SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.16 número3A relevância do índice de anisocitose na doença carotídeaEndoleak tipo 1A tardio após EVAS: um desafio único índice de autoresíndice de materiabúsqueda de artículos
Home Pagelista alfabética de revistas  

Servicios Personalizados

Revista

Articulo

Indicadores

Links relacionados

  • No hay articulos similaresSimilares en SciELO

Compartir


Angiologia e Cirurgia Vascular

versión impresa ISSN 1646-706X

Angiol Cir Vasc vol.16 no.3 Lisboa set. 2020

 

CASOS CLÍNICOS

Técnica de CRISS-CROSS no tratamento de trombose venosa profunda do membro inferior - a propósito de um caso clínico

A case report on the CRISS-CROSS technique for lower limb venous thrombosis

Carlos Veterano1, Luís Loureiro1, Gabriela Teixeira1, Inês Antunes1, Carlos Veiga1, Daniel Mendes1, Henrique Rocha1, João Castro1, Pedro Sá Pinto1, Rui Almeida1

1Serviço de Angiologia e Cirurgia Vascular - Centro Hospitalar Universitário do Porto

Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence


 

RESUMO

Introdução: A técnica criss-cross combina acesso vascular anterógrado e retrógrado da veia poplítea, de modo a obter recanalização venosa em doentes com trombose venosa profunda (TVP) ileofemoral associada a trombose das veias poplítea e gemelares.

Caso clínico: Doente do sexo feminino de 57 anos, com antecedentes de histerectomia radical e linfadenectomia de nódulos linfáticos pélvicos em 2013, devido a neoplasia uterina, com consequente linfedema crónico do membro inferior direito. Admitida na urgência por edema grave do membro inferior direito, com 7 dias de evolução. À observação, a paciente apresentava edema da coxa e perna, cianose da perna, dor gemelar, extremidades quentes e pulsos distais palpáveis. Estudo com ecodoppler a objetivar trombose dos eixos venosos do membro inferior direito. Estudo com TC contrastado excluiu extensão proximal do trombo para a veia ilíaca comum direita ou veia cava; excluiu tromboembolismo pulmonar e evidenciou clips cirúrgicos em proximidade com a veia ilíaca externa direita, causando uma respetiva redução luminal superior a 50%. A doente foi submetida a trombectomia e fibrinólise dirigida por cateter. Obteve-se acesso vascular através de punção ecoguiada da veia poplítea. Após colocação de introdutores em sentido retrógrado e anterógrado, realizou-se trombectomia das veias gemelares até à veia femoral comum, com recurso a aspiração por cateter. Instituiu-se perfusão de alteplase e heparina não fracionada por via periférica, mantidas durante 72 horas, com controlo angiográfico a cada 24h. Após recanalização satisfatória, realizou-se angioplastia com balão 14x40mm, seguida de stent 14x80mm na veia ilíaca externa. Não ocorreram complicações hemorrágicas major. O tratamento invasivo foi complementado com drenagem postural e meia elástica compressiva, permitindo melhoria clínica imediata e progressiva. Após dois dias, a doente recebeu alta medicada com heparina de baixo peso molecular. Em consulta de follow-up após um mês, constatou-se melhoria clínica progressiva e alterada hipocoagulação para rivaroxabano ad aeternum.

Conclusão: A técnica de criss-cross permite recanalização do inflow e outflow, restaurando patência venosa e mantendo a função valvular, aspetos com eventual papel crítico nos resultados após TVP ileofemoral extensa.

Palavras-chave: Técnica criss-cross; trombose venosa profunda; trombólise dirigida por cateter


 

ABSTRACT

Introduction: The criss cross technique combines antegrade and retrograde vascular access to the popliteal vein in order to achieve venous recanalization in patients with acute iliofemoral deep venous thrombosis (DVT) with concomitant popliteal and calf vein thrombosis.

