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Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental

versão impressa ISSN 1647-2160

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental  no.15 Porto jun. 2016

https://doi.org/10.19131/rpesm.0126 

ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO

 

Tradução, adaptação e validação do Childbirth Self-Efficacy Inventory (CBSEI) para o idioma e cultura portuguesa

 

Translation, adaptation and validation of the Childbirth Self-Efficacy Inventory (CBSEI) for the language and Portuguese culture

 

Traducción, adaptación y validación del Childbirth Self-Efficacy Inventory (CBSEI) para la lengua y la cultura portuguesas

 

Ana Paula Prata*, Ana João Neves**, Célia Santos***, & Margarida Reis Santos****

*Mestre em Gestão e Economia da Saúde; Professora Adjunta na Escola Superior de Enfermagem do Porto, Rua Dr. António Bernardino de Almeida, 4200-072 Porto, Portugal. E-mail: prata@esenf.pt

**Mestre em Enfermagem Avançada; Enfermeira no Centro Hospitalar do Porto, 4099-001 Porto, Portugal. E-mail: ajneves@hotmail.com

***Doutora em Psicologia da Saúde; Professora Coordenadora na Escola Superior de Enfermagem do Porto, 4200-072 Porto, Portugal. E-mail: celiasantos@esenf.pt  

****Doutora em Enfermagem; Professora-Coordenadora na Escola Superior de Enfermagem do Porto, 4200-072 Porto, Portugal. E-mail: mrs@esenf.pt  

 

RESUMO

A autoeficácia da mulher para lidar com o trabalho de parto influencia a forma como esta perceciona o trabalho de parto e o parto. Identificar precocemente as grávidas com baixa autoeficácia para lidar com o trabalho de parto, pode ajudar os enfermeiros de saúde materna e obstétrica a programar intervenções de enfermagem que deem uma resposta mais eficaz às necessidades de apoio que estas mulheres possam ter. O Childbirth Self-Efficacy Inventory (CBSEI) permite medir a confiança da mulher nas suas capacidades para lidar com o trabalho de parto e pode constituir-se como uma ferramenta útil para a prática clínica, pelo que, este estudo teve como objetivo traduzir, adaptar culturalmente e validar para português este instrumento. A amostra de conveniência constituiu-se por 525 grávidas, com 28 ou mais semanas de gestação.

Quanto à fiabilidade da escala, os valores de alfa de Cronbach, superiores a 0.89, permitem concluir que esta é fiável para a população portuguesa.

A análise de componentes principais suportou o facto de cada uma das subescalas ter duas dimensões, nomeadas autocontrolo/relaxamento e distração. A forte correlação entre as subescalas nos dois estádios do trabalho de parto e valores de alfa de Cronbach superiores a 0.90 levam, também, a considerar a proposta de vários autores para reduzir de quatro para duas as subescalas do instrumento

Palavras-Chave: Trabalho de parto; Autoeficácia; Estudos de validação

 

ABSTRACT

Women's self-efficacy to cope with childbirth influences their perception of labour and delivery. Early identification of pregnant women with low self-efficacy to cope with labour can help maternal health nurses in the development of interventions that provide a more effective response to the support that these women might demand. The Childbirth Self-Efficacy Inventory (CBSEI) measures the confidence of women in their ability to cope with labour and can be a useful tool for the clinical practice, which justifies the aim of this study: translate, culturally adapt and validate this instrument to the Portuguese population. The convenience sample consisted of 525 pregnant women with 28 or more weeks of pregnancy.

Regarding the scale’s level of reliability, Cronbach's alpha values higher than 0.89 substantiate the conclusion that CBSEI is reliable for this population.

The main component analysis justified each of the subscales having two dimensions, namely self-control/relaxation and distraction. The substantial correlation between the subscales in both periods of labour and Cronbach's alpha values higher than 0.90 permitted also to consider the proposal moved forward by several authors of reducing the questionnaire subscales from four to two.

