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Revista :Estúdio

versão impressa ISSN 1647-6158

Estúdio vol.9 no.22 Lisboa jun. 2018

 

ARTIGOS ORIGINAIS

ORIGINAL ARTICLES

Um recorte da produção gráfica de Nilza Haertel: 1980 a 1990.

A selection over Nilza Haertel's graphic production: 1980 to 1990

 

Maristela Salvatori*

*Brasil, artista visual.

AFILIAÇÃO: Instituto de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Rua Senhor dos Passos, 248, CEP 90020-180, Centro. Porto Alegre, RS Brasil.

 

Endereço para correspondência

 

RESUMO:

Apresentação de elementos sobre a obra gráfica de Nilza Haertel (1942 — 2014), artista brasileira que atuou como professora de Desenho e Gravura no Instituto de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Palavras chave: Nilza Haertel / gravura / arte contemporânea / processos de criação.

 

ABSTRACT:

Presentation of elements about the graphic work of Nilza Haertel (1942 — 2014), Brazilian artist who acted as teacher of Drawing and Engraving at the Institute of Arts of the Federal University of Rio Grande do Sul.

Keywords: Nilza Haertel / engraving / contemporary art / creation processes.

 

Nilza Belita Grau Haertel (Porto Alegre, 1942 — Porto Alegre, 2014), foi professora de Desenho e Gravura no Instituto de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (IA/UFRGS), de 1980 a 2009. Em 2015, sua família buscou o IA/ UFRGS para oferecer parte deseulegado. Dentre os itens propostos àdoação, havia um numeroso acervo de obras gráficas autorais sobre as quais aqui nos deteremos. Conheci Nilza Haertel em 1981, quando eu era uma jovem que iniciava a Graduação em Artes Plásticas do IA/UFRGS e Nilza era uma jovem professora, que recém ingressara no quadro de professores da instituição e voltava de um período de estudos na Holanda. Fui sua aluna em cursos de Desenho; seu entusiasmo era contagiante, me estimulou a produzir intensamente durante aqueles anos. Logo após, Nilza partiu do Brasil, e ficou fora por duas temporadas, para estudos, primeiro para a realização do Master in Fine Arts, realizado na Colorado State University, CSU, Estados Unidos (1982-1985), depois para a realização do Doutorado em História da Arte, na Indiana University, IU, Estados Unidos (1993-2006).

Perdemos o contato por mais de uma década, até meu ingresso como professora no IA/UFRGS (1994). Quando eu mesma retornei de um período de estudos no exterior (2002), não encontrei no olhar de Nilza aquele delicioso entusiasmo que havia me cativado, estando ela fragilizada por problemas de saúde na família. Sua postura no IA/UFRGS era bastante reservada. Igualmente discreta como artista, realizou e participou de exposições esparsas.

 

Descobrindo um acervo

Helena Kanaan e eu, ambas professoras da área de Gravura do IA/UFRGS, atendemos à solicitação da Chefia Departamental e auxiliamos no processo de levantamento dos itens propostos à doação. Foi uma enorme e grata surpresa abrir pastas e pacotes e encontrar numerosas obras de Nilza — revelando, na intensa produção, uma artista de grande sensibilidade e força, que até então desconhecíamos e nos emocionou profundamente.

De imediato, começamos a pensar como dar mais visibilidade a este riquíssimo acervo. Planejamos e realizamos uma série de ações. Com auxílio de bolsistas de Iniciação Científica e de Extensão, tratei da organização prévia deste acervo. Em conjunto com Helena Kanaan, realizei a curadoria da exposição Nilza Haertel: experimentações gráficas, que apresentou uma seleção de suas obras, especialmente litografias, no Centro Cultural CEEE Erico Verissimo (CCCEV), em Porto Alegre, de setembro a outubro de 2016. Em paralelo à mostra, promovi o seminário O Artista pesquisador na Universidade, com a finalidade de levantar questões em torno do artista pesquisador na universidade e a obra desenvolvida por Nilza Haertel, o seminário contou com a participação de Helena Kanaan, Flávio Gonçalves e Hélio Fervenza, artistas pesquisadores do IA/UFRGS, e Lurdi Blauth, artista pesquisadora da FEEVALE. Finalmente, recentemente, lançamos a publicação Experimentações gráficas de Nilza Haertel: recorte de um acervo, apresentando o projeto, com organização minha e de Helena.

 

A pesquisa gráfica

Embora na exposição tenhamos dados ênfase a sua produção litográfica, por estas obras serem mais abundantes e terem maior força, em toda sua produção poética, observamos uma atitude investigativa incansável, desde a busca pelo melhor enquadramento no papel — em meio ao acervo encontram-se muitas provas de estado em diferentes posições e enquadramento nos papéis, estes também variando na dimensão, a pesquisa de cores, e muito intensamente a experimentação de variações sucessivas.

