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Observatorio (OBS*)

versão On-line ISSN 1646-5954

OBS* vol.7 no.3 Lisboa jun. 2013

 

O ecrã da (hiper) televisão: novos olhares a partir das emissões dedicadas ao Euro 2012 na TV portuguesa

The (hyper) television screen: new insights and perspectives from the Euro 2012 portuguese TV broadcasts

 

Felisbela Lopes*, Luís Miguel Loureiro**, Ivo Neto***

* Centro de Estudos em Comunicação e Sociedade - Universidade do Minho, Portugal

** Centro de Estudos em Comunicação e Sociedade - Universidade do Minho, Portugal

*** Centro de Estudos em Comunicação e Sociedade - Universidade do Minho, Portugal

 

RESUMO

Dando continuidade a uma série de estudos já realizados no âmbito do projecto de investigação em que se insere, o presente trabalho questiona a evolução do ecrã televisivo como dispositivo supostamente convergente. Contrariando uma tendência discursiva dominante, quer na esfera dos media quer na própria produção académica sobre o medium televisivo, clarificam-se aqui alguns dos desenvolvimentos teóricos mais significativos, resultantes dos anos de trabalho que este projecto de investigação já tem. Propõe-se, pois, uma distinção conceptual entre o ecrã prometido pela cultura da convergência, que designamos como ecrã convergente, e o ecrã verdadeiramente resiliente da instituição-televisão, o ecrã centrípeto, que ainda obedece aos princípios de sequência e fluxo enunciados por Raymond Williams nos anos 1970.

Palavras-chave: Televisão, ecrã, teorias do dispositivo, convergência, estudos televisivos

 

ABSTRACT

In line with the previous research that we developed inside the project we’re taking part for some years now, the work we’re presenting questions the evolution of the televisive screen as a supposedly convergent apparatus. It means a questioning that argues against the ongoing dominant discourse on television (both in the media as in the academic sphere). We then intend to bring to light some of the main conceptual theoretical distinctions that where emerging from our previous articles and reflections. What we propose is a distinction between the screen as promised by the convergence culture, one we designate the convergent screen, and the screen we actually see enduring in our TV sets, a resilient screen representing the TV-institution: a centripetous screen that still follows the same principles of sequence and flow as generically theorized by Raymond Williams in the 1970s.

Keywords: Television, screen, apparatus theories, convergence, television studies

 

Introdução

Toda a construção do olhar é uma construção discursiva. Mas é também uma remissão a lugares de partida que, por permitirem a partida, prometem sempre a possibilidade de caminhos novos, vias alternativas. Abrem-se aos lugares da hipótese.

São as seguintes, as hipóteses que o presente artigo quer explorar: é possível que os olhares sobre os ecrãs da contemporaneidade estejam, muitas vezes, contaminados por uma aparente facilidade imediata que a relação entre o observador e o observado introduz na leitura; é possível que essa contaminação se transmute em formulação discursiva, logo, política, e se distraia e dilua em inapercebidos modos de dominação, em especial, de ordem técnica; é possível que essas dominações, especialmente de ordem técnica, operem a sua própria ocultação na imediatez luminosa do ecrã. O ecrã que vemos pode não ser, pois, o ecrã que é.

Cruzando as reflexões que temos vindo a desenvolver em anteriores artigos, fundadas e enquadradas pelas teorias do dispositivo, com os dados empíricos recolhidos ao longo do período de execução do projecto de investigação em que o presente artigo se insere, propomo-nos aprofundar uma distinção conceptual que, em anteriores abordagens ao ecrã televisivo (a partir dos programas de informação da televisão generalista e noticiosa portuguesa), já se vinha evidenciando necessária: as noções, concorrentes e antagónicas, de ecrã convergente e de ecrã centrípeto.

 

Ecrãs e participação: o ecrã convergente hipermoderno

Se há, de facto, um discurso recorrente sobre as novas tecnologias da comunicação e da informação, dele faz certamente parte um refrão discursivo, intensamente repetitivo, que não cessa de prometer uma acessibilidade generalizada à informação em circulação global, que comporta em si, e convoca, a possibilidade de uma nova cidadania de largo espectro social e político, promotora da realização do que autores como Pierre Lévy (2001) vêm designando a ciberdemocracia.

Trata-se de uma promessa que, notaremos, se vem renovando a cada nova vaga tecnologicamente induzida, tendo tomado de assalto a produção discursiva de esferas públicas tão diversas (e, ao mesmo tempo, tão intercomunicantes) como a política, a social, a económica ou a académica. Tem-nos surgido renovada nos discursos sobre a convergência dos media incluindo, concomitantemente, a formulação conceptual do que designaríamos o ecrã convergente, para o qual tenderão os ecrãs tecnológicos que quotidianamente utilizamos e com os quais, de algum modo, interagimos. Entre os quais se conta, obviamente, o ecrã televisivo.

