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Acta Obstétrica e Ginecológica Portuguesa

versão impressa ISSN 1646-5830

Acta Obstet Ginecol Port vol.10 no.3 Coimbra set. 2016

 

ESTUDO ORIGINAL/ORIGINAL STUDY

Avaliação das práticas contracetivas das mulheres em Portugal

Evaluation on portuguese women contraceptive practice

Fernanda Águas*, Teresa Bombas**, Daniel Pereira da Silva***

Sociedade Portuguesa de Ginecologia, Sociedade Portuguesa da Contraceção

*Presidente da Sociedade de Ginecologia

**Presidente da Sociedade Portuguesa da Contraceção

***Presidente da Federação das Sociedades de Portuguesas de Obstetrícia e Ginecologia

Em representação da Sociedade Portuguesa de Ginecologia e da Sociedade Portuguesa da Contraceção1

1. Direção SPG - 2015: Fernanda Águas, Carlos Marques, Teresa Mascarenhas, Alberto Fradique, Isabel Torgal, Margarida Barros, Eunice Capela, Cristina Frutuoso, Pedro Vieira Batista.

Direção SPDC - 2015: Teresa Bombas, Ana Rosa Costa, Maria João Carvalho, Maria do Céu Almeida, Fátima Palma.

Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence


 

ABSTRACT

Background: The study about evaluation of the contraceptive practices in Portugal is a cross-sectional survey that evaluated women’s contraceptive choices and how they get information and advice about sexuality and contraception.

Methods: Women aged between 15 and 49 years completed an anonymous questionnaire with 21 questions, which included open and closed questions on information and use of contraceptive methods. The results were analyzed and compared with the results of the survey performed in 2005 by the Portuguese Gynecology Society.

Results: Information about sexuality and contraception at school is acknowledged by 70% of the younger women. For this group other sources of information about contraception are friends, 46,1% and internet 45,9%. On the other side women older than 30 years get information on contraception mainly through family doctors and gynecologists. 94% of sexuality active women use contraception, this percentage is significantly higher than the one observed in 2005, 75,4%.

Contraceptive pill remains as the preferred method for Portuguese women although its use decreased from 70,4% to 58% of the women between 2005 and 2015. On the other hand the preference for methods independent from the users, long-acting reversible contraception (LARCs), has significantly increased. Women still maintain a high rate of forgetfulness for the pill and considering this fact the use of emergency contraception is still low. Use of contraception is beneficial for quali­ty of life according to 81% of women in this study.

Conclusions: Portuguese women are in general well informed and get an easy access to contraceptive methods. The amount of sexually active women using contraception has increased in ten years and almost achieves 100%. Contraceptive pill is the number one choice for more than 50% of women but the use of LARCs is steadily increasing.

Palavras-chave: Combined oral contraceptive; Contraception; Counseling; Contraceptive practices; Sexuality.


 

Introdução e objetivos

A contraceção é um dos pilares do planeamento familiar, permite evitar a gravidez indesejada e possibilita aos casais viver a sexualidade de uma forma mais gratificante e segura.

Em Portugal, e de acordo com a legislação em vigor, tanto as consultas de planeamento familiar como os métodos contracetivos são gratuitos para os utilizadores dos serviços públicos de saúde1. Ainda assim, continua a ocorrer um número significativo de gravidezes não planeadas2 que poderão estar relacionadas com a falta de informação sobre contraceção, com a baixa frequência de consultas de planeamento familiar ou de consultas de ginecologia ou ainda com o deficiente uso dos métodos contracetivos escolhidos.

O estudo sobre avaliação das práticas contracetivas em Portugal levado a cabo pela Sociedade Portuguesa de Ginecologia (SPG) e Sociedade Portuguesa da Contraceção (SPDC) em 2015, teve por objetivo principal fazer um levantamento sobre as opções contracetivas das mulheres residentes em Portugal. Em simultâneo, procurou-se avaliar a preparação dessas mulheres para o uso de métodos contracetivos e identificar o modo como a informação foi adquirida, bem como as expetativas das mulheres face à contraceção e o impacto do uso da contraceção na qualidade de vida.

