SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.14 número3Retração tardia do saco aneurismático da aorta abdominal após colocação de endoprótese índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Angiologia e Cirurgia Vascular

versão impressa ISSN 1646-706X

Angiol Cir Vasc vol.14 no.3 Lisboa set. 2018

 

EDITORIAL

In Memoriam Professor António Braga (1931-2018)

Armando Mansilha

Presidente da Sociedade Portuguesa de Angiologia e Cirurgia Vascular


 

OBRIGADO PROFESSOR ANTÓNIO BRAGA

IN MEMORIAM (1931-2018)

 

 

Neste meu primeiro Editorial como Presidente da Sociedade Portuguesa de Angiologia e Cirurgia Vascular (SPACV) não podia deixar de prestar a devida homenagem à memória do nosso primeiro Presidente e Sócio Emérito, Professor Doutor António Braga.

Nasceu a 10/06/1931 em Ramalde, no Porto. Frequentou o ensino primário no Colégio Universal e o ensino secundário no Liceu Rodrigues de Freitas.

Licenciou-se em Medicina em 1955, na Faculdade de Medicina do Porto, com a classificação de 19 valores. Durante o seu percurso como estudante universitário recebeu os seguintes prémios atribuídos aos melhores classificados das respetivas disciplinas: Adelaide Fontes (Obstetrícia e Ginecologia), Cândido de Pinho (Obstetrícia), Tito Fontes (Patologia Médica), Idalina de Almeida (Clínica Médica), Rotary Club do Porto (melhor aluno do ano letivo).

Iniciou a sua carreira docente nesse mesmo ano como assistente voluntário do 1º grupo de disciplinas. Ministrou aulas práticas de Anatomia Descritiva, Anatomia de Superfície, Histologia, tendo praticado algumas disseções cadavéricas para aulas posteriores.

Foi assistente de Clínica Cirúrgica de 1958 até 1978.

Em 1967 prestou provas de exame da especialidade de cirurgia geral da Ordem dos Médicos, tendo sido aprovado por unanimidade.

Prestou provas de doutoramento em Setembro de 1969, na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP), tendo sido aprovado com 18 valores. Tendo a sua dissertação versado sobre “Oclusão arterial femoro-poplítea: contribuição para o seu estudo” afirmou então nessa altura “Não deve o cirurgião alhear-se da patologia que motiva a sua intervenção; é legítimo e aceitável que procure meios de evitar a doença cirúrgica em geral e a aterosclerose em particular”.

De 1969 a 1971 fez comissão de serviço militar em Moçambique, tendo desempenhado os seguintes cargos ou funções: Diretor da enfermaria do setor B (Mueda); Diretor da enfermaria de Cirurgia do Hospital Militar de Lourenço Marques; Presidente da Comissão de controle do apetrechamento do bloco operatório de um futuro hospital militar em Lourenço Marques; Regente de Patologia Cirúrgica da Faculdade de Medicina da Universidade de Lourenço Marques, em acumulação autorizada com o serviço militar.

Nesta comissão de serviço em Moçambique recebeu três louvores: do Diretor do Hospital Militar de Nampula (1969), do Comandante do Batalhão de Caçadores 15 (Mueda, 1970) e do Diretor do Hospital Militar de Lourenço Marques (1971). Recebeu também um louvor do Comandante da Região Militar de Moçambique (General Kaúlza de Arriaga).

Regressou a Portugal em Agosto de 1971, ocupando o cargo de Professor Auxiliar de Clínica Cirúrgica, mantendo simultaneamente o seu vínculo à equipa de Cirurgia Vascular.

Em Novembro de 1971, a convite do Prof. Álvaro Rodrigues, iniciou comissão de serviço civil como Professor Auxiliar da Faculdade de Medicina da Universidade de Luanda, tendo exercido as seguintes funções: Regente das disciplinas de Propedêutica e de Clínica Cirúrgica, Diretor do Serviço de Cirurgia 1 e do Bloco Operatório do Hospital Universitário de Luanda.

Regressou definitivamente a Portugal em 1974, sendo reintegrado no Serviço onde estivera anteriormente, e tendo nessa altura ministrado aulas de Propedêutica Cirúrgica.

Em 1975 teve lugar o processo de equiparação dos médicos da carreira docente aos graus da carreira hospitalar e nessa altura, por concurso documental, foi equiparado a Chefe de Clínica de Cirurgia Geral e de Cirurgia Vascular, tendo optado por Cirurgia Vascular.