Indiferente a um constante adiamento das suas efectivas condições de concretização como ideia de política (Miranda, 1997: 40), esta reiterada promessa de participação vem-se apresentando à época como palavra-chave da sociedade (dita) da informação. No seu recorrente uso, como refrão discursivo que emerge da fraseologia dominante acerca de ecossistemas mediáticos aceleradamente modificados no sentido da progressiva diluição da fronteira entre emissores e recetores (ecossistemas postos, assim, em movimento convergente, pela ação e pelos efeitos conjugados das novas tecnologias da comunicação e das forças do mercado), a promessa de participação surge como horizonte desejado de um processo de abertura a novos modos de exercício da cidadania, que se apresentam invariavelmente decorados pelas promessas de renovação da própria democracia: o que a participação digital, potenciada pela libertação da palavra (Lévy, 2003: 56-65), promete, é a nova ágora: uma comunidade política de indivíduos livres e autónomos, comprometidos individualmente nessa comunidade, ligados na e pela rede (Castells, 2004: 197). Diríamos que, transposta e potenciada por uma cultura de convergência (Jenkins, 2006: 256), a participação devém pré-condição essencial à formulação política do novo sujeito tecnologicamente integrado, capaz de agir a partir da sua (tele)presença em renovadas micro-esferas públicas, elaborando-se como panos de fundo uma nova cidadania digital (Rosas, 2010: 117-127) e uma inteligência coletiva de carácter universalizante (Lévy, 2003: 175-182).

Sucede, porém, que para se verificar, uma tal promessa de participação tem de convocar e se concretizar nos dispositivos sociotécnicos que a operacionalizam e esses resumem-se, na conversa contemporânea, àquilo que pretendemos descrever como o ecrã convergente: um ecrã sociotecnicamente constituído pelas promessas da convergência tecnológica que, para se concretizarem politicamente, implicam um processo concomitante de empowerment do espectador-utilizador, ou seja, um processo que eleva o utilizador individual à categoria de sujeito político.

Na formulação virtuosa do ecrã convergente é para esse espectador-utilizador que converge toda a centralidade conceptual do dispositivo1. Trata-se, contudo, de uma convergência que, na verdade, opera como desfasamento e fragmentação: dirige-se, antes de mais, à figura do espectador não como cidadão mas como consumidor, oferecendo-se à individualização espácio-temporal dos usos como usufruto, ou seja, elaborando o ecrã como dispositivo libidinoso (Loureiro, 2007: 163-172), simultaneamente público e íntimo, que se faz consumir através da realização do desejo. E é aqui que se revelam as suas contradições constitutivas. Como pode um dispositivo que, na sua dinâmica convergente, individualiza e isola, promover o reencontro político da comunidade? Como pode a satisfação do desejo reverter-se num fazer parte de? Poderá, em tais condições, o empowerment prometido corresponder ao empowerment efectivamente alcançado?

A nossa proposta analítica passa por um exame crítico da própria noção de empowerment e ao modo como se vem impondo à época. De facto, deve observar-se que na reiterada utilização discursiva do empowerment se está a promover uma substituição política fundamental: nela, o espectador moderno vem sendo definitivamente arrumado como sujeito passivo. Do espectador moderno, sujeito separado do objecto a que é sujeito, já só se espera um fraco participante no espectáculo, um cidadão diminuído, domado e dominado. O novo sujeito empowered que supletivamente surge em seu auxílio já não é, pois, esse espectador passivo e separado, mas aqueloutro sujeito flexível, imersível e mobilizável que, emergindo da efectualidade quotidiana, ancora nas capacidades e valências aí adquiridas (e inevitavelmente promovidas pelas tecnologias), a sua autonomização e, consequentemente, a sua capacidade de intervenção individual num mundo comum. Este já não é mais o espectador separado do espectáculo, mas um sujeito novo capaz de intervir e mudar, capacitado para a acção política transformadora. Trata-se da concretização da moderna promessa de tomada, pelo indivíduo assim autonomizado, do poder de agir, através da consumação de uma erótica técnica na qual a vontade de controlo se constitui como “o problema político por excelência” (Miranda, 2007: 151). O empowerment promete, pois, a realização do que Hannah Arendt designa a ilusão do mito popular do homem forte que, “isolado dos outros, deve a sua força ao facto de estar só” (Arendt, 2001: 238). Atente-se como o mito se afirma, por exemplo, nas distinções propostas pelo tecnólogo do MIT e teórico da cultura da convergência, o norte-americano Henry Jenkins, quando define as relações que opõem a variante quotidiana do empowered user, o empowered consumer, à versão do consumidor-espectador que o originou: “Se os antigos consumidores eram considerados passivos, os novos consumidores são activos. Se os antigos consumidores eram previsíveis, imóveis e obedientes, os novos consumidores são migratórios e demonstram uma cada vez menor lealdade para com as grandes redes e os media. Se os antigos consumidores eram indivíduos isolados, os novos consumidores possuem mais conexões sociais. Se o trabalho dos consumidores de media era silencioso e invisível, os novos consumidores são agora barulhentos e públicos” (Jenkins, 2008: 18-19).

