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Da Investigação às Práticas

versão On-line ISSN 2182-1372

Invest. Práticas vol.7 no.2 Lisboa jul. 2017

 

ARTIGOS

 

Ação sociopolítica e aprendizagem cooperativa: a elaboração de um banner com alunos do ensino fundamental no município de Miguel Pereira, Rio de Janeiro

 

Sociopolitical action and cooperative learning: creation of a banner with students from elementary education in the municipality of Miguel Pereira, Rio de Janeiro

 

Action sociopolitique et apprentissage coopératif: élaboration d’une affiche avec les élèves de l'école primaire dans la municipalité de Miguel Pereira, Rio de Janeiro

 

Fernanda Veneu, Cássio Rosse, Marco Costa
Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, Brasil

Contacto

 

Resumo

Descreve-se, aqui, o processo de criação, organização/construção de um banner com uma turma de 8. °ano do ensino fundamental no município de Miguel Pereira (Rio de Janeiro, Brasil), bem como da apresentação deste material aos demais alunos da escola. O tema proposto foi Amamentação no século XIX. Durante a preparação do material, utilizam-se técnicas de aprendizagem cooperativa (group investigation), com o objetivo de estimular o protagonismo dos estudantes ao desenvolver habilidades e valores como cooperação, interdependência positiva e responsabilidade. A atividade está sendo realizada no âmbito do projeto europeu Irresistible, de sensibilização de professores e de alunos para a pesquisa e inovação responsáveis.

Palavras-chave: aprendizagem cooperativa, exposição, protagonismo.

 

Abstract

We describe here the creation process of a banner with a group of 8th grade of an elementary school in the city of Miguel Pereira (Rio de Janeiro, Brazil). The proposed theme was “Breastfeeding in the nineteenth century”. In the process of preparation of the material to be exposed, teachers used cooperative learning techniques (group investigation), with the aim of encouraging the active participation of students, thus developing skills and values such as cooperation, positive interdependence and responsibility. The activity was carried out under the European project Irresistible, designed to raise teachers’ and students’ awareness on responsible research and innovation (RRI). The students exhibited the banner at the school, explaining its content to the others and answering the questions raised under the scope of the World Breastfeeding Week, and they watched a video about Brazilian pro-breastfeeding laws. The activity was undertaken on August 4th 2016 to match the World Breastfeeding Week calendar (August, 1st to 7th).

Keywords: cooperative learning, exposition, active participation of the youths

 

Résumé

Nous décrivons ici le processus de création, organisation d’une affiche, avec les élèves de 8e année de l'école primaire dans la ville de Miguel Pereira (Rio de Janeiro, Brésil). Le thème proposé est Allaitement au XIXe siècle. Pour préparer le matériel à exposer, les professeurs ont utilisé des techniques d'apprentissage coopératif (group investigation), dans le but d'encourager la participation active des étudiants à développer des compétences et des valeurs telles que la coopération, l'interdépendance positive et la responsabilité. L'activité est réalisée dans le cadre du Project Irresistible, créé par des chercheurs de l’Union Européenne. Ce projet a l’objectif de sensibiliser les enseignants et les étudiants à la recherche et l'innovation responsables. Les élèves ont présenté l’affiche aux collègues et leur ont expliqué quelques détails à propos de l’allaitement au XIXe  siècle. Ensuite, ils ont regardé ensemble une vidéo. Cette activité a été organisée le 4 Août, 2016, pour coïncider avec la Semaine Mondiale de l'Allaitement Maternel (1-7 Aout).

Mots-clés: apprentissage coopératif, exposition, participation active des étudiants

 

A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem” (Guimarães Rosa).

