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Da Investigação às Práticas

versão On-line ISSN 2182-1372

Invest. Práticas vol.7 no.2 Lisboa jul. 2017

 

ARTIGOS

A educação em ciências e a intervenção sociopolítica em questões socioambientais e sociocientíficas: uma experiência na formação inicial de professores e educadores

 

Education in sciences and sociopolitical intervention in socioenvironmental and socioscientific questions: an experience in the initial training of teachers and educators

 

L'éducation à la science et l'intervention sociopolitique dans les questions socio-environnementales et socio-scientifiques: une expérience dans la formation initiale des enseignants et éducateurs

 

Helder Martins Costa

 

Instituto Piaget – Escola Superior de Educação Jean Piaget de Almada; Universidade de Lisboa / Instituto de Educação; CEPESE / Universidade do Porto – Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade 

Contacto

 


Resumo

Este artigo assenta essencialmente na importância, na formação inicial de professores e educadores, de uma intervenção sociopolítica em diferentes comunidades como estratégia fundamental para uma abordagem pedagógica construtiva do pensamento docente e discente. Assim, nesta perspetiva, apresenta-se os resultados obtidos na implementação do projeto “We act”, na Escola Superior de Educação Jean Piaget de Almada e na unidade curricular de Atelier e Didática das Ciências e Educação Ambiental. Para o efeito, realizou-se um estudo de natureza metodológica mista, de modo a compreender o impacto das atividades propostas pelos diferentes grupos de estudantes

Os resultados obtidos indiciam a necessidade e a urgência em mudarmos as nossas práticas e traçarmos novos caminhos que promovam a mudança metodológica e pedagógica, assente em estratégias diferenciadas, e um ensino centrado no estudante. Sugerem também que este envolvimento em atividades de ação sociopolítica, sobre questões socioambientais e sócio- científicas, contribuem para alterar comportamentos e ampliar os conceitos. Estes estudantes, futuros docentes, ganharam, assim, uma nova postura, assente na importância da ciência para o quotidiano, para a resolução de problemas das comunidades.

Palavras-chave: Ativismo, Educação em Ciência, Formação de Professores.

 

Abstract

This article is based essentially on the importance, in the initial training of teachers and educators, of a sociopolitical intervention in different communities as a fundamental strategy for a constructive pedagogical approach of teacher’s and student’s thought. So, in this perspective, we present the results obtained in the implementation of the "We act" project, at the Jean Piaget Higher School of Education of Almada and in the curricular unit of Atelier and Didactics of Sciences and Environmental Education. For this purpose, a mixed methodological study was carried out in order to understand the impact of the activities proposed by the different groups of students

The results indicate the need and the urgency to change our practices and to outline new paths that promote methodological and pedagogical change, based on differentiated strategies and student-centered teaching. They also suggest that this involvement in activities of sociopolitical action on socioenvironmental and socioscientific issues contribute to change behaviors and to broaden concepts. These students, future teachers, have thus gained a new posture, based on the importance of science for everyday life, for solving community problems.

 

Keywords: activism, science education, teacher training.

 

Résumé

Cet article se base sur l’importance, dans la formation initiale des enseignants et éducateurs, d’une intervention sociopolitique dans différentes communautés comme stratégie fondamentale pour un abordage pédagogique constructif de la pensée de l’enseignant et de l’étudiant. Ainsi, selon cette perspective, il présente les résultats obtenus dans la mise en œuvre du projet “We act”, à l’école Supérieure d’Éducation Jean Piaget d’Almada et dans l’unité d’enseignement d’Atelier et de Didactique des Sciences et de l’Éducation Environnementale. Dans ce but, il a été réalisé une étude de nature méthodologique mixte, afin de comprendre l’impact des activités proposées par les différents groupes d’étudiants.

Les résultats obtenus indiquent le besoin et l’urgence de changer nos pratiques enseignantes et de tracer de nouveaux chemins qui conduisent au changement méthodologique et pédagogique, basé sur des stratégies différenciées et un enseignement centré sur l’élève. Les résultats suggèrent également que cette participation à des activités d’action sociopolitique, sur les questions socio-environnementales et socio-scientifiques, contribuent pour changer les comportements et élargir les concepts. Ces étudiants, futurs enseignants, ont acquis, ainsi, une nouvelle attitude, basée sur l’importance de la science pour la vie quotidienne et pour la résolution des problèmes des communautés.

 

Mots-clés: activisme, éducation en science, formation des enseignants.

 

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Desde a última metade do séc. XX até aos nossos dias, a sociedade tem vindo a modificar a perceção que tem sobre a ciência. O progresso científico não transferiu só vantagens para os povos, transmitiu igualmente resultados adversos e perversos, nomeadamente ao nível ambiental e, consequentemente, económico. Neste sentido, a ciência é encarada como um refúgio de soluções, milagres dos muitos problemas que as nossas sociedades possuem, mas é também vista por uma franja de investigadores e áreas da sociedade como uma ferramenta ameaçadora (Osborne & Hennessy, 2006).