Note-se, ainda, a propósito da prometida tomada do poder de acção pelos consumidores e utilizadores, o modo como autores profusamente citados como os já referidos Manuel Castells ou Pierre Lévy descartam totalmente a noção do espectador nas suas reflexões sobre o que poderíamos designar as novas ágoras virtuais. Em A Galáxia Internet (original de 2001), o sociólogo da sociedade em rede distingue apenas entre os produtores-utilizadores, responsáveis pela realimentação da rede, e os utilizadores-consumidores, que se situam no lado da recepção (Castells, 2004: 55). É tanto aos primeiros como aos últimos que Castells lança “o controlo dessa ágora pública” como “o desafio político mais importante que a Internet apresenta” (Castells, 2004: 197). Lévy vai ainda mais longe naquilo a que tem chamado as utopias realizáveis, escrevendo em Ciberdemocracia (de 2002) que os cibercidadãos, os internautas com capacidade de agir na ágora virtual, “têm muita coisa a dizer” (Lévy, 2003: 57) e que “a Internet é um extraordinário vector de libertação da palavra” (Lévy, 2003: 64). Investidos, pela tecnologia, deste novo poder do discurso global, os cibercidadãos criariam as condições de acção para concretizar a previsão do filósofo francês: “as ditaduras cairão ao ritmo da expansão da cibercultura” (Lévy, 2004: 65). Verifica-se, assim, nestas formulações, o que afirmamos: ao proscreverem, pelo esquecimento, o espectador, o que nelas se apresenta é, invariavelmente, a promessa da potenciação do utilizador e do consumidor, através das novas tecnologias da informação e da comunicação, com a consequente elevação da sua capacidade de agir como cidadão. O que daqui emerge, conceptualmente é, pois, um utilizador-actor ou um consumidor-actor, apresentados sob o modo do empowerment do user ou do consumer. Ou seja: a formulação de um ecrã convergente implica um dispositivo centrado, elaborado mesmo, a partir de um sujeito político autonomizado que já não corresponde à noção do espectador moderno, separado do espectáculo, tornado passivo pelo dispositivo espectacular. O novo sujeito, o empowered user ou empowered consumer produz e comanda, ele mesmo, o espectáculo. Ele é o conteúdo. Ele é o ponto de convergência do dispositivo. O que terá de ter como consequência o apagamento do dispositivo técnico separador em nome do dispositivo sociotécnico integrador.

 

Televisão e participação: a revelação totalizante do ecrã centrípeto

Apesar de, à superfície, se assumir a aparência de uma evolução no sentido integrador do espectador-utilizador, elaborado como consumidor, o dispositivo digital, analogicamente configurado, que elabora socialmente o ecrã televisivo contemporâneo, mantém um conjunto de características sociotécnicas que só excepcionalmente o poderão definir como ‘interactivo’2. Será relativamente incontroversa a noção de que, apesar de toda a panóplia de novas potencialidades tecnológicas, o zapping síncrono e a possibilidade de dessincronização decorrente da gravação de programas permanecem como modos preferenciais de intervenção do receptor sobre os conteúdos programáticos de som e imagem que lhe chegam (Uricchio, 2004: 171)3. A emissão é ainda fornecida como fluxo contínuo de conteúdos sobre o qual este receptor-espectador possui, assim, poucas ou nenhumas possibilidades de intervenção efectiva, limitando-se a pouco mais do que meros actos de ligação ou desligação. Diríamos, assim, que, pelo uso do comando à distância e de outras ferramentas técnicas de disrupção do fluxo, esse espectador-zapper é investido, tecnicamente, de um poder eufemístico, revelando-se nele a situação paradoxal que, noutra ocasião, designámos a história incompleta do ‘empowered user’ (Lopes & Loureiro, 2011: 207-211)4.

Ou seja, apesar do constante e constantemente afirmado acréscimo de potencialidades tecnológicas do ecrã televisivo, será ainda demasiado cedo para que a sociologia dos media possa arrumar em definitivo a teorização proposta na década de 1970 por Raymond Williams, que define a programação televisiva como broadcast, precisamente, a partir de noções como sequência e fluxo (1990: 87-96). A televisão digital desenvolveu-se certamente como tecnologia mas, características propriamente digitais, como a interactividade – que, no limite, hibridizaria dispositivos dispensando os usos sociais de outros ecrãs além do televisivo, transformando esse ecrã convergente num horizonte sociotécnico agenciado pela internet (Negroponte, 1996: 192), produzindo alterações profundas, tanto na indústria dos conteúdos (Elmer-Dewitt apud Poster, 2000: 39) como na condição passiva de um espectador que deviria um activo utilizador-produtor –, persistem em registar uma apropriação social difusa. Na verdade, a própria interactividade é, de tal modo, difícil de delimitar e definir, que autores de referência no estudo dos novos media como Lev Manovich chegam mesmo a manifestar dúvidas acerca do seu uso conceptual corrente. No limite, como afirma Manovich, aplicar a interactividade como conceito analítico aos media fundados na cultura informática não significa mais do que “afirmar o mais básico que há para dizer sobre os computadores” (Manovich, 2001: 55).

Continua, assim, por demonstrar uma relação causal entre as intensificadas potencialidades tecnológicas e uma constantemente prometida mudança profunda dos usos sociais da televisão, que se daria no sentido da integração total do espectador no dispositivo. A evidência científica tem demonstrado, pelo contrário, a resiliência da televisão como instituição (Caldwell, 2004: 43) e a persistência de um modelo de broadcast que se manifesta sob modos mais ou menos novos (Gripsrud, 2004: 219; Tay & Turner, 2009: 37), o que dificulta a plausibilidade dos anúncios de uma nova era televisiva, potenciada por um ambiente de convergência dos media, quando não torna mesmo improváveis as narrativas recorrentes sobre um inevitável fim da televisão (Caldwell, 2004: 70).

