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Revista de Gestão Costeira Integrada

versão On-line ISSN 1646-8872

RGCI vol.16 no.2 Lisboa jun. 2016

https://doi.org/10.5894/rgci565 

ARTIGO / ARTICLE

Condição Oceanográfica, Uso e Ocupação da Costa de Salinópolis (Setor Corvina – Atalaia), Nordeste do Pará, Brasil*

Oceanographic Condition, Use and Occupation of The Salinópolis Coastline (Corvina – Atalaia Sector), Northeastern of Pará, Brazil

 

Leilanhe Almeida Ranieri@, 1; Maâmar El-Robrini1

 

@Corresponding author, to whom correspondence should be addressed:
1Universidade Federal do Pará. Instituto de Geociências. Grupo de Estudos Marinhos e Costeiros. Avenida Augusto Corrêa, 1. Prédio da Biblioteca Setorial (Raimundo M.G. Montavão), Salas 1 e 2. CEP 66075-110. Belém, PA, Brasil. e-mails: Ranieri < leilanhe.ranieri@gmail.com>; El-Robrini <robrini@ufpa.br>


RESUMO

As zonas costeiras são áreas sob grande estresse ambiental, devido à excessiva exploração de seus recursos naturais, uso desordenado do solo e a influência de agentes oceanográficos (ondas, marés, correntes), meteorológicos (ventos, tempestades), hidrológicos (rios, aquífero, oceano) e antrópicos (habitação, indústria, turismo, lazer). As praias são os ambientes mais dinâmicos e mais apreciados para uso e ocupação humana nas zonas costeiras. No Nordeste do Estado do Pará (Brasil), Salinópolis destaca-se como um dos municípios mais populosos e freqüentados por turistas. O maior problema atual no âmbito do gerenciamento costeiro são as ocupações irregulares em áreas de risco sujeitas a erosão. Este artigo analisa as condições oceanográficas nas praias de Salinópolis (Corvina, Maçarico, Farol Velho e Atalaia), e as atividades relacionadas ao lazer e ocupação imobiliária. Foram coletados dados oceanográficos durante dois períodos (26, 27 e 28/04/2013 – estação chuvosa – e 04, 05 e 06/10/2013 – estação menos chuvoso) e, em 12/07/2014 – alta temporada turística – foi feita a análise dos aspectos de uso e ocupação da costa e aplicação de entrevistas/questionários com banhistas. Para caracterização oceanográfica foram utilizados métodos observacionais e instrumentais de medições de ondas e correntes, além de coleta de sedimentos superficiais para complementar a identificação de estados morfodinâmicos de praia. Critérios de classificação de orla oceânica com base no decreto nº 5.300/2004 visaram a compartimentação da costa de Salinópolis em termos de urbanização. Atualmente, a orla oceânica de Salinópolis possui diferentes características quanto à utilização e conservação, abrangendo desde a tipologia de orlas naturais (Classe A) às orlas com urbanização consolidada (Classe C). A primeira ocorre nos extremos da área de estudo e, a segunda, na região da sede municipal. Quatro tipos de praias foram definidos segundo a exposição marítima e o grau das condições oceanográficas: tipo 1 (Maçarico), tipo 2 (Corvina), tipo 3 (Farol Velho) e tipo 4 (Atalaia). O trecho de costa com maiores impactos ambientais e com elevada erosão costeira localiza-se na praia do Farol Velho. Áreas de acresção ou estabilidade estão localizadas nas praias da Corvina e Maçarico e nos extremos da ilha do Atalaia. O grau de periculosidade ao banho foi pouco variável, com escala de segurança de 4 (praia do Maçarico) a 7 (praia do Atalaia) – médio a alto grau de risco. A praia mais freqüentada em Salinópolis é a do Atalaia, e os principais perigos potenciais identificados por banhistas entrevistados nesta praia são o trânsito de veículos, consumo alcoólico e marés altas.

Palavras-chave: Costa Amazônica, expansão urbana, classificação de praias, erosão/acresção costeira.


ABSTRACT

The coastal zones are areas under great environmental stress, due to excessive exploitation of natural resources, uncontrolled land use and the influence of oceanographic (waves, tides, currents), weather (winds, storms), hydrology (rivers, aquifer, ocean) and anthropogenic (housing, industry, tourism, leisure) agents. The beaches are the environments most dynamic and most appreciated for human use and occupation. In the Northeastern State of Pará (Brazil), Salinópolis stands out as one of the occupation in risk areas subject to erosion. This article analyzes the oceanographic conditions on the Salinópolis beaches (Corvina, Maçarico, Farol Velho and Atalaia), and activities related to leisure and human occupation. Oceanographic data were collected during two periods (April 26th, 27 th and 28 th, 2013 – rainy season – and October 04th, 05th and 06th, 2013 – less rainy season), and July 12th, 2014 – peak tourist season – was made analysis of aspects of the use and occupation of the coast and application interviews/questionnaires with bathers. Observational and instrumental methods of waves and currents measurements were used to oceanographic characterization, and collecting surface sediments to complement the identification of beach morphodynamic states. The classification criteria of ocean coastal of n° 5.300/2004 Decree were used, aiming to categorize the Salinópolis coast in terms of urbanization. Currently, the Salinópolis seafront has different characteristics regarding the use and conservation, ranging from the type of natural coast (Class A) until coastal with consolidated urbanization (Class C). The first occurs at the extremes of the study area and the second in the county seat. Four types of beaches were defined according to maritime exposure and the degree of oceanographic conditions: type 1 (Maçarico), type 2 (Corvina), type 3 (Farol Velho) and type 4 (Atalaia). The section of coast with major environmental impacts and high coastal erosion is located on the Farol Velho beach. Areas of accretion or stability are located on the Corvina and Maçarico and the extremes of the Atalaia island. The degree of danger to the bath was somewhat variable, with a scale of security 4 (Maçarico beach) to 7 (Atalaia beach) – medium to high degree of risk. The most popular beach in Salinópolis is the Atalaia, and the main potential hazards identified by interviews bathers at this beach are vehicle traffic, alcohol consumption and high tides.