Em democracia, acreditamos que os cidadãos devem integrar os processos de decisão, mas essa participação requer uma literacia científica alargada à população em geral (Hilário & Reis, 2009). Desta forma, revela-se importante promover a literacia científica das populações para que consigam entender e gerir com confiança as situações do quotidiano (Nutbeam, 2008). Surge, assim, a importância de dotar os futuros docentes desta ferramenta de intervenção sociopolítica, assente numa cultura consciente de conhecimento científico, para assim difundir o saber junto das gerações mais novas.

Face ao panorama nacional, quer no ensino básico, quer na formação de professores, considera-se que um currículo de ciência é essencial para o desenvolvimento de literacia científica crítica. Um currículo, segundo Hodson (1998), deve estar assente em temas locais, regionais, nacionais ou globais, escolhidos pelo professor e/ou pelos estudantes, tendo em conta as crenças, aspirações e as experiências pessoais, permitindo o envolvimento em atividades de resolução dos problemas identificados, baseados em valores socialmente coerentes. Formar professores e educadores neste caminho é forçoso, é urgente.

Diversos estudos (Galvão & Reis, 2002; Reis, 2004, 2006; Holbrook 2010) apontam para que o desenvolvimento de Educação em Ciência nas nossas escolas (em todos os níveis de ensino) poderá melhorar substancialmente o nível de educação e de literacia dos estudantes, consequentemente, a melhoria do sistema educativo do país. Isto porque permite desenvolver, nos estudantes, conhecimentos e práticas de que estes necessitam para se tornarem pessoas/profissionais com mais competências, para pensarem por si e compreenderem o que os rodeia, intervindo socialmente.

Reis (2009) vai mesmo mais longe, referindo que, numa sociedade democrática, as tomadas de decisão sobre questões científicas, tecnológicas e ambientais não deverão ser exclusivas de especialistas. Qualquer cidadão tem de ter um papel ativo, desde que reflita e aja sobre essas discussões.

Nesta perspetiva, Hodson (2014) refere que é fundamental promover este tipo de educação em que se valoriza a literacia científica e o ativismo cívico. São necessárias a promoção de aprendizagens ativas, a criação e desenvolvimento de ambientes de aprendizagem promotores de sucesso. Estes ambientes, aliados à motivação, à autonomia, à construção crítica e (re)centrados nas comunidades em que os discentes vivem (focando-se em recursos e questões locais) tornam-se em locais propícios ao desenvolvimento de mais e melhor saber. Assim, é fundamental um currículo que dê destaque às ciências como impulsionador da resolução de questões do quotidiano e que mostre a sua aplicabilidade em termos sociais e tecnológicos.

Pelas razões anteriormente apontadas, é urgente e relevante que, na formação de professores, sejam criadas condições para que os mesmos se sintam familiarizados com estas temáticas e que ajam em contexto da sua prática de ensino supervisionada.

Holbrook (2010) reforça esta ideia, referindo que a educação em ciência deve ser vista como uma componente forte do currículo, em que os princípios e objetivos operacionais devem promover três áreas-chave: desenvolvimento intelectual, desenvolvimento dos atributos pessoais e desenvolvimento dos valores sociais.

Assim, e segundo Reis (2009), envolver alunos e futuros docentes na discussão de controvérsias sócio-científicas e sócio-ambientais conduz ao desenvolvimento pessoal, pelo contacto com diferentes pontos de vista, interpretações e níveis de conhecimento, uma vez que, para uma tomada de posição, tentativa de resolução de um problema ou situação identificada, é necessária a capacidade de partilhar, de saber ouvir e de discutir. Por isso, as atividades que envolvam uma discussão crítica e fundamentada são efetivamente atos de democracia e de cidadania, pois, na sua base, estão argumentos que levam a uma tomada de decisão, promoção e coesão grupal em torno de uma problematização comum.

Atualmente, Roldão (2005) e Costa (2015) indicam que o modelo de organização educativo e escolar está ajustado à homogeneização, à formatação encapsulada e ao esvaziamento do saber. Este vai promover tarefas irreais, desajustadas e autojustificadas, contribuindo necessariamente para uma sociedade, uma escola e uma cultura esgotadas e esvaziadas.

Assim, e como forma de superar esta cultura escolar, o professor deverá criar oportunidades de aprendizagem, pelo que a formação de professores (a de base e a contínua) deve estar (re)focada nas aprendizagens ativas, com uma forte componente de educação em ciências, tendo por base a promoção da literacia científica e o ativismo cívico. Tal é essencial.

Como afirma Alarcão (2000), o docente não pode ser um mero zelador e cumpridor de currículos, aprovados por uma cúpula organizacional, devendo tornar-se em agente crítico, construtor da realidade, para assim “instituir o currículo, vivificando-o e coconstruindo-o com os seus colegas e os seus alunos” (p.22). Como fazer? Como já temos vindo a referir, a promoção da literacia científica em contexto escolar (no ensino básico, secundário e superior) é uma das respostas possíveis para este enquadramento.

Consequentemente, práticas científicas e tecnológicas viradas para esta lógica identificam uma diversidade de dilemas sociais resultantes da aplicação desses princípios (Kolstø, 2001; Reis, 2004; Sadler & Fowler, 2006;), não exibindo conclusões simples, diretas, nem mesmo singulares. Promove-se o erro como construção que deve ser submetida ao escrutínio das comunidades (de saber e a outras mais alargadas), podendo ser influenciada por questões económicas, políticas, morais e éticas (Sadler & Zeidler, 2002).