Este estudo foi efetuado, considerando grupos de mulheres em diferentes faixas etárias, a sua caracterização sociodemográfica e as diferenças decorrentes da idade ou do grau de instrução da população, tendo em vista a implementação de estratégias de planeamento, formação e informação otimizadas.

Procurou-se, por fim, estabelecer uma comparação entre as práticas contracetivas atuais da população portuguesa com os resultados encontrados em estudo semelhante, realizado, em 2005, pela Sociedade Portuguesa de Ginecologia3.

Material e métodos

Este estudo epidemiológico, transversal, foi elaborado com base num inquérito realizado através de uma amostra representativa da população do sexo feminino, em Portugal continental e nas regiões autónomas, com idades compreendidas entre os 15 e os 49 anos. As mulheres inquiridas tinham de responder presencialmente e de forma anónima a 21 perguntas. O desenho dessa amostra foi estratificado em função da região e da idade, sendo respeitada a distribuição por faixas etárias da população residente (15-19, 20-29, 30-39 e 40-49 anos) e a sua representação por quotas. Os cálculos basearam-se numa estimativa amostral de indivíduos do sexo feminino com idade compreendida entre os 15 e os 49 anos, subdivididos por Região e grupo etário (INE, Censos 2011)4. Relativamente às probabilidades de erro, a amostra foi estimada para um nível de significância de 5% e para um poder estatístico do inquérito de 80%. Concluiu-se que, para um erro amostral inferior a 1,5%, e para uma representatividade a nível nacional, seria necessária uma amostra de 4.000 mulheres.

A resposta às 21 perguntas foi obtida por abordagem domiciliária, através de entrevista individual presencial, conduzida por metodologia de random route e contacto porta-a-porta, e realizadas de segunda-feira a domingo, entre as 10.00h e as 21.30h, nos meses de dezembro de 2014 a março de 2015.

Foi previamente obtido o consentimento informado oral para a resposta às questões integrantes ao formulário. A realização do estudo foi notificada à Comissão Nacional de Proteção de Dados.

A análise estatística dos resultados foi efetuada utilizando o Software SPSS 20.0.

Resultados

O questionário foi feito a 4.003 mulheres em sete regiões geográficas do país, cuja distribuição está representada na Figura 1.

 

 

Todas as inquiridas responderam à primeira parte do inquérito, sendo que apenas responderam à questão de saber «se utilizava algum método de contraceção» 3.226, que declararam ter atividade sexual.

A segunda parte do inquérito, por dizer respeito à caracterização da contraceção, foi respondida apenas pelas 3.035 mulheres que referiram estar a usar algum método contracetivo.

Caracterização sociodemográfica da população

A idade média das mulheres inquiridas era de 32,5 anos, sendo a distribuição por faixa etária descrita no Quadro I.

 

 

A maioria das mulheres tinha um nível de escolaridade médio/elevado, 86,9% das quais com grau de instrução correspondente a ensino secundário ou universitário, descrita no Quadro I. No grupo dos 30 aos 39 anos foi encontrada a maior percentagem de mulheres com curso superior ou ensino secundário (52% e 43% respetivamente). Sessenta por cento das inquiridas exerciam atividade profissional, 23% eram estudantes e pertenciam maioritariamente aos dois primeiros grupos, entre os 15 e 29 anos, descrito no Quadro I.

Avaliação de conhecimentos sobre contraceção

Foi objeto de inquérito o nível de informação sobre sexualidade, incluindo a obtida em meio escolar. A análise por faixa etária mostra diferenças significativas entre todos os grupos, sendo que o acesso a informação sobre sexualidade em meio escolar foi mais frequente nos grupos com idades inferiores a 30 anos: 69,8%, dos 15 aos 19 anos*; 65%, dos 20 aos 29 anos; 20%, dos 30 aos 39 anos e 5% dos 40 aos 49 anos* (*p<0,001), dados não representados.