Keywords: Amazon Coast, urban expansion, beach classification, coastal erosion/accretion.


 

 

1. Introdução

A gestão das zonas costeiras está sendo cada vez mais discutida em todo o mundo no sentido de monitorar e proteger essas zonas, principalmente devido à grande importância dada nas últimas décadas às Mudanças Climáticas.

Entende-se que as zonas costeiras são áreas sob intenso estresse ambiental, devido à excessiva exploração de seus recursos naturais, uso desordenado do espaço (Gruber et al., 2003) e por desempenhar papel de proteção contra erosão causada pelos agentes oceanográficos (ondas, marés, correntes), meteorológicos (ventos, tempestades) e fluviais (hidrodinâmica estuarina).

Para uma boa caracterização do grau de estabilidade das zonas costeiras é requerido o monitoramento destes agentes naturais e também dos antrópicos (especulação imobiliária, devastação de ecossistemas, construção de estruturas rígidas de proteção litorânea) que determinam a dinâmica e evolução da costa ao longo do tempo.

O conhecimento de aspectos naturais e antrópicos, uma vez entendido, permite presumir o comportamento dos ambientes costeiros, identificar condições favoráveis e desfavoráveis de utilização ou preservação da costa.

A maioria dos estudos que visam este conhecimento ocorre nas praias, ambientes mais afetados pela interação da dinâmica marinha e terrestre. Pesquisas sobre a circulação costeira de sedimentos em algumas praias são fundamentais na identificação de pequenas e grandes células de transporte locais e regionais e trazem importantes conclusões sobre o balanço sedimentar e a atuação de processos de erosão costeira acelerada (Souza, 1997; Souza & Suguio, 1998).

Em relação aos aspectos antrópicos, as praias são também as mais apreciadas para uso e ocupação humana, seja por sua beleza, lazer, moradia, comércio, turismo e até mesmo atividades portuárias.

São bens de uso comum do povo. Espaços públicos onde o direito de ir e vir deve estar sempre garantido, sendo áreas que podem ser utilizadas por todos em igualdade de condições (MMA, 2006).

No Brasil, o órgão competente pela gestão dos bens da União, nos quais se inserem as praias e Terrenos de Marinha, é a Secretaria do Patrimônio da União (SPU), do Ministério do Planejamento. Uma das competências da SPU é justamente disciplinar a utilização de bens de uso comum do povo, adotando as providências necessárias à fiscalização de seu uso (SPU, 2012).

No entanto, a gestão de praias apresenta diversos desafios, como destacado pelo Projeto Orla (MMA, 2006): regularização fundiária, ordenamento dos empreendimentos turísticos e de projetos urbanísticos, ordenamento de barracas/quiosques de praia, manutenção da acessibilidade à praia, conservação de biodiversidade e de culturas tradicionais, minimização de processos erosivos; entre outros, demonstrando que nem sempre as atividades desenvolvidas nas praias são devidamente ordenadas. Além disso, as praias têm o potencial de ser um dos primeiros ambientes a sofrer as consequências das mudanças climáticas, tais como a combinação da elevação do nível do mar com eventos climáticos extremos mais frequentes e rigorosos (Scherer, 2013).

O Projeto Orla propõe parâmetros de classificação da orla, tanto dos seus atributos físico-naturais quanto em relação a sua utilização e conservação. Um dos fundamentos deste projeto é o emprego de instrumentos de ordenamento territorial, com a classificação e o enquadramento da Orla Marítima, considerando o padrão de qualidade ambiental que se deseja atingir e/ou manter ao longo do tempo, segundo classes de trechos da Orla, subclasses (tipologias da orla) e estratégias de ação (Sobrinho, 2006).

Este projeto, no Estado do Pará, está sendo tratado, com base em informações peculiares sobre a hidrodinâmica estuarina e costeira da Região Norte, as unidades morfológicas, os dados socioeconômicos, as leis ambientais e os aspectos fundiários.

Salinópolis é um dos municípios contemplados neste projeto. Trabalhos referentes à oceanografia e os aspectos de uso da costa (socioeconômicos) na área foram realizados, dentre outros, por Gregório et al. (2005) e Busman (2004), abordando a morfodinâmica das praias do Atalaia e Farol Velho, respectivamente; Pereira et al. (2014), analisaram os aspectos físicos e antropogênicos da praia do Atalaia; e Cavalcante (2001), Brito (2004) e Marinho (2009), mostraram os reflexos da expansão urbana em Salinópolis.

