SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
 número12O doente com esquizofrenia e com filhos índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental

versão impressa ISSN 1647-2160

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental  no.12 Porto dez. 2014

 

EDITORIAL

 

Comunicação terapêutica em saúde mental

 

Carlos Sequeira*

*Doutor em Ciências de Enfermagem; Presidente d’ A Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental; Diretor da Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental; Professor Coordenador na Escola Superior de Enfermagem do Porto, Rua Dr. António Bernardino de Almeida, 4200-072 Porto, Portugal. E-mail: carlossequeira@esenf.pt

 

A comunicação é importante em qualquer contexto de saúde, no entanto, em saúde mental, assume uma importância acrescida quer pela natureza dos problemas, quer pelo potencial de impacte que tem.

No campo da comunicação proliferam vários léxicos, por vezes, com semânticas similares. Por isso, encontramos termos como: comunicação, comunicação interpessoal, relacionamento interpessoal, comunicação em saúde, relacionamento terapêutico, comunicação clinica, comunicação terapêutica, (...), pelo que procuraremos fornecer alguns contributos para a clarificação dos conceitos e salientar a sua importância quer ao nível do rigor diagnóstico, quer ao nível da efetividade da clinica.

A comunicação assume um papel fundamental na relação entre um profissional e uma pessoa, grupo, família ou comunidade, (vulnerável pela situação de saúde/doença) alvo de atenção e de cuidados, na medida em que, a comunicação é o contexto em que se desenvolve a relação e é, ou pode ser, uma ação terapêutica, por si só ou completar a ação terapêutica de outra intervenção. É a comunicação que permite o desenvolvimento da relação e por conseguinte, pode, criar um contexto favorável ou desfavorável, daí a sua importância.

É através da comunicação que um profissional de saúde tem acesso ao outro, à sua história, ao seu contexto, e às suas necessidades. `

É através da comunicação que um profissional de saúde fornece orientações que possibilitam à pessoa, família ou comunidade, uma melhor gestão da sua situação de saúde/doença.

É através da comunicação que se toma consciência do estado de saúde, se processa a tomada de decisão e se promove uma gestão adequada de um determinado regime terapêutico, muitas vezes complexo.

É fundamental que os profissionais de saúde sejam detentores de conhecimentos, habilidades e recursos que lhes permitam utilizar a comunicação como estratégia de ajuda ao outro, de forma a maximizar os ganhos em saúde.

Existe uma significativa discrepância grande entre o que eu quero dizer; o que eu digo; o que o outro quer ouvir; o que o outro ouve e o que o outro compreende. Daí a importância da escolha das palavras, do contexto e da forma como são transmitidas. Por isso, é importante "trabalhar" a questão do léxico, do significado, do contexto, dos fatores promotores da eficiência da comunicação e dos ruídos/ barreiras na comunicação

Nesse sentido abordam-se alguns conceitos que permitem compreender as diferenças entre a comunicação e a comunicação terapêutica.

Comunicação - toda a interação que ocorre num determinado contexto, quer seja, intrapessoal, interpessoal, intergrupal e/ou comunicação pública. Esta interação rege-se por regras sociais e está dependente essencialmente do tipo de relação existente, do "status" social, e das necessidades dos intervenientes.

A comunicação em saúde, refere-se à comunicação que ocorre num contexto de prestação de cuidados de saúde e rege-se por regras próprias, em função dos profissionais em interação e do tipo de intervenção. Os profissionais tem a obrigação de conhecer diferentes modalidades de comunicação, tem códigos de ética e deontológicos, como o sigilo, a confidencialidade da informação, a necessidade de privacidade, etc. Os utentes e os profissionais de saúde, tem um conjunto de direitos e deveres que também se aplicam à comunicação.

A comunicação clínica refere-se à comunicação contida num ato clinico, ou seja a comunicação que os profissionais utilizam para avaliarem uma situação, para efetuarem uma intervenção, para documentarem os cuidados prestados, para planearem os próximos contatos e para partilharem experiências clinicas entre os diferentes elementos da equipa de saúde. Utiliza habitualmente uma linguagem própria que facilita a comunicação entre os diferentes profissionais. Recorre a taxonomias para a uniformização dos léxicos e dos conceitos.

