumas considerações finais subjacentes a todo o texto.

 

PROBLEMATIZAÇÃO DA CATEGORIA GÉNERO

Clarificando a noção de género

No PE, o género consiste numa categoria nominal obrigatória para a concordância das palavras nos sintagmas e nas frases (Costa et al., 2015) e assume-se como uma categoria assistemática e sincronicamente arbitrária, que não é flexional (Villalva, 2003; 2008). Nesta língua, existem dois valores de género no nome – masculino e feminino – e esta atual distinção de género provém do Latim. Porém, fazendo uma breve contextualização histórica, no Latim existia, para além do género feminino e do género masculino, o género neutro, que somente subsiste nos pronomes demonstrativos invariáveis, designadamente isto, isso e aquilo (Costa & Choupina, 2011). Ademais, alguns nomes do neutro singular integraram o género masculino (como templum > templo), e alguns de género neutro plural passaram a feminino singular (como fructa > fruta) (Gouveia, 2005). Há que referir ainda que, atualmente, a identificação dos valores de género é possível, entre outras estratégias de concordância, pela anteposição do artigo, isto é, são masculinos os nomes a que se podem antepor os artigos <o(s)> ou <um(s)> e são femininos os nomes a que se podem antepor os artigos <a(s)> ou <uma(s)> (Bechara, 2003). Contudo, no Latim tal não acontecia, já que o artigo era inexistente e, por isso, se verificava a linearização do valor de género nas terminações das palavras, as chamadas desinências (Costa & Choupina, 2011).

Quanto à aquisição da categoria género por falantes de Português Língua Materna, esta ocorre ainda antes da entrada na educação formal, visto que as crianças, intuitivamente, se revelam capazes de identificar os valores de género e de realizar as relações de concordância em género corretamente (Figueira, 2004). A partir dos três anos, as crianças possuem já a capacidade de refletir em termos metalinguísticos, logo, por volta dos dois anos, conseguem reconhecer o valor de género das palavras (Lambelet, 2012; Müller, 1995). A referida reflexão metalinguística é visível através da alternância do índice temático -a/-o; -a ou do seu acrescento quando pretendem associar um determinado nome a um sujeito do sexo feminino ou do sexo masculino, respetivamente (como em produções espontâneas do tipo 1. A Maria é chofera ou O João é jornalisto).

Já no Dicionário Terminológico em linha (2008), pode-se encontrar a seguinte definição de género:

Categoria morfossintáctica que está presente em todos os nomes, em alguns adjectivos (os adjectivos biformes) e em alguns pronomes. Em português há dois valores de género: masculino e feminino. Nos nomes que referem uma entidade animada (uma pessoa ou um animal), o valor de género corresponde, tipicamente, a uma distinção de sexo, excepto no caso dos nomes epicenos, sobrecomuns e comuns de dois e ainda em casos irregulares (B.2.2.1).

Em concordância com esta definição, torna-se exequível afirmar que se tende a integrar o género nas “categorias relevantes para a flexão de nomes, determinantes, pronomes e adjectivos” (DT, 2008, B.2.2.1). Porém, correspondendo a flexão a um processo marcado pela sua obrigatoriedade e sistematicidade morfológica (Villalva, 2003; 2008), é percetível que esta conceção da categoria género se revelou inadequada, dado o seu caráter assistemático e sincronicamente arbitrário. Face ao exposto, no género não existe obrigatoriedade de contraste e de marca morfológica, assim como não se verifica uma sistematicidade na realização, uma vez que são vários os processos de formação de palavras e de explicitação e/ou atribuição do género no nome. Realce-se ainda o facto de a variação não constituir uma regra, visto que muitos nomes não admitem variação em género. Por isso, não há variação em nomes de género único, somente existe em alguns nomes de género sintático, como é o caso de menino, gato e cliente. Neste âmbito, revela-se importante a distinção entre género sintático e género inerente/único.