Contudo, apesar dos seus reconhecidos méritos e qualidades evidenciadas e bem documentadas pelos diversos estudos e investigações, a discussão de controvérsias sociopolíticas, socioambientais e sociocientíficas escasseia nas aulas, bem como na formação de professores. A justificação é variável e, como referem diversos autores (Lazorowitz & Bloch 2005; Reis, 2004), assenta na falta de tempo, na importância do cumprimento dos currículos (muito extensos), na implementação de uma prática focada nos manuais e fichas avaliativas, nos resultados, na memorização e, por último, mas não menos importante, na resistência e dificuldade no domínio de conhecimentos pluridisciplinares, transdisciplinares, necessários à compreensão e avaliação destas questões.

 

METODOLOGIA

Na investigação agora apresentada adotou-se uma metodologia mista [1], tendo decorrido no ano letivo de 2013/2014, na Escola Superior de Educação (ESE) Jean Piaget de Almada. Este estudo envolveu os estudantes das duas turmas de 3.º ano da Licenciatura em Educação Básica, ou seja, 33 alunos (19 em regime diurno e 14 em regime noturno), com idades compreendidas entre os 19 e os 37 anos (havendo apenas dois estudantes do sexo masculino). De referir que a investigação se desenvolveu na Unidade Curricular (UC) de Atelier e Didática das Ciências e Educação Ambiental (ADCEA), da qual o investigador é o responsável.

Assim, a investigação desenvolvida assentou num estudo do desenvolvimento de projetos de ação sociopolítica, socioambiental ou sociocientífica, por parte de estudantes do ensino superior, incluídos num projeto mais abrangente – o projeto “We Act” (Reis, 2014a,b), do Instituto de Educação/Universidade de Lisboa, e teve como objetivo principal compreender o impacto das atividades propostas e dos recursos utilizados sobre os alunos e as comunidades envolvidas.

Neste sentido, na componente quantitativa foram aplicados, aos estudantes, dois inquéritos por questionários, elaborados no âmbito do projeto “We Act” , pelo Professor Doutor Pedro Reis e pelo Professor Doutor Luís Tinoca (Instituto de Educação da Universidade de Lisboa). Os dois inquéritos abordam temáticas diferentes, mas fundamentais para se ter a perceção dos futuros profissionais em educação. Assim, pretendeu-se avaliar, através destes instrumentos, por um lado, a importância do ativismo cívico no desenvolvimento de competências docentes (questionário com 12 questões) e, por outro, a relevância das aulas da UC com uma forte componente educativa em ciências (questionário com 45 questões).

Estes foram aplicados em dois momentos diferenciados. Num primeiro instante, no início das aulas da UC de ADCEA, quando os alunos ainda não tinham tido qualquer contacto com a disciplina e com o projeto “We Act”. O intuito era o de entender a pertinência das aulas em ciências, bem como do papel dos futuros professores/educadores na intervenção em sociedade (Pré-teste). O segundo momento foi no final da lecionação das aulas da UC e depois de os discentes terem desenvolvido os seus projetos de ação sociopolítica, após a identificação de uma problemática socioambiental ou sociocientífica (Pós-teste).

No que diz respeito à investigação qualitativa, foram realizados no final da UC dois focus group, um por cada turma, ou seja, com todos os participantes. Fizemos esta escolha, uma vez que é um método destinado à recolha de dados focalizado na interação da discussão do grupo, como fonte de recolha. Esta metodologia possibilita ao investigador dinamizar a discussão num dado assunto, permitindo a sua contribuição para o entendimento do objeto de interesse por parte dos intervenientes, os quais constituem o grupo, pois têm alguma característica em comum e/ou relevante face ao tema em discussão (Krueger & Casey, 2009).

De referir que o objetivo geral deste focus group foi conhecer a amplitude do desenvolvimento, implementação e consciencialização relativamente ao projeto “We Act”, por parte dos estudantes do curso de licenciatura em Educação Básica da ESE Jean Piaget de Almada. O projeto tinha como objetivos específicos conhecer as limitações e potencialidades do projecto “We Act” [2]; compreender a influência das atividades realizadas na tomada de consciência dos alunos em relação aos temas de enquadramento; conhecer o impacto das atividades realizadas; averiguar a pertinência do projeto; compreender a influência do projeto na formação pessoal e profissional e conhecer a perceção do conceito de ativismo cívico.

Com este enquadramento metodológico, os discentes foram desafiados (após a identificação de uma problemática) a realizar um projeto de intervenção, socioambiental ou sociocientífica, no âmbito da UC de ADCEA, adequando-o à promoção da Educação em Ciência, em que a literacia científica é desenvolvida através de iniciativas de ativismo, para todos os intervenientes, nomeadamente no que diz respeito às capacidades que se pretende desenvolver e às aprendizagens que se espera que os estudantes realizem. Nesta perspetiva, os estudantes desenvolveram projetos em diferentes comunidades, com o intuito de demonstrar os problemas que as afetam e compreender o conceito e exercício de cidadania ativa. Desta forma, seriam levados a intervir no sentido da resolução das problemáticas encontradas e tendo em vista a melhoria da qualidade de vida e sustentabilidade das comunidades.

