SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.7 número15Rui Macedo: Da sugestão e do seu poder imagético índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Revista :Estúdio

versão impressa ISSN 1647-6158

Estúdio vol.7 no.15 Lisboa set. 2016

 

EDITORIAL

EDITORIAL

O risco corre no Estúdio

The risk lies in the Estúdio

 

João Paulo Queiroz*

*Portugal, par académico interno e editor da Revista Estúdio.

AFILIAÇÃO: Universidade de Lisboa, Faculdade de Belas-Artes, Centro de Investigação e Estudos em Belas-Artes (CIEBA). Largo da Academia Nacional de Belas-Artes, 1249-058, Lisboa, Portugal.

 

Endereço para correspondência

 

RESUMO:

Com o tema geral que orienta a Revista Estúdio, artistas a escreverem sobre outros artistas, este número 15 reuniu 17 artigos. Percebem-se regularidades nos sentidos pesquisados e propostos. Detetam-se intenções metalinguísticas nas intencionalidades criadoras. Observa-se que o assunto que ocupa os criadores se baseia numa autorreferencialidade questionadora: a arte a interrogar-se, e aos seus dispositivos de legitimação, às suas convenções de disseminação. O risco corre no Estúdio, atravessa as paredes, e traça um propósito fundamental, a emergência fora do centro.

Palavras-chave: Estúdio, arte, metalinguagem.

 

ABSTRACT:

With the overall theme that guides 'Estúdio' journal, that invites artists to write about other artists, this issue n. 15 collects 17 articles. Regularities can be found in the researched themes and in their directions. Metalinguistic intentions can be detected in their creative intentions. It is observed that the matters of interest by the creators are based on questioning self-referentiality: art asks us, and questions its legitimacy circuits, its dissemination conventions. The risk lies in the 'Estúdio,' through its walls, and draws a fundamental purpose, an emergency totally off-center.

Keywords: Estúdio, Art, metalanguage.

 

Sempre com o tema geral que orienta esta publicação, artistas a escreverem sobre outros artistas, este número 15 da revista Estúdio reuniu 17 artigos que, no seu conjunto, permitem alguma reflexão. Percebe-se, na textura das obras e dos criadores visitados, regularidades nos sentidos pesquisados e propostos. Deteta-se uma intenção metalinguística nas intencionalidades criadoras. Observa-se que o assunto que ocupa os criadores se baseia numa autorreferencialidade questionadora: a arte interroga o seu próprio tecido, os seus dispositivos de legitimação, as suas convenções de disseminação, os seus cânones. Brian O'Doherty (2002) enunciou o questionamento da ideologia nos espaços de apresentação, trazendo para a discussão um suporte e uma perspetiva teóricas que, de alguma forma, permitiu compreender o enredo de algumas iniciativas conceptuais e pós conceptuais. Por seu lado, Rosalind Krauss (1979) criticou as delimitações dos espaços e dos suportes ao caracterizar o "campo expandido." O alargamento do campo pode também incluir o seu sentido.

Os artigos agora reunidos transportam algumas dessas inquietações, atualizando-as. Percebe-se que os criadores observam o campo da arte com uma intencionalidade atenta e crítica, acrescentando pontuações aos consensos, quebrando-os, não de modo gratuito, mas de modo essencial. Cria-se sentido.

O artigo de Margarida Prieto (Lisboa, Portugal), "Rui Macedo: da sugestão e do seu poder imagético" informa o interesse pelo problema do referente e pela verosimilhança. Através de algumas referências implícitas a autores como Plínio, o velho (Cayo Plinio Segundo, 1998), ou também Jorge Luís Borges (2002), entre outros, em que o espectador é convidado a confirmar a verosimilhança recorrendo às próprias características funcionais do que é representado: para ver cada um dos pássaros representados por Rui Macedo, torna-se necessário chamá-los, reproduzindo o seu canto …

Maria do Carmo de Freitas (Minas Gerais, Brasil), no artigo "O encontro do imaginário no diálogo entre a obra 'Unheimlich' de Walmor Corrêa e a 'Histoire naturelle' de Buffon: uma aproximação entre arte e ciência" coloca a obra gráfica de Walmor Corrêa em contraponto com as singularidades descritas por Buffon, na sua História Natural iluminista: podemos agora apreciar a descrição anatómica e detalhada de uma sereia.