Nos nomes de género sintático, o valor de género é construído sintaticamente, implicando, por isso, processos morfológicos ou morfossintáticos de especificação temática ou de formação de bases complexas ou compostas (Baptista et al, 2013a; Choupina & Baptista, 2019). Evidenciam-se várias formas de atribuição do género sintático, nomeadamente: combinação com uma palavra de outra categoria; acréscimo de um morfema derivacional, como -ção e -idade para formar nomes femininos e -mento e -ismo para formar nomes masculinos; especificação pela alternância do índice temático -o/-a. Nos nomes de género inerente/único, o valor de género é atribuído no léxico, ou seja, é arbitrário e intrínseco ao próprio radical nominal, sendo a sua aquisição feita de forma intuitiva (como mesa, panda e tribo) (género imanente em Botelho, 2004).

 

Processos Fonológicos, Morfológicos e Sintáticos de Marcação e Atribuição de Género

Não se tratando o género de uma categoria flexionável, são múltiplos os processos que atribuem o valor de género aos nomes.

Primeiramente, destaca-se o processo de alternância do índice temático, que, não raro, é interpretado como a regra de identificação dos valores de género em manuais e gramáticas escolares do 1.º CEB, sendo, todavia, uma pseudorregra. No referido processo, constata-se a variação de género pela alternância de tema em -o (maioritariamente, nomes de género masculino) e tema em -a (maioritariamente, nomes de feminino), por exemplo, menino/ menina, e o contraste de género pela alternância de tema Ø (masculino) e tema -a (feminino), por exemplo, professor/professora (Costa & Choupina, 2011; Duarte, 2000; Villalva, 2000;). Contudo, tal não é uma regra geral, pois existem nomes femininos que têm tema em -o (como a libido e a tribo) e nomes masculinos que têm tema em -a (como o mapa e o clima). Existem ainda casos em que, apesar de esta regra se verificar, se está somente perante contrastes lexicais e não contrastes de género da mesma palavra, por exemplo barca e barco têm o mesmo radical, mas sabe-se que não designam o mesmo referente, tal como flor e flora. Além disso, existem vários nomes no PE que terminam com a vogal -e e que podem ser tanto do género feminino, como do masculino (como o leite e a parede). Aliás, em alguns usos coloquiais da língua, em nomes que designam seres sexuados, o contraste de género é levado ao extremo, sendo feito pela alternância de tema em -e/ tema em -a (como o presidente/ a presidenta).

Um outro processo de marcação de género corresponde à redução da forma do masculino, em que nomes que terminam em ditongo [?~w] e [?w] podem formar o feminino pelo contraste com vogal [?~] e [?], como é o caso de irmão/irmã ou campeão/campeã e réu/ré (Estrela, Soares & Leitão, 2004). Sublinhe-se também a alternância fonológica, em que a formação do contraste em género se processa pelo grau de abertura da vogal, sendo que [o] é para o masculino e [?] é para o feminino, como é o caso de avó e avô. Por isso, a vogal que tem um maior grau de abertura marca o feminino e a que tem menor marca o masculino (Costa & Choupina, 2011). A par destes processos, destaca-se a derivação, em que a adição de um morfema derivacional cria uma base complexa com um valor de género específico (Bechara, 2003). Assim, em relação aos nomes que não referem seres sexuados, destaca-se o acréscimo de um morfema derivacional, nomeadamente -ção e -idade para formar nomes femininos (como felicidade e organização) e -mento e -ismo para formar nomes masculinos (como casamento e facilitismo). Já no âmbito dos nomes que referem seres sexuados, o morfema pode ser afixado ao feminino, ao masculino ou a ambas as formas, por exemplo, em abade/ abadessa verifica-se uma afixação no feminino, em perdigão/ perdiz é visível uma afixação no masculino e em embaixador/ embaixatriz constata-se uma afixação em ambas as formas, no masculino e no feminino.

Acresce referir os processos sintáticos, em que se enquadram os nomes tradicionalmente denominados comuns de dois [2], já que é o contexto sintático que pode desfazer a ambiguidade quanto ao género, ou seja, é este que especifica o valor de género no nome (Bechara, 2003; Cunha & Cintra, 1984). Logo, o valor de género é atribuído através da combinação com uma palavra de uma outra categoria (como o artista e magnífico artista).