Do inquérito faziam parte questões tendentes à identificação das fontes de informação sobre contraceção tendo as respostas revelado a importância do médico nesse papel (médico de família e ginecologista, respetivamente em 52% e 32,4% das situações). A análise por faixa etária mostra diferenças significativas (p<0,001), entre todos os grupos no tocante a fontes de informação sobre contraceção. O grupo das mulheres mais velhas privilegia a informação veiculada pelo médico de família (66% no grupo etário dos 40 aos 49 anos e 58% no grupo dos 30 aos 39 anos) e pelo médico ginecologista (35% e 43% respetivamente). Por sua vez, as mulheres de faixas etárias com idades inferiores a 20 anos procuram informação na internet ou junto de colegas/amigos (46,1% e 45,9% respetivamente), dados representados na Figura 2.

 

 

Análise de comportamentos e práticas contracetivas

Sessenta por cento da população do estudo teve, no último ano, uma consulta de planeamento familiar ou de ginecologia. A análise por faixa etária mostra diferenças significativas (p<0,001), sendo que, segundo os dados do último ano, as mulheres em faixas etárias com idades inferiores têm uma frequência muito menor de consultas de planeamento familiar ou de ginecologia que as mulheres em faixas etárias com idades superiores (11,9% no grupo dos 15 aos 19 anos, 48,7% no grupo dos 20 aos 29 anos, 77,4% no grupo dos 30 aos 39 anos, 74,8% no grupo dos 40 aos 49 anos), dados não representados.

Das 4.003 mulheres inquiridas, 3.226, ou seja, 80,6%, eram à data sexualmente ativas. Quando analisados por faixa etária, os dados obtidos permitiram verificar que 28,8% das mulheres entre os 15 e os 19 anos têm atividade sexual, em contraste com os 85% na faixa etária dos 20 aos 29 anos, 94,0% na faixa etária dos 30 aos 39 anos, 91,7% na faixa etária dos 40 aos 49 anos (p<0,001), dados não representados.

Noventa e quatro por cento das inquiridas com atividade sexual, afirmaram usar um método contracetivo. Na faixa etária da adolescência apenas 4,7% das inquiridas sexualmente ativas não referiram uso de contraceção. O grupo de mulheres na faixa etária entre os 40 e os 49 anos, é aquele em que a percentagem de mulheres sexualmente ativas que não recorre a qualquer método contracetivo é mais elevada (9,2%).

As 3.035 mulheres que, à data do inquérito, utilizavam um método contracetivo responderam maioritariamente que o aconselhamento para uso desse método era feito por um médico (o médico de família em 48,8% dos casos e o médico ginecologista em 31,8% dos casos), as diferenças entre o aconselhamento feito por estes profissionais está representada no Quadro II.

 

 

Os médicos de família privilegiam o aconselhamento dos contracetivos hormonais, preferencialmente a pilula, enquanto os médicos ginecologistas privilegiam as novas vias de administração dos estroprogestativos e os métodos contracetivos de longa duração.

Cerca de 46,9% das mulheres obtêm o contracetivo gratuitamente, no Centro de Saúde ou no Hospital. As que o adquirem na farmácia de oficina, 18% fazem-no com receita médica e 15% compram-no diretamente sem receita médica.

A pílula continua a ser o método contracetivo preferencialmente utilizado pelas mulheres portuguesas, sendo o seu uso declarado por 58,1% das inquiridas. Considerado isoladamente, o preservativo masculino foi o segundo método contracetivo mais utilizado; foi utilizado por 14,3% dos casais, representado na Figura 3.

