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Revista :Estúdio

versão impressa ISSN 1647-6158

Estúdio vol.8 no.18 Lisboa jun. 2017

 

Editorial

Editorial

Projeto: fluxo dinâmico, movimento perpétuo

Project: dynamic fluxus, perpetual movement

 

João Paulo Queiroz*

*Portugal, par académico interno e editor da Revista Estúdio.

AFILIAÇÃO: Universidade de Lisboa, Faculdade de Belas-Artes, Centro de Investigação e de Estudos em Belas-Artes (CIEBA). Largo da Academia Nacional de Belas-Artes, 1249-058, Lisboa, Portugal.

 

Endereço para correspondência

 

Resumo:

Os discursos são bons contributos dos estudos estruturais: os significantes, deslizantes, tornam-se significados em geração, o tempo chama para si a construção do sujeito. A identidade surge de um desempenho, e os enviesamentos ideológicos são denunciados. A revista Estúdio gera novos discursos, em que os enunciadores são os próprios artistas, tomando por objeto a obra de outros artistas. Entra ar fresco no circuito poderoso da arte. É resistência, ocupar espaço, construir discurso, e contribuir com conteúdo informado e qualificado.

Palavras chave: discursos / desempenho / resistência / Revista Estúdio

 

Abstract:

The speeches are important contributions from the structural studies: the signifiers, become sliding meanings in continuous generation, and time is a contributor to the construction of the subject. The identity arises from a performance, and hence the ideological biases are reported. Revista Estúdio generates new speeches, in which the enunciators are the artists themselves, taking as subject the work of other artists. Freshness enters in the powerful art circuit. Resistance is demanded, to take up space, build speech, and contribute to more informed and qualified content.

Keywords: speeches / performance / resistance / Revista Estúdio.

 

O fluxo exige um desequilíbrio controlado, que produzirá uma corrente. A continuidade da corrente depende da persistência dos agentes intervenientes, da sua dinâmica mais ou menos perene.

Os fluxos presentes nesta revista são consistentes, mas certamente não serão perenes. Dependem das pessoas, das suas relações, e instituem-se como um projeto formativo, de raiz não formal. Trata-se estabelecer, propor e fazer funcionar uma rede conectiva, colaborativa, que abranja os meios artísticos e universitários dos países de línguas ibéricas, um projeto não hierarquizador, um espaço de comunicação igualitária, democrática, eficiente, porque assente nos discursos dos próprios artistas, aqui convidados a comunicar sobre outros artistas.

O desafio tem produzido resultados, contáveis em artigos publicados, em revistas já esgotadas, em artistas que passaram a tomar como referentes outros artistas, que lhes eram desconhecidos, apesar de tão próximos. O modelo é formativo, consciente, e ambiciona mais: mais relação, mais conhecimento, mais disseminação, mais públicos, mais discursos sobre arte, mais conhecimento. É uma nova estética, mais que relacional (Bourriaud, 2009) é uma estética cognitiva.

A secção editorial do número 18 da revista Estúdio apresenta três artigos de pares académicos da Revista. Marcos Rizolli, de São Paulo, Brasil, no artigo "Es[ins]tabilidades: as instalações de José Spaniol" apresenta uma reflexão sobre as instalações realizadas no Mosteiro de São Bento e na Galeria Baró, assim como a participação na 29ª Bienal de São Paulo) ou na Pinacoteca do Estado, por este artista, José Spaniol. A instalação "Arte e espiritualidade," em parceria com o monge Eduardo Uchoa, ou a instalação "Ascensões" são exemplos do seu potencial inovador e potente.

Eduardo Vieira da Cunha, de Rio Grande do Sul, Brasil, no artigo "O duplo de Laura Cattani: reflexões sobre as armadilhas de Narciso em um trabalho plástico" aborda o trabalho da brasileira Laura Cattani (n. 1990), concretamente "Demônio Pessoal" (2015) estabelecendo e debatendo a propósito o conceito do duplo, na psicanálise e na arte. Dois mitos em particular, Narciso e Pigmalião, são revisitados no que respeita aos limites da pulsão erótica na produção artística.