Por último, evidencia-se a composição morfossintática, em que os nomes resultantes de uma composição morfossintática recebem o valor de género sintaticamente (como guarda-chuva, saca-rolhas e bomba-relógio).

 

Género Linguístico e Sexo Biológico: Estrita Correlação ou Não?

Revisitando a definição de género presente no Dicionário Terminológico em linha (2008), urge colocar a seguinte questão: será que em todos os nomes de seres sexuados o valor de género se relaciona com o sexo dos referentes? Analisando os nomes mulherão e dragão-fêmea, constata-se que, em termos biossociais, estes nomeiem referentes do sexo feminino, mas ao nível gramatical, são nomes do género masculino. Esta não correspondência é também visível nos nomes rapaziada e cobra-macho, que são do género feminino e que nomeiam referentes do sexo masculino. A par destes nomes, importa realçar os que não expressam o sexo do referente, os tradicionalmente designados sobrecomuns [3], podendo nomear seres de sexo masculino ou feminino, como vítima, criança, cônjuge, testemunha, pessoa. Assim, os exemplos comprovam que, no PE, género e sexo não possuem uma relação intrínseca entre si, isto é, “o género é uma categoria arbitrária e, por isso, não estabelece correlação com a noção de sexo.” (Costa & Choupina, 2011, pp.3-4). Embora em várias línguas do mundo, o género linguístico e a expressão do sexo dos seres vivos correspondam a informações correlatas (Corbett, 1991), no PE, género e sexo não são interdependentes (nem sistematicamente coincidentes em seres sexuados). Conforme advoga Luft (1987), no PE, o género gramatical consiste num critério puramente linguístico e o género biológico é o sexo, isto é, uma categoria linguisticamente facultativa, dependendo da comunicação.

A confusão que se verifica entre género e sexo reside também no facto de, para ambas as categorias, se aplicarem as mesmas formas de designação e de distinção dos valores ou categorias em que se concretizam – masculino e feminino -; bem como por se considerar que “o sexo biológico funciona como motivação para a atribuição do valor de género” (Costa et al., 2015, p. 329). Ademais, a promoção de uma correlação estrita entre género e sexo ocorre pelo facto de o termo género ser polissémico e se aplicar a realidades diferentes. Este pode surgir como sinónimo de sexo ou de identidade biossocial e ocorrer para referenciar uma categoria morfossintática, no âmbito da metalinguagem linguística (Baptista et al., 2013b).

Tendo já sido explicitados os processos de marcação de género, torna-se impreterível realçar os processos linguísticos que indicam apenas o sexo do referente e que, frequentemente, surgem associados à categoria género, designadamente os processos de composição com <macho> e <fêmea> e de contraste lexical por heteronímia de radicais. No que concerne ao primeiro processo, este ocorre pelo acrescento de <macho> ou <fêmea> ao nome (em nomes epicenos [4]), permitindo um contraste de sexo entre os referentes designados e não um contraste de género nos nomes (como o tigre-macho/ o tigre-fêmea e a baleia-macho/ a baleia-fêmea) (Bechara, 2003; Choupina, 2011). Estes pares de nomes possuem um só género gramatical para designar um ou outro ser de sexo diferente. Por sua vez, o segundo processo ocorre pela heteronímia de radicais, ou seja, pela associação de palavras de radicais distintos, existindo, assim, um contraste de sexo entre as entidades que os nomes designam e não um contraste de género dos próprios nomes, dado que são palavras diferentes e não a mesma de género diferente (como pai/ mãe, genro/ nora e boi/vaca) (Bechara, 2003; Cunha & Cintra, 1984).

 

ESTUDO EXPLORATÓRIO: O GÉNERO LINGUÍSTICO NOS DOCUMENTOS NORMATIVOS E EM MANUAIS ESCOLARES

Metodologia

Face ao enquadramento teórico, desenvolveu-se um estudo exploratório, assente numa metodologia de investigação qualitativa e interpretativa, com o propósito de verificar o modo como a categoria género linguístico é apresentada e desenvolvida nos documentos normativos de Ensino do Português no 1.º CEB (Buescu et al., 2015) e em manuais escolares do mesmo ciclo de ensino. Portanto, este desenvolveu-se nas seguintes fases: análise de conteúdo dos documentos normativos de ensino do Português; seleção do material, nomeadamente oito manuais escolares de Português (dois manuais de cada um dos anos de escolaridade do 1.º CEB) e gravação visual das fichas informativas e dos exercícios dedicados à categoria gramatical género para posterior análise; construção de uma grelha de observação dos oito manuais escolares selecionados; recolha dos dados, a partir das gravações visuais realizadas com base numa grelha de categorias previamente elaborada, e análise quantitativa e qualitativa dos mesmos.