Com as questões identificadas, os estudantes organizaram-se e desenvolveram a sua prática em diversos contextos territoriais, realizando também parcerias com algumas entidades. Apresenta-se, de seguida, um quadro que indica o número de elementos de cada grupo, a problemática identificada, os produtos/ações realizadas, o público-alvo e a informação relativa à existência ou não de parcerias.

 

QUADRO I – Problemática identificada e ações realizadas

 

É de referir que todos os trabalhos foram apresentados e discutidos em contexto de turma, de modo a haver uma partilha das intervenções realizadas, para que se proporcionasse um envolvimento dos estudantes na discussão dos resultados obtidos pelos diferentes projetos.

 

APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DE RESULTADOS

Componente Quantitativa – Inquéritos por questionário sobre ativismo

Numa análise dos valores médios obtidos em todos os pares estudados (valores de resposta inicial e final), pode observar-se uma subida dos valores médios observados entre o pré-teste e o pós-teste.

Analisando os valores médios das 12 questões consideradas, passa-se de uma média de valor inicial de 3,114 (Sd[3]= 0,342) para uma média final de 3,263 (Sd = 0,3555).

Realizado o estudo comparativo (teste t para amostras emparelhadas), podemos observar que existem diferenças estatisticamente significativas no par 12 [valores médios iniciais e finais da questão “Conheço formas de influenciar as decisões dos cidadãos sobre problemas sociais relacionados com a ciência, a tecnologia e o ambiente.”] (t = -2,781; p= 0,009) e nas médias obtidas na avaliação inicial e final do questionário (t= -2,128; p= 0,041).

Numa análise sumária dos dados relativos ao ativismo, o que ressalta é a melhoria sistemática dos valores médios de resposta em todas as questões colocadas. Ainda que apenas a questão 12 e a média global das respostas apresentem diferenças estatisticamente significativas, parece seguro assumir que a melhoria dos resultados provém de uma melhoria transversal nas atitudes e competências desenvolvidas ligadas ao ativismo. De alguma forma, os respondentes parecem assumir cada vez mais perceções positivas face ao seu envolvimento em questões  sobre ciência, tecnologia, sociedade e ambiente (CTSA) e à sua capacidade de influenciar os outros na resolução de problemas relacionados com a CTSA. Neste sentido, os nossos resultados afirmam-se congruentes com os estudos obtidos por Aikenhead (2009); Pereira et al (2007) e Reis (2004);

 

Componente Quantitativa – Inquéritos por questionário sobre a UC de ADCEA

Numa análise dos valores médios obtidos em todos os pares estudados (valores de resposta inicial e final), pode observar-se uma tendência sistemática para a subida dos valores médios observados entre o pré-teste e o pós-teste.

Analisando os valores médios das 45 questões consideradas, esta tendência mantém-se, passando-se de uma média de valor inicial de 3,069 (Sd= 0,447) para uma média final de 3,429 (Sd=0,384).

Realizado o estudo comparativo (teste t para amostras emparelhadas), podemos observar que existem diferenças estatisticamente significativas nas seguintes questões:

 

QUADRO II – Teste t para amostras emparelhadas - Inquéritos por questionário sobre a UC de ADCEA

 

Diferenças estatisticamente significativas (t= -4,533; p = 0,000), podemos igualmente encontrar nos valores globais obtidos na avaliação inicial (média = 3,069; Sd = 0,447)  e final (média = 3,429; Sd= 0,384) do questionário.

Neste sentido, verificamos que existiram alterações profundas e, consequentemente, significantes em 30 das 45 questões deste inquérito por questionário, ou seja, em cerca de 77,78% da globalidade do instrumento utilizado.

Numa análise sumária dos dados relativos às aulas de ciências, ressalta também a melhoria sistemática dos valores médios de resposta em todas as questões colocadas, situação que concorre para a melhoria dos resultados, o que surge de uma melhoria transversal nas perceções da importância da educação em ciência, bem como da importância das ferramentas Web 2.0 para a implementação de projetos em ciências, de modo a atingir os objetivos propostos. Esta perceção vai ao encontro das ideias de Benzce & Alsop (2014).

Verificamos também, como base nos resultados obtidos, uma melhoria significativa nas atitudes relativas às questões ligadas a uma cidadania e a uma pedagogia que valorizam as diferentes opiniões, o trabalho em equipa e as tomadas de decisão para superação do(s) problema(s) identificado(s) (Goodnough, 2011; Kincheloe, 2006; Mockler & Groundwater-Smith, 2015).

De alguma forma os respondentes parecem preconizar cada vez mais a educação em e para as ciências, essenciais para o futuro profissional em educação (Apple, 2013; Kincheloe, 2006). Desta forma os nossos resultados afirmam-se congruentes relativamente à qualidade das aprendizagens com base na participação ativa dos intervenientes. Numa visão muito prática e simplificada, podemos afirmar que se deve refletir para melhor agir. (Mueller & Tippins, 2015; Reid, Jensen, Nikel & Simovska, 2008).

