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Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental

versión impresa ISSN 1647-2160

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental  no.7 Porto jun. 2012

 

Desafios da Atenção Psicossocial na Rede de Cuidados do Sistema Único de Saúde do Brasil

 

Annette Costa*; Marília Silveira**; Paula Vianna***; Teresa Silva-Kurimoto****

*Enfermeira, Doutora em Enfermagem, Professora Adjunta da Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), annette@enf.ufmg.br

**Enfermeira, Doutora em Enfermagem, Professora Adjunta da Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mrezende@enf.ufmg.br

***Enfermeira, Doutora em Enfermagem, Professora Associada da Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), paulacmv@gmail.com

****Enfermeira, Psicóloga, Doutoranda em Ciências da Saúde, Professora Assistente da Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), teresac@ufmg.br

 

Resumo

Este estudo tem o objetivo de descrever os elementos que compõem os desafios acerca da reabilitação psicossocial na rede de cuidados em saúde. Trata-se de uma revisão bibliográfica não sistemática na qual foram analisados artigos que tratavam dos desafios da reabilitação psicossocial na rede de cuidados em saúde. O artigo reflexivo toma como ponto de partida a Reforma Psiquiátrica Brasileira, cenário em que se encontram abrigadas mudanças substanciais na assistência em saúde mental, com a reversão do modelo hospitalocêntrico de atenção e criação de novos dispositivos de atendimento. Nesse cenário, a reabilitação psicossocial do portador de sofrimento psíquico no contexto da rede de cuidados em saúde constitui um conjunto de desafios, entre os quais a articulação entre os serviços substitutivos e a atenção primária, o ato cuidador e o acolhimento. Identifica-se que o exercício de enxergar a complexidade do atendimento em saúde mental exige saberes e fazeres que não faziam parte, até então, do repertório das equipes de saúde na atenção primária. O acolhimento, dispositivo, estratégia, ato, um direito, figura central no processo de trabalho das equipes que atuam na atenção primária, também fundamental quando se pensa a atenção psicossocial e todos os desafios que envolvem a articulação entre saúde mental e saúde coletiva. Embora busquemos a reversão do modelo de assistência à saúde mental, se não prestarmos atenção, poderemos repetir em novos ambientes antigas práticas, criando outro tipo de manicômio, sem muros, mas que continua a ter a segregação e a exclusão como normas máximas. A Atenção Psicossocial na rede de cuidados em saúde é uma realidade ainda incipiente que convoca e exige mudanças individuais, sociais e institucionais. O desafio é político e exige um compromisso contínuo na construção de novas formas de lidar com o sofrimento psíquico.

Descritores: Centros de Atenção Psicossocial (Serviços de Saúde Mental); Atenção primária à saúde; Acolhimento; Serviços comunitários de saúde mental; Serviços de Saúde Mental.

 

Abstract

This study aims at describing the elements that constitute challenges to psychosocial rehabilitation in the health care system. It is a non-systematic literature review in which articles on the challenges to psychosocial rehabilitation where analysed. This reflective article starts at the Brazilian Psychiatric Reform that brought about substantial changes in mental health care and allowed the reversal of the hospital-centric model and the creation of new modes of care. In this scenario, psychosocial rehabilitation of patients in psychological distress in the context of the health care system comprises a set of challenges, including the articulation between alternative services and primary care, and between caregiving performance and sheltering. The complexity of mental health care requires knowledge and competencies that hitherto were not among primary health care teams repertoire. The concept of sheltering as a device, a strategy, an act, and a right is central to the work process of primary care teams and it is fundamental when considering psychosocial care. Although the goal is the reversal of mental health care models if we are not careful a re-enactment of old practices in a new environment is bound to happen: a new kind of institution without walls is going to be created, but retaining segregation and exclusion as its main values. Psychosocial Care in the health care system is still incipient and it wants individual, social and institutional changes. It is a political challenge that requires constant commitment for the construction of new ways to deal with psychic suffering.

Keywords: Mental Health Services; Primary health care; mental health assistance; user embracement; Community mental health services.