O artigo "Processos de criação na obra de Maya Watanabe," de Sylvia Furtado (Ceará, Brasil) debruça-se sobre a obra da autora multimédia peruana Watanabe. As suas instalações vídeo apropriam-se de trechos sonoros pré-existentes, colocando em confronto identidades e territórios de referências culturais.

Silvina Valesini (La Plata, Argentina) em "Metáforas del cuerpo ausente en las instalaciones de Doris Salcedo" apresenta uma reflexão sobre as instalações de Salcedo (Colômbia), que se referem àquilo que sobra, depois do massacre (o narcotráfico, a violência urbana). As "casas viúvas" implicam também uma reflexão sobre um discurso sobre o género gerado no contexto do crime organizado.

O artigo "Ferran Adrià, a criatividade como discurso (entre gastronomia, arte e design)," de Suzana Parreira (Lisboa, Portugal), lança um olhar sobre o método observado por um grande chef, Adrià, notabilizado no El Bulli, Barcelona. O reconhecimento de Adrià (Documenta 12, em Kassel, por exemplo), motiva a procura das hibridações entre áreas e géneros de criatividade que expandem as atuações artísticas.

Liana Chaves, no artigo "Isa Aderne: uma senhora gravadora," (Paraíba, Brasil), apresenta esta discípula de Goeldi, com uma obra em xilogravura que cedo reflete um posicionamento político, forçando um exílio fora do Brasil. As obras são próximas dos pobres, e mostram sempre a vida.

Em "O social media como veículo da obra de arte total de Ana Pérez-Quiroga," Felipe Aristimuño (Brasil) aborda o corpus de 16.000 imagens, instagram, utilizadas como médium da ação / intervenção da artista, na obra com o título Self-portrait of a female artist as part of society ou ainda o seu projeto Home. As plataformas sociais são suporte para uma reflexão permanente e uma auto-ironia concomitante.

Isabel Sabino (Lisboa, Portugal), no artigo "Grupo Acre, aqui nasceu (e assim finou?)" lança novas perspetivas sobre a intervenção do grupo Acre (Clara Menéres e Lima Carvalho) nas Caldas da Rainha, Portugal, em agosto de 1977, nos IV Encontros Internacionais de Arte. Os acontecimentos e manifestações provocaram alguns desacatos e perseguições, bastante documentados em jornais da época, ao mesmo tempo que a arte contemporânea se desdobrava pela energia potencial do contexto que então se vivia em Portugal.

O artigo "Uma Colagem sobre Portugal: 'o Fado Lusitano'de Abi Feijó" Eliane Gordeeff (Brasil) analisa o filme de animação de Abi Feijó (1995) que utiliza a colagem e o recorte para sintetizar a portugalidade, tomando como marco o mito do sebastianismo e do resgate.

Isabel Albuquerque (Lisboa, Portugal), em "A 'joia dispositivo' na obra de Ana Cardim," apresenta algumas obras de joalharia que transgridem os cânones habituais: cadeados, ovos com objetos desconhecidos, moedas folheadas a ouro mostrando a sujidade do dinheiro, jóias que contrariam a lógica da venda.

O artigo "'It Girl': o problema lolicon no videoclipe de Mr. para Pharrell Williams," de Matilde Diogo de Sousa (Lisboa, Portugal), explora a polémica da aculturação manga, especialmente no que respeita às lolicon, e à sua essencial exploração voyeur associada a todo um imaginário onde a ingenuidade e a inocência estereotipada se tornam signos para a compulsão sexual dissimulada pela omissão.

A capa do presente número da revista Estúdio foi sugerida pela obra de Samuel Castro, abordada por Sara Fuentes (Vigo, Espanha), no artigo "Recursividad, modelos y sistemas en la obra de Samuel Castro." As relações estabelecidas entre objetos e conceitos, numa agilidade que atravessa as escalas, convidam-nos a reconsiderar os centrismos, sejam eles nacionalistas, modernistas, neo-colonialistas, ou ambientais: os homens suportam o seu ambiente, e o ambiente está suspenso deste equilíbrio no mínimo frágil. Para o manter, muitas atividades, representações, operações, e alguns aparelhos inúteis.