Keywords: Labor; Self efficacy; Validation studies

 

RESUMEN

La autoeficacia de la mujer para enfrentarse al trabajo de parto influye su percepción del nacimiento. La identificación precoz de mujeres embarazadas con baja auto-eficacia para enfrentar al trabajo de parto, puede ayudar al personal de enfermería obstétrica y salud materna en la programación de intervenciones que ofrecen una respuesta más eficaz a las potenciales necesidades de apoyo a estas mujeres. El Inventario de Autoeficacia en el Parto (CBSEI) mide la confianza de las mujeres en su capacidad para hacer frente al trabajo de parto y puede establecerse como una herramienta útil para la práctica clínica, lo que nos conduce al objetivo de este estudio: traducir, adaptar culturalmente y validar este instrumento para el portugués. La muestra de conveniencia consistió en 525 mujeres embarazadas con 28 o más semanas de gestación.

En cuanto a la fiabilidad de la escala, los valores superiores a un 0,89 en el alfa de Cronbach apoyan la conclusión de que este es fiable para la población portuguesa.

El análisis de componentes principales sostiene el hecho de que cada una de las subescalas tiene dos dimensiones, designadas autocontrol/relajación y distracción. La fuerte correlación entre subescalas en ambos períodos de trabajo y valores de alfa de Cronbach superiores a un 0.90 permite también considerar la propuesta de varios autores de reducción de las subescalas del inventario de cuatro a dos.

Descriptores: Trabajo de parto; Autoeficacia; Estudios de validación

 

Introdução

Desde os anos 80, do século XX, que começaram a surgir os primeiros estudos sobre a confiança da mulher no trabalho de parto. Walker e Erdman (1984) começaram a explorar os níveis de confiança das mulheres durante o parto usando uma escala ordinal de um só item. Mais tarde, Crowe e Von Baeyer (1989) usaram uma escala visual analógica de 10 cm, para medir os níveis de confiança das mulheres grávidas nas suas capacidades para controlar a dor durante o trabalho de parto, concluindo que as primíparas, com maior confiança e mais conhecimento, após as aulas de preparação para o parto, registavam uma experiência de parto menos dolorosa. Apesar destes resultados preliminares sobre a medição da confiança no trabalho de parto, a fiabilidade e a validade destas medições não foram registadas e a discussão de conceitos teóricos relacionados com a confiança também foi limitada.

Em 1983, Manning e Wrigth, estudaram a confiança das mulheres na sua capacidade para controlar a dor de trabalho de parto, sem medicação. Utilizaram uma escala de certeza, de um só item com 12 pontos, administrada durante o trabalho de parto, em intervalos de 5 horas. Os resultados indicaram que a expetativa de autoeficácia contribuía mais para a previsão da persistência no controlo da dor, do que a expetativa de resultado. Contudo, a medição com um só item limitou o rigor psicométrico do instrumento (Ip, Chan & Chien, 2005).

Em 1991, Lowe referiu que a confiança da mulher na sua capacidade para lidar com o trabalho de parto é uma variável importante, pois está relacionada com o medo e com a forma como a mulher perceciona a dor de trabalho de parto. Esta autora usou como instrumento de medida o "McGill Pain Questionnaire", para avaliar e explicar as variações na experiência da dor. Em 1993, tendo por base referencial a teoria da autoeficácia de Albert Bandura, Nancy Lowe desenvolveu o "Childbirth Self-Efficacy Inventory" (CBSEI) para medir a confiança da mulher nas suas capacidades para lidar com o trabalho de parto.

O CBSEI é uma escala de autorrelato, constituída por quatro subescalas. Tem como objetivo medir as expetativas de resultado (i.e. crença de que uma melhor experiência de parto pode resultar da realização de um comportamento específico) e de autoeficácia (crença de que se consegue concretizar com sucesso um determinado comportamento) na fase ativa do trabalho de parto e no período expulsivo (Lowe, 1993).

As duas subescalas, referentes às expetativas de resultado e de autoeficácia na fase ativa do trabalho de parto (AL-OU e AL-SE, respetivamente) têm 15 itens e as subescalas respeitantes às expetativas de resultado (SS-OU) e de autoeficácia (SS-SE) no período expulsivo têm 16 itens. Em cada subescala referente às expetativas de resultado é pedido à mulher que imagine que está em trabalho de parto, que sente contrações uterinas com cinco minutos de intervalo ou menos, e que indique o quão útil (numa escala de 10 pontos, em que 1 corresponde a nada útil e 10 a muito útil) pensa que cada um dos comportamentos descritos a ajuda a lidar com o trabalho de parto. Nas subescalas relativas às expetativas de autoeficácia pede-se à grávida que refira o quanto se considera certa (numa escala de 10 pontos, em que 1 corresponde a nada certa e 10 a completamente certa) de vir a realizar, com sucesso, esses mesmos comportamentos no trabalho de parto.