 

A Reforma Psiquiátrica Brasileira

No Brasil, em contraposição ao modelo manicomial que vigorou exclusivamente até o final da década de 70, ocorreram mudanças substanciais na assistência psiquiátrica com a reversão do modelo hospitalocêntrico de atenção e criação de novos dispositivos de atendimento. Essas mudanças foram fundamentais para selar um compromisso com uma assistência mais humanizada e cidadã para os usuários com sofrimento psíquico.

É nesse contexto que situamos a atual Reforma Psiquiátrica Brasileira com direcionalidade para a construção de uma rede única de atendimento à população, regionalizada e hierarquizada, segundo o nível de complexidade. De forma concreta, a Reforma Psiquiátrica possibilitou uma oferta de cuidados diferenciados aos portadores de sofrimento psíquico, com mudanças significativas nos saberes e práticas assistenciais (Tenório, 2002; Amarante, 1995).

Se, em seu início, buscava-se apenas a humanização do espaço institucional desumano, a consolidação da Reforma Psiquiátrica se dá a partir de políticas públicas amparadas por legislações específicas, estabelecendo uma rede assistencial substitutiva à internação em hospitais psiquiátricos. Há que se reconhecer a reforma psiquiátrica brasileira como um processo que, nos últimos trinta anos, vem se desenvolvendo de acordo com as características de cada região. Nesse sentido, diante da dimensão e diversidade do território brasileiro, a reforma vem ganhando características regionais sem, no entanto, deixar de guiar-se pela legislação vigente e pelos princípios fundamentais que a regem. A rede de atenção à saúde mental é formada por diferentes dispositivos de atenção, tendo os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) como articuladores estratégicos dessa lógica. Os CAPS (com espaços específicos para adultos, crianças ou adolescentes e dependentes de álcool e outras drogas), os serviços residenciais terapêuticos, hospitais gerais, serviços de urgência e emergência, dentre outros compõem a rede de serviços de saúde. São também elos da rede os recursos das comunidades por meio de organizações não-governamentais, associações de moradores, cooperativas de trabalho, escolas, famílias (Brasil, 2004a) e suas associações e todos os demais dispositivos que se articulem ao modo de vida dos cidadãos de um determinado território.

Entretanto a complexidade e amplitude das questões ligadas à saúde mental apontaram para a necessidade de integrar essa rede aos serviços de Atenção Primária (Brasil, 2004a). Com isso, o modelo de atenção à Saúde Mental proposto torna-se descentralizado, com oferta de serviços mais próximos das residências das pessoas.

A integração desses serviços de saúde em rede permite definir a Atenção Primária, como a porta de entrada do usuário no sistema de saúde, o que já acontece para outros agravos. Esse modelo vai ao encontro das recomendações da OPAS/OMS (2001), que no relatório "Saúde no mundo", estabelece como metas para a assistência psiquiátrica: atendimento na Atenção Primária como a porta de entrada do sistema, acesso aos psicotrópicos e atenção voltada para o ambiente residencial com envolvimento da comunidade de origem.

O novo modelo reforça as potencialidades dos territórios admitindo que a responsabilidade pelo cuidado é uma prática de diferentes atores. Substitui-se a lógica do encaminhamento pela responsabilização compartilhada, isto é, o percurso do usuário na rede passa a ser acompanhado pelos profissionais que o atendem, seja na atenção primária, seja nos CAPS ou em outros serviços na rede de cuidados. Esse modelo se orientou inicialmente por uma estratégia de reabilitação psicossocial que, com o passar do tempo, acabou por se constituir numa verdadeira ética norteadora das ações que se voltam aos portadores de sofrimento psíquico. A reabilitação psicossocial objetiva a restituição do exercício pleno da cidadania que deve se dar por meio de ações que possibilitam a contratualidade social em seus três cenários: casa, trabalho e rede social (Sarraceno, 1996). Ressalta-se que nas modalidades substitutivas em saúde mental todas as estações de cuidado têm que funcionar, pois isso interfere nos resultados esperados. Mesmo com a co-responsabilização entre os CAPS e a Atenção Primária, este nível de atenção não tem respondido com efetividade, qualidade e resolutividade, o que se constitui em desafio a ser superado (Silveira, 2009). Constata-se, assim, que o desenvolvimento e a implantação desse modelo assistencial são marcados por tensões cotidianas entre a Atenção Primária e os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). Vivenciam-se no cotidiano das práticas alguns desafios para vincular a Saúde Mental à Atenção Primária, com vistas a construir uma rede de atenção integral. Muitas vezes, o percurso do usuário na saúde mental se limita exclusivamente à procura dos serviços de saúde mental desconsiderando a porta de entrada oficialmente definida (Silveira, 2009).Nesse sentido, surgem questões acerca da natureza dos desafios da articulação entre a saúde mental e a atenção primária. Como essa questão vem sendo abordada na literatura científica brasileira?