 

Apresentação e Análise dos Dados Recolhidos

Para o estudo desenvolvido procedeu-se à análise de conteúdo do Programa e Metas Curriculares de Português do Ensino Básico, nomeadamente do 1.º CEB (Buescu et al., 2015), por corresponderem aos únicos documentos normativos vigentes para o ensino do Português, aquando da realização do presente estudo; bem como à observação de duas coleções de manuais escolares de Português deste ciclo de ensino.

Em relação ao Programa e Metas Curriculares de Português do Ensino Básico constatou-se que o conteúdo género gramatical figura nos documentos normativos imediatamente no 1.º ano de escolaridade, centrando-se a abordagem na produção de contrastes por alternância do índice temático, no objetivo 21 e no descritor de desempenho 1 “Formar femininos e masculinos de nomes e adjetivos de flexão regular (de índice temático -o ou - a)” (Buescu et al., 2015, p. 47). Deste modo, para além de se promover desde o início da escolaridade a confusão entre género linguístico e sexo dos referentes, está-se a orientar o ensino do género no sentido de se iniciar pela pseudorregra.

A aparente defesa da existência de uma correlação entre género e sexo é reforçada no 3.º ano de escolaridade, no domínio Gramática, objetivo 27 e descritor de desempenho 8: “Reconhecer masculinos e femininos de radical diferente” (Buescu et al., 2015, p. 57), em que se recorre à heteronímia de radicais como um processo para opor nomes de género distinto. Contudo, estando-se perante palavras com radicais distintos, somente se verifica um contraste ao nível do sexo dos referentes em questão. Mas esta defesa é também reafirmada pela presença, quer neste ano de escolaridade, quer no 4.º ano, de descritores de desempenho que solicitam a formação de femininos ou de masculinos dos nomes, quando a maioria não admite contraste. Acresce referir que a frequente referência a flexão em género, em vez de variação, quer no Programa, quer nas Metas Curriculares, assim como a associação sistemática do género dos nomes e dos adjetivos nos mesmos descritores e a referência à categoria género associada à categoria número são realidades preocupantes. Efetivamente, no 1.º CEB, são vários os descritores de desempenho que solicitam a formação de femininos ou de masculinos de determinados nomes e adjetivos, o que apenas se compreende se entendermos que o género é uma propriedade tanto dos nomes, como dos adjetivos. Neste contexto, os sólidos conhecimentos científicos e (meta)linguísticos do professor são fundamentais nos processos de ensino e de aprendizagem dos alunos. Caso o docente não proceda a uma reflexão (meta)linguística acerca dos referidos descritores, o conteúdo gramatical poderá ser abordado e transmitido aos alunos sem haver qualquer atualização científica e pedagógica.