 

INTRODUÇÃO

A influência do movimento Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente (CTSA) na educação vem modificando a maneira de se pensar e de se ensinar ciência ao longo dos últimos 50 anos. Muitos países atualizaram seus currículos, buscando mais consonância com as ideias norteadoras do CTSA, e os pesquisadores têm desenvolvido projetos, atividades e metodologias mais condizentes com essa proposta (Bettencourt et al., 2014; Amaral, 2001). A velocidade desse processo varia de acordo com o local e a disponibilidade econômica, política e ideológica, bem como com a história de cada país (Auler & Bazzo, 2001; Cerezo, 1999, entre outros).

Ao mesmo tempo, a importância de se construir uma cidadania mais informada sobre ciência ganhou espaço e amplitude nos estudos da área. A alfabetização científica, um dos pilares do movimento CTSA no ensino, tem sido considerada pelos pesquisadores não apenas como a capacidade de entender os temas relacionados à ciência e tecnologia, mas também a de compreender os fatores éticos e políticos envolvidos na atividade científica e as relações entre ciência, tecnologia, sociedade e ambiente (Deboer, 2000; Sasseron & Carvalho, 2011). Apesar de todas as conquistas na área até o momento, existe um longo caminho a percorrer. Ainda é fato que, como nos lembra Chassot (2003, p. 94), “usualmente, conhecer a ciência é assunto quase vedado àqueles que não pertencem a essa esotérica comunidade científica”. O papel social do ensino de ciências cresceu, mas ainda não o suficiente para derrubar esta barreira.

Nesta mesma linha de pensamento, e citando especificamente o caso do Brasil, autores como Conrado e El-Hani questionam a qualidade da formação cidadã oferecida, se comparada à realidade do país:

Podemos até dizer que o ensino tem atuado para a formação cidadã. No entanto, que tipo de cidadão tem sido formado? … Grande parte da população assume um comportamento passivo e muitas vezes até conformado diante de questões ambientais relevantes, problemas sociais e urbanos, conflitos éticos e políticos. (Conrado & El-Hani, 2011, p. 2)

Um dos mecanismos de que se dispõe para propiciar um ensino de ciências mais contextualizado é a discussão de controvérsias sociocientíficas, que ultrapassam as fronteiras dos laboratórios e encontram seu lugar nas páginas dos jornais (Reis, 2004, 2008; Duso & Hoffman, 2012, Vieira & Bazzo, 2007, entre outros).

Para autores como Reis (2009), “torna-se vital a passagem progressiva do conceito de cidadão passivo, governado por uma elite iluminada, para um conceito de cidadão ativo, predisposto e apto a participar em processos de decisão sobre as opções de desenvolvimento com as quais é confrontado.” (p.12).

Ao referir-se ao teor e à gravidade das controvérsias sociocientíficas com que temos sido confrontados, o autor vai além, propondo um passo a mais, a ação sociopolítica: “nos tempos atuais, a promoção da discussão sobre controvérsias sócio-científicas não é suficiente, tornando-se necessário apoiar professores e alunos a passarem à ação sociopolítica fundamentada em investigação.” (Reis, 2013, p. 2).

O projeto We Act caminha nesta direção, tendo como principais objetivos:

O desenvolvimento, a utilização e o estudo de materiais e metodologias destinadas a apoiar/assessorar os professores e estudantes (desde o primário até a universidade) na realização de ações informadas e negociadas sobre problemas sociais e ambientais associados com os campos da ciência e da tecnologia (também denominados controvérsias ciência, sociedade, tecnologia e ambiente ou controvérsias sociocientíficas). (Reis, 2014, p. 18)

Dos muitos questionamentos que surgem a partir desta proposta, selecionou-se um, para se obter mais profundidade na busca pela resposta. Que métodos/metodologias podem propiciar uma postura mais ativa dos estudantes? Entre os existentes, escolheu-se, aqui, o ensino cooperativo. Acredita-se que a aprendizagem cooperativa pode propiciar o desenvolvimento das habilidades necessárias para uma cidadania mais ativa, de acordo com as propostas defendidas pelo projeto We Act. Em seguida, explica-se por quê.