Nessa perspectiva, este estudo tem por objetivos descrever e analisar os elementos, identificados na literatura científica brasileira, que compõem os desafios da constituição de uma rede de cuidados em saúde mental voltada para a reabilitação psicossocial dos portadores de sofrimento psíquico.

 

Metodologia

Para alcançar os objetivos deste estudo optou-se por realizar uma revisão bibliográfica não sistemática sendo consultadas as bases MEDLINE, LILACS e o portal SCIELO. Foram localizados 164 artigos a partir das pesquisas com os descritores: Reforma Psiquiátrica Brasileira, Saúde Mental e Saúde Coletiva. Dos artigos localizados 38 tratavam da temática da construção da rede de atenção em saúde mental e desses 18 artigos mencionam os desafios dessa articulação.

Dentre os elementos citados como desafios ou obstáculos à construção da uma rede de atenção psicossocial pelos autores dos diferentes artigos, destacam-se as questões relacionadas ao acolhimento dos portadores de sofrimento mental nos serviços constituintes da rede de cuidados bem como as dificuldades enfrentadas para a construção de laços terapêuticos, a que muitos denominam vínculo profissional-paciente.

Para tanto, buscou-se situar a atenção psicossocial em suas concepções e ações, para que, a partir dessa análise, fosse possível traduzir esses elementos fundamentais do cotidiano de trabalho na Atenção Primária, a saber, acolhimento e vínculo, quando estes se referem ao portador de sofrimento psíquico.

 

Os Desafios da Atenção Psicossocial

A complexidade do atendimento em saúde mental exige saberes e fazeres que não faziam parte, até então, do repertório das equipes de saúde na atenção primária. As práticas de atenção psicossocial propõem um modelo de atenção interativo e complexo, que contemple as abordagens biológica, psicológica e social. Nesse contexto, valoriza-se o trabalho interdisciplinar centrado nas potencialidades de cada profissional em benefício de uma assistência mais dinâmica e eficiente no tratamento do doente mental (Lima e Silva, 2004; Campos et al., 2009; Onocko-Campos e Furtado, 2006). Infere-se que a troca de informações e experiências, as diferentes formas de estar e escutar o paciente possibilita uma maior interação entre a equipe e o usuário.

Entretanto "o modelo assistencial que opera hoje nos nossos serviços é centralmente organizado a partir dos problemas específicos, dentro da ótica hegemônica do modelo médico liberal, e que subordina claramente a dimensão cuidadora a um papel irrelevante e complementar" (Mehry, 1998: p.13) com pouca ou nenhuma preocupação com o antes, com os modos de vida do paciente e sua família. Existem, sim, intervenções pontuais e descontextualizadas para atender situações específicas de crise (Silva et al., 2005).

Corroborando com essa idéia, Saraceno (1999) afirma que no campo da saúde mental predomina a abordagem biomédica sendo necessário o deslocamento para uma abordagem biopsicossocial, o que requer mudanças importantes na formulação das políticas de saúde mental; na formulação e no financiamento de programas de saúde mental; na prática cotidiana dos serviços; no status social dos médicos. Essa passagem, segundo o autor, é norteada por uma forte resistência, cultural, social e econômica dos psiquiatras em transformar a assistência em saúde mental, colocando em crise o paradigma médico. Para o referido autor, o modelo hegemônico de atendimento, centrado no paradigma médico, apesar de acolher algumas proposições das abordagens psicossociais, se caracteriza por ser:

- linear – um dano definido do sistema nervoso central provoca uma condição de doença e os tratamentos são reparações desse dano;

- individualista – saúde e doença são determinadas pelos recursos/carências do indivíduo e os tratamentos são intervenções exclusivamente dirigidas a ele;

- histórico – ignora as interações indivíduo-ambiente. A despeito de terem decorrido mais de dez anos dessas afirmações, constata-se que elas ainda encontram eco em diversas realidades de nosso país.