Cada uma das medições relativas à fase ativa do trabalho de parto proporciona um resultado entre 15 e 150 pontos, enquanto as relacionadas com o período expulsivo, produzem um resultado entre 16 e 160 pontos. Segundo indicação da autora, para facilidade de interpretação e gestão de dados, pode-se simplificar a pontuação de cada subescala, para um número de 1 a 10, dividindo a pontuação da subescala pelo seu número de itens. A pontuação total das expetativas de resultado é calculada somando os resultados das subescalas AL-OU e SS-OU e a pontuação total das expetativas de autoeficácia é efetuada da mesma forma, mas com as subescalas AL-SE e SS-SE. Em ambos os casos, um valor superior indica um nível mais alto de expetativas de autoeficácia ou de resultado no trabalho de parto.

O questionário demonstrou ter validade e fiabilidade para medir a confiança expressa pelas grávidas nos diversos países onde foi aplicado. Tem uma alta consistência interna, sendo este facto transversal aos diversos estudos (i.e. entre 0.86 e 0.95), e uma análise fatorial exploratória sugere que cada subescala do CBSEI é unidimensional (Lowe, 1993), tendo a validade de constructo do instrumento sido determinada quando a autora encontrou uma correlação positiva, estatisticamente significativa, com as variáveis autoeficácia geral, autoestima e locus de controlo interno e uma correlação negativa com o locus de controlo externo (Lowe, 1993; Cunqueiro, Comeche & Docampo, 2009; Carlsson, Ziegert & Nissen, 2014).

O CBSEI foi traduzido e validado em vários países: China, Irão, Espanha, Tailândia, Suécia e Grécia. Em Portugal, não se conhece nenhum estudo sobre a tradução e validação das propriedades psicométricas do CBSEI, pelo que este estudo teve como objetivo traduzir, adaptar culturalmente e validar para a população portuguesa o CBSEI.

 

Metodologia

O estudo metodológico foi efetuado em duas etapas. A primeira etapa correspondeu à tradução e retro tradução do instrumento e à avaliação da validade de conteúdo. Através de um conjunto de procedimentos procurou-se garantir a paridade linguística e cultural do conceito em estudo. A segunda etapa compreendeu a avaliação das propriedades psicométricas. A consistência interna da versão portuguesa do CBSEI foi avaliada com a determinação do coeficiente alfa de Cronbach e a correlação item total para cada subescala. A validade de constructo foi obtida através do uso da análise fatorial exploratória.

 

Etapa 1

Na primeira etapa do estudo, o procedimento de tradução e retro tradução foi efetuado de acordo com o protocolo de Beaton, Bombardier, Guillemin e Ferraz (2000) que prevê o cumprimento de cinco fases: tradução inicial, síntese da tradução, retro tradução, comité de juízes e pré-teste da versão final.

O procedimento iniciou-se, após permissão de Nancy Lowe, com a realização de duas traduções independentes para a língua portuguesa, realizadas por duas tradutoras portuguesas, com domínio da língua inglesa. Uma, com conhecimento prévio do objetivo do estudo e da área da saúde e outra, sem conhecimentos na área da saúde e sobre o objetivo do estudo, de forma a evitar os vieses de linguagem. Uma cuidadosa análise dos textos produzidos foi efetuada pelos investigadores e tradutores de forma a minimizar as possibilidades de erros típicos de tradução, como omissão ou acréscimos de palavras e expressões que mudassem o sentido dos itens. Duas novas tradutoras, sem conhecimentos na área da saúde, do objetivo do estudo e do questionário original efetuaram a retro tradução.

No sentido de se validar o conteúdo da versão portuguesa do CBSEI (Questionário de Autoeficácia no Trabalho de Parto-QAETP) quanto à sua clareza e adequação linguística e cultural, constituiu-se um painel de especialistas, convidando-se cinco peritos na área de saúde materna e obstétrica (enfermeiras especialistas a trabalhar em contexto clínico e académico), com domínio da língua inglesa. Foi solicitado que procedessem à avaliação da escala em relação à sua equivalência semântica, cultural e concetual. Posteriormente foi realizada uma revisão de todas as anotações sendo produzida a versão final. Nenhum item necessitou de ser reestruturado.