O município é um dos mais populosos e frequentados por turistas no NE do Pará. Do ponto de vista urbanístico e geológico, o maior problema atual são as ocupações irregulares em áreas de risco sujeitas a erosão, como os ecossistemas de dunas que desempenham função de proteção costeira.

De acordo com Scherer (2013), legalmente, toda e qualquer construção na faixa costeira deve estar devidamente regularizada, com as autorizações pertinentes, e as construções/estruturas sem autorização, deveriam ser imediatamente retiradas e a área recuperada por conta de quem a ocupa. Isto está descrito na Lei Federal 9636/98, que discorre sobre os Bens da União,“a utilização, a título precário, de áreas de domínio da União para a realização de eventos de curta duração, de natureza recreativa, esportiva, cultural, religiosa ou educacional, poderá ser autorizada, na forma do regulamento, sob o regime de permissão de uso.”

Ainda, na mesma norma, no seu Art. 6º coloca-se que “a realização de aterro, construção ou obra e, bem assim, a instalação de equipamentos no mar, lagos, rios e quaisquer correntes de água, inclusive em áreas de praias, mangues e vazantes, ou em outros bens de uso comum, de domínio da União, sem a prévia autorização do Ministério da Fazenda, importará: I - na remoção do aterro, da construção, obra e dos equipamentos instalados, inclusive na demolição das benfeitorias, à conta de quem as houver efetuado;....”.

É amplamente conhecido que o desenvolvimento turístico, ao longo da costa de Salinópolis, contribui para o crescimento urbano, sendo cada vez mais intensa a especulação imobiliária e hoteleira. Em locais mais próximos da linha de costa, onde a ocupação humana vem se consolidando, o forte problema de erosão costeira em virtude da hidrodinâmica (ondas, marés, correntes) e da devastação dos ecossistemas de proteção costeiros (construções irregulares sobre os mesmos), tem acarretado impactos socioeconômicos e ambientais significativos.

O presente artigo objetiva identificar as condições oceanográficas das praias de Salinópolis, e as atividades relacionadas com o lazer e a ocupação imobiliária nestas praias, efetuando uma proposta de classificação da orla oceânica do município quanto ao uso e ocupação.

 

2. Área de estudo

A área de estudo está localizada no município de Salinópolis, NE do Pará, Brasil. A área foi limitada à faixa de praias oceânicas: Corvina e Maçarico, onde se situa o principal empreendimento do município (Orla do Maçarico) e o setor mais urbanizado; Farol Velho, praia com urbanização mais próxima da praia; e Atalaia, praia mais populosa com campo de dunas com urbanização em expansão (Figura 1).

2.1. Aspectos fisiográficos da costa

Apesar da relativa semelhança na composição granulométrica, morfologia e processos costeiros, as praias de Salinópolis apresentam unidades fisiográficas distintas diferenciando-as do domínio continental; na zona de pós-praia estão presentes, desde planícies lamosas (manguezais) a planícies arenosas com vegetação de restinga (termo aqui equivalente a terreno arenoso e salino coberto por plantas herbáceas).

A praia da Corvina (Figura 1b), localizada ao extremo oeste de Salinópolis, é limitada por dunas frontais, restinga e manguezais, assim como pela Orla do Maçarico (Figura 1c).

A praia do Maçarico (Figura 1d), que faz conexão com a praia da Corvina, é a praia menos exposta ao oceano aberto de entre as quatro praias estudadas, devido à adjacência com a foz do rio Sampaio. Esta praia é limitada pela Orla do Maçarico, por falésias (Formação Barreiras), dunas e restinga.

A praia do Farol Velho (Figura 1f) é onde ocorrem os maiores impactos socioeconômicos em função de erosão costeira, visto que há elevada especulação imobiliária bem próxima à praia. Nesta praia, afloramentos rochosos são expostos na face praial (Figura 5g) que é limitada por moradias (Figura 2f) construídas à frente do manguezal.

A praia de Atalaia (Figura 1g), localizada ao extremo leste de Salinópolis, é limitada por dunas frontais e permanentes cobertas com vegetação de restinga (plantas herbáceas) (Figura 1h), e em parte por moradias construídas no pós-praia (Figura 2h).

2.2. Aspectos oceanográficos

O município sofre influência das ondas formadas a partir dos ventos alísios. Estes cruzam a plataforma continental em direção nordeste, gerando trens de ondas incidentes. Associados à morfologia de fundo, ocasionam correntes de deriva litorânea para noroeste (Geyer et al., 1996).

Segundo o modelo WWATCH (Cptec, 2013), a altura de onda em águas profundas varia de 0,5 a 1,5 m. Na zona de arrebentação das praias oceânicas, ou seja, em águas rasas, estas ondas alcançam 0,4 a 1,05 m.

Em Salinópolis ocorrem macromarés semidiurnas (amplitudes > 4m). As correntes de maré são as principais correntes atuantes no litoral. Secundariamente, são as correntes litorâneas resultantes da chegada das ondas à costa. Ambas são responsáveis pelo transporte de grandes quantidades de sedimentos da plataforma continental para o litoral (Braga, 2007).

As correntes longitudinais têm grande intensidade durante a sizígia e a estação chuvosa amazônica (dezembro- maio), quando são acrescidas pelas correntes de maré, alcançando velocidade máxima na plataforma continental interna de 2 m.s-1 (Segundo, 2007).