 

 

A análise por grupo de faixas etárias mostra diferenças significativas no tipo de método contracetivo utilizado, consoante a idade. Os jovens destacam-se na utilização do preservativo, o grupo dos 30 aos 39 anos, na utilização da pílula e o grupo dos 40 aos 49 na utilização de DIU/SIU, representado na Figura 4

 

 

Das mulheres que afirmaram utilizar algum método de contraceção (n=3035), 5,4% (n=164) utilizam simultaneamente, a pílula e o preservativo. A utilização destes 2 métodos em simultâneo tem maior expressão nas mulheres das faixas etárias dos 15 aos 19 anos e dos 20 aos 29 anos (24%).

Das mulheres que usam preservativo, a maioria pensa no uso do preservativo simultaneamente como contracetivo e como proteção (80%).

No que diz respeito à análise por grupo de faixa etária, as mulheres mais velhas assumem com maior frequência, o efeito do preservativo enquanto contracetivo (35% do grupo dos 40-49 anos). No caso das mulheres mais jovens associam o efeito contracetivo e de proteção (92% na faixa etária entre os 15 e os 19 anos), dados não representados.

No global, as mulheres confiam bastante no método contracetivo que utilizam. Os métodos de longa duração, DIU/SIU e implante são aqueles que têm merecido maior confiança por parte das utilizadoras, com 49,9% destas, a atribuir o valor de confiança 5, valor máximo na escala de respostas consideradas. Ao contrário, o método que regista menor nível de confiança é o preservativo masculino a quem apenas 17,8% das mulheres atribui o valor de confiança máximo, representado no Quadro III.

 

 

No que concerne às mulheres que utilizam a pílula como método contracetivo (n=1.766), 22% admitem que se esquecem de tomar a pílula todos os ciclos ou mais de uma vez por mês. No que diz respeito ao esquecimento relativamente à toma da pílula por faixa etária, este é mais frequente nas mulheres mais jovens, sendo que a maioria das mulheres não tem por hábito contar ao médico ou a outro profissional de saúde os esquecimentos da pilula (apenas 15,6% responderam «Sim/às vezes» relativamente a contarem ao médico os esquecimentos da pílula), dados não representados.

Oitenta e oito por cento das mulheres sexualmente ativas conhecem a contraceção de emergência. Dessas mulheres, 84% encontram-se na faixa etária entre os 15 e os 19 anos, 95% na faixa etária entre os 20 e os 29 anos, 93% na faixa etária entre os 30 e os 39 anos e 77% na faixa etária entre os 40 e os 49 anos, dados não representados.

Dezassete por cento das mulheres sexualmente ativas já utilizaram pilula de emergência, em 53% dos casos aconselhada pelo farmacêutico ou por amigas.

O uso de contraceção teve repercussões positivas na qualidade de vida em 81% das mulheres. Para além da segurança contracetiva, um número significativo de mulheres valoriza os benefícios adicionais, nomeadamente regularização do ciclo menstrual (22,2%), melhoria da dismenorreia (16,5%), melhoria da acne (4,9%), amenorreia (3,8%), redução da pilosidade (2,7%), entre outros, dados não representados.

Discussão

Durante o período de 10 anos que medeia entre os dois estudos aqui comparados verificaram-se várias mudanças em Portugal tanto a nível legislativo como a nível socioeconómico com repercussões no uso de práticas contracetivas face à diversidade das opções existentes.

Do ponto de vista sociodemográfico notam-se algumas diferenças entre a população que respondeu ao inquérito em 2005 e a população que participou no inquérito de 2015. Desde logo, os níveis de instrução aumentaram de forma significativa ao longo destes 10 anos e assim podemos verificar que, em 2015, a maioria das mulheres inquiridas tinham o ensino secundário ou formação universitária (72,3 vs 86,9%).

Esta situação, só por si, é suscetível de influenciar a resposta a questões especificamente relacionadas com informação e conhecimento sobre sexualidade e contraceção. Assim, nas questões relativas à informação sobre sexualidade e contraceção obtida em meio escolar verificaram-se diferenças consideráveis entre os grupos de mulheres nas diferentes faixas etárias. As mulheres com menos de 30 anos tinham tido, na sua grande maioria, aulas de educação sexual na escola. Pelo contrário essa percentagem diminuía muito a partir dos 30 anos e era residual depois dos 40 anos. Esta situação não pode ser desligada da obrigatoriedade da educação sexual nas escolas introduzida pela Lei 60/2009 de 6 de Agosto: Estabelece o regime de aplicação da educação sexual em meio escolar5.