Case report: We report a 57-year-old female, with a background of radical hysterectomy and pelvic lymphadenectomy in 2013 due to uterine tumour, resulting in right lower limb chronic lymphedema. Admitted in the emergency service due to severe right lower limb oedema, beginning 7 days before. Upon observation the patient presented severe leg and thigh oedema, leg cyanosis, swollen and painful calf, warm extremities and palpable peripheral pulses. Venous ultrasound exposed thrombosis of the lower limb veins. Contrast CT confirmed the ultrasound findings, excluded proximal extension of the thrombus to the right common iliac vein or the vena cava, excluded pulmonary thromboembolism and exposed surgical staples in close relation with the right external iliac vein causing a >50% luminal reduction. The patient underwent thrombectomy and catheter directed thrombolysis. Venous access was obtained with ultrasound-guided popliteal vein puncture. After anterograde and retrograde sheaths placed in the popliteal vein, thrombectomy using catheter aspiration was performed in the calf veins and up to the common femoral vein. Thrombolytic infusion with alteplase and peripheral unfractionated heparin infusion was initiated and maintained for 72 hours with a control phlebography performed every 24 hours. We achieved satisfactory recanalization and performed an angioplasty with a 14x40mm balloon followed by a 14x80mm stent deployment on the external iliac vein. There were no major haemorrhagic complications. The invasive treatment was complemented with postural drainage and compressive stockings, leading to an immediate and progressive clinical improvement. Two days later the patient was discharged and prescribed a low molecular weight heparin. A month later, on a scheduled appointment, progressive clinical improvement was reported and life-long rivaroxaban prescribed.

Conclusion: The criss-cross technique allows for inflow and outflow thrombus removal, restoring venous patency and maintenance of valve function which may play a critical part on the outcome after iliofemoral DVT.

Keywords: Criss-cross technique; deep venous thrombosis; catheter directed thrombolysis


 

Introdução

As estratégias interventivas para remoção de trombo (cirúrgicas ou endovasculares) têm um papel na redução da incidência do síndrome pós-trombótico (SPT) e melhoria da qualidade de vida nos doentes com trombose venosa profunda (TVP) extensa dos membros inferiores. Técnicas farmacomecânicas para remoção do trombo diminuem o tempo de tratamento, dose de fibrinolítico, estadia em unidades cuidados intensivos e estadia hospitalar(1-3). O benefício na qualidade de vida após episódio de TVP tem correlação direta com o volume de trombo removido(4), sendo que quanto maior a lise de trombo alcançada, menores os sintomas de SPT observados(5). Tendo em conta o supracitado, e apesar da inexistência de evidência, prevê-se provável benefício no restabelecimento da patência das veias gemelares em doentes com TVP ileofemoral extensa. A técnica criss-cross combina acesso vascular anterógrado e retrógrado (criss-cross) da veia poplítea, de modo a obter recanalização venosa em doentes com TVP ileofemoral associada a trombose das veias poplítea e gemelares(6).

Caso clínico

Doente do sexo feminino, 57 anos, com antecedentes de hipertensão arterial e dislipidemia. Em 2013, devido a neoplasia uterina, submetida a histerectomia radical e linfadenectomia de nódulos linfáticos pélvicos, com consequente linfedema crónico do membro inferior direito.

Recorre ao serviço de urgência por edema grave do membro inferior direito, com 7 dias de evolução, sem queixas respiratórias. Sem referência a eventos precipitantes de trombose. À observação, a doente apresentava edema grave da coxa e perna, cianose da perna, dor gemelar, extremidades quentes e pulsos distais palpáveis. O ecodoppler venoso evidenciou trombo de ligeira ecogenicidade a condicionar incompressibilidade e oclusão total das veias ilíaca externa, femoral comum, femoral, poplítea, gemelares e grande safena, do membro inferior direito. A extremidade cefálica do trombo na veia ilíaca externa não foi passível de observação. Trombose do membro inferior esquerdo foi excluída, e observaram-se fluxos com fasicidade respiratória na veia femoral comum esquerda, sugerindo ausência de obstrução proximal, nomeadamente da veia cava. O estudo com TC contrastado confirmou os achados ecográficos; excluiu extensão proximal do trombo para a veia ilíaca comum direita ou veia cava; excluiu tromboembolismo pulmonar e evidenciou clips cirúrgicos em proximidade com a veia ilíaca externa direita, causando uma respetiva redução luminal superior a 50% (Figura 1).