 

AÇÃO E ENSINO COOPERATIVO

O ensino cooperativo é um método instrucional mundialmente utilizado a partir dos anos de 1970 (Johnson & Johnson, 2009). Estudos pioneiros na área já avaliavam a efetividade desse método quando comparado a outros métodos baseados no individualismo ou na competição (Johnson, Johnson, & Stanne, 2000; David W. Johnson, Maruyama, Johnson, Nelson, & Skon, 1981; Stevens, Slavin, & Farnish, 1991; Thomas & Kothari, 2015)

Geralmente, nas estratégias individualistas e competitivas, os estudantes realizam as atividades por conta própria e o professor as avalia utilizando um mesmo critério. A centralidade do processo de ensino reside na figura do professor. No ensino cooperativo, os estudantes trabalham em grupo para atingir um objetivo.

No entanto, para que ocorra um trabalho efetivamente cooperativo, não basta apenas que os estudantes formem grupos. Algumas características precisam ser satisfeitas, como(Johnson & Johnson, 2009):

• Interdependência positiva – o desempenho de cada integrante afetará decisivamente o trabalho em grupo. A realização de tarefas deve ser interdependente de tal modo que cada membro tenha sua função no interior do grupo. Dessa maneira, nenhum aluno está apto a realizar a atividade sozinho.

• Responsabilidade individual – cada estudante se torna responsável por cumprir tarefas na dinâmica do seu grupo. A responsabilidade individual gera um maior envolvimento dos estudantes no trabalho em grupo e possibilita que todos os envolvidos aprendam.

• Interações face a face – na dinâmica do trabalho cooperativo, os estudantes devem ter condições para interagirem diretamente uns com os outros, traçando prioridades e objetivos, formulando hipóteses, promovendo feedbacks e conclusões.

• Habilidades colaborativas – os estudantes são estimulados a desenvolver importantes habilidades interpessoais, como a liderança, a capacidade de tomar decisões, ouvir atentamente, propor argumentos e contra-argumentos, formular hipóteses, traçar conclusões, gerenciar conflitos.

• Processamento de grupo – os membros do grupo devem fazer avaliações periódicas do andamento do trabalho cooperativo. Eles devem analisar as ações do grupo que foram bem sucedidas e aquelas que necessitam um novo planejamento. Os membros também devem verificar as prioridades e devem tomar atitudes que favoreçam a resolução de problemas.

Para além dos comprovados ganhos cognitivos, a aprendizagem cooperativa possibilita o desenvolvimento de importantes relações sociais (Lord, 2001; Tanner, Chatman & Allen, 2003). Estudos na área indicam que os estudantes que realizam atividades cooperativamente desenvolvem atitudes sociais positivas com os demais grupos. Os estudantes tornam-se mais sociáveis e dispostos a ouvir os demais (Felder, Richard & Brente, 2007). Além disso, dada a heterogeneidade dos grupos, eles aprendem a lidar com todo tipo de diversidade, seja ela étnico, cultural ou social.

Os efeitos de aprendizagem cooperativa também podem ser observados no domínio emocional. Estudantes expostos a esse método instrucional desenvolvem uma maior autoestima, persistem mais nas tarefas e estão mais dispostos a realizar outras atividades.

O desenvolvimento de habilidades colaborativas, somado aos ganhos escolares e sociais proporcionados pela aprendizagem cooperativa, contribuem decisivamente para formação de um cidadão crítico e atuante. Segundo Johnson e Johnson (2014, p.  843), “quando os indivíduos trabalham juntos para realizar tarefas, interagem, dominando habilidades sociais e competências; trabalham pelo sucesso uns dos outros, ganhando autoestima, e desenvolvem relações pessoais e profissionais, criando a base para um desenvolvimento social saudável.”

Neste contexto, apresenta-se a experiência de organização de uma miniexposição com alunos do 8° ano do ensino fundamental no município de Miguel Pereira, Rio de Janeiro, Brasil. Utilizaram-se, aqui, os pressupostos da aprendizagem cooperativa para a preparação de um painel que seria exibido em um museu da região. O emprego da metodologia Group Investigation associada à atividade se mostra atraente por possibilitar um trabalho cooperativo com toda a turma e que culminará com a montagem de uma miniexposição.