 

Componente Qualitativa –  Focus Group

Conforme descrito anteriormente, foram realizadas duas sessões (uma por cada turma), de modo a obter uma melhor leitura sobre o desenvolvimento, implementação e consciencialização do projeto “We Act” e sobre a importância deste tipo de projetos, para a melhoria da sociedade e formação docente.

A motivação dos intervenientes, para responder aos itens em discussão, marcou os trabalhos. Foi necessário, por vezes, travar o entusiasmo e ansiedade de resposta. De seguida, fazem-se algumas inferências sobre as respostas que foram dadas, de modo a ter-se uma melhor leitura dos resultados obtidos. Conforme refere Ratcliffe (1998), a discussão em si agrada e motiva os alunos, sendo igualmente um processo de socialização com os pares.

Assim, com este enquadramento analisou-se a entrevista sob os seguintes aspetos:

 

1) Limitações e potencialidades dos projetos

Relativamente às potencialidades do Projeto “We Act”, e da intervenção realizada junto das comunidades, retiramos algumas afirmações que indiciam alterações positivas ao nível de comportamentos e competências dos futuros docentes, conforme o que é sugerido nos trabalhos de Sadler & Fowler (2006). Segundo estes, os cidadãos baseiam a discussão de questões sociocientíficas essencialmente nos aspetos socioculturais da ciência.

Este estudo indica-nos também a heterogeneidade dos grupos (a nível emocional, mental e situacional) e a consequente diversidade de raciocínios como uma mais-valia para a compreensão da existência de diferentes perspetivas sobre uma mesma situação (Kolstø, 2006). Este tipo de atividades contribuiu para a apropriação e aprofundamento de conhecimento científico.

A ilustrar esta ideia temos as seguintes respostas:

R1 - “Este projecto permitiu a construção de uma nova forma de pensamento. Assim, seremos certamente melhores professores, melhores cidadãos, pois seremos mais competentes, com maior capacidade de intervenção no terreno e com uma maior consciência”.

R2 - “Esta aprendizagem foi uma nova dinâmica de direccionar o nosso pensamento para a importância da auto-pesquisa. Fundamental para desenvolver as nossas ideias sobre as questões socio científicas de uma forma responsável”.

R3 -“A introdução deste tipo de projetos quando formos professores será fundamental para proteger o ambiente, pois chega mais facilmente às crianças, às pessoas, à população.”

 R4 -“ O elevado número de comentários e de participantes no blogue desenvolvido, permitiu discutir o tema e passar a mensagem ao alcance de um click”.

R5- “A nossa intervenção permitiu desenvolver o hábito nos participantes de serem mais críticos, mais activos sobre os problemas ambientais.”

Relativamente às limitações, podemos afirmar que estas surgiram, sobretudo, para os estudantes em regime noturno, pois a maioria é trabalhadora-estudante, como é exemplo a seguinte afirmação “o facto de trabalhar de dia e estudar à noite não permitiu uma maior intervenção”.

A questão “Tempo” pode constituir um entrave para a opção mais frequente e generalizada por este tipo de atividade, pois a sua  implementação exigiu tempo de planificação, pesquisa, concretização e reflexão, o que, por vezes, é difícil de conciliar com outras UC. No entanto, dentro da carga horária de ADCEA, foram dadas cerca de 12 horas de trabalho autónomo e/ou tutorias, por parte do professor/investigador, para um melhor e maior impacto dos projetos desenvolvidos.

Outro aspeto salientado foi por vezes a falta de apoio de algumas instituições para a implementação dos projetos. Vejamos a resposta seguinte: “pedir autorização a outra instituição e autorizações aos encarregados de educação dos locais de estágios, por causa das imagens”.

Por fim, apontamos dois aspetos que foram transversais aos diferentes trabalhos: o desenvolvimento de uma concordância ampla ao nível das ações (“foi elaborar um plano de acção que fosse consensual”) e a imprevisibilidade do número de participantes nas atividades desenvolvidas (“a incerteza do número de participantes”).

 

2) Influência das atividades realizadas na tomada de consciência dos temas

Neste ponto, pode referir-se que a participação dos estudantes, informada e coletiva, na implementação das atividades dos diversos projetos foi significativa quer para os discentes quer para as comunidades envolvidas. As atividades desenvolvidas pelos estudantes conduziram a mudanças comportamentais em termos pessoais e profissionais, mas também nas comunidades envolvidas. Assim, este tipo de intervenção fundamentada influencia de uma forma consciente e crítica as práticas desenvolvidas pelos intervenientes mas também eleva a importância de trabalhar as controvérsias CTSA.

Esta ideia é apoiada por Lewis & Leach (2006) e Sadler & Zeidler (2005), segundo a qual a capacidade para discutir uma controvérsia sociocientífica está relacionada com o conhecimento científico. Assim, o pouco conhecimento científico de uma dada questão pode impossibilitar uma tomada de decisão de qualidade, acerca da mesma.

