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Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental

versão impressa ISSN 1647-2160

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental  no.14 Porto dez. 2015

https://doi.org/10.19131/rpesm.0105 

ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO

 

Validação da Escala de Stress Profissional em Enfermeiros*

 

Validation of Job Stress Scale for Nurses*

 

Validación de la Escala de Estrés Profesional en Enfermeros*

 

Maria da Conceição Rainho**, Graça Pimenta***, Maria Cristina Antunes****, & Maria João Monteiro*****

**Doutora em Ciências de Enfermagem; Docente na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Escola Superior de Enfermagem, Lugar do Tojal, 5000-232, Lordelo – Vila Real, Portugal. E-mail: crainho@utad.pt

***Doutora em Ciências de Enfermagem; Docente na Escola Superior de Enfermagem do Porto, 4200-072 Porto, Portugal. E-mail: gpimenta@esenf.pt

****Doutora em Psicologia; Docente na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Escola Superior de Enfermagem, 5000-232, Lordelo – Vila Real, Portugal. E-mail: mantunes@utad.pt

*****Doutora em Ciências Sociais e Humanas; Docente na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Escola Superior de Enfermagem, 5000-232, Lordelo – Vila Real, Portugal. E-mail: mjmonteiro@utad.pt

 

RESUMO

CONTEXTO: As alterações a diferentes níveis, tecnológicas, científicas, económicas e organizacionais, que se estão a verificar, têm impacto na gestão das organizações, especificamente na gestão de recursos humanos, o que frequentemente se repercute na saúde dos trabalhadores.

OBJETIVOS: Com este estudo pretende-se analisar a consistência interna da Escala de Stress Profissional em Enfermeiros e verificar a sua validade através da análise fatorial confirmatória, e validar o modelo de quatro fatores proposto por Garrosa, Moreno-Jiménez, Liang e González (2008), isto é, analisar o ajustamento dos dados através da modelação de equações estruturais (Anderson & Gerbing, 1988).

METODOLOGIA: A Escala de Stress Profissional em Enfermeiros é constituída por quatro dimensões e por 16 itens, respondidos através de uma escala tipo Likert de quatro pontos, variando entre 1 "Discordo totalmente" e 4 "Concordo totalmente", a pontuação mais elevada corresponde à intensidade de concordância mais elevada com a dimensão em análise. Os participantes foram enfermeiros a desempenhar funções em instituições de saúde sedeadas na região norte do país.

RESULTADOS: O modelo para uma solução fatorial de quatro dimensões (sobrecarga, interação conflituosa, ambiguidade de papel e contato com a morte e dor), da escala em análise, revelou-se o mais adequado, dado que os índices mostraram bom ajustamento.

CONCLUSÕES: A Escala de Stress Profissional em Enfermeiros é fidedigna e válida para recolher informação relativa a stress profissional em enfermeiros. A aplicação deste instrumento disponibilizará informação fidedigna, potenciando nas organizações a definição de estratégias de promoção de ambientes de trabalho saudáveis.

Palavras-Chave: Stress; Questionário; Enfermagem

 

ABSTRACT

CONTEXT: The changes at different levels, technological, scientific, economic and organizational that they are taking place, have an impact on management of organizations, specifically in the management of human resources, which often has an impact on workers' health.

OBJECTIVES: This study aims to analyze the internal consistency of Job Stress Scale for Nurses, to check its validity through confirmatory factor analysis, and to validate the model of four factors proposed by Garrosa, Moreno-Jiménez, Liang and González (2008) through structural equation modeling (Anderson & Gerbing, 1988).

METHODOLOGY: The validation of Job Stress Scale for Nurses consistsof four dimensions and 16 items, answered through a Likert scale of four points, ranging from 1 "strongly disagree" to 4 "totally agree"; the highest score corresponds to higher intensity of agreement, in each dimension. The participants were nurses performing functions in health institutions in the northern region of the country.

RESULTS: The factorial model solution of four dimensions (overload, conflict interaction, role ambiguity and contact with death and pain), proved to be the most appropriate, as showed by the Global Fit Indices of adjustment

CONCLUSIONS: The scale is reliable and valid to collect information on job stress in nurses. The application of this instrument will provide reliable information in organizations fostering the adoption of strategies to promote a healthy working environment for nurses.