A reflexão falada da versão final foi realizada para avaliar se o instrumento era de fácil leitura e compreensão para as grávidas portuguesas. Uma amostra de conveniência de 10 mulheres, no terceiro trimestre de gravidez, a efetuar consulta de obstetrícia numa instituição hospitalar, foi constituída. Convidando-se as participantes a completar o QAETP e a comentar sobre a compreensão de cada item e sobre as dificuldades encontradas. Foi monitorizado o tempo que as grávidas demoraram para responder ao questionário, verificando-se que demorava cerca de 10 minutos a ser preenchido. Não foram encontradas dificuldades que sugerissem alterações à tradução final (Neves, 2010).

 

Etapa 2

A colheita de dados foi efetuada em duas instituições de saúde da região norte de Portugal, no serviço de obstetrícia, entre setembro de 2009 e setembro de 2012. O QAETP foi administrado juntamente com um questionário sociodemográfico, a uma amostra de conveniências, constituída por grávidas com 28 ou mais semanas de gestação. De acordo com os critérios de inclusão, eram convidadas a participar no estudo grávidas com 20 ou mais anos de idade e que soubessem ler e escrever português. Recusaram participar no estudo 31 mulheres, 525 preencheram o questionário obtendo-se uma taxa de resposta de 94%.

A amostra constituiu-se, assim, por 525 participantes, com uma média de idade de 30.5 anos (DP=4.7; min:20, máx:41) e com uma idade gestacional média de 33.3 semanas (DP=4.6; min:28, máx:41). A maioria das grávidas era casada (78.9%), habilitada com o ensino básico (59%), primigesta (64.2%), não tinha experiência anterior de parto (72.2%) e frequentava as sessões de preparação para o parto (60.8%).

Efetuou-se estatística descritiva para descrever as subescalas. A fiabilidade do QAETP foi avaliada através do coeficiente alfa de Cronbach e da correlação item total para cada subescala.

Para avaliar a validade de constructo explorou-se a composição fatorial do QAETP recorrendo-se à análise dos componentes principais (ACP). Como sugerido pela autora original do CBSEI (Lowe, 1993), de forma a evitar o erro sistemático resultante da repetição dos itens para a fase ativa do trabalho de parto e para o período expulsivo, a análise foi efetuada por subescala. A sensibilidade da escala foi medida com recurso à correlação de Spearman, teste usado para explorar as relações entre os valores do QAETP e as variáveis experiência anterior de parto, a preparação para o parto e o grau de escolaridade. Todos os dados foram revistos no que diz respeito a valores em falta e a outliers. Como evidenciado pelos valores de Kolmogorov-Smirnov de p<0.05, verificou-se que a distribuição da amostra não era normal pelo que se efetuaram testes não paramétricos.

O teste Wilcoxon Signed Rank foi usado para investigar se havia diferenças nos valores das expetativas de resultado e de autoeficácia do QAETP entre os dois estádios de trabalho de parto. Um nível de p<0.05 foi considerado estatisticamente significativo.

Os dados foram analisados com recurso ao SPSS para Windows, versão 21.0.

Obteve-se permissão da autora do CBSEI para a utilização do questionário e autorização da comissão de ética das instituições para a realização do estudo. Verbalmente e por escrito, os objetivos e procedimentos do estudo foram explicados às grávidas, tendo sido enfatizado que poderiam abandonar o estudo a qualquer momento, e que isso não afetaria a qualidade dos cuidados que receberiam. Todas as participantes assinaram um documento de consentimento informado. A participação voluntária e o anonimato dos dados foram assegurados.

 

Resultados

Com o objetivo de se avaliarem as caraterísticas métricas da versão portuguesa do CBSEI efetuou-se a análise da sua validade de constructo e confiabilidade.

 

Validade de Constructo

No sentido de se verificar como os itens da escala se organizavam conceptualmente, foi efetuada uma análise dos componentes principais e comparados os resultados com os outros estudos.