 

O município

Miguel Pereira é um município do centro-sul do estado do Rio de Janeiro, com uma população de aproximadamente 26 mil pessoas e que ganhou autonomia político-administrativa há pouco mais de 50 anos (http://www.pmmp.rj.gov.br/historia.php.) Conta com dois pequenos museus: a casa de Francisco Alves, famoso cantor brasileiro, e o museu ferroviário – que, no momento, encontra-se fechado. Os estudantes que moram nas proximidades, portanto, não dispõem de muitas opções. O museu mais próximo fica a 31,8km de distância, já em outro município.

 

Painel

O painel “Amas de leite: importantes, mas esquecidas” é parte do trabalho final do módulo sobre amamentação desenvolvido no âmbito do Projeto Irresistible (http://www.irresistible-project.eu/index.php/pt/). Iniciado em 2013 e envolvendo 10 países europeus e Israel, o projeto tem como objetivo sensibilizar professores e alunos para a importância da pesquisa e inovação responsáveis ( https://ec.europa.eu/programmes/horizon2020/en/h2020-section/responsible-research-innovation), sempre utilizando temas científicos de ponta e trabalhando as controvérsias sociocientíficas que estes temas possam suscitar.

De acordo com as orientações do projeto, ao final de cada módulo, os alunos devem organizar uma exposição sobre o tema estudado. Neste caso específico, os estudantes fizeram primeiro este painel com um tema mais restrito, que seria colocado em um museu. Depois, a partir da experiência adquirida, planejariam a exposição mais ampla, envolvendo outros aspectos trabalhados em sala de aula, como as controvérsias sobre a indústria do leite e as diferenças entre o leite materno e o artificial.

Em algumas outras experiências, a exposição costuma ser realizada na própria escola ou em algum outro lugar. No caso descrito aqui, os estudantes iriam expor seu trabalho em uma casa-museu do século XIX, em um município vizinho. A ideia de procurar contato com um museu para sediar a exposição feita pelos alunos partiu dos professores envolvidos no projeto.

A data prevista para a inauguração da miniexposição foi 4 de agosto de 2016, justo durante a semana mundial da amamentação (1 a 7 de agosto).

 

Escolha do tema

Feito o contato, devido às particularidades da casa-museu, que abriga apenas exposições e acervo relacionados ao século XIX, decidiu-se montar uma miniexposição com o tema “amamentação no século XIX”. A ideia surgiu no contato com os profissionais do museu, que cederam um painel para que os estudantes possam preparar seu trabalho. Além da cessão de espaço, os profissionais ofereceram itens do acervo documental para compor a exposição, bem como atividades educativas, como a participação em cineclube (uma sessão de cinema seguida por debate), uma visita guiada pela casa-museu e uma oficina sobre como montar uma exposição. Seria um dia inteiro dedicado a outros tipos de aprendizagem que não fazem parte dos conteúdos tratados em sala de aula.

 

METODOLOGIA

Participantes

Estão envolvidos no projeto os 25 alunos de uma turma de 8° ano do ensino fundamental na cidade de Miguel Pereira, Rio de Janeiro, Brasil. Os estudantes têm entre 11 e 13 anos.)

 

A escola

A escola participante, pertencente à rede municipal, atende ao segundo segmento do ensino fundamental (6º ao 9° ano). Ao todo, recebe 200 estudantes, distribuídos em 8 diferentes turmas, 2 de cada série. O projeto Irresistible está sendo aplicado em uma turma do 8.º ano. A escolha dessa série se deu justamente para que a temática do projeto fosse inserida de maneira mais orgânica possível nos conteúdos de disciplina de Ciências, de acordo com os conteúdos programáticos.)

