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Medievalista

versão On-line ISSN 1646-740X

Medievalista  no.28 Lisboa jul. 2020

 

EDITORIAL

A Medievalista e a continuidade das mudanças

Medievalista - continuity and change


 

A Medievalista renovou-se e a vários títulos. Para começar, simplificou o nome e renunciou ao on line no título, que fizera sentido em 2005, quando Luís Krus a criou e eram poucas as revistas electrónicas. Se o apodo era testemunho do suporte que a revista escolhia, não havia então, nem há agora, outra Medievalista e ele nunca foi necessário para a designar, nem para a distinguir. Desapareceu desta vez, sem que o facto altere a natureza electrónica da revista e a sua disponibilização em acesso aberto.

A mudança do nome acompanhou outras modificações. Uma foi interna e consistiu na alteração do director da Medievalista. O facto não é novidade na história da revista, onde a rotação dos mandatos sempre se encarou como uma rotina habitual, salutar em todos os grupos e instituições. Essa alternância não terá outras consequências, tanto mais que o anterior director se manterá como membro activo da Redacção. A segunda delas é mais facilmente reconhecível e passou pela renovação do grafismo que a revista agora apresenta e que se manterá nos próximos números. Não foi a primeira vez que isso aconteceu: em 2010, ao celebrar os primeiros cinco anos de publicação, já se modificara o figurino precedente.

Mas a actual renovação gráfica é diferente. Em boa parte, porque resulta de uma decisão estratégica, que vinha a ser há muito discutida e preparada pela Redacção e que era necessária para resolver os custos e os problemas postos pela comunicação entre os conteúdos da Medievalista e as plataformas que a indexavam e divulgavam (Scielo, Lusopen, Dialnet, Latindex, etc). Do ponto de vista técnico, a transferência entre elas exigia trabalhos adicionais para adequar os textos aos seus distintos critérios e um investimento que nos últimos anos crescera mais que o orçamento da Medievalista. O problema resolveu-se através do abandono do sistema anterior e da adopção de um programa de gestão e de edição de revistas electrónicas, o Open Journals Systems (OJS), de acesso aberto e que facilita a migração dos conteúdos para aquelas plataformas. Pelas novidades e alterações que implicava, a transferência para o novo programa foi aproveitada para renovar o grafismo da revista.

Com tantas mudanças, manteve-se o que era essencial. A Medievalista preservou a herança do passado - processo de avaliação duplamente anónimo (autor e avaliadores), abertura a investigadores doutras geografias e doutras línguas, aposta na difusão de novos estudos através da organização de dossiers e de números temáticos -, e conservou boa parte da sua identidade gráfica, talvez até com algum ganho de causa. Mas ela pode fazer mais e quer fazer melhor. Se é verdade que o novo programa de gestão e de edição simplifica o processo de submissão de artigos e de proposta de dossiers e de números temáticos, podendo permitir o aumento das submissões com outras proveniências, a Medievalista pretende multiplicar essas colaborações e afirmar-se como uma revista de referência internacional nos estudos medievais. Tal como já aconteceu em números anteriores e volta a suceder no actual, apostará na edição regular de dossiers com abordagens inovadoras e multidisciplinares, capazes de cruzar diferentes realidades e perspectivas. Mas procurará dar, de igual modo, um carácter mais sistemático e mais abrangente a algumas das rubricas habituais. Como as recensões, as notícias, e, em particular, as apresentações de teses, que podem e devem servir como montra do que de melhor se vai fazendo num medievalismo que ganha cada vez mais uma escala global. Por estar certa do interesse e da competência do trabalho já realizado, a Medievalista espera que a qualidade da sua actividade editorial seja reconhecida, à imagem do que aconteceu recentemente com a investigação desenvolvida nos últimos anos pelo Instituto de Estudos Medievais.