Saraceno (1999) acrescenta que a abordagem biopsicossocial aponta para o reconhecimento do papel dos usuários, da família, da comunidade e de outros profissionais de saúde como fontes geradoras de recursos para o tratamento da doença mental e promoção da saúde mental. Intervir, portanto, em saúde mental, não significa apenas prestar assistência. Intervir significa, sobretudo, estar atento à realidade social, econômica e cultural em que vivem as pessoas que atendemos. Sabe-se que um dos maiores desafios reside em alcançar as ações que estão para além da saúde (Lobosque, 2011). Saraceno (1999: p. 98) comenta que "o muro do manicômio a ser demolido é qualquer muro que impeça de ver (e usar) outros saberes e outros recursos".

Sendo assim, operar na perspectiva de formulação de uma "Clínica Ampliada" traz possibilidades de fazer emergir para os profissionais de saúde outros aspectos do sujeito, que não apenas o biológico, considerando os usuários em seu contexto socio-histórico, em seus modos de viver, enfim, em seu território. A clínica ampliada é denominada por "Clínica do Sujeito", que exige um deslocamento da ênfase na doença para centrá-la na pessoa que apresenta algum problema de saúde. Trata-se aqui de saber o que o sujeito apresenta de regularidade na clínica e mais além, o que ele manifesta de diferente, de singular, que não se repete e que é só dele. Isto pressupõe a construção de um vínculo com o usuário (Campos, 2003).

Outro pressuposto da clínica ampliada é de que as expectativas dos usuários e o tempo das relações terapêuticas são diferentes na atenção primária e, em particular, na atenção em saúde mental. Trata-se também de uma prática capaz de reconhecer as potencialidades dos sujeitos em cada situação e que os profissionais, familiares e usuários estão imersos em uma teia de forças que os constitui (Campos, 2003; Tenório, 2007).

A maneira como agem os diversos atores sociais (usuários, familiares, técnicos, Estado) faz com que seja produzido um determinado modo de cuidar, sustentado pela cultura e instigado pelas novas maneiras de assistir. Nesse sentido, "somos em certas situações, a partir de certos recortes, sujeitos de saberes e das ações que nos permitem agir protagonizando processos novos como força de mudança. Mas, ao mesmo tempo, sob outros recortes e sentidos, somos reprodutores de situações dadas" (Mehry, 2002: p. 14-5).

Nesse sentido, não podemos reduzir a amplitude de um serviço a um local físico e aos seus profissionais, mas a toda gama de oportunidades e lugares que favoreçam a reabilitação psicossocial do paciente A ausência de inventividade, somada à ações fragmentadas podem contribuir para o surgimento do que se denomina nova cronicidade (Rotelli, De Leonardis e Mauri, 2001; Pande e Amarante, 2011).

Nesse contexto estão incluídas a valorização das habilidades de cada indivíduo, práticas terapêuticas que visam ao exercício da cidadania, as políticas de saúde mental transformadoras do modelo hegemônico de assistência. A reabilitação psicossocial, portanto, trata-se de "uma atitude estratégica, uma vontade política, uma modalidade compreensiva, complexa e delicada de cuidados para pessoas vulneráveis aos modos de sociabilidade habituais" (Pitta, 1996: p. 210).

É neste percurso que precisamos caminhar, ganhando a rua, a cidade. Gramsci (1987: p.13) afirma que "criar uma nova cultura não significa apenas fazer individualmente descobertas ‘originais’; significa também, e, sobretudo, difundir criticamente verdades já descobertas, ‘socializá-las’ por assim dizer; transformá-las, portanto, em base de ações vitais, em elemento de coordenação e de ordem intelectual e moral".