Comunicação clinica remete-nos para a utilização de estratégias de comunicação, que nos permitem avaliar as necessidades das pessoas; que facilitem a transmissão de informação sobre o estado de saúde das pessoas, de modo a promoverem a sua saúde e orienta para uma estratégia de intervenção que resolva ou minimize o seu problema.

O Institute for Healthcare Communication (2011), faz referência a dados de investigação que indicam que há fortes relações positivas entre a capacidade de comunicação de um membro da equipa de saúde e a capacidade do utente seguir as recomendações médicas e adotar comportamentos preventivos em saúde.

São igualmente diversos os estudos que evidenciam os benefícios de uma boa comunicação entre os profissionais de saúde e os doentes, que se traduzem numa melhoria do estado geral de saúde do doente, numa melhor capacidade de adaptação aos tratamentos e na recuperação mais rápida.

A Comunicação clinica é um elemento chave de todo o processo de atuação em saúde, destacando-se o seu potencial  ao nível de: i) minimização do erro diagnóstico; ii) impacte terapêutico; iii) promoção de estilos de vida saudáveis – promoção da saúde/prevenção da doença.

A comunicação terapêutica é um tipo singular de comunicação inserida na comunicação clinica e comunicação em saúde, utilizada por profissionais de saúde para apoiar, informar, educar e capacitar as pessoas no processos de transição de saúde doença, e/ou na adaptação a dificuldades. Refere-se ao conjunto de intervenções efetuadas pelos profissionais de saúde que de forma autónoma ou complementar tem um potencial "terapêutico no processo de recuperação das pessoas.

Adicionalmente, na comunicação terapêutica, o profissional de saúde utiliza um conjunto de técnicas/habilidades para ajudar as pessoas a resolverem os seus problemas, a se relacionarem melhor consigo e com os outros, a adaptarem-se a sua condição de saúde e contexto de vida.

Por isso a comunicação terapêutica, é orientada para um objetivo especifico, tem uma intencionalidade dirigida para a situação da pessoa, requere determinadas competências do profissional, como a capacidade de escuta, disponibilidade, aceitação, (..), necessita de um "setting" com características especificas para a sua operacionalização e pressupõe a utilização de um conjunto de técnicas/habilidades de comunicação verbal e não verbal, nas quais a empatia e a assertividade desempenham um papel central.

Podemos dizer que a comunicação terapêutica é uma meta comunicação na medida em que, implica a consciencialização de todas as componentes comunicativas e pressupõe a sua utilização com uma finalidade terapêutica, na relação com as pessoas.

Salienta-se que a interação em saúde é sempre uma interação complexa e que, por vezes, os resultados não são lineares pelo que é necessário utilizar a "escuta ativa" para promover a consciencialização das variáveis que concorrem para a comunicação terapêutica e minimizar o impacte das variáveis dificultadoras.

Principais técnicas de comunicação verbal e não-verbal a utilizar na comunicação terapêutica

  • Escuta
  • O Toque
  • Distancia
  • O Posicionamento
  • O Olhar
  • A Informação
  • Aceitação
  • Silêncio
  • Parafraseamento ou acentuação
  • Questionamento/questões
  • Explicitação/clarificação
  • Focalização
  • Confrontação
  • Assertividade
  • Empatia
  • Humor
  • Validação
  • Sumarização/síntese
  • Anamnese associativa
  • A reformulação
  • A exploração
  • A interpretação
  • Orientação
  • Feedback
  • Uma comunicação adequada, centrada na pessoa e no seu contexto, deve ser considerada como um dever ético e uma responsabilidade de qualquer profissional de saúde que trabalhe em contato direto com pessoas, de forma a garantir que os cuidados prestados para além da competência técnica, também tenham uma competência relacional e humana. Por isso é necessário melhorar a formação e a consciencialização dos profissionais de saúde para a necessidade de promoverem a utilização e o potencial da comunicação terapêutica.