Antes de se efetuar a ACP, foi avaliada a adequação dos dados para a análise fatorial. A matriz de correlação de cada subescala revelou que todos os valores de coeficiente encontrados foram iguais ou superiores a 0.30. O valor da medida Kaiser-Meyer-Olkin da adequação da amostra variou entre 0.89 a 0.94 e o teste Bartlett de esfericidade teve significância estatística (p<0.001) para as quatro subescalas. Os resultados suportam a adequação dos dados para a realização da análise fatorial.

Tal como em estudos anteriores (Drummond & Rickwood, 1997; Ip et al., 2005; Khorsandi et al., 2008; Carlsson et al., 2014), foi realizada a ACP com rotação Varimax, com um valor próprio > 1 em cada subescala. Verificou-se a presença de dois fatores nas subescalas AL-OU e AL-SE, com o primeiro fator a explicar respetivamente 44.29 e 57.99% da variância total.

Na subescala SS-OU apuraram-se quatro fatores, não se encontrando explicação nem teórica nem empírica, para a sua presença efetuou-se uma nova análise forçando a três fatores, seguida de um estudo de consistência interna por fator. Não se encontrado valores que permitissem sustentar a presença dos três fatores, realizou-se nova tentativa forçando a ACP a dois fatores. A análise da distribuição dos itens entre os fatores revelou que a maioria se enquadra no fator um, envolvendo o segundo fator seis itens, cada um apresentando um valor de α de Cronbach de 0.91 e 0.78, respetivamente.

Na subescala SS-SE obtiveram-se três fatores, o primeiro com uma variância explicada de 58.64%. Após a análise da consistência interna por fator, verificou-se não existirem valores que sustentassem a sua presença, pelo que se realizou nova pesquisa forçando a dois fatores. A análise da distribuição dos itens entre os fatores revelou que a maioria se enquadra no fator um, envolvendo o segundo fator quatro itens. Cada fator revela uma consistência interna de 0.94 e 0.81. Estes resultados indicam que cada uma das quatro subescalas pode ser interpretada como tendo dois fatores, que explicam entre 54 a 66% da variância (tabela 1). Não se verificando, assim, a organização dimensional da escala proposta tanto pela autora da versão original, como pelos outros investigadores.

 

 

Os conceitos subjacentes aos dois fatores foram interpretados pelas autoras como autocontrolo/relaxamento e distração, de acordo com a particularidade dos itens. Na tabela 2 estão sumarizados os resultados da ACP com rotação Varimax.

 

 

Confiabilidade do QAETP

No sentido de se compreender se a variabilidade nas respostas depende da diferença de opinião das participantes, minimizando a possibilidade de erro aleatório, efetuou-se o cálculo dos coeficientes alfa de Cronbach e correlação item total para avaliar a consistência interna do QAETP. Os resultados deste estudo e dos anteriores são apresentados na tabela 3.

 

 

Consistente com resultados anteriores, os coeficientes alfa de Cronbach para todas as subescalas do QAETP foram iguais ou superiores a 0.89. O alfa de Cronbach para a escala total das expetativas de resultado foi de 0.94 e para a escala total das expetativas de autoeficácia foi de 0.97, pelo que, de acordo com Murphy e Davidsholder (2005) se pode considerar que o QAETP apresenta uma elevada fiabilidade. Os valores de correlação item total foram superiores a 0.40 para todos os itens. Verificou-se que cinco itens, dois da subescala AL-SE (19 e 22) e três da subescala SS-SE (50, 53 e 60) apresentaram valores de correlação item total superiores a 0.80.

A estabilidade temporal do instrumento não foi avaliada dado se considerar que se trata de um instrumento que pretende avaliar constructos com características dinâmicas.

 

Resultados da Análise Descritiva das Subescalas do QAETP

Na tabela 4 estão representados os resultados da análise descritiva e a sua comparação com os estudos anteriores. As médias indicam que as participantes do estudo apresentam um alto nível de expetativas de resultado e de eficácia ao longo do processo de parto. Verificando-se, também, que os valores médios das expetativas de resultado são superiores aos das expetativas de autoeficácia.

 

 

O teste Wilcoxon Signed Rank foi realizado para se verificar se existiam diferenças significativas entre as expetativas de resultado e de autoeficácia no trabalho de parto. Verificou-se existir uma diferença estatisticamente significativa entre as expetativas de resultado e de autoeficácia tanto na fase ativa do trabalho de parto (AL-OU e AL-SE, z= -16.62, p<0.001) como no período expulsivo (SS-OU e SS-SE, z= -15.52, p<0.001), com as expetativas de resultado a terem um valor de média superior nos dois períodos do trabalho de parto.