2.3. Aspectos socioeconômicos e ambientais

Assim como várias outras cidades à beira-mar, Salinópolis apresenta uma dinâmica na estrutura espacial que se reflete, principalmente, no modo de vida da população local, basicamente em função do mercado turístico que se instala na região, incentivando também o comércio, com um movimento significativo durante a alta temporada, quando, além de atender a população local, atende também a população flutuante (Brito, 2004).

A pesca, que é considerada uma das atividades mais antigas na região tem, ainda hoje, importante contribuição para a economia local. A comercialização de pescados é realizada nos mercados municipais de Porto Grande e Cuiarana, bem como em pequenos estabelecimentos localizados na sede municipal.

Os principais fatores de impacto sobre o ambiente no município de Salinópolis são diminuição das áreas de manguezal, avanço da cunha salina sobre o aquífero, aumento da erosão costeira, lixo, esgoto sem tratamento, contaminação de águas subterrâneas, conflitos fundiários e ocupações irregulares em área de proteção costeira, especialmente na ilha do Atalaia, onde os efeitos da interferência humana estão sendo cada vez mais consolidados com construções irregulares de hotéis em áreas de dunas e residências de veraneio sobre os terraços que limitam a linha de costa.

Na ilha, a ocupação desordenada ocorre desde a década de 70, com a construção da ponte que interliga a sede do município à ilha (Brito, 2004; Marinho, 2009), expondo este sistema costeiro à forte especulação imobiliária sobre áreas antes ocupadas por dunas.

Atualmente, as dunas frontais na praia do Atalaia estão cercadas por atividades degradadoras que implicam na dificuldade de recarga do lençol freático (importante papel das mesmas). Tais atividades são: destruição das dunas, aterramento e queimadas da vegetação de restinga, além do forte problema de erosão costeira em virtude da hidrodinâmica local (ondas, marés e correntes). Há o recuo periódico de barracas existente na proximidade da linha de costa para os campos de dunas devido à erosão, e nas dunas são intensos os loteamentos.

Apesar da intensa especulação imobiliária e hoteleira ter contribuído para as transformações socioambientais em Salinópolis, a ação dos processos erosivos provocados pelos agentes dinâmicos costeiros é muito mais expressiva, se comparada com a intervenção humana (Brito, 2004), sendo o impacto ambiental muito mais problemático para o homem do que para a própria natureza.

 

3. Materiais e métodos

Tendo em vista a estabilidade das praias de mesomacromarés, tanto espacialmente quanto no tempo (meses a anos) e, ressaltando que modificações significativas nos padrões morfológicos e nas condições oceanográficas sazonais das praias equatoriais ocorrem em condições extremas (durante o Equinócio ou chuvas mais severas), foram realizadas campanhas de campo para coleta de dados hidrodinâmicos durante dois períodos sazonais distintos com influência do Equinócio, visando obter valores máximos: 26, 27 e 28/04/2013 – estação chuvosa – e 04, 05 e 06/10/2013 – estação menos chuvosa. Nestes períodos também foram analisados os aspectos de uso e ocupação da costa, assim como em 12/07/2014 – alta temporada turística, quando foram aplicadas entrevistas/questionários com banhistas.

Foram feitas medições de correntes nas praias da Corvina e Atalaia através de uma bóia de deriva largada entre o ponto de quebra da onda e a linha de costa, medindo- se a distância percorrida pela bóia em 1 minuto.

A altura de onda significativa da onda (Hb) foi estimada nas mesmas praias através de filmagem da passagem de cristas de ondas numa torre de metal disposta após a zona de arrebentação, onde se verificou a média da altura de 1/3 das maiores ondas registradas.

Foram ainda obtidas alturas de ondas e intensidade de correntes através de um sensor de pressão integrado no equipamento OBS (Optical Backscatter Sensors) e com o uso de correntômetro magnético, respectivamente. Estes métodos instrumentais ocorreram nas praias do Maçarico e do Farol Velho.

Foram identificados os estados morfodinâmicos das praias (dissipativo, intermediário e reflectivo) através do parâmetro empírico adimensional ômega (Ω), de Wright & Short (1984): Ω = Hb/Ws*T, onde Hb é a altura significativa da onda na arrebentação; Ws é a velocidade de decantação de partículas sedimentares obtida pela relação com a granulometria de sedimentos superficiais coletados nas praias (Dean, 1973); e T é o período médio das ondas (tempo da passagem das ondas dividido pelo número delas).

Foi aplicado o Decreto nº 5.300, de 7 de dezembro de 2004, visando a classificação e compartimentação da costa de Salinópolis em termos de urbanização. Segundo o anexo II deste decreto, a orla pode ser classificada em três classes quanto à sua utilização e conservação: Orlas Naturais ou Classe A, Orlas em Processo de Urbanização ou Classe B e Orlas com Urbanização Consolidada ou Classe C. Para as Classes B e C foram adaptados os critérios sugeridos por Oliveira (2009) de recuo urbano (ver Informação de Suporte), referentes à distância da urbanização com a praia atual, e ao tipo de construção, que se refere basicamente a estruturas horizontais e verticais. Utilizou-se como base a linha costa correspondente ao limite inferior do pós-praia, até onde há o alcance das ondas e marés.