No inquérito de 2005 era colocada a questão de saber se o tema da contraceção foi alguma vez abordado pelos professores na escola, ao que 47% das inquiridas responderam afirmativamente. Tal como no inquérito de 2015, também neste caso se verificaram idênticas diferenças entre os grupos de mulheres das faixas etárias mais jovens e os grupos de mulheres das faixas etárias mais elevadas.

As fontes de informação sobre contraceção também variaram em função da faixa etária das inquiridas. Assim as mulheres mais velhas procuram essa informação junto dos médicos (médico de família ou ginecologista), enquanto as mais jovens o fazem junto de amigas. A internet é, em 2015, uma fonte de informação procurada por todos os grupos etários embora com maior expressão nas adolescentes. Em 2005, era o médico ginecologista o profissional de saúde com o qual as mulheres costumavam falar sobre métodos contracetivos (63,3% das respostas), sendo que o médico de família apenas era referido em 33,7% dos casos. Já em 2015, o médico de família passou a ser o principal interlocutor para o tema da contraceção (52% das respostas obtidas). O acesso à informação sobre contraceção diversificou-se, se bem que continue a ser importante o papel do médico (médico de família e/ou ginecologista) para a aquisição dessa informação, o recurso à internet surge como o meio de acesso mais utilizado logo em seguida, tendo em 2015 um lugar de destaque, dados descritos no Quadro IV. Os profissionais de saúde devem ter em conta esta realidade e familiarizar-se com as novas tecnologias e criar conteúdos fiáveis e acessíveis adequando a informação à era digital6.

 

 

Cerca de 3/4 das mulheres inquiridas eram sexualmente ativas. No grupo das adolescentes, a percentagem das que eram sexualmente ativas foi semelhante à encontrada em 2005 o que não revela alterações do padrão de comportamento relativo ao início da vida sexual no grupo dessa faixa etária.

Apesar da gratuitidade das consultas de planeamento familiar nos serviços públicos de saúde, cerca de 40% das mulheres não tinham tido uma consulta no ano anterior à participação no inquérito. Esta situação acontece sobretudo nas mulheres mais jovens, o que poderá constituir motivo de reflexão sobre as vantagens da criação de condições para aproximar estas jovens dos cuidados de saúde. A não comparência às consultas, poderá também ser responsável por menos de metade das mulheres não beneficiar da cedência gratuita dos contracetivos naqueles serviços.

Contudo, o facto de a frequência das consultas ter ficado aquém do esperado não obstou a que a quase totalidade das mulheres sexualmente ativas estivesse a utilizar um método contracetivo. Comparativamente com o que acontecia em 2005, houve um aumento de 18,6% do uso de contraceção (94,1% vs 75,4%)6 pelas mulheres sexualmente ativas. O acréscimo de utilização foi também significativo no grupo das adolescentes, em 2005, 15,9% dessas jovens referia não utilizar contraceção enquanto em 2015 apenas 4,7% desse grupo o não fazia. Este é um bom indicador no que diz respeito à saúde sexual e reprodutiva das jovens e que poderá ter a ver com a inclusão do tema nos conteúdos educativos. Ao contrário do que se poderia antever, é no grupo das mulheres com mais de 40 anos que se encontram taxas mais elevadas de não utilização de contraceção (9,2%). Ainda assim, este valor é significativamente mais baixo do que o encontrado no inquérito de 2015 (31,9%). 

A pílula continua a ser o método contracetivo mais utilizado pelas mulheres portuguesas embora o seu uso tenha vindo a diminuir de 2005 a 2015, passando de 70,4% (pílula isolada ou em associação a outros métodos) para 58,1%6. Nesse período de 10 anos verificou-se um aumento da tendência para utilização de métodos contracetivos menos dependentes da utilizadora, tais como o DIU/SIU ou o implante subcutâneo, descrito no Quadro IV.