Keywords: Stress; Questionnaire; Nursing

 

RESUMEN

CONTEXTO: Los cambios tecnológicos, científicos, económicos y organizativos que están tomando lugar, tienen un impacto en la gestión de las organizaciones, especialmente en la gestión de los recursos humanos que frecuentemente tiene influencia en la salud de los trabajadores.

OBJETIVOS: el objetivo es analizar la consistencia interna de la Escala de Estrés profesional para enfermería, comprobar su validez a través del análisis factorial confirmatorio, y validar el modelo de cuatro factores propuestos por Garrosa, Moreno-Jiménez, Liang y González (2008) a través de los modelos de ecuaciones estructurales(Anderson & Gerbing, 1988).

METODOLOGÍA: La escala de estrés profesional en enfermeros, consta de cuatro dimensiones y 16 ítems, contestados mediante una escala Likert de cuatro puntos, que van desde 1 "totalmente en desacuerdo" y 4 " totalmente de acuerdo", puntuación alta corresponde a una intensidad de acuerdo más alta. Los participantes fueran enfermeros a trabajar en instituciones de salud con sede en la región norte del país.

RESULTADOS: El modelo para una solución factorial de cuatro dimensiones (sobrecarga, interacción conflictiva, ambigüedad de rol y de contacto con la muerte y el dolor), resultó ser lo más adecuado, ya que los índices mostraron buen ajuste.

CONCLUSIONES: La escala es fiable y válida para recoger información sobre estrés profesional en enfermeros. La aplicación de este instrumento proporciona información fiable a las organizaciones, en el sentido de adopción de estrategias de promoción de entornos de trabajo saludables.

Palabras Clave: Estrés; Cuestionario; Enfermería

 

Introdução

No desempenho das suas funções, o enfermeiro está exposto a fatores que podem contribuir para o bem-estar ou para o stress no trabalho. O bem-estar relaciona-se com a perceção de se sentir útil e ser reconhecido socialmente. O stress envolve questões organizacionais, como a sobrecarga de trabalho, as dificuldades no processo de comunicação com os utentes e colegas, que podem gerar situações de conflitualidade, a convivência com o sofrimento e a morte, e ainda, as questões relacionadas com a ambiguidade de papel com reflexos na falta de autonomia.

Antes de se analisarem alguns dos fatores de stress específicos do trabalho dos enfermeiros, consideramos necessário clarificar o conceito de fator de stress - situação ou acontecimento indutor de experiências de stress. Os fatores de stress profissional em enfermagem, de acordo com Cocco, Gatti, De Mendonça, Lima e Camus (2003), podem agrupar-se em pessoais e relacionados com o contexto de trabalho, que incluem: i) sobrecarga e muitas horas de trabalho e a pressão do tempo; ii) cuidar e tratar especialmente de pessoas com dor, sofrimento e morte, a pressão de ser exposto a diferentes riscos, cometer erros, elevada exigência e responsabilidade; iii) falta de autonomia, ambiguidade de papel e a falta de apoio de superiores e colegas; iv) falta de confiança, respeito e consideração entre os membros da equipa que potenciam um clima negativo e conflito, podendo induzir comunicação ineficiente, causando distorção e demora na divulgação dos fluxos de informação; falta de recursos, tanto humanos como materiais e os baixos salários que podem originar elevada perceção de iniquidade (Montanholi, Tavares & Oliveira, 2006).

A sobrecarga, a diversidade de tarefas e a falta de coerência com a prática, são aspetos de primordial importância quando se pretende avaliar e identificar os fatores stressores relacionados com o contexto de trabalho (Meneghini, Paz & Lautert, 2011). A sobrecarga, em termos quantitativos e qualitativos, ocorre quando as exigências excedem as capacidades de desempenho do indivíduo, por falta de tempo, infraestruturas e na organização do trabalho. Na profissão de enfermagem observa-se, por vezes, um trabalho normalizado e rotinizado, com divisão de atividades, organização de horários por turnos, com elevada rotatividade exigida pelos serviços, verificando-se frequentemente uma elevada carga de trabalho num curto espaço de tempo, o que pode causar sobrecarga laboral (Ferreira & Ferreira, 2014). Não é pouco comum a conjugação destes fatores, podendo levar ao abandono da profissão, problema preocupante e que se observa atualmente em alguns países (Jourdain & Chênevert, 2010). Também a atribuição de tarefas muito simples, rotineiras e aborrecidas, em confronto com as competências de que são detentores, associam-se a stress profissional.