Apesar de considerarem tratar-se de um facto que passa, muitas vezes, despercebido, os investigadores australianos Jinna Tay e Graeme Turner constatam a existência de um alinhamento entre algumas narrativas académicas tecnocentradas e os discursos produzidos pelo mercado sobre os modelos económicos emergentes da TV (Tay & Turner, 2009: 32). Propondo uma pesquisa aos conteúdos discursivos e às respectivas relações de origem e sincronicidade, os autores concluem tratar-se de narrativas com especificidade geográfica, isto é, não aplicáveis fora do contexto dos países ocidentais. E, mesmo neste contexto, Tay e Turner consideram de difícil tradução empírica o que descrevem como um certo wishful thinking produzido académica e economicamente em torno dos ‘futuros revolucionários da TV’ (2009: 57). De facto, poderemos remeter a estes ambientes cientifico-económicos tecnoentusiasmados a elaboração discursiva de autores como Amanda D. Lotz que consideram necessária uma revisão significativa do conceito de fluxo de Raymond Williams, “pelo menos, nos termos em que atribui a outrém, que não o receptor individual, o controlo do fluxo” (Lotz, 2007: 34), propondo a ideia de que as sociedades tecnologicamente avançadas já se encontram numa era post-network, ao declarar ultrapassadas as redes tradicionais de televisão (Lotz, 2007: 7-8). Apesar disso, a investigadora americana reconhece a persistência de dados contraditórios, que insistem em demonstrar a prevalência de uma audiência relativamente estável nos programas de prime-time sobre todos os restantes modos de visionamento televisivo (Lotz, 2007: 22). A proposta de Lotz, de uma era post-network, perde consistência quando confrontada com o cenário europeu, no qual a emissão televisiva broadcast significa, não apenas, a resiliência das noções de sequência e fluxo, mas possui também significado cultural, social, institucional e político como serviço público o que a vem transformando em tema recorrente de debate público, em torno de noções modernas como a do acesso universal (Harrisson & Vessels, 2005: 835), e lhe confere uma acentuada centralidade nas sociedades europeias (Moe, 2008: 221). Asserções, como as do investigador norueguês Jostein Gripsrud, emergem, assim, como cientificamente mais rigorosas. A análise demonstrará que “estamos ainda numa situação social que parece remeter para o conjunto de pré-condições para o broadcast, descritas por Raymond Williams” (Gripsrud, 2004: 221). Podemos, pois, afirmar que o dispositivo televisivo, configurado a partir do broadcast tradicional, apesar de ter registado evoluções, parece resistir ainda aos continuados anúncios do seu desaparecimento.

Assim, a questão que se nos coloca é: o que é que estamos, de facto, a ver nos ecrãs de televisão? Assumindo a tese de um processo evolutivo que mantém, na origem, o enquadramento conceptual do broadcast, julgamos viável avançar com a seguinte hipótese: é possível que, como dispositivo, o ecrã televisivo contemporâneo esteja a compensar uma certa perda de centralidade social, através de um processo de metamorfose, cuja cinética intrínseca se alimenta de um magnetismo progressivo. Observado através desse campo de forças, o ecrã de televisão emerge não como participante sociotécnico de um cenário de convergência, mas como ecrã centrípeto que atrai, acomoda e combina em si todo o tipo de recursos espácio-temporais e socio-semióticos, de modo a assegurar a manutenção da sua posição central nas sociedades contemporâneas.

Não é, no entanto, apenas devido a um carácter simulacional - sendo incapaz de ser efectivamente interactivo, o ecrã fusional da televisão revela-se, contudo, capaz de simular a interactividade (Scolari, 2008: 7) -, que nele identificamos uma gravítica centrípeta. É, igualmente, devido ao facto de ser um ecrã que mobiliza o seu espectador ou, como defende Jean-Louis Missika (2006: 29), o convida constantemente a entrar, fazendo com que o espectador sinta que (não está apenas no, mas) é, efectivamente, o centro. E também porque, tal como já arguimos noutra ocasião, é um dispositivo que tende a reunir, substituir e totalizar uma ideia de espaço público (Lopes et al, 2011: 229, 237-238). Autorizando uma predominância do ego (Loureiro, 2007: 315-338), este ecrã centrípeto, que mantém o broadcasting no seu núcleo operativo, convoca, assim, o indivíduo para uma multitude de opções que incluem a possibilidade de inserção nas referências e representações comunitárias tradicionais, características de uma televisão de massas que cedo se constituiu como promessa de sincronicidade e comunhão social, participação democrática e identidade partilhada (Wolton, 2000: 60-63), além de, obviamente, incluírem também as possibilidades em que se jogam as promessas modernas de autonomia e emancipação individuais.