O Serviço de Cirurgia Vascular do Hospital de São João foi criado oficialmente em 24 de Fevereiro de 1978, tendo sido o seu fundador e nomeado primeiro Diretor de Serviço, cargo que exerceu ininterruptamente até à sua jubilação em Junho de 2001.

 

 

Elaborou, com a colaboração da Dra. Fernanda Viana, as primeiras normas de funcionamento do Serviço, abrangendo toda a área geométrica, as áreas funcionais e o elencar das diversas funções do pessoal colaborador. Criou o Laboratório Vascular, inicialmente composto por um pletismógrafo volumétrico PVR III com duas sondas doppler com registo bidirecional.

De 1977 a 1982 foi membro da direção médica do Hospital de São João na qualidade de Diretor do Internato Médico e por isso membro do Conselho Nacional do Internato Médico.

Em 1977 foi nomeado membro do Conselho Regional de Ensino e Educação Médica e em 1979 membro do Conselho Nacional de Ensino e Educação Médica. Foi membro da Comissão de Ingresso no Internato Complementar Hospitalar, de Saúde Pública e de Clínica Geral (DR, II série, nº 242). Foi o Presidente do júri dos concursos de ingresso no internato complementar, por indicação da tutela (1978-1982). Tendo solicitado a cessação do cargo, foi-lhe esta concedida com agradecimento público do Senhor Ministro da Saúde (DR, II série nº 112 de 27/05/1982).

Em 1978 prestou provas para professor extraordinário de Cirurgia, tendo sido aprovado por unanimidade e obtendo assim o grau de Professor Agregado. É nomeado em 1980 Professor Catedrático de Cirurgia. Foi também Diretor do Serviço de Cirurgia Vascular da FMUP até à sua jubilação em 2001.

Em 1979 integra a comissão encarregada da criação e funcionamento da especialidade na Ordem dos Médicos (OM), após o seu reconhecimento oficial como especialidade independente em 1978. Essa comissão propôs os nomes dos médicos que deveriam figurar como os primeiros especialistas pela OM, propôs as normas de funcionamento e definiu a metodologia de formação dos internos da especialidade. De salientar o reconhecimento internacional obtido pelos documentos gerados, tendo sido Portugal um dos países pioneiros a nível europeu.

Foi presidente do Conselho Científico da FMUP de 1982 a 1984 e vice-presidente do Conselho Diretivo de 1996 a 1999, tendo como presidente o Prof. Doutor Pinto Machado. Foi representante do Grupo de Cirurgia entre 1995 e 1998.

Desempenhou igualmente outras funções como: Diretor do Serviço de Cirurgia Experimental da FMUP, Assessor da Direção do Hospital para a atividade de transplantação, Diretor da atividade de transplantação renal e primeiro Diretor do Gabinete de Coordenação de Colheitas de Órgãos de Transplantação, Membro do conselho diretivo da Sociedade Portuguesa de Endoscopia e Cirurgia Endoscópica (SPECE), Presidente na área da Angiologia na SPECE, Membro da Comissão de Equivalências da Ordem dos Médicos, Diretor do Serviço de AngioRadiologia do Hospital de São João.

Na área pedagógica foi também: orientador de 4 monografias de fim de curso, orientador de 4 teses de doutoramento, presidente ou vogal de numerosos júris de concursos da carreira docente e hospitalar.

Foi membro da Sociedade Portuguesa de Cirurgia, membro fundador da Sociedade Portuguesa de Cirurgia CardioTorácica e Vascular e Presidente em 1991-1993, membro do Conselho Nacional de Transplantação e Presidente Honorário do V Congresso da Sociedade Portuguesa de Transplantação.

Na nossa Sociedade Portuguesa de Angiologia e Cirurgia Vascular para além do papel determinante que teve como primeiro Presidente (2000-2002) e Sócio Emérito, foi sempre uma presença marcante em todos os Congressos Anuais até ao XVII em Évora, nas inúmeras reuniões e iniciativas, nomeadamente como impulsionador do Núcleo de Biologia Vascular.

 

 

Foi Co-Editor da Revista Arquivos Portugueses de Cirurgia e membro dos Conselhos Científicos de várias revistas médicas: Angiologia e Cirurgia Vascular, Arquivos de Medicina, Angiologia e Técnicas Endovasculares, Revista Portuguesa de Cirurgia CardioTorácica e Vascular.