Aliás, a introdução de controvérsias sociocientíficas nas aulas, através da apresentação de trabalhos em que fossem apontadas as mudanças e intervenção realizadas, motivou e permitiu o aprofundamento do conhecimento científico, de forma autónoma (Mockler & Groundwater-Smith, 2015). Exemplificando esta visão, temos as seguintes afirmações:

R1- “Antes do projeto, atirava beatas para o chão, agora deixei de o fazer e os meus colegas que fumam também já não fazem. Só quando passamos pelo problema é que tomamos realmente consciência daquilo que fazemos”

R2- “Os problemas sociais são indissociáveis dos problemas ambientais e vice versa. Assim, se formos melhores cidadãos seremos melhores educadores, mais atentos e com uma maior consciência de prática”.

R3- “Ao desenvolver estes projetos de cidadania, da actividade cívica ativa, permitiu estabelecer uma prática mais correta, valorizando o que temos em termos de património natural”

R4 - “Qualquer educador deverá consciencializar junto das crianças e dos jovens as diferentes temáticas através da ação e não  só apenas com a reflexão.”

R5 - “A promoção de ações junto das redes sociais, com panfletos, com cartazes, com vídeos, e tudo o que seja apelativo visualmente, certamente vai causar um maior impacto e uma maior sensibilização nas pessoas que têm essa abordagem”.

R6- “Deve-se apostar na divulgação realmente informada e com uma diversificação de ferramentas tecnológicas, pois cada vez mais é necessário inovar para passar a mensagem que queremos”.

 

3) Impacto e pertinência das atividades realizadas

No que concerne a este ponto, podemos falar em impactos relevantes, tendo alguns deles continuado visíveis nas comunidades que participaram. Outros, no entanto, após a conclusão da intervenção do projeto, diluíram-se ou terminaram, em virtude de não haver uma continuidade. Esta perspetiva é largamente apontada por Benzce & Alsop (2014).

Contudo, foi consensual que as estratégias utilizadas, por parte dos grupos, foram pertinentes e conduziram a impactos positivos nos locais onde se realizaram. Esta observação vai ao encontro de autores como Apple (2013) e Mockler & Groundwater-Smith (2015). Apontamos de seguida algumas frases dos estudantes que explanam estas ideias:

R1- “quando tivemos a colocar os nossos cartazes de divulgação para a não colocação de beatas no chão, bem como dos cinzeiros, reparamos que haviam muitas no chão, mas passado poucos dias deixaram de haver, até hoje. Os cinzeiros (quer os nossos, quer os da instituição) estão finalmente a ser utilizados.”

R2- “As primeiras semanas após a nossa intervenção, notamos que houve um impacto positivo. Os estudantes tentaram manter os espaços exteriores da nossa instituição limpos, mas actualmente já voltou tudo mais ou menos ao mesmo. Creio que faltou a continuidade ao projecto”

R3- as crianças saíram da nossa acção a cantar o refrão do nosso teatro, certamente a mensagem passou. Pelo menos foi o que alguns pais disseram dando-nos os parabéns pela iniciativa”

R4- “Não se deve focar as catividades só para os adultos, devemos focar a nossa atenção sobretudo para as crianças, porque são elas que poderão ser modificadas e por sua vez elas influenciam os adultos. Ao pensar e agir precocemente nos problemas identificados podemos dar maior sentido às acções que fazemos junto dos grupos que escolhemos para agir. Só assim é que há continuidade nos projectos, pois as crianças têm um enorme poder sobre os adultos, estes é que não sabem”

R5- “O facto de consciencializar e sensibilizar para uma tomada de consciência dos problemas, já estamos a dinamizar pelo menos uma solução junto das comunidades”.

R6- “Os projectos levaram a mudanças de atitudes, de valores. A capacidade acção humana, será sempre a grande ferramenta de mudança:”

 

4) Influência do projeto “WE Act”, na formação pessoal e profissional

Numa abordagem a este ponto, verificamos que os discentes acreditam que esta forma de intervenção consciente, nas comunidades de aprendizagem, levou a uma melhoria da sua prática, constituindo também uma ferramenta extremamente útil na vida docente, como referem Sadler & Zeidler (2002). As tomadas de posição, análise e escolhas para a intervenção são influenciadas pelo grau de confiança relativamente aos temas abordados.

Também, como já foi referido anteriormente, a apresentação dos resultados dos projetos contribuiu para o desenvolvimento de competências necessárias a uma participação ativa, nomeadamente ao nível da comunicação, argumentação, reflexão, tolerância e respeito.

Assim, os estudantes indicaram essas mesmas convicções conforme podemos ver nas seguintes afirmações produzidas:

R1- “vai influenciar imenso na nossa futura profissão, pois ficamos a perceber realmente a entender que este tipo de acções fazem que todos tenham o mesmo objectivo e no sentido da construção de um mundo melhor e mais sustentável.”

R2- “ao temos esta consciencialização, de pensar para agir, será mais fácil passar as nossas ideias para os nossos alunos e futuros colegas”.

R3- “Vai influenciar o futuro de uma geração pois, enquanto professores ou educadores somos modelos para as nossas crianças, logo temos de ser nós a dar o exemplo, os primeiros passos para que a mensagem correta passe”.