O problema, que no presente trabalho se transforma em hipótese sob nova inquirição, é que sempre que a pesquisa questiona as promessas de participação, isto é, as promessas que, pela evolução dos dispositivos técnicos, afirmam a renovada possibilidade do cidadão, o máximo que tem encontrado é, invariavelmente, a noção de uma falsa integração (Lopes & Loureiro, 2011b: 149-161): no lugar do cidadão e dos sinais de uma participação autónoma, livre e democratizante, o ecrã devolve o consumidor, sujeito sujeitado, mero respondente à audiência estatística, um sujeito eufemisticamente integrado pela força centrípeta do dispositivo.

 

Euro 2012: Tabelas e notas

O presente estudo tem como referência um total de 498 emissões informativas, que foram para o ar na televisão portuguesa entre os dias 8 de Junho e 1 de Julho de 2012, datas coincidentes com a realização do Euro 2012, o campeonato da Europa de futebol, disputado na Polónia e na Ucrânia. Neste sentido foram analisados os canais generalistas (RTP 1, SIC e TVI) e os temáticos de informação (RTP Informação, SIC Notícias e TVI 2). Em relação aos canais generalistas, a análise incidiu em todos os espaços de informação emitidos, excluindo do estudo os blocos de entretenimento. No que diz respeito à investigação desenvolvida no contexto dos canais temáticos de informação, e tendo em conta que são canais com emissões informativas contínuas, foram apenas seleccionados os espaços dedicados ao Euro 2012 mais os fóruns do telespectador.

Cada uma das 498 emissões informativas estudadas incidiu depois em dois níveis:

  • Em primeiro lugar procuramos compreender o espaço que os responsáveis pela informação televisiva concedem ao telespectador. Neste sentido, procuramos saber se existem canais abertos para a integração dos telespectadores e através de que veículos tecnológicos quem está do ‘outro’ lado do ecrã tem acesso à palavra televisiva.
  • No segundo ponto da análise o objectivo é estudar a composição do plateau, através da aplicação das seguintes variáveis: Origem, ocupação profissional, sexo, mote do convite e ligação ao tema em discussão.
  •  

     

A RTP Informação foi o canal que registou um maior número de emissões sujeitas a análise, somando o total de 130 espaços informativos. A RTP1 contribuiu com 109, seguindo-se a SIC com 74. TVI e SIC Notícias somaram 66 cada. Finalmente, na TVI24 foram para o ar 53 emissões especialmente dedicadas ao Euro 2012.5

O futebol é alvo de um acompanhamento minucioso por parte dos media e o Euro 2012 ocupou grande parte dos espaços informativos durante o mês de Junho. Para além dos habituais espaços de informação que foram moldados para seguir a maior competição desportiva por selecções no velho continente, foram também criados programas especialmente dedicados a este evento desportivo. A RTP Informação foi o canal que mais programas emitiu exclusivamente dedicados à competição. Entre os dias 8 de Junho e 1 de Julho, a estação pública de informação passou um total de 127 emissões informativas. A SIC Notícias colocou no ar 44 emissões e a TVI24 26. Entre as generalistas foi possível assistir a 19 emissões na RTP1, 12 na SIC e três na TVI.6

Entre os programas que mais vezes foram emitidos com o propósito de analisar a competição desportiva, o destaque vai para o Diário do Euro, com 70 emissões contabilizadas, que durante o Euro 2012 foi para o ar várias vezes por dia na RTP Informação. Ainda no canal de notícias da RTP, o programa Antena Aberta: Euro Selecção, um fórum do telespectador especialmente desenvolvido para o evento, contabilizou oito emissões.

 

 

Em relação às possibilidades de integração dos telespectadores, e tal como é recorrente em estudos desenvolvidos anteriormente tendo como base este mesmo projecto de investigação, existem mais programas que não permitem o acesso dos telespectadores à palavra televisiva. Entre as 498 emissões informativas analisadas, apenas 86 (82,7%) contemplaram esta possibilidade.

 

 

Em relação às estações que permitiram a participação dos telespectadores, foi a RTP Informação, com 35 emissões, o canal que mais vezes abriu a janela a esta possibilidade. A TVI24 permitiu a integração dos telespectadores em 27 emissões, seguindo-se a SIC Notícias com 22. Entre as generalistas, apenas na RTP1, e só em dois casos, é que os telespectadores tiveram a possibilidade de participar activamente como telespectadores. 7

 

 

Quando observamos os programas que permitiram a participação dos telespectadores em destaque encontra-se o Missão Euro, da RTP Informação, que em 25 emissões contemplou a participação dos telespectadores. Nesta lista, há ainda espaço para os fóruns do telespectador, como o Discurso Directo, 23 emissões, na TVI24, e o Opinião Pública, 16 emissões, na SIC Notícias.

 

 

Em relação às plataformas de integração dos telespectadores, o importante é compreender quais as tecnologias utilizadas para dar voz a quem está do outro lado do ecrã. Estas ferramentas podem ser directas – como o telefone – ou indirectas – como as redes sociais, os emails ou os sites, onde a mensagem do telespectador pode ser apresentada durante a emissão. Apesar da evolução tecnológica verificada, o telefone, que foi utilizado em 59 casos, continua a ser a plataforma mais vezes usada. As plataformas de acesso através da internet, como as redes sociais digitais ou os sites dos programas, registaram 51 utilizações, o email, 47, e o rodapé, quatro.