Observamos diferentes jogos com a forma e os recursos gráficos, desde matrizes de colagravura (obtida pela colagem de diversos materiais) explorando diferentes possibilidades de impressão, como na Figura 1 (cuja base é uma lixa de madeira), como uma busca da singularidade em formas despercebidas do cotidiano, como a singela bandeja descartável de alumínio que, amassada, adquire outras conotações e que aparece já em obras de 1979 e 1980 (Figura 2), até ser incorporada à obra de 1983 (Figura 3), onde adquire um aspecto bastante poético, quase como uma evocação de planeta ou de fenômeno da natureza — como o próprio título sugere: Autumn composition. Aliás, praticamente toda sua produção posterior a 1980 recebe títulos em inglês, possivelmente, pelos estreitos vínculos estabelecidos com os Estados Unidos, onde viveu por longas temporadas — além de sua permanência para desenvolvimento da dissertação de mestrado e da tese de doutorado, Nilza também atuou na Colorado State University, primeiro como Monitora Convidada de Gravura (G.T.A.), de 1984 a 1985, depois como docente em Desenho (Contrato de Tempo Parcial) e como docente em Gravura no Continuing Education Program, de 1985 a 1986, tendo retornado àquela universidade como Professor Visitante Convidado (Artist in Residence), em 1990.

 

 

 

 

 

 

Segundo relato de sua sobrinha, Iris Richter, Nilza e o marido, Victor Haertel, também professor universitário vinculado à UFRGS (Instituto de Geociências), estavam extremamente bem adaptados ao modo de vida e sistema acadêmico americano.

A produção litográfica realizada nos EUA, além de se impor pela liberdade do gesto (Figura 4 e Figura 5), também impacta pelas dimensões, certamente executadas em ateliês bem melhor equipados do que os ateliês encontrados no sul do Brasil, permitindo a composição com imagens sangradas, o que parece intensificar a amplitude do movimento.

 

 

 

 

Os títulos dos trabalhos, Fugue (1983), Adagio (1983), Cantata (1983), Song (1983), Aleggro (1983), Chords (s/d), Door (1983) Old Wall (s/d), Woods' sounds and silence (1983), Stormy Night (1983), Night Wind (1983), Echoes (1984), Grass and Water (1984), Spring (1984), Water Wings (1984), Canyon Wall (1985), Rocks under water (s/d), Sounds and Silence (1984), Dark Chords (1984), Sandstone Arch (s/d), Silent dance of grasses (1985), Slow opposed forces (1985), Flowering Shrub (1986), Moonlit Wall (s/d), Trees and Snow (1990), Vessel (1990), assim como das séries, Impromptu (1984), Rock (s/d), Square (1985), e Fragment (1985-1987), revelam suas paixões pela natureza e pela música, tendo ela própria realizado formação fundamental em piano (de 1950 a 1960 no IA/UFRGS).

Sua dissertação de mestrado, com o sugestivo título Shapes of Sounds and Silence, também explicita seu interesse sobre o silêncio nas artes visuais, como artista pesquisadora, tendo escrito sobre o tema o artigo A magia do silêncio nas Artes Visuais, na Revista Porto Arte (Porto Alegre, v. 01, nº 1, p. 5659, 1990). Conforme suas palavras, "a noção de silêncio pode apenas ser apreendida, nas artes visuais, num sentido metafórico — como imobilidade e serenidade." (Haertel, 1990:57) Seria "uma chamada para uma nova visão, uma suspensão de significados 'traduzíveis', uma questão em aberto." (Haertel, 1990:58)

O trabalho de organização prévia de seu acervo e de realização de uma curadoria para Nilza Haertel foi feito com muita admiração e respeito. No volumoso material proposto à doação (contabilizamos cerca de cento e quarenta gravuras), havia cerca de sessenta imagens assinadas e datadas, muitas provas com anotações de ateliê, provas de estado, desenhos, impressões e experiências diversas, constituindo uma importante fonte para pesquisas sobre o seu processo de criação. Foi um privilégio e uma honra poder fazer esta primeira leitura sobre este rico acervo e contribuir para uma maior divulgação desta riquíssima e importante obra que, sem dúvida, logo terá a merecida visibilidade.

 

Referências

Haertel, Nilza. (1990) A magia do silêncio nas Artes Visuais. Porto Arte, Porto Alegre, v. 01, nº 1, p. 5661        [ Links ]

Salvatori, M.; Kanaan, H. (2018) Experimentações gráficas de Nilza Haertel: recorte de um acervo. Porto Alegre: MarcaVisual.         [ Links ]

 

 

Enviado a 28 de dezembro de 2017 e aprovado a 17 de janeiro de 2018

 

Endereço para correspondência

 

Correio eletrónico: maris@ufrgs.br (Maristela Salvatori)

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