Para uma melhor visualização dos aspectos hidrodinâmicos e urbanísticos da costa de Salinópolis foram feitos mapeamentos das classes acima identificadas na área de estudo, das condições oceanográficas em trechos distintos das faixas praiais, sugerindo-se tipos característicos de praias, e mapeamento dos locais com erosão/acresção, tendo como auxílio a tabela de Bush et al. (1999), com geoindicadores de avaliação do estado da costa (ver Informação de Suporte).

Para a caracterização da faixa praial em termos de periculosidade ao banho, foram integrados os dados de hidrodinâmica, a tabela de Short & Hogan (1993) (ver Informação de Suporte) e entrevistas/questionários aplicados aos banhistas, contendo perguntas como:

  1. Faixa etária e profissão.
  2. Motivos de frequentar praias e qual a frequência.
  3. Cuidados tomados com as crianças.
  4. A praia que mais frequenta e por quê.
  5. O grau de perigo das praias e qual deles.

 

4. Resultados

4.1. Classificação da Orla Oceânica

Salinópolis, diferentemente dos outros municípios da Costa Atlântica do Nordeste do Pará, apresenta urbanização mais densa próxima aos limites de praia. É o único município onde se observam, inclusivamente, edificações prediais sobre áreas próximas à linha de costa. Cerca de 50% da faixa de praias oceânicas de Salinópolis é limitada por zona urbanizada e a outra metade ainda se apresenta conservada.

Desta forma, a orla oceânica de Salinópolis possui diferentes características quanto à utilização e conservação, abrangendo desde a tipologia de orla natural a orla com urbanização consolidada (Figura 2). A primeira ocorre nos extremos da área de estudo (a oeste da região sede municipal e a leste da ilha do Atalaia), onde há paisagens conservadas, baixo a nulo grau de ocupação, difícil acesso (somente por pequenas trilhas e ruas), e atividades humanas apenas de subsistência ou lazer (como passeios ou práticas esportivas, a exemplo do extremo leste da ilha do Atalaia) (Figura 3b).

O trecho de costa classificado como estando em processo de urbanização em padrão horizontalizado está localizado antes deste extremo, com recuo em relação à linha de costa de, no mínimo, 50 m – B1; contudo há presença de barracas de madeira semelhantes a palafitas (com base apoiada por estruturas de madeira) que apresentam este formato para mitigar os efeitos de suas presenças em possíveis alterações nas células de circulação costeira (transporte longitudinal e transversal de sedimentos) (Figura 3a).

O trecho de orla com processo de urbanização verticalizada e sem recuo relativamente à linha de costa (distância menor que 50 m) – B4 – situa-se na principal via de acesso à faixa de praias da ilha do Atalaia, onde há médio adensamento de hotelaria e comércio (Figura 2h). Outro trecho, que compreende a praia do Atalaia (divisa desta com a praia do Farol Velho), bem como toda a praia do Farol Velho, foi classificado como orla em processo de urbanização horizontalizada e sem recuo característico – B3 (Figura 2f e Figura 2g). Trata-se do trecho da orla oceânica com ocupação diretamente sobre a linha de costa, principalmente por grandes casas de veraneio, com médio adensamento de construções e população não residente do município em quase toda sua totalidade.

Na ilha do Atalaia, as construções prediais estão, na maioria, localizadas além do limite sugerido para recuo máximo da linha de costa preservada (mais que 200 m), situando-se, contudo, em áreas antes de dunas que foram devastadas para especulação imobiliária. Na Ilha, áreas mais próximas ao oceano são mais apreciadas para uso e ocupação humana, devido a sua beleza, mas também potencial para lazer, moradia, comércio e turismo. Este último é o principal responsável pelos problemas de ordenamento do território na costa de Salinópolis, em especial na ilha do Atalaia, integrada num grande segmento costeiro em processo de urbanização, com e sem recuo característico da linha de costa (maior que 50 m e menor que 50 m, respectivamente).

O turismo, que vem se desenvolvendo de forma irregular e desordenada do ponto de vista socioambiental, descaracteriza a faixa litorânea de Salinópolis pela implantação de grandes condomínios e hotéis em loteamentos mal planejados, estes em crescente expansão no município (Cavalcante, 2001).

A região da sede municipal foi caracterizada como sendo do tipo de orla com urbanização consolidada – C, pois se trata da região primeiramente colonizada, ou seja, com ocupação mais antiga e com alto adensamento populacional.Nesta região, a área onde se situa a Orla do Maçarico foi classificada como tendo recuo urbano maior que 50 m de distância da linha de costa – C1. Um trecho de orla com urbanização consolidada mas sem este recuo foi identificado na foz do rio Sampaio (Figura 2c e 2d) – C3 e C4, área mais abrigada da ação oceânica, cuja hidrodinâmica é menos acentuada, basicamente em função das correntes do rio.

A verticalização próxima a linha de costa ocorre nas zonas mais adentro do rio, havendo um trecho com recuo urbano maior que 50 m de distância da linha de costa – C2 – localizado no lago artificial do Pedalhinho (Figura 2d), construído com o aterramento próximo à margem do rio Sampaio e construção de uma pequena estrada que separa este do lago (Figura 2f).

Na sede municipal, a ocupação é mais antiga e de alto adensamento populacional, como em locais próximos aos rios. Em função desta urbanização consolidada nos locais mais abrigados, as áreas mais expostas da costa (praias, dunas costeiras, manguezais) vêem sendo cada vez mais ocupadas, contudo de forma desordenada. A exemplo da atual expansão urbana de beira-mar rumo à ilha do Atalaia.