Por sua vez, o cruzamento da categoria género com uma outra categoria morfossintática – o número -, é notório sobretudo no Programa de Português do 1.º CEB, quando, no mesmo conteúdo, se associa género e número, nas áreas da Morfologia e da Lexicologia. Face ao exposto, torna-se percetível que nas Metas Curriculares ocorra esta associação entre género e número, embora tal ocorra nos mesmos objetivos e não nos mesmos descritores de desempenho. Exemplificando, no 1.º ano, no domínio Gramática e no objetivo 21 “Descobrir regularidades no funcionamento da língua” surge um descritor de desempenho referente à categoria género e outro relativo à categoria número, respetivamente: “1. Formar femininos e masculinos de nomes e adjetivos de flexão regular (de índice temático - o ou - a)” e “2. Formar singulares e plurais de nomes e adjetivos que seguem a regra geral (acrescentar -s ao singular), incluindo os que terminam em -m e fazem o plural em -ns” (Buescu et al., 2015, p. 47). Assim, ressalte-se a diferença no modo de concretização das categorias em questão, todavia estando as duas sob a mesma designação (“regularidades”) convoca-se a existência da mesma sistematicidade e obrigatoriedade no que se refere ao género e ao número das palavras, o que cientificamente não é verdadeiro. Por conseguinte, seria pertinente focar a abordagem na concordância em género ao nível do sintagma e da frase, quer na deteção de concordâncias quer na correção de erros de concordância, em alternativa à descoberta de regularidades, contando apenas com a palavra e a sua morfologia. Esta abordagem inicial da categoria género deve beneficiar da diversidade de nomes quanto à classe de índices temáticos e quanto às subclasses semânticas, ainda que os primeiros exemplos devam assentar na concordância em género linguístico com nomes cujos referentes sejam não animados. Igualmente nos 3.º e 4.º anos as questões de género e de número surgem, no domínio Gramática, em descritores distintos de um mesmo objetivo, nomeadamente, no 3.º ano, no objetivo 27 “Conhecer propriedades das palavras” (Buescu et al. 2015, p. 57) e, no 4.º ano, no objetivo 28 “Conhecer propriedades das palavras e explicitar aspetos fundamentais da sua morfologia e do seu comportamento sintático” (Buescu et al., 2015, p. 62).

Relativamente aos manuais escolares, é de referir que foram analisadas duas coleções (coleção A e coleção B [5]) de manuais de Português do 1.º CEB (do 1.º ao 4.º ano de escolaridade), de duas editoras distintas. A opção por duas coleções prendeu-se com o facto de entendermos, desta forma, ser possível perceber, com maior diversidade, de que modo a categoria género é proposta científica e pedagogicamente no decurso do 1.º CEB numa fase de alteração sistemática de normativos. Ademais, as duas editoras selecionadas correspondem a duas das quatro editoras mais representativas no mercado para este ciclo, no ano letivo 2017/2018, de acordo com os dados sobre adoção dos manuais escolares pelas escolas fornecidos pela Direção-Geral de Educação, na sua página online ( https://www.dge.mec.pt/lista-de-manuais-escolares-adotados).

Note-se ainda que somente os manuais dos 1.º e 2.º anos da coleção B não foram publicados em anos posteriores ao atual Programa e Metas Curriculares de Português do Ensino Básico, embora sejam subsequentes às Metas Curriculares, sendo que ambas as coleções são cobertas por este normativo. Pretendia-se, assim, a análise de duas coleções completas, e das editoras com maior representatividade no ensino do Português no 1.º CEB, que pudessem ilustrar (ou não) uma mudança de paradigma no que à conceção e abordagem do género linguístico diz respeito, daí a opção por se incluir estes manuais escolares.

Prosseguindo para a análise dos dados recolhidos, verificou-se (cf. Gráfico 1) um predomínio de exemplos de nomes comuns animados (como égua/cavalo, abelha/zangão, mulher/homem, mãe/pai, tigre-fêmea/tigre-macho, foca-fêmea/foca-macho), quer humanos, quer não humanos, nas duas coleções de manuais escolares analisadas. Na coleção A, os exemplos de nomes comuns animados humanos (42%) e de nomes comuns animados não humanos (36%) totalizam uma percentagem de 78%. Já na coleção B, os exemplos de nomes comuns animados humanos (55%) e de nomes comuns animados não humanos (26%) perfazem uma percentagem total de 81%. Tais percentagens deveras elevadas nestas subclasses de nomes constituem um fator propício para a realização de tarefas de produção de contrastes e para a promoção da confusão entre género linguístico e sexo dos referentes. A estas subclasses seguem-se os nomes comuns não animados (13% na coleção A e 17% na coleção B) e os nomes próprios (10% na coleção A e 2% na coleção B). Por último, realce-se a percentagem nula associada aos nomes comuns coletivos, tanto na coleção A como na coleção B, o que conflui para a ideia de que a esta subclasse de nomes não se associa qualquer valor de género e contribui, uma vez mais, para a promoção da confusão entre género linguístico e sexo biológico.