 

Planejamento do banner

Os alunos planejaram o banner durante as aulas de ciências. O professor de ciências tem quatro tempos de 45 minutos de aula por semana. Dois tempos de aula são dedicados ao projeto Irresistible e, nos outros dois, o professor segue com o conteúdo programático habitual, porém integrado aos conteúdos do projeto.

Durante três semanas, durante as aulas dedicadas ao projeto, a turma foi dividida em quatro grupos heterogêneos, formados a partir dos interesses nos diferentes tópicos de investigação.

Cada grupo trabalhou em um tópico extraído do tema central. Todos eles apresentam perguntas de investigação que contribuem para realização de buscas amplas e críticas, com variadas interpretações. Os tópicos escolhidos foram os seguintes:

• Os personagens (mãe, pai, bebê, ama de leite) – quais eram os principais personagens envolvidos na amamentação nesse momento histórico? Que controvérsias podemos identificar nesse contexto? Neste item, a ideia é que os estudantes descubram particularidades da época, como a figura da ama de leite escrava e, a partir daí, possam levantar controvérsias.

• O século XIX – quais foram os principais acontecimentos históricos durante esse período? Dentro deste tópico, pretende-se trabalhar o contexto histórico mundial, com suas principais revoluções, invenções e os acontecimentos mais importantes. Objetiva-se, aqui, fazer com que os próprios estudantes procurem uma visão mais ampla do tema e do momento histórico.

• Sociedade brasileira – em que contexto histórico, político, social e cultural se encontrava o Brasil naquele momento? Neste tópico, pretende-se que os alunos descubram que ideias permeavam a sociedade brasileira nos anos 1800, bem como de onde vinham. Trata-se de Joaquim Nabuco – quem foi esse abolicionista que deu destaque tamanho a sua ama de leite, a ponto de mencioná-la  em suas memórias? Qual a sua importância na sociedade brasileira e qual a relação que teve com os antigos moradores da casa-museu?

• Passado e presente: – tema: linha do tempo da amamentação. Quais os fatos mais relevantes sobre o tema do século XIX até o momento? Por que mudanças passou o processo de amamentar?

Os estudantes tiveram aproximadamente duas semanas para realizarem suas buscas e analisarem os materiais disponíveis. Em seguida, cada grupo realizou uma apresentação para toda a turma sobre seus achados. O material apresentado pelos grupos poderá ser utilizado posteriormente na montagem da exposição. Nesse momento, houve um trabalho cooperativo não só no interior dos grupos, mas entre todos os grupos.

A montagem da exposição seria feita no próprio museu, por todos os alunos, com a ajuda de uma profissional da instituição. Porém, faltando 8 dias para o evento, uma das interlocutoras do museu enviou um email suspendendo a atividade, com a justificativa de o texto preparado pelos alunos não ser fiel à “verdade científica”.

 

BANNER E APRENDIZAGEM COOPERATIVA: POSSÍVEIS BENEFÍCIOS PARA OS ALUNOS

Na preparação do banner, desenvolveram-se os seguintes aspectos da aprendizagem cooperativa:

1. O sucesso da tarefa está vinculado a uma interdependência positiva entre grupos.

2. O desempenho de cada um deles afeta decisivamente a qualidade do produto final.

3. Interações face a face irão ocorrer não só nos trabalhos dos grupos heterogêneos, mas durante a montagem da exposição.

4. Todos os estudantes possuem responsabilidades.

5. Caberá aos grupos cooperativos definirem metas e dividirem esforços para que possam apresentar com a melhor qualidade possível os resultados dos seus tópicos de investigação. Durante todo esse processo, importantes habilidades colaborativas podem ser desenvolvidas.

Além disso, um processamento de grupo foi realizado por cada um deles, assim como uma autoavaliação da atividade produzida coletivamente pela turma.

Dessa maneira, os estudantes puderam desenvolver uma atividade efetivamente cooperativa, segundo os pressupostos apresentados inicialmente.