Cuidar pessoas, significa para o profissional um duplo desafio, um compromisso pessoal que, por vezes, de forma insidiosa, vai afetando as suas próprias emoções e necessidades, pela reciprocidade dos papéis vivenciados na relação terapêutica: dar e receber, aceitar e ser aceite, ser entendido e entender o outro. Reforça Queirós (2005) que a aceitação começa pela capacidade de escutar e colocar-se no lugar do outro e que a responsabilidade por pessoas é geradora de mais stress do que a responsabilidade por coisas e objetos. No contexto do exercício profissional inscrevem-se relações interpessoais com o utente, os colegas, os superiores hierárquicos e os subordinados. Quando predominam relações de confiança e direcionadas para a qualidade do trabalho, promove-se o apoio e suporte social, benéficas para a saúde, permitindo lidar de maneira mais eficaz com o stress profissional. Pelo contrário, relações baseadas na desconfiança ou na competição, frequentemente geram reações e situações de conflitualidade.

No desempenho de algumas profissões, é necessário maior controlo emocional, e cuidar de utentes em estado grave tem subjacente a (com)partilha de dor, sofrimento, angústia e, simultaneamente, uma atitude contida. No caso particular dos enfermeiros, cuja profissão implica interação com utentes sujeitos a níveis de stress mais elevados decorrentes da vivência dos processos de saúde e doença, o desempenho profissional é caracterizado por contacto com dor, sofrimento e morte, condições desfavoráveis de trabalho e, por vezes, baixo reconhecimento profissional (Borges, Argolo & Baker, 2006).

A ambiguidade de papel, considerada um dos fatores de stress que ocorre quando existe uma insuficiente delimitação de papéis entre os diversos profissionais, por parte das organizações (Maslach, Schaufeli, & Leiter 2001), manifesta-se de diferentes formas e frequentemente conduz a problemas e dificuldades entre pessoas que interagem com papéis complementares. Segundo Serrano (2008), a falta de complementaridade entre equipas poderá levar a algum constrangimento na tomada de decisão, podendo ter consequências quer para os profissionais, quer para o utente, quer para a organização.

O estudo dos fatores de stress relacionados com o contexto de trabalho dos enfermeiros apresenta-se como relevante no que concerne à prevenção de riscos laborais e à possibilidade de intervenção nas condições de trabalho. A saúde dos enfermeiros é uma condição indispensável para o desenvolvimento pleno das suas potencialidades profissionais. Uma das formas de promover e manter a saúde deste grupo profissional é evitar ou minimizar a sua exposição a fatores de stress profissional, que interfiram no desempenho profissional. Concordamos com a Ordem dos Enfermeiros (2002, p. 8) quando afirma que "a saúde é o reflexo de um processo dinâmico e contínuo; toda a pessoa deseja atingir o estado de equilíbrio, que se traduz no controlo do sofrimento, no bem-estar físico e no conforto emocional, espiritual e cultural". Também "toda a pessoa interage com o ambiente: modifica-o e sofre a influência dele durante todo o processo de procura incessante do equilíbrio e da harmonia" (Ordem dos Enfermeiros, 2002, p. 9).

O interesse pelo estudo das condições de trabalho dos enfermeiros conduziu à validação da Escala de Stress Profissional em Enfermeiros (ESPE), que integra a versão reduzida do Questionário de Desgaste Profissional em Enfermeiros, (QDPE).

Com este estudo pretende-se analisar a consistência interna da Escala de Stress Profissional em Enfermeiros (ESPE), verificar a sua validade através da análise fatorial confirmatória, e validar o modelo de quatro fatores proposto por Garrosa, Moreno-Jiménez, Liang e González (2008), isto é, analisar o ajustamento dos dados através da modelação de equações estruturais (Anderson & Gerbing, 1988).