Relativamente aos processos de marcação de género, verificou-se a presença do processo de alternância de índice temático nos oito manuais analisados, um processo que somente surge referenciado explicitamente para o 1.º e o 4.º anos de escolaridade, no Programa e Metas Curriculares de Português do Ensino Básico (2015). Este processo vem mencionado para o conteúdo género linguístico já desde 2012, no primeiro documento normativo intitulado Metas Curriculares, anterior ao subsequente Programa e Metas Curriculares, que viria a ser publicado em 2015. Recorde-se que o documento de 2015 em pouco alterou o documento de 2012 no que às metas se refere, pelo que todos os manuais analisados seguem os mesmos princípios de abordagem – os expressos nas Metas Curriculares. Este dado remete para um possível entendimento do ensino da categoria género com base na pseudorregra.

Ademais, salienta-se a constatação de que em alguns manuais surgem os processos de contraste lexical e de composição com <macho> e <fêmea> associados aos processos de marcação de género linguístico, quando estes processos indicam apenas o sexo dos referentes. Portanto, ainda que nos documentos normativos de ensino do Português do 1.º CEB apenas seja referido o processo de contraste lexical no 3.º ano, nas coleções de manuais em análise verifica-se a presença do processo supracitado nos manuais do 2.º ano da coleção A e nos manuais dos 3.º e 4.º anos da coleção A e B; bem como a referência ao processo de composição com <macho> e <fêmea> nos manuais dos 3.º e 4.º anos da coleção B, o que se revela promotor do erro e da confusão desde o início da escolaridade. Importa ainda destacar que quer nos manuais em análise, quer nos documentos normativos, se verifica uma maior variedade de processos nos 3.º e 4.º anos (alternância do índice temático, redução da forma do masculino, derivação, processos sintáticos, composição com <macho> e <fêmea>, contraste lexical); contrariamente ao que ocorre nos 1.º e 2.º anos, em que apenas se constata a presença dos seguintes processos: alternância do índice temático, derivação e contraste lexical. Note-se, por último, a ausência de qualquer referência aos processos de alternância fonológica e de composição morfossintática nos manuais e no Programa e Metas Curriculares de Português do Ensino Básico, processos relevantes para a marcação de género linguístico.

Quanto à observação da tipologia das tarefas solicitadas em ambas as coleções, de maneira a facilitar a análise, todas as tarefas propostas foram organizadas nas seguintes categorias: produção de contrastes, produção de concordâncias, classificação quanto ao valor de género (feminino/masculino) e identificação de processos morfossintáticos (cf. Gráfico 2 e Gráfico 3). Embora tenham sido registados os dados por ano de escolaridade, aqui apresentam-se por coleção (em ambas as coleções há 4 manuais, 1 por anos), uma vez que não era objetivo comparar dados por categoria por anos de escolaridade. Por meio destas categorias, comprovou-se um indício destacado aquando da constatação do predomínio de exemplos de nomes comuns animados (humanos e não humanos). Melhor dizendo, a maior percentagem das tarefas solicitadas corresponde à produção de contrastes (52% na coleção A e 44% na coleção B). Com a mesma percentagem desta tipologia de tarefa (44%) encontra-se a produção de concordâncias, na coleção B, e, na coleção A, surge com 13%.

Neste tipo de tarefas, os alunos deparam-se, predominantemente, com enunciados como “Reescreve a frase seguinte no feminino” ou “Passa a seguinte frase para o feminino” (exemplos retirados do manual do 3.º ano da coleção B). Portanto, são confrontados com enunciados cuja instrução se encontra erradamente formulada, pois as frases não possuem género, mas sim os nomes que nelas se encontram. Neste tipo de tarefas somente haverá consciência das concordâncias entre os constituintes frásicos se o professor proceder a uma reflexão com os alunos. Caso contrário, esta corresponde a uma tarefa totalmente mecânica que os alunos realizam sem qualquer reflexão, e, em acrescento, vem contribuir para a associação de género a sexo dos seres. Sublinhem-se ainda as tarefas em que se solicita aos alunos que procedam à classificação de alguns nomes quanto ao valor de género (35% na coleção A e 9% na coleção B). Neste tipo de tarefas há, uma vez mais, uma nítida contaminação entre categorias, género linguístico e sexo dos referentes, uma vez que se recorre sobretudo à identificação do valor de género de nomes comuns animados (humanos e não humanos). Por fim, unicamente na coleção B é dado destaque à identificação dos diferentes processos morfossintáticos de marcação de género, designadamente alternância do índice temático, redução da forma do masculino, derivação e processos sintáticos. A par destes processos surgem, erroneamente, os processos de contraste lexical e de composição com <macho> e <fêmea> associados à categoria género linguístico.