A partir da verificação das condições oceanográficas através dos métodos instrumentais e observacionais sugeriu-se a definição de quatro tipos de praias (Figura 4) para a costa oceânica de Salinópolis (ver síntese dos dados em Informação de Suporte):

  • Tipo 1: praia adjacente ao rio e delta de vazante, com estado morfodinâmico de banco e calha longitudinais (Ω: 4,7 a 5,5), altura de ondas abaixo de 0,50 m e correntes moderadas (em média maiores que 0,3 m.s-1), devido sua localização, com elevada influência estuarina. Praia identificada: Maçarico.
  • Tipo 2: praia com alta influência estuarina e oceânica, com estado morfodinâmico variando de banco e calha longitudinal (Ω: 4,7 a 5,5), e dissipativo (Ω > 5,5), dependendo da época do ano, alturas de ondas abaixo de 0,70 m e correntes fracas (em média menores que 0,3 m.s-1). Praia identificada: Corvina.
  • Tipo 3: praia com moderada influência estuarina e alta influência oceânica, com estado morfodinâmico dissipativo (Ω > 5,5), alturas de ondas abaixo de 0,90 m e correntes moderadas (em média maiores que 0,3 m.s-1). Praia identificada: Farol Velho.
  • Tipo 4: praia com moderada influência estuarina e alta influência oceânica, com estado morfodinâmico dissipativo (Ω > 5,5), alturas de ondas abaixo de 1,20 m e correntes fortes (em média maiores que 0,4 m.s-1). Praia identificada: Atalaia.

4.2. Vulnerabilidade dos Ambientes Costeiros

A interferência com o meio físico, principalmente no que se relaciona com a dinâmica dos processos sedimentares, é induzida, em grande parte, por ações de natureza antrópica, podendo acarretar problemas no âmbito ambiental e financeiro. Do ponto de vista ambiental, especialmente o geológico, as principais alterações são na linha de costa, decorrentes de erosões, assoreamentos, bem como de colapsos do substrato. Em relação ao fator econômico, destacam-se as perdas de moradias, edificações e estruturas localizadas à beiramar, causadas pelos processos anteriormente citados (Farinaccio & Tessler, 2010).

O trecho de costa com maiores impactos ambientais localiza-se na praia do Farol Velho, onde há ocupação diretamente na praia, não havendo reposição de areias. Por este motivo, a praia está apresentando erosão severa (Figura 5), ficando mais estreita, com uma paisagem degradada por colapso de muros, de barreiras de rochas e com afloramentos rochosos de idade terciária (Formação Pirabas) expostos em diferentes proporções (Figura 5g), alterando a topografia praial. Fatos que também ocorrem em parte da praia do Atalaia (Figura 5h), no local de divisa com a praia do Farol Velho.

Sabe-se que a ocupação do ambiente praial por casas, edificações ou outras estruturas (paredões rochosos, muros de contenção, estradas) modifica o equilíbrio sedimentar natural das praias, pois estas obras são construídas sobre o pós-praia, setor essencial para o suprimento de sedimentos.

Na praia do Atalaia, as dunas ainda presentes no litoral funcionam como repositoras de sedimentos à praia, que também sofre com a erosão costeira numa extensa faixa (Figura 5). Há dunas escarpadas por ondas e pelas grandes subidas das marés (Figura 5i), sendo a praia toda coberta pelo espraiamento de ondas, que periodicamente levam os donos de estabelecimentos (bares e restaurante) na praia a recuarem suas barracas em direção ao pós-praia (Figura 5j).

As dunas são parte integrante do balanço sedimentar de uma praia e a gestão da mesma depende também da conservação das dunas. Não obstante, muitas vezes os campos dunares são ocupados indiscriminadamente (Scherer, 2013).

Dunas foram devastadas e aterradas para ocupação de imóveis, ruas, inclusive com pavimentação asfáltica, e para loteamentos na ilha do Atalaia, causando, entre outras coisas, alteração do regime de fluxo das águas subterrâneas. Na praia do Farol Velho há apenas um campo de dunas estável, totalmente vegetado, situado após um terreno de edificações. Provavelmente, estas edificações funcionam como barreira ao vento, propiciando condições de grande estabilidade e de persistência de vegetação.

Questões como dutos emissários de efluentes e resíduos sólidos também são preocupantes na ilha do Atalaia, contaminando as praias e o lençol freático. Associado a isto, a excessiva água retirada dos poços construídos em residências, barracas de praia, hotéis e pontos comerciais está comprometendo o aquífero superior pelo processo de cunha salina, causando a salinização das águas.

Na sede municipal, os problemas ambientais relacionam- se, também, com a erosão costeira localizada na foz do rio Sampaio, na sua margem esquerda (Figura 5), embora neste caso a situação seja induzida pela hidrodinâmica estuarina. Os impactos traduzem-se, entre outros, por colapso de muros de proteção, assoreamento e solapamento basal (Figura 5e). Verificam-se, também neste setor, obras que interferem no fluxo dos canais estuarinos e que propiciam a instalação de processos erosivos e a redução de ambientes naturais, como acontece no Lago do Pedalhinho com a construção de uma via de passagem sobre o rio (Figura 5f), dotada de dutos emissores que fazem a conexão deste com o lago.