Os ganhos proporcionados pela aprendizagem cooperativa redimensionam o estudante no processo de ensino e o colocam em uma posição de centralidade. Cada membro deve manter uma postura ativa e participativa frente a seu grupo. Tal postura é fundamental em contextos educacionais modernos, na qual se espera, cada vez mais, um papel de protagonismo do estudante.

 

RESULTADOS

Espera-se que as atividades cooperativas trabalhadas durante a preparação da miniexposição possam ajudar os estudantes a desenvolver as habilidades necessárias para uma atuação sociopolítica mais efetiva não apenas na escola, mas na vida.

O fato de o museu ter suspendido a atividade faltando tão pouco tempo para o dia marcado trouxe preocupação para os professores, mas acabou sendo revertido a favor dos alunos. Os estudantes foram postos a par do que ocorreu e prepararam, na própria escola, um evento no mesmo dia como parte das atividades da semana mundial de amamentação. O banner foi exposto por eles, tendo estes explicado aos colegas o que haviam aprendido até então. Assistiram também a um vídeo sobre as leis e normas que regem a propaganda de produtos relacionados à amamentação. (Figura 1)

Outras atividades foram organizadas e levadas a cabo durante o ano letivo de 2016. Um exemplo foi a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, no município de Vassouras, em que, além de apresentarem o banner, os alunos organizaram espontaneamente uma campanha para doação de leite materno.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Acredita-se que a aprendizagem cooperativa é adequada para desenvolver as habilidades necessárias aos cidadãos de nosso século. Cada uma de suas características atende a um aspecto desta cidadania. A partir da interdependência positiva, por exemplo, os estudantes podem entender que, para realizar bem uma tarefa, é necessária a participação de todos. Esta compreensão ajuda a um melhor desempenho nas atividades colaborativas, que, por sua vez, requerem o desenvolvimento de habilidades como liderança e resolução de conflitos.

A interação face a face é fundamental para traçar prioridades e objetivos, bem como para a resolução de possíveis conflitos. Reconhecer sua responsabilidade individual é outro fator importante no processo de construção da cidadania. E o processamento em grupo, por sua vez, pode auxiliar na autocrítica e no processo de ouvir os demais. Todos estas características estão  em consonância com os objetivos e intenções do Projeto We Act.

Em outros estudos sobre a aprendizagem cooperativa, mencionam-se também benefícios emocionais, como a elevação da autoestima, da persistência na realização de tarefas e mais disposição para atuar. Este aspecto também é muito importante para os envolvidos no projeto, tanto de maneira individual, quanto socialmente.

Além disso, o fato de os alunos terem superado a frustração de não terem o trabalho exposto no museu, como previamente combinado, trouxe crescimento e amadurecimento para o grupo. Alguns meses depois, houve ações espontâneas como a campanha pela doação de leite materno e panfletagem nas ruas de Miguel Pereira, com o mesmo objetivo. Isto mostra que é possível, a partir da escola, ter influência sobre o ambiente externo. Um convite à ação sociopolítica, afinal. E um belo exemplo da coragem descrita por Guimarães Rosa.

 

AGRADECIMENTOS

À Fundação Joaquim Nabuco, que cedeu gentilmente as fotos de ama de leite do século XIX para utilização no banner, e ao Museu Casa da Hera, pela pesquisa e cessão dos anúncios de amas de leite encontrados nos jornais do século XIX.

 

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Contacto:

Fernanda Veneu, Fundação Oswaldo Cruz, Av. Brasil, 4365 - Manguinhos, Rio de Janeiro - CEP: 21040-900, Rio de Janeiro, Brasil / fveneu@gmail.com
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Marco Costa, Fundação Oswaldo Cruz, Av. Brasil, 4365 - Manguinhos, Rio de Janeiro - CEP: 21040-900, Rio de Janeiro, Brasil costa@fiocruz.br

 

(recebido em dezembro de 2016, aceite para publicação em janeiro de 2017)

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