 

 

A doente foi submetida a trombectomia e fibrinólise dirigida por cateter. Obteve-se acesso vascular através de punção ecoguiada da veia poplítea. Após colocação de introdutores em sentido retrógrado (5F) e anterógrado (8F) (Figuras 2 e 3), realizou-se trombectomia das veias gemelares até à veia femoral comum, com recurso a aspiração por cateter MPA 8Fr (anterógrado) e cateter reto 5Fr (retrógrado) (Figura 4). Instituiu-se perfusão de alteplase (0.5mg/h por cada cateter) e heparina não fracionada por via periférica (500UI/h), mantidas durante 72 horas, com controlo angiográfico a cada 24h. Após recanalização satisfatória, realizou-se angioplastia com balão 14x40mm, seguida de stent 14x80mm na veia ilíaca externa, com excelente resultado angiográfico (Figuras 5 e 6). Não ocorreram complicações hemorrágicas major ou minor. O tratamento invasivo foi complementado com drenagem postural e meia elástica compressiva, obtendo-se melhoria clínica imediata e progressiva. Após dois dias, a doente recebeu alta medicada com heparina de baixo peso molecular (HBPM). Em consulta de follow-up após um mês, constatou-se melhoria clínica progressiva e alterada hipocoagulação para rivaroxabano ad aeternum. A preferência pela HBPM durante ao primeiro mês deveu-se ao facto de estar em curso o estudo para despiste de neoplasia, para o qual não se considerou o rivaroxabano a melhor opção inicial, até este estar concluído. Por motivos alheios aos autores, não foi realizado o estudo com ecodoppler venoso na data da consulta de follow-up.

 

 

Discussão

Procedimentos de remoção de trombo demonstraram uma melhoria nos resultados dos doentes(7,8), sendo que a fibrinólise dirigida por cateter é o tratamento de escolha na maioria dos doentes que não apresentam contraindicação a tratamento fibrinolítico. Apesar de bons resultados com esta estratégia, os tempos de tratamento para lise eficaz são frequentemente longos, aumentando risco hemorrágico e custo associado.

A par de outras técnicas, a trombectomia através de aspiração endovascular por cateter poderá ser uma alternativa eficaz para diminuição da carga trombótica. Jia et al reportaram uma taxa de sucesso técnico de 100% neste procedimento, complementando ou não com fibrinólise dirigida por cateter(9). É de referir o benefício destas técnicas em doentes com contraindicação para fibrinólise.

Um subgrupo de doentes com TVP ileofemoral e concomitante trombose das veias poplítea e tibiais proximais, apresentam maior probabilidade de SPT grave. O não desenvolvimento frequente de colateralidade nessa região resulta em hipertensão venosa distal grave. Este subgrupo deverá ser sempre considerado para remoção de trombo(10).

Ainda está por comprovar o benefício da abordagem de trombose das veias da perna, em doentes com TVP ileofemoral. Labropoulus et al mostraram que mesmo TVP gemelar distal está associada a pior prognóstico clínico em doentes com TVP proximal(11). A redução do inflow poplíteo causado por trombose de veias gemelares poderá motivar recorrência de TVP. Contudo, Jeyabalan et al concluíram que a trombose de inflow (poplíteo ou gemelar) não influenciou a taxa de SPT ou patência venosa após fibrinólise em doentes com TVP ileofemoral(12).

O presente caso clínico representa o sucesso técnico e clínico da estratégia de criss-cross, com recanalização das veias gemelares, poplítea, femorais e ilíaca externa. A fibrinólise dirigida por cateter complementada com remoção mecânica de trombo permite uma redução da carga de trombo e de eventuais complicações hemorrágicas favorecidas pelo tempo prolongado de fibrinólise.

Conclusão

A técnica de criss-cross permite recanalização do inflow e outflow, restaurando patência venosa e mantendo a função valvular, aspetos com eventual papel crítico no resultado após TVP ileofemoral extensa com concomitante trombose das veias da perna.