 

Metodologia

Participantes e Procedimentos

O estudo foi desenvolvido em diferentes instituições de saúde sedeadas na Administração Regional de Saúde do Norte (ARSN), IP, que previamente autorizaram a recolha de dados e o projeto foi aprovado pela Comissão de Ética de uma das instituições que integra a referida Administração.

Dado que não foi disponibilizada a lista atualizada dos enfermeiros que desempenhavam funções nas instituições de saúde selecionadas para o estudo, foi constituída uma amostra não probabilística, tomando-se como referência o número de enfermeiros em Portugal em 2008 (53.157) (Direção-Geral da Saúde, 2008) e considerámos que trabalhariam 17.468 enfermeiros na ARSN, IP, que constituiu a população alvo para o cálculo do tamanho da amostra, assumindo um erro amostral de 3% e um nível de confiança de 95%. Dos 1.500 questionários distribuídos, foram considerados válidos 1033, constituindo a amostra de enfermeiros no presente estudo.

Na investigação, os participantes desempenham um papel fundamental, pois tomam decisões relativamente à sua participação. Previamente foi disponibilizada informação sobre o estudo e objetivos do mesmo e garantida a participação voluntária. Segundo Fortin, Prud’Homme-Brisson e Coutu-Wakulczyk (2003), quando se pretende que as pessoas participem numa investigação, é necessário proteger a sua identidade, logo neste estudo recomendou-se que no questionário não deveriam identificar-se. Também foram adotados procedimentos para assegurar a confidencialidade da informação disponibilizada, pelo que os questionários foram distribuídos a cada enfermeiro dentro de um envelope que, após o preenchimento, era selado pelo próprio.

Na apresentação de resultados não se identificam as instituições em análise, no sentido de respeitar o compromisso com os participantes na investigação e com as instituições.

 

Instrumento

O QDPE de Moreno-Jiménez, Garrosa e Gutiérrez (2000) foi traduzido e adaptado para português por Rainho, Queirós, Soares e Monteiro (2006), é um instrumento válido e confiável, necessitando de mais estudos para a confirmação da bondade do instrumento. Neste estudo foi utlizada a versão reduzida da ESEP integrada no QDPE de Garrosa et al. (2008).

A ESPE é constituída por 16 itens, respondidos através de uma escala tipo Likert de 4 pontos, variando entre 1 "Discordo totalmente" e 4 "Concordo totalmente". De acordo com a metodologia proposta pelos autores, após inversão da pontuação do item 2, as pontuações totais das dimensões obtêm-se através da média ponderada dos valores atribuídos pelos participantes aos itens, sendo que pontuações mais elevadas indicam maior intensidade dos fatores de stress profissional.

Segundo Garrosa et al. (2008), a Escala de Stress Profissional em Enfermeiros, integra as seguintes dimensões:

·    Sobrecarga (4 itens): corresponde ao excesso de carga de trabalho, quer em termos quantitativos quer qualitativos, dependendo da exigência, do tempo e dos recursos necessários e disponíveis para desenvolver as atividades;

·    Interação conflituosa (4 itens): refere-se a problemas na interação com os médicos, utentes e familiares;

·    Contacto com a morte e dor (4 itens): está relacionado com o grau em que os enfermeiros são afetados pelo contacto com os utentes que estão em sofrimento, fase terminal, ou que morrem;

·    Ambiguidade de papel (4 itens): diz respeito à clareza da informação que os enfermeiros recebem sobre o seu trabalho e o papel organizacional.

 

Análise Estatística

A validade dos instrumentos utilizados é fundamental para a precisão e validade dos resultados numa investigação. A consistência interna avalia a fidedignidade com que um determinado conjunto de itens estima uma dimensão. Para determinar o coeficiente de consistência interna das dimensões da ESPE, utilizou-se o coeficiente de alfa de Cronbach, em que os valores podem variar entre 0 e 1, considerando-se que valores superiores a 0,6, são fidedignos, conforme Malhotra (2001).