R4- “por vezes é um erro pensar que está tudo falado sobre um assunto ambiental, e todos já sabem desse tema mas com o nosso projecto percebemos que nunca é demais haver sensibilização, pois há sempre alguém que não familiarizado com a importância das questões ambientais”.

R5- “ferramenta fundamental que poderemos utilizar em qualquer área do currículo”.

 

5) Perceção do conceito de ativismo cívico

Quanto à noção do que é ativismo cívico, os participantes, que inicialmente tinham conceitos abstratos e por vezes ambíguos, no final desta ação, do presente projeto “We Act”, conseguiram interiorizar o conceito e ponderam torná-lo efetivo na sua futura prática, enquanto profissionais em educação, o que vai ao encontro dos estudos e trabalhos de Bencze & Alsop (2014). Vejamos algumas das respostas:

R1- “Activismo cívico é querer passar uma mensagem e acreditar que essa mensagem pode mudar e pode melhorar o mundo. Por pouco que seja. Mas como é óbvio sem fanatismos, sem quebrar a confiança e a liberdade de cada um”.

R2- “Activismo cívico é fazer a diferença, é ultrapassar a sensibilização, é arregaçar as mangas, é fazer diferente, é agir e não só falar”.

R3- “Activismo cívico é tomar a responsabilidade que enquanto cidadãos temos de ter a consciência de querer melhorar e mudar positivamente aquilo que nos está mais próximo”

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo ajuda-nos a compreender melhor a necessidade e a urgência em mudarmos as nossas práticas e auxilia-nos a traçar novos caminhos que promovam a mudança, “seja qual for a inovação, seja qual for a modificação das práticas, apenas se tornarão operantes, se os professores acreditarem nelas, se se dispuserem a colaborar e se forem capazes de se identificar com elas” (Thurler, 1994, p. 49). São necessárias mudanças metodológicas e pedagógicas, que promovam estratégias diferenciadas e um ensino centrado no aluno, em que o papel do professor é cada vez mais o de orientar e cada vez menos o de transmissor de conteúdos. O recurso a metodologias em que há progressivamente menos ensino e mais aprendizagem requer muito tempo. Trata-se de um processo muitas vezes penoso e doloroso, porque é preciso fazer uma rutura com o que habitualmente fazemos, é uma rutura de modelos conceptuais e de atitude, é adquirir um outro olhar sobre o ensino e a aprendizagem. A assim se compreende que a mudança e a inovação requerem o seu tempo de maturação.

De acordo com os resultados e com a bibliografia consultada, pode concluir-se que, após o envolvimento dos estudantes do ensino superior nestas atividades, registaram-se diferenças estatisticamente significativas nas conceções dos alunos, tal como reflete a análise dos resultados obtidos no questionário sobre ativismo. Os mesmos modificaram as suas conceções. Genericamente, consideraram fundamental o trabalho coletivo para influenciar as comunidades educativas, numa perspetiva de participação, envolvimento e resolução de problemas ligados à ciência, à tecnologia e ao ambiente em prol dessas mesmas comunidades.

De igual modo, as respostas das entrevistas em focus group mostraram uma mudança de atitudes. Os alunos revelaram-se, em primeiro lugar, melhores cidadãos e, em segundo lugar, mostraram uma melhoria das suas competências docentes, mostrando uma maior capacidade de intervenção social e educativa.

Estes resultados indiciam que o envolvimento dos alunos (neste caso, também de futuros profissionais em educação) em atividades de ação sociopolítica, socioambientais e sociocientíficas contribui solidamente para alterar comportamentos e o conceito de ativismo, pois como refere Reis (2009), “os cidadãos devem ser ajudados a encarar a controvérsia convictos do seu direito de formular opiniões e de tomar decisões e não na expectativa de que qualquer autoridade possa decidir e resolver em seu lugar” (p.14).

Os inquéritos sobre as aulas em ciências da natureza mostraram, também, diferenças estatisticamente significativas na comparação das respostas ao pré e ao pós teste. Neste sentido, consideramos que existiram modificações profundas das perceções prévias dos estudantes. Após a realização das atividades dos seus projetos, em contexto das aulas de ciências (da UC de ADCEA), os discentes reconheceram que os conhecimentos científicos não só permitem explicar a realidade, tendo revelado também um maior interesse pelo ensino das ciências. Os principais fatores de mudança de perspetiva foram a tipologia metodológica e as atividades desenvolvidas, pois a turma, no seu global, ganhou uma nova postura assente na importância da ciência para o quotidiano, para a resolução de problemas das comunidades, fortalecendo-se o seu entendimento sobre a relevância da educação em ciência.

Os estudantes compreenderam também que o desenvolvimento deste tipo de atividades é fundamental em termos educativos, pois alteram substancialmente os modelos tradicionais de aprendizagem, permitindo uma mobilização de várias competências para a pesquisa de informação e para o fomento de um raciocínio crítico

Podemos também inferir que a concretização de ambientes de aprendizagem investigativos e o desenvolvimento de atividades em comunidades, como estratégia de ensino e aprendizagem, têm um impacto deveras positivo no desempenho profissional quer nos futuros docentes, quer na comunidade docente, quer no professor-investigador, uma vez que estabelecem uma estratégia inovadora que conduz a um melhor desenvolvimento de competências de cada um.