 

 

O Antena Aberta: Euro Selecção e o Missão Euro foram os únicos programas criados exclusivamente para o Euro 2012 que permitiam a integração dos telespectadores. O primeiro seguia a lógica do fórum do telespectador, com a possibilidade de participação via telefone. Por seu lado, o Missão Euro, com a criação de uma página na rede social digital Facebook, desenvolveu um espaço conduzido pelo jornalista Álvaro Costa, a Janela Digital, onde eram mostrados comentários e lançadas perguntas feitas pelos telespectadores.

 

 

Análise dos convidados

No que diz respeito ao número de convidados em estúdio, nos programas analisados, é possível verificar um grande equilíbrio entre as emissões informativas que não apresentaram convidados em estúdio, 262 (53%), e as emissões com convidados, 236 (47%)

 

 

Entre os programas que permitiram a entrada de convidados nos seus plateaux o número mais comum foi de apenas um convidado, em 119 casos (50,4%). Entre 2 e 5 convidados contabilizaram-se 91 (38,6%) emissões e 26 (11%) com mais de cinco convidados.

 

 

De que se compuseram, então, os plateaux televisivos, cuja base foram os 504 convidados que foram chamados aos estúdios da televisão portuguesa para comentar o Euro 2012?

O canal que apresentou mais convidados nos seus estúdios foi a RTP Informação com 195. Ainda nos temáticos de informação, a TVI24 contou com 134 e a SIC Notícias com 101. Entre as generalistas, a RTP 1 foi a que mais personalidades chamou a comentar os principais tópicos relacionados com a competição: um total de 52 convidados. A TVI chamou 18 e a SIC, quatro.8

 

 

O primeiro ponto a analisar no perfil dos convidados chamados a estúdio é a sua ocupação profissional. Nesta perspectiva, constata-se que o domínio está do lado dos jornalistas, com 308 convidados. Depois dos jornalistas surgem os ex-futebolistas com 85 chamadas. A presença de um número tão elevado de personalidades com ligação ao universo futebolístico demonstra o efeito que a cobertura informativa do Euro 2012 teve na composição dos plateaux televisivos em Portugal. Apesar de as análises realizadas ao longo do ano demonstrarem que os convidados ligados ao futebol têm uma presença regular nos estúdios televisivos, nunca como no mês de Junho este tipo de convidados esteve tantas vezes presente na TV portuguesa.9

 

 

Na análise relativa ao género dos convidados chamados a estúdio, verifica-se que a presença de mulheres para comentar futebol é quase inexistente. A supremacia dos homens, com 499 convidados para apenas cinco mulheres, reforça o facto de o futebol ser um tema mais popular junto do público masculino. Para além disso, o Euro 2012 foi uma competição masculina e as personalidades de referência ligadas a este desporto são maioritariamente homens.

 

 

Entre as mulheres, a jornalista Cláudia Lopes, da TVI, foi integrada em directo em quatro ocasiões. Mónica Jorge, que foi treinadora da selecção feminina de futebol de Portugal e é hoje dirigente na Federação Portuguesa de Futebol, foi a outra convidada mulher identificada no estudo.

 

 

Apesar de o futebol ser um desporto global, os convidados chamados a estúdio para comentar o Euro 2012 na televisão portuguesa são provenientes apenas de três grandes zonas geográficas: a Grande Lisboa, com 320 representantes, o Norte, com 174, e a Europa, com 10. 10

 

 

Analisando a distribuição geográfica dos convidados por cada um dos canais que compõem este estudo, a Grande Lisboa emerge como a região mais representada em todos os canais, com a excepção da RTP1 e a RTP Informação. Os dois canais do Estado contaram com um maior número de convidados do Norte de Portugal.

 

 

No próximo ponto, o objecto de estudo passa por compreender o mote dos convidados chamados a estúdio para analisar a actualidade informativa. Aqui, o objectivo é o de compreendermos se os convidados são actores, caso exerçam uma influência directa sobre o assunto em questão, ou se são meros observadores desse mesmo tópico.O único convidado-actor encontrado foi Paulo Bento, que esteve presente na Grande Entrevista, da RTP1, para fazer o rescaldo da participação da selecção portuguesa de futebol no Euro 2012.

Outra das variáveis que apresenta grande discrepância é a ligação dos convidados ao tema para o qual foram convidados a intervir. Neste ponto, o objectivo era compreender se os convidados possuem habilitações, quer pela sua formação académica quer pela experiência profissional, para falar sobre o assunto abordado no programa, neste caso o futebol, ou se, pelo contrário, não têm conhecimentos para tal.

Todos os convidados analisados tinham ligação ao tema futebol. Para além de treinadores, jogadores, ex-jogadores e árbitros que possuíam, ou possuíram, uma ligação profissional, foi encontrado um grande número de jornalistas habituados a comentar o jogo. Para além disso, os representantes de outras áreas profissionais que marcaram presença neste estudo são também eles comentadores de futebol em espaços semanais de debate desportivo.