 

REFERÊNCIAS

1. Martinez Trabal JL, Comerota AJ, LaPorte FB, Kazanjian S, DiSalle R, Sepanski DM. The quantitative benefit of isolated, segmental, pharmacomechanical thrombolysis (ISPMT) for iliofemoral venous thrombosis. J Vasc Surg. 2008;48(6):1532-1537. DOI: 10.1016/j.jvs.2008.07.013        [ Links ]

2. Parikh S, Motarjeme A, McNamara T, et al. Ultrasound-accelerated Thrombolysis for the Treatment of Deep Vein Thrombosis: Initial Clinical Experience. J Vasc Interv Radiol. 2008;19(4):521-528. DOI: 10.1016/j.jvir.2007.11.023        [ Links ]

3. Lin PH, Zhou W, Dardik A, et al. Catheter-direct thrombolysis versus pharmacomechanical thrombectomy for treatment of symptomatic lower extremity deep venous thrombosis. Am J Surg. 2006;192(6):782-788. DOI: 10.1016/j.amjsurg.2006.08.045        [ Links ]

4. Grewal NK, Martinez JT, Andrews L, Comerota AJ. Quantity of clot lysed after catheter-directed thrombolysis for iliofemoral deep venous thrombosis correlates with postthrombotic morbidity. J Vasc Surg. 2010;51(5):1209-1214. DOI: 10.1016/j.jvs.2009.12.021        [ Links ]

5. Comerota AJ, Grewal N, Martinez JT, et al. Postthrombotic morbidity correlates with residual thrombus following catheter-directed thrombolysis for iliofemoral deep vein thrombosis. J Vasc Surg. 2012;55(3):768-773. DOI: 10.1016/j.jvs.2011.10.032        [ Links ]

6. Rego DC, Ahmed AKS, O’Sullivan GJ. Addressing Infra-popliteal Thrombus in Iliofemoral DVT: The Criss-Cross Technique. Cardiovasc Intervent Radiol. 2018;41(7):1095-1099. DOI: 10.1007/s00270-018-1918-z        [ Links ]

7. Plate G, Eklöf B, Norgren L, Ohlin P, Dahlström JA. Venous thrombectomy for iliofemoral vein thrombosis-10-year results of a prospective randomised study. Eur J Vasc Endovasc Surg. 1997;14(5):367-374. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/9413377. Accessed June 15, 2019.         [ Links ]

8. Enden T, Haig Y, Kløw N-E, et al. Long-term outcome after additional catheter-directed thrombolysis versus standard treatment for acute iliofemoral deep vein thrombosis (the CaVenT study): a randomised controlled trial. Lancet (London, England). 2012;379(9810):31-38. DOI: 10.1016/S0140-6736(11)61753-4        [ Links ]

9. Jia Z, Tu J, Zhao J, et al. Aspiration thrombectomy using a large-size catheter for acute lower extremity deep vein thrombosis. J Vasc Surg Venous Lymphat Disord. 2016;4(2):167-171. DOI: 10.1016/j.jvsv.2015.09.009        [ Links ]

10. Sidawy AP, Perler BA. Rutherford’s Vascular Surgery and Endovascular Therapy. 9th editio. (Elsevier, ed.). Elsevier Inc.; 2019.         [ Links ]

11. Labropoulos N, Waggoner T, Sammis W, Samali S, Pappas PJ. The effect of venous thrombus location and extent on the development of post-thrombotic signs and symptoms. J Vasc Surg. 2008;48(2):407-412. DOI: 10.1016/j.jvs.2008.03.016        [ Links ]

12. Jeyabalan G, Marone L, Rhee R, et al. Inflow thrombosis does not adversely affect thrombolysis outcomes of symptomatic iliofemoral deep vein thrombosis. J Vasc Surg. 2011;54(2):448-453. DOI: 10.1016/j.jvs.2011.02.033        [ Links ]

 

Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence

Correio eletrónico: carlosveterano.cv@gmail.com (C. Veterano).

 

Responsabilidades éticas

Proteção de pessoas e animais.

Os autores declaram que para esta investigação não se realizaram experiências em seres humanos e/ou animais.

Confidencialidade dos dados.

Os autores declaram que não aparecem dados de pacientes neste artigo.

Direito à privacidade e consentimento escrito.

Os autores declaram que não aparecem dados de pacientes neste artigo.

Conflitos de interesse.

Nenhum.

 

Recebido a 15 de junho de 2019. Aceite a 16 de setembro de 2020.

Creative Commons License Todo el contenido de esta revista, excepto dónde está identificado, está bajo una Licencia Creative Commons