Nesse sentido, um dos primeiros desafios se impõe. A sociedade e até mesmo os profissionais de saúde questionam: Por que criar novas maneiras de assistir que trazem o doente mental de volta ao espaço público? Por que nos haver com a loucura em toda a sua plenitude, longe dos muros dos hospícios? Por que é necessário buscarmos uma interlocução efetiva com os profissionais que trabalham com saúde mental e a atenção primária?

A psiquiatria permitiu a inclusão do doente mental no universo dos humanos, mas criou um paradoxos: a identidade de doente mental é uma identidade sem valor de troca, que exclui e afasta as pessoas. Isto nos faz correr o risco de reproduzir em nosso novo modelo assistencial a mesma prática excludente e segregadora, que norteou a assistência ao doente mental durante décadas (Cavalcanti, 2000).

A Reforma Psiquiátrica atual propõe um trabalho interdisciplinar que valorize as potencialidades de cada profissional, em benefício de uma assistência mais dinâmica e eficiente no tratamento do doente mental, tal como aponta Dobies e Fioroni (2010). A troca de informações e experiências (Schneider, 2008), as diferentes formas de estar e escutar o paciente e o diálogo permanente com a rede de cuidados à saúde possibilita uma maior interação entre a equipe e o usuário. Entretanto, o próprio trabalho em equipe também representa desafios. A necessidade uma comunicação clara e aberta. É a partir de uma interlocução cotidiana, na qual os diferentes saberes e arcabouços teóricos, as diferentes experiências e leituras devem encontrar lugar privilegiado na construção de um trabalho em rede. O suporte ou matriciamento realizado pelos profissionais especialistas é um dispositivo de apoio institucional que requer uma comunicação constante mas principalmente nos espaços instituídos das reuniões de equipe. Como apontam diversos autores isso nem sempre acontece (Lima e Silva, 2004; Vasconcelos e Morschel, 2009).

Saraceno (1999: p. 156-7) afirma que "um programa de reabilitação psicossocial dirigido a um determinado paciente psicótico pode ser ao mesmo tempo realizado através de intervenções individuais (administração de psicofármacos, sustentação psicológica individual, adestramento de atividade laborativa, educação à aptidão na vida cotidiana) e intervenções coletivas (suporte à família, sensibilização da comunidade onde o paciente reside, envolvimento dos indivíduos com o local de trabalho)". De forma mais sistemática Guerra (2004), diante da diversidade de acepções do termo reabilitação psicossocial, reúne as diferentes perspectivas em três modelos epistêmicos: psicoeducativos, sócio-políticos ou críticos e de orientação clínica. Embora partam de recortes epistemológicos distintos, os três modelos trazem a marca de um trabalho em construção. Há que se considerar que a perspectiva de um trabalho inacabado, em construção, bem como a amplitude conceitual aqui mencionada, funcionam, simultaneamente, simultaneamente como desafio e propulsor dessa proposta de atenção ao portador de sofrimento mental. A instabilidade do inacabado, as dúvidas diante da diversidade teórica e conceitual contribuem sobremaneira para a construção de uma proposta que pretende lidar - e não extinguir - com o sofrimento psíquico.

Portanto, as intervenções em saúde mental podem contemplar o indivíduo em sua totalidade, utilizando técnicas tanto individuais como coletivas, considerando as realidades locais como determinantes dessas intervenções ou, ainda, partir da singularidade do sujeito para propor intervenções convocando a responsabilização do sujeito pelas respostas que apresenta (Viganó, 1999; Guerra, 2004; Kantorki e Pinho, 2011).

 

O Ato Cuidador e o Acolhimento

Existem maneiras diferentes de entender o ato cuidador. Para muitos, cuidar pressupõe somente a presença de um serviço de saúde. Não que, no manejo da crise, possamos prescindir de ajuda especializada e acesso aos serviços de saúde. O ato cuidador, em nosso entender, vai mais além. Ele faz emergir a capacidade criadora existente em cada um, aponta para a disponibilidade em se lançar, em criar novas maneiras de conviver com o outro em suas diferenças.

Experiências como a de Educação Popular em Saúde Mental, mostram a potencialidade das ações de saúde que visam dar voz a comunidade, valorizando os diferentes saberes na construção coletiva das novas práticas em saúde mental (Carneiro et al., 2010).