 

Propostas de Abordagem do Género Gramatical no 1.º CEB

Em consonância com o exposto nos pontos anteriores, a abordagem da categoria género não deve promover a produção de contrates. Portanto, defendemos que a abordagem da categoria sexo biossocial se deve fazer separadamente, em momento próprio, no âmbito do Estudo do Meio, tal como já se preconizou em Lopes, Choupina e Monteiro (2017).

Já a abordagem explícita da categoria género deve seguir a subsequente sequência de progressão nas tarefas, tal como já defendido por Costa et al (2015): concordância, correferência e identificação. Ao nível da concordância, a abordagem à categoria género deve ser estabelecida primeiramente ao nível do Sintagma Nominal (SN) e, posteriormente, em relação a outros constituintes frásicos, por exemplo integrados no Sintagma Verbal (SV). Em termos da correferência, a sua abordagem deve fomentar a retoma de nomes ou do SN pelo uso de pronomes. Já no último nível, procede-se à identificação do valor de género dos nomes.

Importa também referir que a abordagem dos nomes deve respeitar um faseamento: nomes comuns não animados de género inerente, nomes comuns animados de género inerente, nomes comuns não animados de género sintático e nomes comuns animados de género sintático. Melhor dizendo, deve-se iniciar pelos nomes de género inerente e só, posteriormente, é que devem ser abordados os nomes de género sintático. Para além disto, é fundamental um primeiro trabalho com os nomes comuns não animados, em vez dos nomes comuns animados.

Seguidamente, apresentam-se propostas de abordagem da categoria género nos 1.º e 2.º anos de escolaridade. Importa sublinhar que as propostas são independentes e não seguem, necessariamente, uma sequência de abordagem a aplicar diretamente num dado momento a um determinado nível de ensino. Cada atividade é iniciada com uma nota informativa para o professor, em que consta o ano de escolaridade recomendado para aplicação; bem como o objetivo da mesma, com a intenção de explicitar os propósitos exatos das propostas.

Proposta 1

Ano de escolaridade: 1.º ano.

Objetivo: Construir a noção de género gramatical através da concordância no Sintagma Nominal - anteposição do determinante artigo definido ao nome - e utilizando exemplos de nomes comuns não animados com índices temáticos variados.

1. Antecede cada um dos nomes com “a” (artigo feminino) ou com “o” (artigo masculino)(Figura 1).

 

Proposta 2

Ano de escolaridade: 1.º ano e/ou 2.º ano.

Objetivo: Construir a noção de género gramatical através da anteposição do determinante artigo definido e utilizando exemplos de nomes comuns não animados e de nomes animados (humanos e não humanos) inseridos em contexto de frase.

1. Acompanha a leitura que o professor faz da lengalenga e sublinha os nomes que encontrares.

 

Rei rainha

Foi ao mar

Buscar sardinha

Para a mulher

Do juiz

Que está presa

Pelo nariz;

Salta a pulga

Na balança

Que vai ter

Até à França,

Os cavalos

A correr

As meninas

A aprender.

Qual será

A mais bonita

Que se vai

Esconder?

 

In Luísa Ducla Soares, Mais Lengalengas.


1.1. Copia esses nomes para as linhas abaixo, colocando-os na coluna dos nomes masculinos ou dos femininos dependendo do seu valor de género. Segue o modelo.

Nomes masculinos                                 Nomes femininos

“o/os” + Nome                                       “a/as” + Nome   
   o   +     sapato                                       a +   sola                      
____ + ____________                         ____ + ____________         
____ + ____________                         ____ + ____________         

 

Proposta 3

Ano de escolaridade: 2.º ano.