Para se averiguar se, entre as expetativas de resultado e de autoeficácia nas duas fases do trabalho de parto existiam diferenças, realizou-se novamente o teste de Wilcoxon. Confirmou-se haver uma diferença estatisticamente significativa entre as expetativas de resultado, na fase ativa e no período expulsivo (AL-OU e SS-OU, z=9.79, p<0.001), sendo a média superior no segundo período de trabalho de parto e entre as expetativas de autoeficácia na fase ativa e no período expulsivo (AL-SE e SS-SE, z=9.40, p<0.001), também com um valor de média superior no período expulsivo.

Com recurso ao teste de correlação de Spearman investigou-se a relação entre as expetativas de resultado e de autoeficácia no trabalho de parto. Constatou-se existir uma correlação positiva, moderada (Dancey & Reidy, 2006) e estatisticamente significativa entre as expetativas de resultado e as expetativas de autoeficácia (r=0.56, p<0.001, n=525) no trabalho de parto. Por subescala, verificou-se haver uma correlação positiva, forte e significativa entre as expetativas de resultado na fase ativa do trabalho de parto e no período expulsivo, assim como, entre as expetativas de autoeficácia na fase ativa do trabalho de parto e no período expulsivo (tabela 5).

 

 

No sentido de se averiguar a relação entre as variáveis sociodemográficas e o QAETP, efetuou-se uma análise estatística inferencial. Não se verificaram diferenças estatisticamente significativas entre o grau de escolaridade e a experiência de parto e as expetativas de resultado, e a frequência de sessões de preparação para o parto e as expetativas de resultado e de autoeficácia.

Verificou-se haver uma diferença estatisticamente significativa entre as expetativas de autoeficácia e o grau de escolaridade (Kruskal-Wallis=7.01, p<0.05), sendo as mulheres com o ensino básico que apresentam maior expetativa de autoeficácia do que as mulheres habilitadas com o ensino secundário ou com o ensino superior.

O resultado obtido através do teste de Mann-Whitney mostrou que há, também, uma diferença muito significativa entre as participantes com e sem experiência de parto e as expetativas de autoeficácia, observando-se que são as mulheres com experiência anterior de parto que apresentam um mais elevado nível de expetativa de autoeficácia (Teste Mann-Whitney=32,410,5, p<0.01).

 

Discussão

Com este estudo pretendeu-se traduzir e adaptar culturalmente o CBSEI para português e analisar as suas propriedades psicométricas.

No que diz respeito à validade de constructo, a análise fatorial efetuada sugeriu a existência de dois a quatro fatores dependendo da subescala, não se confirmando o caráter unidimensional da escala, como sugerido por Lowe (1993). Visto não se encontrar explicação teórica para o facto, efetuou-se uma nova tentativa forçando a três fatores, como proposto por Carlsson e col. (2014) e Gourounti e col. (2015), não se certificando a existência dos mesmos, pelo que se realizou nova análise forçando a dois fatores. Os dois fatores confirmados pela análise fatorial apresentam explicação teórica e duas estruturas com itens que apresentam uma carga fatorial superior a 0.40. De acordo com o proposto por Carlsson e col. (2014), as dimensões encontradas foram nomeadas como autocontrolo/relaxamento e distração. Na análise da correlação item-total, tal como no estudo de Gourounti e col. (2015), observou-se que alguns itens apresentavam valores superiores a 0.40 em mais do que um fator, indicando que partilham as duas dimensões e cinco itens tinham valores superiores a 0.80, sugerindo os autores que estes resultados podem assinalar que alguns itens poderiam ser eliminados, pois estão a medir o mesmo que os outros. No entanto, optou-se por não os retirar visto se verificar que isso não alterava o valor do alfa de Cronbach das subescalas correspondentes. Desta forma, considera-se que cada subescala do QAETP tem duas dimensões.

Quanto às subescalas, os resultados levam a considerar que a proposta de Ip e col. (2005) e de Carlsson e col. (2014) de reduzir o seu número deve ser tida em conta pois, tal como nos seus estudos, averiguou-se que há uma forte correlação entre as subescalas nos dois períodos do trabalho de parto e valores de alfa de Cronbach superiores a 0.90 em três delas, o que pode corroborar as propostas dos autores, do QAETP incluir unicamente duas subescalas, uma para avaliar as expetativas de resultado e outra para avaliar as expetativas de autoeficácia ao longo do processo de parto, sem descriminar os estádios.