O levantamento bibliográfico realizado aponta o acolhimento como um primeiro e fundamental ato de cuidado (Dobies e Fioroni, 2010; Schneider, 2008; Lobosque, 2011; Mucci et al., 2008) , mas que, também ultrapassa a questão do cuidado em si, situando-se como um direito de todo cidadão (Lobosque, 2011).

Ao discutir o lugar do apoio da equipe de saúde mental aos profissionais que se encontram na saúde coletiva (Apoio Matricial) novamente o acolhimento é compreendido na qualidade de uma prática que se volta à subjetividade, seja do usuário ou do trabalhador (Figueiredo e Onocko Campos, 2009). É certo que o acolhimento, dispositivo, estratégia, ato, um direito, figura central no processo de trabalho das equipes que atuam na atenção primária, também é fundamental quando se pensa a atenção psicossocial e todos os desafios que envolvem a articulação entre saúde mental e saúde coletiva. No contexto apresentado, outros princípios e dispositivos devem ser incluídos para nortear a ação da equipe que atua na atenção primária, dentre eles o acolhimento, reconhecido como uma ferramenta estratégica ou tecnologia de cuidado que imprime qualidade aos serviços de saúde. E mais, no acolhimento o trabalhador deve mobilizar seu saber no sentido de produzir respostas às demandas a ele trazidas (Malta, 2001). Por fim, o acolhimento se volta à construção de um vínculo com a comunidade, aproximando o usuário com o serviço de saúde (Malta, 2001; Gomes e Pinheiro, 2005).

Se partirmos do princípio de que o lugar de todo portador de sofrimento psíquico é na comunidade - em contraponto à idéia de que esse lugar é em uma instituição - o reconhecimento de sua condição de ser único, particular, bem como de sua cidadania é fundamental para sua circulação no espaço público. Com isso, responsabilização e vínculo ganham espaço privilegiado quando compreendidos na acepção de ações que tem como objetivo a autonomia e não a alienação do portador de sofrimento psíquico ao serviço ou ao profissional de saúde e seu saber.

A condição de ser único requer acolher aquele que sofre, sempre e a cada vez que ele procura ajuda profissional. Queixas orgânicas não podem ser tomadas como algo do tipo ‘o mesmo de novo’. Cada queixa, cada momento exige uma investigação de seu teor.

A responsabilização do profissional com cada usuário é algo já proposto (Lobosque, 2011). Entretanto, acolher o usuário portador de sofrimento psíquico implica responsabilizá-lo, implicá-lo em sua queixa (Silva, 2005). Quando o vínculo e a responsabilização deixam de existir o risco é a institucionalização da doença e todo o retrocesso que isso significa (Lima e Silva, 2004). Entretanto é necessário compreender, do ponto de vista prático, o sentido de acolher. Acolher não significa atender de pronto a demanda do usuário. Em especial, quando esta demanda situa-se na realização de atos rotineiros da unidade de saúde (marcar consulta, fazer exames, procedimentos, dentre outros) ou ainda quando se trata de uma demanda insistente e infindável de um mesmo usuário. ‘Livrar-se’ dele, atendendo-o logo, por vezes significa sustentar indefinidamente sua situação de queixas ajudando-o a ampliá-las e diversificá-las. Em um atendimento individual, buscar com o usuário os reais sentidos de suas queixas e demandas infinitas pode funcionar como acolhimento ao sujeito e não às suas demandas, responsabilização de ambos: profissional e usuário e fortalecimento de um vínculo.

Um vínculo profissional que se pretende terapêutico não comporta que o profissional de saúde faça tudo pelo usuário e, tampouco, busque soluções para todos os problemas trazidos por ele. As limitações do conhecimento, da capacidade de atendimento e resolutividade são elementos reais e bastantes presentes no cotidiano dos serviços. Atribuir novos significados para as queixas persistentes, novas possibilidades de reabilitação, de reinserção desse usuário num exercício de reconhecimento de sua cidadania e de seus direitos constitui um desafio e desenha possibilidades de abordagem.

A ressignificação dos sintomas não pode anular o sujeito, mas necessita que convocá-lo a dizer sobre si, sobre o que deseja, o que consegue fazer, convida-lo a ressignificar algo de seu sofrimento, a exercer sua cidadania.