Outros locais pontuais de erosão ocorrem no local onde está a plataforma de acesso da Orla do Maçarico à praia da Corvina (Figura 5b), com colapso periódico da estrutura, principalmente durante a estação chuvosa associada às grandes subidas das marés de sizígia (marés vivas). Na divisa da praia da Corvina com a do Maçarico também há pequenos indícios de erosão, como a eexistência de vegetação de mangue tombada (Figura 5c). Áreas de acresção ou estabilidade estão localizadas essencialmente nos extremos da ilha do Atalaia.

Nas praias situadas na região da sede municipal, há campos de dunas frontais, algumas vegetadas por plantas herbáceas, principalmente na praia do Maçarico (Figura 5d), além de manguezal na praia da Corvina (Figura 5a). Este também está presente no extremo oeste da ilha do Atalaia. Já no extremo leste, existem extensos campo de dunas frontais (Figura 5k), além de praia larga e dunas robustas estáveis e semi-vegetadas na zona de pós-praia (Figura 1h).

4.3. Relação entre a periculosidade ao banho e perfil do banhista

Como as características morfodinâmicas das praias oceânicas de Salinópolis são pouco variáveis, assim como as alturas de ondas incidentes nas praias (&kt;1,5 m), o grau de periculosidade foi quase invariável, com escala de 4 a 7 (Tabela 1), de acordo com a classificação de Short & Hogan (1993). Isso indica que no trecho de costa estudado a escala de segurança é moderada a baixa, ou seja, com médio a alto grau de periculosidade. Além disso, a presença de bancos e calhas longitudinais em praias cujo regime de maré é semidiurno, constituem risco para os banhistas quando a mesma está enchendo, podendo deixá-lo isolado da costa e das saídas das praias.

Por isso, apesar da escala de segurança (4) ter sido mais baixa na praia do Maçarico (Tabela 1), deve-se considerar que a mesma situa-se numa desembocadura estuarina com presença de banco e calha longitudinais, sendo uma praia com bastante calmaria na baixa-mar, mas com energia hidrodinâmica mais elevada em níveis mais altos de maré, devido às correntes intensas de maré e não da arrebentação de ondas.

Assim, os riscos ao banho são grandes em todas as praias de Salinópolis devido aos perigos associados à hidrodinâmica local: correntes longitudinais geradas por ondas, correntes de maré e alta turbulência gerada pela arrebentação de ondas em alguns locais. Por isso, para adultos que levam crianças à praia é indicado que frequentem apenas os locais mais rasos, longe da arrebentação de ondas, onde estas e as correntes são mais fracas. A permanência nestes locais (30%) e a constante presença de adultos (31%) são os principais cuidados tomados com as crianças pelos banhistas entrevistados.

Os principais frequentadores das praias de Salinópolis são do Pará (mais de 85%), especialmente de Belém, mas muitos do interior do Estado e de estados vizinhos, como Amazonas e Amapá, onde não há praias oceânicas. São na maioria jovens, de 26 a 40 anos (cerca de 55%), de classe média e do sexo masculino, que vão às praias a passeio (47%) e para banho de mar (26%) (Figura 6a). Estes frequentam as praias de Salinópolis principalmente durante os feriados e no verão (48%) ou raramente (39%), e as outras praias do estado que costumam frequentar são principalmente estuarinas e fluviais. A maioria sabe nadar (77%), gostam de tomar banho na arrebentação de ondas (63%), mas poucos se envolveram em afogamentos (14%).

A partir desta primeira análise entende-se que os cuidados com o mar devem ser redobrados, pois a maioria não apresenta contato frequente com o ambiente praial oceânico e costumam tomar banho em áreas de risco.

A praia mais frequentada em Salinópolis é a do Atalaia, devido ao conforto e infraestrutura da praia (44%). Para seus banhistas, a praia apresenta médio grau de perigo (66%), o qual é identificado, principalmente, com o trânsito de veículos (31%) e o consumo de bebidas alcoólicas (23%) (Figura 6b). 90% dos entrevistados já souberam de acidentes ocorridos nesta praia, seja por afogamento ou por atropelamento.

No questionário foi também perguntada a opinião sobre o novo corredor de tráfego de veículos confinante à linha de costa, adotado nas férias de julho de 2014, e a maioria dos entrevistados achou bom (42%).

A segunda praia mais frequentada de Salinópolis é a do Farol Velho, com médio grau de perigo (32%), sendo este variado (Figura 6c), igualando-se o trânsito de veículos (22%) e as marés altas (22%). Isto é justificado quando se tem em consideração que a praia do Farol Velho é uma praia estreita, onde a maré sobe rapidamente, e que tem depressões no seu leito representadas por poças d’água originadas junto aos afloramentos rochosos, o que cria condições de risco.

As praias da Corvina e Maçarico são mais freqüentadas por moradores locais (nativos), que utilizam as praias para prática de esporte como futebol, para a atividade de pesca por trabalhadores autônomos e para banho de mar, especialmente as crianças. Na praia do Maçarico tal sucede devido a sua calmaria na baixa-mar, Para surfistas e praticantes de outros esportes aquáticos, as praias apresentam alturas de ondas medianas, mas as mesmas são do tipo deslizante, menos desejáveis por esse grupo de pessoas. No entanto, para praticantes de Kite Surf e Wind Surf, os ventos fortes, especialmente na praia do Atalaia, e as correntes mais intensas, são favoráveis. Na praia do Farol Velho, a presença dos afloramentos rochosos oferece maior risco.