Na análise do ajustamento da ESPE, iremos verificar se as quatro dimensões se ajustam aos dados obtidos a partir da amostra de enfermeiros que participaram no estudo. Neste sentido, optámos pela AFC, pois dispomos de informação prévia da estrutura fatorial, relatada na literatura pelos autores, o que permitiu a definição das variáveis a inserir no modelo.

Na AFC foram utilizados como índices de qualidade de ajustamento: CFI (Comparative Fit Index) GFI (Goodness of Fit Index) e AGFI (Adjusted Goodness of Fit Index), cujos valores devem ser superiores a 0,9; o c2/gl<5,0 e (Root Mean Square Error of Approximation) RMSEA <0,08.

Utilizaram-se os programas estatísticos AMOS 16.0 e SPSS 16.0. para o tratamento dos dados e análise dos resultados.

 

Resultados

No estudo participaram 1033 enfermeiros e a maioria era do sexo feminino (83,3%, n=860) com uma média de idades de 37,8 (dp=9,35) anos, sendo superior no sexo masculino (38,8; dp=9,12), a diferença não foi significativa. A maioria (86,4%) informou ter uma relação com um parceiro habitual e ter filhos (67,5%) e era detentora do grau académico de licenciatura (91,1%).

Quanto às características de natureza socioprofissional, a maioria dos enfermeiros (85,4%) trabalhava num hospital e para a totalidade da amostra a média de anos de serviço na profissão de enfermagem era de 14,4 (dp=9,2) anos, trabalhavam em média 36,4 (dp=4,0) horas por semana e com predomínio do horário por turnos (69,5%) há 12,2 anos (dp=8,6). Quanto à situação laboral, a maioria (73,1%) referiu ser detentora de contrato por tempo indeterminado. Em relação ao tempo da jornada diária em interação com o utente, 83,3% dos enfermeiros refere que é igual ou superior a 40 por cento, sendo de salientar que destes, 31,4% assumiu um tempo de interação com o utente superior a 80 por cento e atendiam em média, 14,7 (dp=13,3) utentes por dia.

Para analisar as propriedades psicométricas da ESPE, realizou-se um estudo com uma amostra considerada grande (n=1033).

Na tabela 1 apresentam-se os valores dos coeficientes de alpha de Cronbach de cada uma das dimensões da ESPE relativos a este estudo e os de um estudo desenvolvido pelos autores.

 

 

Os valores de consistência interna das dimensões que integram a ESPE variam de α=0,84 para sobrecarga a α=0,64 para contacto com a morte e dor. Os resultados mostram que a escala em estudo apresenta valores moderados de consistência interna.

Verificados os pressupostos de normalidade, apresentam-se seguidamente os resultados da AFC da ESPE. Na tabela 2 podem observar-se os valores dos índices de qualidade de ajustamento.

 

 

Os valores dos índices (tabela 2) indicam bom ajustamento, dado que o qui-quadrado por graus de liberdade (c2/gl) foi inferior a 5, os valores dos índices de bondade de ajustamento GFI (0,96) e AGFI (0,95) foram superiores a 0,90. Os outros indicadores de qualidade de ajustamento do modelo são o SRMR (0,030) e RMSEA (0,043) com p(rmsea)= 0,974, valores que confirmam  bom ajustamento do modelo.

Da AFC da ESPE resultou um modelo de quatro dimensões (sobrecarga, interação conflituosa, ambiguidade de papel e contato com a morte e dor), com quatro itens cada, confirmando o modelo teórico proposto pelos seus autores. 

Na figura 1 apresenta-se o diagrama de caminhos do modelo de medida e os pesos fatoriais entre os itens e a respetiva dimensão, bem como as correlações entre as quatro dimensões da ESPE.

 

 

A validade fatorial é avaliada pelos pesos fatoriais padronizados (li). Segundo Marôco (2010), assume-se que se os itens apresentarem pesos fatoriais elevados (l≥0,50) a dimensão em análise apresenta validade fatorial. O modelo de medida da ESPE, com dezasseis itens (variáveis observadas) e quatro dimensões (fatores) correlacionadas, apresenta valores positivos de (l) superiores ao valor de referência (l≥0,5), exceto os itens 2, 4 e 16, que apresentam um valor inferior ao de referência, respetivamente l=0,46, l=0,35, l=0,43. No entanto, a saturação destes itens com a respetiva dimensão apresenta um valor superior a 0,30, justificando a sua permanência no modelo (Byrne, 2006).