E mais, esse processo requer a participação da família, na qualidade de pessoas que podem oferecer suporte e apoio ao usuário. Transformar, recriar as relações existentes entre a família, a sociedade e o usuário com sofrimento psíquico não é tarefa das mais fáceis. Existe o pronto, o universalmente aceito, a delegação do cuidado a outrem, evidenciando a incapacidade de lidar com a loucura, de aceitar novos desafios e de se aventurar em caminhos não trilhados. Pode-se pensar que o desconhecimento de como cuidar do portador de sofrimento psíquico, apontado por diversos autores (Dobies e Fioroni, 2010; Silva et al, 2005; Lobosque, 2011; Ambrósio et al., 2009; Figueiredo e Onocko Campos, 2009) como um obstáculo, pode se fundamentar também na idéia de que ser terapêutico na área da saúde mental implica o clássico atendimento individual utilizando-se ferramentas de psicoterapia. Entretanto, o trabalho de acolher e responsabilizar, reconhecendo a cidadania e o direito desse usuário de se inserir na sociedade, passa não só pelos atendimentos individuais psicoterapêuticos mas também por ações voltadas ao cotidiano, as quais os profissionais da atenção primária estão preparados e amparados por uma larga experiência advinda do lidar cotidiano com os problemas de saúde do território. As questões compreendidas pelos profissionais como mais complexas podem ser discutidas com os especialistas em saúde mental nos espaços de construção coletiva, tais como as reuniões clínicas.

Enfim, o cuidado ao portador de sofrimento psíquico necessita ser incluído na agenda de prioridades da equipe de saúde da família que desenvolvem as ações da atenção primária em saúde no Brasil. No lidar com o sofrimento psíquico, o profissional, qualquer que seja, se verá o tempo todo confrontado com suas próprias questões, e, também ele precisará criar formas de re-significação, seja buscando o acompanhamento de profissionais mais experientes ou reconhecendo os limites de atuação e apostando no desejo de saber mais.

 

Considerações Finais

A Atenção Psicossocial na rede de cuidados em saúde é uma realidade ainda incipiente no Brasil que convoca e exige mudanças individuais, sociais e institucionais. O desafio é político e exige um compromisso contínuo na construção de novas formas de lidar com o sofrimento psíquico. A realidade brasileira, por sua extensão geográfica e marcantes diferenças, revela que nem todos os municípios dispõem de uma rede de atenção à saúde mental própria ou pactuada. Além disso, o simples fato de possuir um serviço substitutivo, um CAPS, não implica o funcionamento de uma rede que se pretende também substitutiva.

A incipiente articulação da Saúde Mental na Atenção Primária, nomeada para acolher e responsabilizar-se por essa clientela, requer conhecimento e preparo por parte das equipes de saúde da família quanto às formas de abordagem, de tratamento e encaminhamentos possíveis. A não responsabilização acaba por afastar o usuário, direcionando-o para os serviços substitutivos ou para os hospitais psiquiátricos, que continuam a representar, em muitos casos, o lugar social da doença mental, o lugar da loucura.

Sendo assim, embora busquemos a reversão do modelo de assistência à saúde mental, se não prestarmos atenção, corremos o risco de repetir em novos ambientes antigas práticas, criando outro tipo de manicômio, sem muros, mas que continua a ter a segregação e a exclusão como normas máximas.

Neste artigo, buscamos expor a realidade da Reforma Psiquiátrica Brasileira, a sutileza e delicadeza do ato cuidador na perspectiva da reabilitação psicossocial e a sua necessária interlocução com a atenção primária. Ousamos fazer algumas recomendações aos profissionais de saúde em seu contato com o portador de sofrimento psíquico e seus familiares. Falamos um pouco de um grande e complexo mundo daquele que apresenta aos profissionais seus sofrimentos.

Sendo assim, procuramos dizer de nossa aposta na possibilidade de um cuidado ao portador de sofrimento psíquico que parta do pressuposto de que seu lugar é na cidade. Um cuidado que simplesmente lide com ele naquilo que ele é.

 

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Recebido para publicação em: 20.03.2012

Aceite para publicação em: 30.05.2012