O número actual não foge aos propósitos atrás enunciados. Dele faz parte um dossier sobre o papel dos eclesiásticos na diplomacia, na administração e na legitimação das monarquias medievais, coordenado por Maria João Branco e por Hermínia Vilar. Ainda que este seja adiante apresentado por quem de direito, há que sublinhar a diversidade dos estudos e das perspectivas, bem como a importância das colaborações vindas de outros países e de outras historiografias. Que se regista com agrado.

O número integra, ainda, outros três artigos, vindos de áreas disciplinares distintas e todos de autores exteriores à península. No primeiro deles, Leandro Rust oferece uma estimulante análise dos processos de confronto e de afirmação dos poderes eclesiásticos na Florença do século XI, feita a partir do questionamento específico do papel das emoções nessas dinâmicas. Insere-se num campo historiográfico em afirmação, e, pela variedade das fontes e pelo prisma com que estas foram analisadas, traz observações importantes sobre a relação do discurso histórico com a narrativa literária e sobre o papel das emoções na construção de uma visão mais complexa do passado. Por outro lado, Gilson Linhares trata o universo da filosofia tomista, discutindo e problematizando o lugar do realismo directo na gnoseologia do Doutor dominicano. Por fim, Mary Magdy Anwar propõe um itinerário pela geografia do mundo cristão copta. Pelas suas igrejas e pelo papel que nelas tinham as diferentes fontes, evocativas, desde logo, da centralidade do baptismo na tradição cristã, sem descartar outros usos da água, como elemento de purificação ritual, ou integrador de outras celebrações sacramentais, como a unção dos doentes. Os dados apresentados estimulam o interesse pelo universo menos conhecido desta outra tradição cristã, que desde os primeiros séculos medievais se distinguiu da ortodoxia vigente e se afirmou através de costumes muito próprios.

Nas secções seguintes mantem-se a diversidade das abordagens e das proveniências dos autores. Assim nas recensões, com a apresentação de obras sobre a história urbana e a estruturação das casas senhoriais, a arqueologia tardoantiga e altomedieval, ou sobre o tema das epidemias, infelizmente tão actual. Assim nas teses apresentadas, agora com um maior peso das que foram defendidas em Espanha. Aí se divulgam investigações inovadoras nos domínios da arquivística histórica, em particular dos arquivos de família, pela mão de Alice Borges Gago; da configuração do monacato nos condados catalães dos séculos IX e X, numa região de fronteira entre a área de influência carolíngia e o espaço ibérico, estudada por Xavier Costa Badia; e dos discursos de guerra santa e da construção da memória das primeiras batalhas do Islão no al-Andaluz, analisados com perspicácia por Javier Albarrán Iruela. Assim, também, na Varia, com notícias de eventos promovidos por várias entidades, desde congressos a exposições. Como se desta junção de áreas diversas, da história à arqueologia, à literatura e à história da arte, resultasse uma outra polifonia.

Como seria de esperar, termina-se com o texto de abertura. Da responsabilidade de Armando Luís de Carvalho Homem, faz-se nele uma justa e sentida homenagem a dois historiadores franceses recentemente falecidos, por causa da actual pandemia: Francis Rapp e Michel Parisse. Fazer memória do seu contributo é um dever de elementar justiça no âmbito do medievalismo europeu, que tanto recebeu dos seus estudos, das equipas e projectos que lideraram, ou das sínteses que propuseram sobre aspectos tão fundamentais da história comum. Ao mesmo tempo, eles constituem um desafio à constante reinvenção da investigação no campo das ciências sociais e humanas, ao rigor e à abertura ao novo e ao diferente e aos questionamentos com que se abrem outras perspectivas. É com estes singelos avanços que se constrói um saber que procura, afinal, a compreensão mais profunda e integradora da condição humana e dos traços da sua construção no espaço e no tempo em que esta inevitavelmente acontece.

A Medievalista

 

Como citar este artigo | How to quote this article:

Redacção - “Editorial”. Medievalista 28 (Julho-Dezembro 2020), pp. 5-8 [Consultado dd.mm.aaaa]. Disponível em https://medievalista.iem.fcsh.unl.pt.

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