Em "A escritura-rasura na obra de Edith Derdyk," de Ângela Castelo Branco (São Paulo, Brasil), revisita a obra desta artista brasileira que já foi objecto da capa das actas do II Congresso internacional CSO (Queiroz, 2011). Os seus desenhos ocupam milhares de quilómetros, estabelecendo relações tensas que interligam superfícies modernistas, no interior do cubo branco (O'Doherty, 2002).

Tatiana Martins (Espírito Santo, Brasil), no artigo "A dialética dos materiais na obra de Regina Rodrigues," debruça-se sobre a obra da ceramista Regina Rodrigues, explorando os vazios e as superfícies topológicas quase homeomórficas mercê de uma combinação entre materiais vitro cerâmicos de execução inovadora.

O artigo "Derivas: um olhar sobre a obra de Marcelo Moscheta," por Joedy Bamonte (São Paulo, Brasil), aborda a itinerância do artista em direção ao norte, na residência "artistic circle", onde a bordo de um barco, se explora a viagem em si mesma e se constroem registos de bordo. Da distância do navio, da heterotopia possibilitada pela viagem artística, importa-se uma nova mundividência feita de desmesura e ausência, numa deriva continuada e tornada método.

Angela Grando (Espírito Santo, Brasil), em "Cildo Meireles: 'como na tradição oral' e além," aborda a intervenção de Cildo Meirelles na Documenta 11, em Kassel, onde os picolés de gelo exibem uma economia do desaparecimento, que se justifica na transação da emoção e no engano do elemento desaparecido.

Em "Hugo Barata: um Compasso no Bolso," Ana Rito (Lisboa, Portugal), faz uma aproximação à "paisagem demorada" de Hugo Barata: de A Natureza das Coisas (Titus Lucrecius) a intuição da materialidade fina da imagem, da sua consumação. A imagem protege ou expõe? Como algo que se projeta, medeia entre dois corpos.

Neste fascículo alargamos as referências descentrando o discurso sobre os artistas, dando a palavra aos artistas. As referências, regularidades observadas indicam-nos um campo em expansão, comprometido no questionamento de suportes, convenções, deslocamentos, derivas, topografias, plataformas de interação e respetivas transgressões. O risco corre no Estúdio, atravessa as paredes, e traça um propósito fundamental, a emergência fora do centro.

 

Referências

Borges, Jorge Luís (2002) "Do Rigor da Ciência." In O Fazedor. Lisboa: Difel. ISBN: 9789722905930        [ Links ]

Cayo Plinio Segundo [Plínio, o Velho] (1998) Historia Natural. Libros III-VI. Madrid. Editorial Gredos. ISBN: 9788424919016        [ Links ]

Krauss, Rosalind (1979) "Sculpture in the Expanded Field." October, 8, pp. 31-44.         [ Links ]

O'Doherty, Brian (2002). No interior do cubo branco: a ideologia do Espaço da Arte. São Paulo: Martins Fontes. ISBN:8533616864         [ Links ]

Queiroz, João Paulo (Ed.) (2011) Quando os criadores apresentam obras de outros criadores: Actas do II Congresso Internacional Criadores Sobre Outras Obras, CSO'2011. Lisboa: Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa & Centro de Investigação e Estudos em Belas-Artes. 679 pp. ISBN: 978-989-8300-14-0 [Consult. 2016-02-17] Disponível em URL: http://cso.fba.ul.pt/atas.htm        [ Links ]

 

Enviado a 12 de janeiro de 2016 e aprovado a 13 de janeiro de 2016

 

Endereço para correspondência

 

Correio eletrónico: joao.queiroz@fba.ul.pt (João Paulo Queiroz)

Creative Commons License Todo o conteúdo deste periódico, exceto onde está identificado, está licenciado sob uma Licença Creative Commons