Para frequentadores de outros estados que não conhecem o estado do mar em praias de macromarés, deve-se ter atenção redobrada, pois as correntes longitudinais geradas por ondas são acrescidas por fortes correntes de maré e podem transportar banhistas por longas distâncias. Além disso, há fatores antropogênicos que podem adicionar riscos e vulnerabilidade às praias, incluindo multidões de férias, veículos nas praias e estruturas de praia construídas (Pereira et al., 2014).

 

5. Discussão e considerações finais

A região da sede municipal de Salinópolis foi caracterizada como o trecho de orla com urbanização consolidada, pois se trata da região com ocupação mais antiga e de alto adensamento populacional. Este fato propicia a atual expansão urbana de beira-mar rumo à ilha do Atalaia.

O maior trecho de orla com urbanização consolidada sem recuo urbano caracterizado (distância menor que 50 m da linha de costa) foi identificado na foz do rio Sampaio, área mais abrigada ao oceano aberto, cuja hidrodinâmica é mais baixa e restringe-se aos processos físicos e geológicos que ocorrem no rio, sendo o maior agravante a erosão nas margens do rio (solapamento basal) causada pela força das correntes de maré. A ocupação mais abrigada reflete um melhor ordenamento territorial nas décadas passadas na costa de Salinópolis, cuja consciência humana era maior quanto à preservação ambiental e às prevenções das respostas naturais que o ambiente oferece.

O trecho da costa oceânica com maiores impactos ambientais localiza-se atualmente na praia do Farol Velho e no início da praia do Atalaia, a partir da divisa com a praia anterior. Trata-se do trecho classificado como em processo de urbanização, principalmente horizontal, e sem recuo característico. Apresenta ocupação diretamente sobre a praia, principalmente por grandes casas de veraneio, com médio adensamento de construções e com a particularidade de que quase todas as residências que ali estão são de população não residente no município. Não havendo nenhum ambiente sedimentar costeiro na zona de pós-praia que favoreça a reposição de areias na zona de espraiamento, Farol Velho e parte do Atalaia estão apresentando erosão severa, ficando mais estreitas e com uma paisagem degradada.

As construções prediais, na ilha do Atalaia, estão quase todas localizadas além do limite sugerido para recuo máximo de urbanização na linha de costa (mais de 200 m da mesma), situando-se, contudo, em áreas antes das dunas, que foram devastadas para especulação imobiliária. Esta devastação no ambiente causa, entre outras coisas, alteração do regime de fluxo das águas subterrâneas, interrompendo o processo de recarga do aquífero, que já sofre com o processo de cunha salina e contaminação do lençol freático por efluentes e resíduos sólidos. As dunas contribuem como fonte de recarga do aquífero pela sua capacidade de recepção, infiltração e transferência de águas de chuvas. Contudo, é possível identificar na praia do Farol Velho casas suspensas em morros dunares com base concretada e, até mesmo, algumas em condições mais fragilizadas sobre morros com solo ainda arenoso. Em outra seção de praia na ilha do Atalaia (extremo leste), as dunas, ainda presentes na costa, funcionam como repositoras de sedimentos.

Áreas de acresção ou estabilidade estão localizadas, na quase totalidade, nas praias do Maçarico e da Corvina, classificadas como tipo 1 e 2, respectivamente, com estado morfodinâmico de banco e calha longitudinal ou dissipativo, dependendo da época do ano, bem como existindo grande influência estuarina.

Praias do tipo 3 e 4 situam-se, respectivamente, na ilha do Atalaia e no Farol Velho e Atalaia, sendo praias dissipativas com grande influência oceânica. Contudo, nos extremos da ilha, a ação estuarina desempenha importante papel de acresção sedimentar.

O grau de periculosidade ao banho nas praias oceânicas de Salinópolis é médio a alto. Os riscos ao banho estão associados à hidrodinâmica local, sendo eles: as correntes longitudinais e de marés, a alta turbulência gerada pela arrebentação de ondas em alguns locais (como na praia do Atalaia) e, nalguns locais, também a presença de canais longitudinais (como nas praias da Corvina e do Maçarico).

As praias mais frequentadas de Salinópolis são primeiramente a do Atalaia e, secundariamente, a do Farol Velho. Os principais perigos potenciais identificados por banhistas entrevistados nestas praias são o trânsito de veículos e as marés altas. O primeiro foi identificado, principalmente, na praia do Atalaia, onde o fluxo é bastante intenso e os carros disputam espaço com os banhistas. O segundo foi referido na praia do Farol Velho, devido a mesma ser uma praia estreita, onde a maré sobe rapidamente.

 

Agradecimentos

Ao Grupo de Estudos Marinhos e Costeiros (GEMC) da Universidade Federal do Pará (UFPA) pela parceria na realização deste trabalho. Ao Programa de Pós-Graduação em Geologia e Geoquímica (PPGG) da UFPA e à Fundação do Amparo à Pesquisa do Estado do Pará (FAPESPA) pelo financiamento de bolsa de estudos.

 

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*Submission: 24 NOV 2014; Peer review: 9 JAN 2015; Revised: 9 MAR 2015; Accepted: 8 MAY 2015; Available on-line: 11 MAY 2015

Appendix

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