Quanto à confiabilidade da escala, os valores de alfa de Cronbach, superiores a 0.89, permitem concluir que esta é fiável para a população portuguesa, pois apresenta uma elevada consistência interna, sendo os resultados do estudo similares aos encontrados pelos autores das versões anteriores.

A análise descritiva realizada no presente estudo permitiu verificar que as médias relacionadas com as expetativas de resultado e de autoeficácia ao longo do processo de parto têm um padrão similar ao dos estudos anteriores que utilizaram o mesmo instrumento (Lowe, 1993; Drummond & Rickwood, 1997; Sinclair & O’Boyle, 1999; Ip et al., 2005; Khorsandi et al., 2008; Cunqueiro et al., 2009; Tanglakmankhong et al., 2011; Carlsson et al., 2014; Gourounti et al., 2015), indicando que as participantes apresentavam um alto nível de autoeficácia no trabalho de parto. Os valores médios e de desvio padrão das subescalas estão de acordo com os valores reportados por Lowe (1993) e Gourounti e col. (2015) e são superiores aos encontrados por Drummond e Rickwood (1997), Sinclair e O’Boyle (1999), Ip e col. (2005), Khorsandi e col. (2008), Cunqueiro e col. (2009), Tanglakmankhong e col. (2011) e Carlsson e col. (2014), o que pode ser explicado, tal como mencionado por Gourounti e col. (2015), pelo facto da maioria das grávidas estarem a frequentar sessões de preparação para o parto, que tendo como objetivo preparar a grávida para o trabalho de parto, fornecem informação sobre o processo de parto e sobre estratégias para lidar com a dor de trabalho de parto podendo contribuir para o aumento da sua autoeficácia.

Concluiu-se, tal como nos estudos anteriores, que as expetativas de resultado apresentavam valores médios superiores aos das expetativas de autoeficácia nos dois períodos do trabalho de parto, sendo essa diferença muito significativa tanto na fase ativa do trabalho de parto como no período expulsivo. Estes resultados revelam que as grávidas foram capazes de distinguir entre os comportamentos que consideram ser úteis para lidar com o trabalho de parto (expetativas de resultado) e os que acreditam ter capacidade para utilizar (expetativas de autoeficácia). Apurou-se, ainda, haver uma correlação positiva, moderada e significativa entre as expetativas de resultado e de autoeficácia, indicando os resultados que as subescalas do questionário justificam a sua presença per si, pelo que devem ser mantidas.

No que diz respeito às variáveis experiência anterior de parto, preparação para o parto e grau de escolaridade e a sua relação com a autoeficácia no trabalho de parto, os resultados relacionados com a experiência anterior de parto confirmam a teoria de Albert Bandura (1997), de que esta é um forte determinante de autoeficácia. No entanto, tal como em estudos anteriores (Lowe, 1991; Drummond & Rickwood, 1997 e Ip et al., 2005) não se confirmou que são as mulheres que frequentam a preparação para o parto e com um maior nível de escolaridade as que apresentam um mais alto nível de autoeficácia.

 

Conclusão

Os resultados obtidos permitem afirmar que a versão portuguesa do CBSEI revelou ser um instrumento válido e fiável para avaliar a autoeficácia no trabalho de parto. Pode constituir-se como uma ferramenta útil para a prática clínica, pois pode possibilitar não só identificar precocemente as grávidas com baixa autoeficácia para lidar com o trabalho de parto, como também, ajudar os enfermeiros de saúde materna e obstétrica a programar intervenções de enfermagem que deem uma resposta mais eficaz às necessidades de apoio que estas mulheres possam ter.

Recomenda-se a realização de futuros estudos que explorem a validade preditiva do QAETP e a validade da versão reduzida. Seria, também importante efetuar investigação longitudinal que avaliasse as mudanças na autoeficácia antes e após os programas de preparação para o parto, visto se considerar que este é um instrumento útil para medir essa evolução.

 

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Recebido a 30 de setembro de 2015

Aceite para publicação a 30 de março de 2016

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