Objetivo: Desenvolver os diferentes níveis de consciência sintática (juízo de gramaticalidade, identificação do erro, correção do erro e explicitação da correção) através da concordância ao nível do Sintagma Nominal ou da concordância de outros elementos frásicos com o núcleo do Sintagma Nominal.

1. Lê as frases seguintes. Verifica se as frases estão corretamente formadas e assinala com uma cruz (X) as que consideras erradas.

a) O tribo deslocou-se para uma nova região.

b) A Sofia é uma jovem muito simpática.

c) Os amigos do Pedro foram sair ontem.

d) As pescadores pescaram toda a noite.

e) Uma panda foi vista numa rua perto do zoo.

f) A Ana tem cinco irmãos mais novos.

g) A Joana comprou o flor azul.

1.1. Identifica o erro que encontraste em cada frase, sublinhando-o.

1.2. Reescreve as frases em que encontraste os erros, para que se tornem gramaticalmente corretas.

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1.3. Explica o que te levou a considerar o erro e a fazer a tua correção.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerando a literatura existente e consultada no âmbito deste estudo, tornou-se nítido que a categoria género nos nomes se distingue das restantes categorias morfossintáticas: por se verificar sempre a sua presença, quer o valor de género seja atribuído no léxico, quer seja atribuído na sintaxe; pela ausência de obrigatoriedade de existência de contrastes de género; e pelo facto de a sua atribuição e realização estarem a cargo de vários processos (lexicais, fonológicos, morfológicos e sintáticos), não se realizando por flexão.

Acresce destacar que a referência a flexão em género nos nomes, quer nos manuais escolares, quer no Programa e Metas Curriculares de Português do Ensino Básico, bem como uma abordagem da categoria género como similar à categoria número são constantes. A par disto, salienta-se a aparente defesa de uma correlação entre género gramatical e sexo biológico nos manuais escolares analisados, visível pelos exemplos pertencentes maioritariamente à classe dos nomes comuns animados (humanos e não humanos).

Ainda que as propostas de abordagem expostas careçam de teste em contexto de ensino e de aprendizagem, as mesmas foram construídas para aplicação em níveis iniciais, procurando promover noções cientificamente enformadas e competências no âmbito da concordância de género linguístico. As atividades foram construídas no decurso da formação de um professor do 1.º CEB, no âmbito de uma Unidade Curricular de Linguística Aplicada, e tiveram por base toda a literatura consultada, pelo que consideramos relevante terminar este breve estudo sublinhando a importância da Linguística Descritiva e Aplicada e da Linguística Educacional na formação inicial e continuada de professores de Português de 1.º CEB.

 

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Contacto: Ana Sofia Lopes, Universidade de Santiago de Compostela e Instituto Politécnico do Porto, Escola Superior de Educação, R. Dr. Roberto Frias 602, 4200-465 Porto, Portugal / anasofia_lopes@hotmail.com
Celda Morgado, CLUP - Centro de Linguística da Universidade do Porto e InED - Centro de Investigação e Inovação em Educação, Instituto Politécnico do Porto, Escola Superior de Educação, R. Dr. Roberto Frias 602, 4200-465 Porto, Portugal / celda@ese.ipp.pt

 

(Recebido em setembro de 2019, aprovado em março de 2020)


NOTAS

 

[1] Frase agramatical.

[2] As designações comuns de dois, sobrecomuns e epicenos caíram em desuso no ensino do Português e não se encontram, atualmente, nos documentos normativos: Programa e Metas Curriculares de Português do Ensino Básico (Buescu, et al. 2015), Aprendizagens Essenciais (2018). Também não são mencionadas no Dicionário Terminológico em linha (2008).

[3] Cf. nota anterior.

[4] Cf. nota de rodapé 4.

[5] Por reservas autorais e direitos legais não serão identificadas as coleções analisadas. Consideramos igualmente que tal anonimato não constitui qualquer impedimento para o entendimento da problemática apresentada e dos objetivos deste breve estudo exploratório.

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