A relação com as respetivas dimensões mostrou-se estatisticamente significativa para todos os itens, o que pode ser constatado por estimativas de erro-padrão baixas, evidenciadas pelos parâmetros estimados (tabela 3).

 

 

Na observação das cargas fatoriais padronizadas verifica-se carga aceitável na relação entre cada item e respetiva dimensão, podendo afirmar-se que os itens ou variáveis observadas medem a variável latente (dimensão), dado que todas as cargas fatoriais mostraram significância estatística, foi estabelecida a validade convergente. A validade convergente diz respeito à magnitude com que a variável não observada (dimensão) se correlaciona com os itens que a avaliam, ou seja, se as variáveis observadas selecionadas para integrar a dimensão, estatisticamente convergem.

 

Discussão

Neste estudo, conduzido junto de uma amostra de 1033 enfermeiros  portugueses, validou-se a ESPE, integrada na versão proposta por Garrosa et al. (2008) e estudou-se a sua fiabilidade e validade fatorial.

A ESPE mostrou uma boa consistência interna com valores  alpha de Cronbach compreendidos entre 0,84 (sobrecarga) e 0,64 (contacto com morte e dor).

Na AFC verificou-se um nível de ajustamento bom ao modelo de quatro dimensões (sobrecarga, interação conflituosa, ambiguidade de papel e contato com a morte e dor) confirmando-se a validade da estrutura de quatro dimensões.

As correlações entre as dimensões que integram a escala em análise são significativas e positivas, cujos valores se mostraram baixos a moderados, indicando que são dimensões relacionadas, mas não sobreponíveis (covariância relativamente baixa), argumentando também a favor da validade de construto.

Apesar da complexidade e subjetividade das dimensões que se pretendem medir, pelos resultados obtidos após análise do modelo, podemos afirmar, no que se refere à ESPE, que estamos em presença de um modelo com bom ajustamento aos dados da amostra em estudo, logo é um instrumento fidedigno e válido para recolher informação relativa às quatro dimensões de stress profissional. em enfermeiros. Dadas as características desta profissão, é importante que para a monitorização e avaliação do stress profissional em contexto de seja utilizado um instrumento específico, fidedigno e válido.

 

Conclusões

Face à singularidade e individualidade da profissão de enfermagem, este instrumento, após os procedimentos estatísticos para a análise de fiabilidade e validade, disponibiliza informação válida sobre as situações de stress profissional vivenciadas pelos enfermeiros no contexto de trabalho. A sua aplicação permite a monitorização de dimensões de stress profissional em enfermeiros disponibilizando informação fidedigna, potenciando a definição de estratégias organizacionais que protejam e promovam a saúde dos enfermeiros no contexto de trabalho e subsequente segurança e qualidade dos cuidados de enfermagem. Neste sentido a aplicação deste instrumento potencia um maior compromisso por parte das organizações na promoção de ambientes de trabalho saudáveis, reduzindo a exposição a situações de stress que caracterizam o quotidiano dos enfermeiros.

 

Referências Bibliográficas

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Agradecimentos

Expressamos um particular agradecimento aos Professores Titulares Bernardo Moreno Jiménez e Eva Garrosa Hernández do Departamento de Psicología Biológica y de la Salud de la Universidad Autónoma de Madrid, autores do instrumento original, pela sua disponibilidade no ato de permitirem a validação em Portugal. Relevamos ainda os contributos para a investigação que temos vindo a desenvolver no âmbito dos riscos psicossociais no contexto de trabalho dos enfermeiros.

 

Recebido a 20 de Fevereiro de 2015

Aceite para publicação a 30 de Outubro de 2015

 

*O artigo foi extraído de Tese de Doutoramento em Ciências de Enfermagem intitulada "Síndrome de Burnout em Enfermeiros", apresentada ao Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto em 2014.

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