Para além das equipas de futebol que se defrontaram em campo, a televisão viu surgir verdadeiras equipas de comentadores, tal o número de convidados repetidos nos seus plateaux informativos. Neste ponto, faz-se um destaque aos convidados mais repetidos. Desta forma, destacamos os 11 convidados mais vezes presentes nos plateaux da televisão portuguesa para comentarem o Euro 2012, entre os dias 8 de Junho e 1 de Julho de 2012. Entre o grupo dos convidados mais vezes repetidos conseguimos destacar nove jornalistas e dois antigos internacionais pela selecção portuguesa de futebol - Pedro Barbosa e Dani.

 

 

Conclusões

Em termos meramente empíricos, o presente estudo não nos traz, propriamente, informação nova. Diríamos, porém, que a informação que nele se recolhe, confirmando tendências já antes observadas, nos permite afirmar uma certa resiliência do ecrã televisivo, cujo dispositivo produtivo permanece fundado nos seus princípios funcionais tradicionais. Notamos que até mesmo as designações que usamos no estudo se misturam, e acabam por, naturalmente, se substituir para revelar a sua verdadeira natureza semântica. Falar de integração do telespectador afigura-se-nos, perante as repetidas evidências empíricas, como muito mais apropriado do que tratar dessa integração como participação. Na verdade, uma e outra estão longe de significar o mesmo. Enquanto a primeira nos remete à noção centrípeta do dispositivo do ecrã, um ecrã que integra, que chama a si, a segunda está contida na promessa do ecrã convergente. Não deixa de ser, por isso, sintomático que continuemos a verificar, estudo após estudo, que existirá, no máximo, e nem sempre, uma integração do telespectador que não constitui, contudo, qualquer novidade de monta no desenvolvimento do ecrã televisivo. Ou seja, falamos da possibilidade de existir, apenas, uma integração. O que significa que nunca poderemos estar a descrever um ecrã que converge para um novo centro, o seu espectador, mas um ecrã que continua a funcionar de modo autorreferencial, um dispositivo cujo controlo se mantém ferreamente detido pela instância produtora. Se é certo que esta se apaga e oculta, tal como a tecnologia, para transmitir ao espectador a ilusão de que o canal é seu, não é menos certo que é a instância produtora que determina, controla e conduz o fluxo de que se continua a fazer a emissão televisiva.

As mesmas noções surgem-nos confirmadas na segunda parte do estudo empírico no qual pretendemos colocar a teste a noção do espaço público configurado a partir da composição dos plateaux. Aqui também se confirmam dados que o projecto de investigação em que se insere o presente estudo tem vindo a recolher. O espaço público configurado pelos plateaux televisivos parte, também, muito mais, de uma noção de integração, conduzida e controlada pela instância de produção, do que de uma noção de participação relacionada com princípios de representatividade gerais. O que, como já escrevemos, os afasta de quaisquer possibilidades de representação do colectivo dos cidadãos, representando apenas realidades e interesses circunscritos: isto é, compondo um resultado de rarefacção do espaço público (Lopes & Loureiro, 2011). Se é certo que, pela especificidade dos programas sobre futebol, não é directamente comparável a composição destes plateaux aos de programas informativos dedicados ao debate político e ao debate de assuntos de interesse geral, também não deixa de ser possível afirmar a identificação de uma rarefacção evidenciada pela reiterada falha de representação quer de género/sexo quer de proveniência regional dos convidados.

Diremos, assim, para concluir e clarificar conceptualmente a nossa proposta, que o ecrã convergente emerge como o dispositivo prometido e elaborado discursivamente pela cultura da convergência: coloca o espectador no centro do dispositivo (aquilo a que, em análises anteriores à situação de convergência do ecrã televisivo, já chamámos a TV do Ego)11, prometendo-lhe a autonomia de decisão e de participação a partir dessa posição central. Ou seja, o ecrã convergente funda-se numa promessa de entrega, ao espectador (que, assim formulado, devém utilizador), do controlo do dispositivo. Mas, conforme temos vindo a constatar empiricamente, esta promessa não consegue ultrapassar o facto de elaborar o espectador/utilizador como consumidor, o que o mobiliza já não como cidadão mas como audiência. Na verdade, no máximo, o dispositivo integra-o, mobilizando-o, pois, não como sujeito político, mas como mero sujeito estatístico, índice e valor de mercado. Identifica-se aqui um paradoxo que, na prática, torna problemática toda a noção de autonomia e de emancipação do espectador: porque o consumo se elabora sempre da necessidade (existente ou criada), logo, da elaboração de uma dependência ou do jogo do desejo. De facto, como consumidores estamos sempre na dependência de. Por isso, a tese que sobra da reflexão que vimos fazendo é a de que o ecrã convergente só pode emergir como promessa, sendo o ecrã centrípeto o dispositivo, de facto, em operação. Porque num dispositivo definido como ecrã centrípeto toda a convergência é autorreferencial, remete para ele mesmo, mantendo, na prática, o espectador fora do verdadeiro centro do dispositivo. A distinção conceptual assim clarificada reforçará, pois, uma das propostas teóricas críticas que temos vindo a desenvolver: o ecrã televisivo contemporâneo é um dispositivo que, na verdade, se elabora e reelabora para manter toda a centralidade tecnológica, social, económica e institucional que alcançou no último meio século.