Almerinda da Silva Lopes, do Espírito Santo, Brasil, no artigo "O fluxo da memória no gesto pictórico de Carlos Zílio" apresenta e discute uma série produzida entre 2000 e 2010 por Carlos Zílio (RJ. 1944) propondo afinidades e referências plásticas que permitem novas leituras.

Na secção de artigos originais a concurso apresenta-se uma seleção de 13 artigos.

De Rio Grande do Sul, Brasil, Sandra Maria Lúcia Pereira Gonçalves no artigo "Klaus Mitteldorf: memórias do presente" apresenta uma reflexão sobre o fotolivro "Introvisão" do fotógrafo, artista e cineasta brasileiro Klaus Mitteldorf (n. São Paulo, 1953). É uma destas 59 imagens, "silence" (1998) reunidas nesse livro que resolvemos colocar na capa da Revista Estúdio 18. Uma síntese do cruzamento entre as palavras e as coisas, o desejo e o corpo, um deslizar vivo onde os vivos sonham a arte e ensaiam memórias.

Norberto Stori & Rossini Castro, de São Paulo, Brasil, "O ambiente amazônico nas obras de Hélio Melo," apresentam o artista amazonense Hélio Holanda Melo (1926-2001), contextualizadas na sua experiência como seringueiro e ativista político na Floresta Amazónica, numa proposta de intervenção espontânea.

De Lima, Perú, as autoras Mihaela Radulescu de Barrio & Rosa Gonzales Mendiburu, no artigo "Las narrativas del cuerpo en la obra de Natalia Iguiñiz" apresentam um contexto de intervenção política e artística bem determinado. Natalia Iguiñiz, artista, foi uma das organizadoras da marcha "Ni una menos", uma manifestação contra aa violência de género que se realizou em Lima, agosto de 2016, com cerca de 150 pessoas. A arte assume o esteio político atravez de arquitecturas relacionais (Bourriaud, 2009). Na obra "Pequeñas historias de maternidad 2" um conjunto de pinturas, fotografias, desenhos e uma videoinstalação que apresentava em tempo real as rotinas do uso de uma bomba extratora de leite, devolvendo a discursividade performativa dos momentos de construção identitária (Butler, 2011; Canclini, 2015).

Daniela Cidade, de Rio Grande do Sul, Brasil, no artigo "Cicatrizes na paisagem: a fotografia entre o olhar e o lugar" apresenta a artista brasileira Claudia Zimmer (n. Florianópolis, Brasil, 1968) que apresenta nas suas fotografias de paisagens uma interposição subjetiva que nos coloca no meio do seu olhar.

De Madrid, Espanha, Asier Luzarraga, no artigo "Desvíos y anomalías: la pintura de Damaris Pan" introduz um olhar sobre a pintura pastosa e plástica de Damaris Pan (n. Mallabia, País Basco, 1983) que convoca os lugares habitados e as coexistências para as tornar mais acesas.

Susana Rocha, de Portugal, no artigo "Felippe Moraes: Tudo o que nos ultrapassa" apresenta uma reflexão sobre a obra plástica do artista brasileiro Felippe Moraes (n. 1988, Rio de Janeiro). Num processo aturado, ao longo de 7 meses, o artista recorta todas ocorrências da palavra "Deus" presentes numa Bíblia, construindo uma meta-linguagem em aberto onde a indizibilidade ou a sua interdição certamente ocupam algum dos itens de discussão. Os 5101 recortes dão origem a outras peças que relacionam ideias com materiais. As relações entre o conceito e o material parecem ocupar com persistência as instalações de Moraes.

Carlos Correia, de Portugal, no artigo "Princípio é o fim é o princípio é o fim : Arte e Ciência no trabalho de Cecilia Costa" aborda a obra da artista portuguesa Cecília Costa (Caldas da Rainha, 1971) que explora em desenhos e objetos algumas experiências plásticas e conceituais onde os discursos humanos parecem mostrar o seu agir à distância.

Iranzu Antona, do País Basco, Espanha, no artigo "Un espacio intermedio para la reflexión: UNA COSA por Irantzu Sanzo" apresenta a obra de Sanzo (n. 1985, Pamplona) a partir dos eu projeto de 2013 para o Centro de Arte Contemporáneo Huarte (UNA COSA). Vidros e analogias parecem buscar identidades que se perdem ao longo das repetições: não há transparência na repetição, na identidade, na experiência.