A opção pelo SIU, nas mulheres com mais de 40 anos poderá ainda ser associada com a indicação para tratamento das perturbações do ciclo menstrual que se iniciam nesta fase da vida7,8.

O preservativo masculino continua a ser um método contracetivo da preferência de muitos casais, especialmente pelos mais jovens. De referir igualmente um amplo uso, nesta faixa etária, da dupla proteção, o que é sinal de uma maior consciencialização da necessidade de proteção face às infeções sexualmente transmissíveis9.

A pílula continua a ser incorretamente utilizada por um número significativo de mulheres. É nos grupos das faixas etárias mais jovens que predomina o esquecimento num maior número de ciclos. Em 2005, 14% das mulheres referia que os esquecimentos na toma da pílula aconteciam em todos os ciclos e 34% dizia que nunca relatava ao médico estes esquecimentos. Cerca de 38% das inquiridas referiram ter o hábito de parar a pílula para «descanso». Em 2015, 22% das mulheres continua a referir esquecimentos de toma da pílula em todos os ciclos, o que pode comprometer a eficácia do método. Esta situação aponta para a eventual vantagem da utilização de estroprogestativos por outras vias de administração, o adesivo contracetivo e o anel vaginal, que podem contornar os inconvenientes da toma diária de um comprimido10,11.

As mulheres portuguesas confiam no método contracetivo que escolhem e essa confiança é maior nos métodos de longa duração que, em muitos estudos, são posicionados no topo da hierarquia da eficácia12. Aqueles métodos que mereceram menor confiança foram os métodos tradicionais e o preservativo. A contraceção de emergência é conhecida da maioria das inquiridas mas tem diminuído a percentagem daquelas que a ela recorreram.

Os benefícios adicionais da contraceção são significativamente valorizados pelas mulheres portuguesas, nomeadamente, o controlo do ciclo menstrual e da dismenorreia13,14. É importante a crescente tomada de consciência de que a contraceção se traduz em ganhos de saúde ainda assim, há que continuar a investir no aconselhamento e educação, para ajudar as mulheres a tomar decisões informadas e melhorar a adesão ao método escolhido15.

Conclusões

As mulheres portuguesas estão, em geral, bem informadas sobre contraceção. Para tal tem contribuído a o regime legal da educação sexual em meio escolar. As fontes de informação sobre contraceção modificaram-se e são diferentes consoante a faixa etária das mulheres, sendo a busca dessa informação através da internet transversal a todos os grupos. Os médicos continuam a ser os profissionais de saúde que as mulheres procuram no aconselhamento sobre o método que pretendem utilizar e o papel do médico de família nesta área tem vindo a ganhar importância. O número de mulheres sexualmente ativas que usam contraceção é próximo dos 100% mantendo-se a pílula como a primeira opção das mulheres portuguesas, se bem que os métodos contracetivos de longa duração tenham vindo a obter maior destaque no panorama da contraceção. O preservativo mantém a sua importância sendo os jovens que mais o utilizam, alertados para o seu papel concomitante de prevenção das infeções sexualmente transmissíveis. As mulheres portuguesas têm, em geral, a perceção de que o uso da contraceção pode ter benefícios na organização da vida de um casal e melhorar a qualidade de vida.

Notas finais

A execução do inquérito no terreno e a análise estatísticas dos resultados estiveram a cargo da Keypoint, Consultoria Científica, Lda.

Operacionalização: Lénia Nogueira; Relatório Estatístico: Ana Macedo

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence

Fernanda Águas

E-mail: faguas@netcabo.pt

 

Agradecimentos

A SPG e a SPDC agradecem à Gedeon Richter o patrocínio que permitiu concretizar este estudo.

 

Recebido em: 19/6/2016

Aceite para publicação: 10/8/2016