Foi autor e co-autor de várias publicações científicas, nacionais e internacionais e palestrante ou moderador de mesas redondas. Conduziu e orientou diversos projetos de investigação e ensaios clínicos.

Após a jubilação colaborou ativamente na Cooperativa de Ensino Superior Politécnico e Universitário (CESPU), onde exerceu funções diretivas (Diretor e Coordenador do curso técnico de Cardiopneumologia) e académicas (membro dos conselhos diretivo e pedagógico, docente de Fisiologia Cardiovascular, de Hemodinâmica e de Imagiologia). Ali propôs o curso de Secretariado Clínico, no qual ministrou aulas de vocabulário em saúde. Promoveu um curso de Mestrado em Técnicas Cardiopneumológicas, de que foi o Diretor. Presidiu a numerosos júris de provas finais de mestrado, de avaliação de monografias e de fim de curso. Colaborou como docente de três disciplinas do curso de Ciências Biomédicas do Instituto Superior de Ciências da Saúde da CESPU.

Foi o representante nacional na Mediterranean League of Angiology and Vascular Surgery e nomeado Honorary Member do European Venous Forum em 2017 no Porto.

 

 

Foi desde sempre membro da Comissão de Honra da Porto Vascular Conference, participante ativo e particularmente empenhado nas avaliações anuais dos melhores E-Posters, tendo marcado presença sucessivamente nas cerimónias de distribuição de prémios, juntamente com os Diretores da FMUP e do Hospital de São João. Foi também Presidente Honorário do Simpósio Internacional de Angiologia e Cirurgia Vascular.

O Prof. António Braga foi sempre uma presença marcante em todos os fóruns de discussão e conversas privadas sendo conhecida a sua paixão pelo mergulho e caça submarina, pela culinária e gastronomia, pela música clássica, pelas novas tecnologias, pelas viagens, pelo cinema.

Foi sempre um conversador nato que a todos entusiasmava e cativava, com as incontáveis histórias e lições que preenchiam um almoço, um jantar, um serão. Cultivava um espírito inquieto, sempre cheio de novos projetos, na medicina e na investigação mas também e muito para além da medicina e da cirurgia vascular.

Foi sempre um exemplo permanente de dedicação, competência e perseverança no tratamento dos doentes. Teve sempre para com quem privava a nível profissional uma preocupação formativa permanente, uma presença constante, proporcionando oportunidades e incentivando continuamente. Aliou sempre ao Saber uma enorme Simplicidade, só ao alcance de quem o é verdadeiramente.

Não pode haver melhor memória de um Mestre, pelo carácter, humildade e elevação, particularmente nas situações mais difíceis e desafiantes.

 

 

Quero recordar a oportunidade que tive este ano de em entrevista à publicação Venous News referir “I had the privilege to make contact with many distinguished physicians, researchers and professors in my career which it makes difficult and even unfair to list only a few. My strongest influence during all my training period and even after as consultant of Angiology and Vascular Surgery was my PhD mentor, António Braga, who taught me the most important attributes of a surgeon, including the clinical judgement, technical skills and the principles of ethics.”

O Prof. António Braga, mesmo após a jubilação, sempre olhou para o futuro à semelhança de Paul Ricceur, que, numa entrevista concedida por ocasião do seu nonagésimo aniversário afirmou:

"A frase que me acompanha sempre é estar vivo até à morte. Os perigos da idade avançada são a tristeza e o tédio. A tristeza está ligada à obrigação de abandonar muita coisa; há um trabalho de desapropriação a fazer. A tristeza não se pode dominar totalmente, mas pode evitar-se o consentir a tristeza, a acedia, como diziam os Pais da Igreja. Aí não se pode ceder. A réplica ao tédio é estar aberto a tudo o que acontece de novo. É o que Descartes chamava a admiração, que é o mesmo que o espanto. Pessoalmente, e chegado a este cabo, permaneço capaz de admirar.”

Em meu nome pessoal e da Sociedade Portuguesa de Angiologia e Cirurgia Vascular quero expressar o mais profundo e sentido agradecimento ao Professor Doutor António Braga pelo seu exemplo de vida.

Muito obrigado!

Armando Mansilha

Presidente da Sociedade Portuguesa de Angiologia e Cirurgia Vascular

 

Creative Commons License Todo o conteúdo deste periódico, exceto onde está identificado, está licenciado sob uma Licença Creative Commons