Também do País Basco, Espanha, Damaris Pan, no artigo "Irrumpe como Granada Roja: Hacer Tener que Ver, El concepto de di-versión en la obra de Taxio Ardanaz," apresenta a obra de Ardanaz (n. 1978, Pamplona), de essencialidade multi-instrumental e não digital. O tema da guerra sobrevoa estas peças que parecem invocar um certo riso dissimulado na loucura da violência, paradigma do absurdo.

Massimo Cova, italiano radicado em Barcelona, Espanha, no artigo "Señales visuales espontáneas presentes en la cotidianidad, como referentes de creación artística en la obra de Ignasi Aballí" vai abordar a obra deste artista, Aballí (n. Barcelona, 1958), que assume uma problematização ética:

La obra 'Mis manos después de tocar cosas sucias' se presenta como metáfora paradigmática de la sociedad actual, competitiva y podrida en sus valores éticos y morales. Consiste en una fotografía en color de pequeño formato, donde el sujeto es a escala natural, creando un efecto perceptivo ambiguo y sugerente. (Cova, 2017: XX)

 

São vestígios, indícios, presenças análogas que reivindicam contacto, evidências.

Guilherme Tosetto, do Brasil, no artigo "Ruído e interferência nas imagens técnicas de Guilherme Maranhão" apresenta os trabalhos para-fotográficos de Guilherme Maranhão (n. 1975, Rio de Janeiro, Brasil) recupera equipamentos obsoletos em aparelhos para fotografar, sendo assim não já um "funcionário" (Flusser, 2002; 2008) mas sim um artista que transforma a caixa preta, de determinação técnica, em espaço de criação e de liberdade.

De São Paulo, Brasil, Neide Marcondes & Nara Martins, no artigo "A transnacionalidade de artistas no Museu Afro Brasil: Yonamine e José Pedro Croft" apresentam uma contraposição entre dois artistas, Yonamine (n. 1975, Angola) e José Pedro Croft (n. 1957), que participaram na mostra "Portugal Portugueses" no Museu Afro em São Paulo, 2017. Da instalação de torradas de pão emerge um rosto, Eduardo dos Santos, "o pão nosso de cada dia". Croft fractura a percepção dos seus desenhos ao intermediá-los por uma instalação de espelhos que os anaformiza e transforma através de diferentes pontos de vista.

A atitude é de resistência. Vencer o capitalismo cognitivo das hegemonias dos discursos artísticos exige persistência e inovação. O desafio é deixado a todos, artistas, públicos, agentes formativos: há um movimento educativo em marcha, uma viragem, que reposiciona no centro as práticas colaborativas e a criação de públicos (Ardenne, 2006).

 

Referências

Ardenne, Paul. (2006). Un arte contextual: creación artística en medio urbano, en situación, de intervención, de participación. Murcia: Cendeac. ISBN: 84-96299-40-6.         [ Links ]

Bourriaud, Nicolas (2009) Estética Relacional. São Paulo. Martins Fontes. ISBN 978-85-99102-97-8        [ Links ]

Butler, Judith (2011) El género en disputa: el feminismo y la subversión de la identidad. Barcelona: Paidós. ISBN: 9788449320309        [ Links ]

Cova, Massimo (2017) "Señales visuales espontáneas presentes en la cotidianidad, como referentes de creación artística en la obra de Ignasi Aballí." Revista Estúdio, artistas sobre outras obras. ISSN 1647-6158 e-ISSN 1647-7316. 8, (18) abril-junho.         [ Links ]

Flusser, Vilém (2002) Filosofia da caixa preta: ensaios para uma futura filosofia da fotografia. Rio de Janeiro: Relume Dumará         [ Links ].

Flusser, Vilém (2008) O universo das imagens técnicas: elogio da superficialidade. São Paulo: Annablume.         [ Links ]

García Canclini, Néstor (2012) Sociedade sem Relato: antropologia e Estética da Iminência. São Paulo: EDUSP, ISBN 13: 978-85-314-1369-8        [ Links ]

 

Artigo completo submetido a 18 de março de 2017 e aprovado a 20 de março 2017

 

Endereço para correspondência

 

Correio eletrónico: j.queiroz@belasartes.ulisboa.pt (João Paulo Queiroz)

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