 

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NOTAS

1 O dispositivo pertence primordialmente à ordem da técnica. O dicionário online Priberam, da Texto Editores, refere que a palavra em Português tem a sua origem no latim dispositivu, e remete para o “que dispõe; que contém ordem ou prescrição”, sendo um “mecanismo disposto para se conseguir certo fim em vista”. O número 25 da revista Hermès, editado pelo CNRS, Centro Nacional de Pesquisa Científica francesa, em 1999, reúne e reflete sobre alguns dos contributos mais significativos produzidos nas últimas décadas sobre o assunto. Partindo das ideias de Michel Foucault, que considerava que “o dispositivo é, ele mesmo, a rede que podemos estabelecer entre os elementos” (Foulcault apud Peeters & Charlier, 1999: 16), o campo teórico do conceito de dispositivo tem-se vindo a elaborar no sentido da incorporação de uma dimensão técnica nos fenómenos sociais (Peeters & Charlier, 1999: 16). Constitui-se como “o conjunto de meios postos ao serviço de uma estratégia, de uma ação definida e planificada com vista à obtenção de um resultado” (Peraya, 1999: 153) ou, na concretização mais foulcaultiana, porque centrada nos mecanismos de alienação, controlo social e poder, “a relação existente entre vários elementos heterogéneos (enunciativos, arquiteturais, regulamentares, tecnológicos) que concorrem para produzir regularmente um efeito no corpo social” (Potte-Bonneville, 2002: s/n). O dispositivo emerge, assim, como “um modelo alternativo de ação” (Jacquinot-Delaunay & Monnoyer, 1999: 11) onde “o actor já não é o único detentor da capacidade de agir e de controlar a atividade e a cognição. Incarnado, divide os seus atributos com os objetos, os artefactos, os utensílios e os não-humanos em geral” (Quéré, 1997: 1).

2 Queremos significar ‘interactivo’ no sentido de um dispositivo tendencialmente híbrido, promotor da anulação da separação metafísica entre sujeito e objecto, presente nas conceptualizações do dispositivo televisivo tradicional (nomeadamente, através da permanência da separação entre emissão e recepção), mesmo as que afirmam a progressiva integração e centralidade do espectador (p. ex. na neotelevisão). A ‘interactividade’ é uma das características a que se tem, invariavelmente, associado o ecrã convergente (Jenkins, 2006: 5).

3 O nosso ponto de vista coincide com o do investigador de media do MIT, William Uricchio, expresso num capítulo, de que é autor, na obra colectiva Television After TV – Essays on a Medium in Transition (2004, Duke University Press), em que descreve, precisamente, a instabilização, gerada por um espectador munido de comando à distância, da noção de fluxo programático: com o comando à distância, o controlo do fluxo iniciou o trânsito de uma situação de domínio do programador para uma situação de domínio do espectador. O que não significa, porém, como discutiremos, que a teorização sobre o broadcasting de Raymond Williams deva ser totalmente posta de parte ou, como arguiremos, que esse trânsito tenha significado alguma alteração radical nas relações de poder no seio do dispositivo televisivo, rompendo definitivamente a separação metafísica.

4 Linha analítica que tomamos dos trabalhos empíricos da investigadora norte-americana Michele White que, numa série de pesquisas sobre a internet, publicadas no livro The Body and the Screen – Theories of Internet Spectatorship (2006, MIT Press), demonstrou o efectivo controlo de um dissimulado programador/produtor da tecnologia sobre as pretensamente livres escolhas que o utilizador/espectador realiza. Confirmaríamos, aliás, estas teses, na pesquisa My Newscast is no Longer Ours (2011), um estudo crítico do dispositivo O Meu Telejornal, disponibilizado em 2009 pelo site da estação pública portuguesa de televisão, RTP.

5 Total de programas analisados por canal: RTP1=21,8%; SIC=14,7%; TVI=13,3%; RTP Informação=26,1%; SIC Notícias=13,5%; TVI24=10,6%.

6 Total de programas dedicados exclusivamente ao Euro 2012: RTP1= 19 (8,2%); SIC= 12 (5,2%); TVI= 3 (1,3%); RTP Informação= 127 (55%); SIC Notícias= 44 (19%); TVI 24=26 (11,3%).

7Integração dos telespectadores por canal: RTP1=2,3%; SIC=0;TVI=0; RTP Informação= 40,7%; SIC Notícias= 25,6%; TVI 24= 31,4%

8Convidados em estúdio por canal: RTP1:10%; SIC:1%;TVI:3%;RTP Informação: 39%; SIC Notícias:20%; TVI 24: 27%;

9 Profissões presentes nos plateaux informativos: Jornalistas: 61,1% Ex-Futebolistas: 16,9%; Treinadores: 8,5%; Futebolistas:4,7% Árbitros:2,8%; Académicos:1,2%; Dirigentes desportivos: 0,8%; outras modalidades.0,8%; Política: 0,6%; Outros: 2,6%.

10 Origem dos convidados: Grande Lisboa: 63%; Norte: 35%; Europa 2%

11 Ver Loureiro (2008).

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