Ao analisar-se as entrevistas, estas indicam também que os estudantes identificam não só uma necessidade de mudança ao nível das ações pessoais, como também da implementação de ações individuais e coletivas que visem modificar atitudes e comportamentos das sociedades em que estão inseridos. Esta ilação leva-nos para uma ideia de Hilário & Reis (2009), acerca do facto de o envolvimento dos discentes em torno de controvérsias sociocientíficas constituir uma estratégia pedagógica que facilita a acomodação de conhecimento, das áreas científicas em análise. Esta é uma perspetiva distinta da natureza da ciência e das suas relações com a sociedade e o desenvolvimento das capacidades de comunicação, de reflexão e de argumentação, orientados para a uma participação ativa (efetiva mas também afetiva) enquanto cidadãos e futuros docentes.

Outros aspetos evidenciados na entrevista foram: a melhoria das suas competências no âmbito da pesquisa e/ou recolha de informação; a melhoria das suas capacidades em executar projetos, tendo em vista a resolução de problemas identificados em prol das comunidades educativas; o incremento do empenho, motivação e tempo para a realização das atividades propostas. Hilário & Reis (2009) ilustram bem esta situação referindo que a abordagem de controvérsias sociocientíficas contribui para aumentar a motivação, para a pesquisa e conhecimentos científicos. Tal também vai ao encontro da reflexão de Dori, Tal & Tsaushu (2002) que indicam que as controvérsias relativamente a estes temas contribuem para a melhoria das competências ao nível do pensamento crítico, da manifestação das suas conceções e do esforço para validá-las, recorrendo a evidências científicas.

Como é óbvio, apesar de os resultados serem extremamente positivos e animadores em relação às questões sobre o ativismo e a importância das aulas numa perspetiva de educação em ciências, certamente que nem todos os estudantes se desenraizaram de algumas convicções e conceções de modo a alterar as suas práticas, o seu modo de pensar sobre estas questões, pois existe sempre relutância face às mudanças. Neste sentido, todos docentes deverão ir ao encontro da ideia de Hodson (1999), que nos indica que, quando os professores induzem uma modificação brusca de metodologias e estratégias de ensino, muitos discentes poderão estar renitentes a essas transformações, lutando até contra elas de forma a manter aquilo a que estão mais habituados.

No entanto, como já foi referido, face aos resultados obtidos, sabemos que os alunos conseguiram prosseguir com estratégias e atividades de pesquisa sobre temas sociopolíticos, socioambientais e sociocientíficos, de modo a fortalecerem-se quer como cidadãos ativos, quer como futuros docentes, agentes de mudança. Desta forma, os respondentes desenvolveram capacidades e atitudes necessárias a uma participação ativa, nomeadamente a comunicação, a reflexão e a argumentação.

O envolvimento neste estudo e no Projeto “We Act” possibilitou não só contactar com novas investigações e estratégias pedagógicas, bem como amplificar as competências de pesquisa sobre as práticas de ensino. Assim, de futuro, pretendemos aproveitar os saberes alcançados para fortalecer a formação docente, a cooperação entre pares, as comunidades e seus estudantes, pois “entrar num processo de mudança não implica deixar para trás aquilo que sempre se fez, antes pelo contrário, (…) é saber retirar do que existe o que nos permite ir mais longe, (…) é ter a vontade de aprender sempre, de questionar e de experimentar (…) (Galvão, Reis, Freire & Oliveira, 2010, p.18).

Como nota final, defendemos o que Bybee (2002) refere quando diz que o professor em ciências é um aprendiz que acredita que a sua aprendizagem nunca está concluída. Aliás, como base neste estudo de caso, nem será possível generalizar os resultados obtidos, pois os mesmos estão circunscritos, mas são um bom desafio para continuar este caminho no sentido de estimular estratégias e competências ligadas às controvérsias sociopolíticas, socioambientais e sociocientíficas, como uma metodologia promotora de uma educação em ciência/literacia científica, para os futuros profissionais educativos e para os estudantes e docentes de uma forma geral.

 

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Contacto: Helder Martins Costa, Escola Superior de Educação Jean Piaget de Almada, Instituto Piaget, Avenida Jorge Peixinho, n.º30 — Quinta da Arreinela, 2805-059 Almada, Portugal / heldercostaprof@gmail.com

 

(Recebido em abril de 2015, aprovado em junho de 2015)


NOTAS

 


[1] Este tipo de investigações parte da dicotomia entre abordagens naturalistas (qualitativa ou etnográfica) e abordagens racionalistas (quantitativa ou experimental) e reflete um posicionamento, no sentido de utilizar características associadas a cada uma dessas formas.


[2] O Projeto “We Act” é um estudo alargado a diversos investigadores/docentes que pretende promover diferentes estudos no âmbito das potencialidades da discussão de controvérsias sociopolíticas, de ações socioambientais ou sociocientíficas na apropriação de conhecimentos e no desenvolvimento de competências necessárias ao exercício de uma cidadania crítica e participativa, quer dos profissionais em educação, quer dos seus alunos.


[3] Sd – Desvio padrão

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