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Laboreal

versão On-line ISSN 1646-5237

Laboreal vol.12 no.2 Porto dez. 2016

https://doi.org/10.15667/laborealxii0216jwpt 

O DICIONÁRIO

 

(Acerca da) Resiliência organizacional

(Acerca de la) Resiliencia organizacional

(À propos de la) Resilience organisationnelle

(About) organisational Resilience

 

 

Jorge Walter

Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Técnicas (CONICET).

Centro de Investigaciones por una Cultura de Seguridad de la Escuela de Administración y Negocios de la Universidad de San Andrés.

Vito Dumas 284, Victoria, Provincia de Buenos Aires

Argentina

walter@udesa.edu.ar

 

 

Resiliência alude à capacidade de recuperação de um sistema após ter sofrido uma alteração. A este respeito, recuperamos a seguinte definição: “característica que alguns sistemas possuem e que lhes permite responder a necessidades repentinas e não antecipadas para a atuação e depois voltar à sua condição normal de funcionamento com rapidez e com uma redução mínima do seu rendimento” (Cook & Nemeth, 2013, p.321, tradução livre). Ainda na mesma obra de onde retirámos esta citação, eis a definição proposta pelos seus editores: “a característica fundamental de uma organização com resiliência é que não perde o controlo sobre o que faz, mas, pelo contrário, é capaz de continuar e de se adaptar” (Hollnagel, Woods & Levenson, 2013, p.378, tradução livre) ou, dito de outra forma, é capaz de se recuperar e continuar a funcionar. Quanto à primeira definição, convém evitar quaisquer ambiguidades, prestando atenção ao seguinte esclarecimento dos editores do livro: a resiliência não é uma característica que o desenho do sistema “possui” (e que pode ser obtida “simplesmente introduzindo mais procedimentos, proteções e barreiras”), mas sim o resultado de um “controlo contínuo da sua atuação” (...) “o facto de ocorrer um evento não desejado não significa necessariamente que a segurança em si tenha falhado, mas sim que isso poderia dever-se também ao facto de que a segurança nunca é total ou absoluta (Hollnagel et al., 2013, p.377, tradução livre). Para explicar o anterior, recorrem ao conceito de racionalidade limitada cunhado por Herbert Simon nos finais dos anos quarenta do século passado. Este visa criticar a suposta racionalidade omnisciente do desenho baseado no “estudo científico da organização do trabalho” por parte de pensadores clássicos da administração como Taylor ou Fayol, pois “nem sempre há tempo suficiente para ser suficientemente minucioso” (e) “de facto o fator mais importante é provavelmente a necessidade de obter tempo para evitar perder o controlo, como descrito no compromisso eficiência-minúcia (Hollnagel, 2009, p.175, tradução livre)”. Por outras palavras: as soluções reais surgem normalmente sob pressão temporal e sob a influência de pontos de vista parciais e com informação não exaustiva, quase insuficiente, não sendo, por isso, perfeitas e representando uma fonte de novos problemas que permanecem latentes no sistema, à espera de uma ocasião para se manifestarem. Assim, a ênfase na recuperação do funcionamento normal do sistema torna o conceito de resiliência subsidiário da literatura sobre gestão de crises. A chave da resiliência não reside, na verdade, na adaptação ou na aprendizagem (“um sistema que se limite a confiar na retroalimentação perderá o controlo mais cedo ou mais tarde” - op. cit., p.378), mas sim na resistência e na recuperação do estado anterior. Por essa razão, a literatura sobre o tema incidiu sobre dois aspetos concomitantes da questão: a) a gravidade da catástrofe (que pode e deve ser dimensionada, tal como são avaliados os níveis de risco) e b) a capacidade de reação do sistema perante a catástrofe. Tal foi feito em três níveis: individual (abuso sexual, por exemplo), grupal (um corpo de bombeiros a combater um incêndio florestal que o pode cercar) e organizacional (as empresas sedeadas nas Torres Gémeas em Nova Iorque após os acontecimentos de setembro de 2001). O exemplo referente ao abuso sexual ilustra claramente o seguinte raciocínio: a recuperação da pessoa é mais difícil quando a violação é reiterada e quando a agressão surge no meio familiar (e vice-versa). A recuperação é mais fácil quando a vítima é sociável, militante de alguma causa e tem algum tipo de passatempo que a ajude a distrair-se (e vice-versa). Resumimos esta literatura num texto publicado um ano após a queda das torres, motivados pela grave crise que a Argentina enfrentava nesse momento (Walter, 2002). De um ponto de vista preventivo, as medidas recomendadas a partir do estudo do fenómeno consistiam em: a) antecipar a emergência de uma catástrofe, mediante a deteção de eventos precursores (“pródomos”, como se denominam em medicina os sintomas que precedem o início de uma doença ou a iminência de um parto), b) reforçar a resistência do sistema para enfrentar esses acontecimentos e c) criar sistemas específicos para a gestão das situações de emergência. Na obra de Hollnagel et al. (2013) é comentado o caso de um tsunami que afetou a costa Oeste dos Estados Unidos, dando origem a um alerta confuso e que, aliás, nunca chegou: “Após o tsunami que ocorreu no sudeste asiático em dezembro de 2004, e que todos recordamos, foram implementados sistemas de alerta precoce em diferentes partes do mundo. Em junho do ano seguinte ocorreu um terramoto perto da Califórnia, estando já os novos sistemas preparados para atuar. O sismo foi detetado por dois centros: primeiro, por um centro situado no Alasca e três minutos mais tarde por um centro localizado no Havai. Este informou que não havia risco de tsunami, mas não se referia à costa Oeste dos Estados Unidos, o que gerou a confusão entre as equipas de socorro californianas. Por outro lado, algumas regiões costeiras da Califórnia, com as quais apenas se mantinham comunicações telefónicas, não receberam quaisquer avisos, devido a uma falha nas linhas de comunicação que não foi detetada. Ainda que tenham sido tomadas as devidas precauções e que os procedimentos estivessem preparados, não se sabia se funcionavam na realidade nem não se sabiam quais eram as condições reais (...) Ainda que o sistema estivesse desenhado para procurar fatores específicos no contexto, não estava desenhado para se observar a si próprio (...) não estava desenhado para ter resiliência” (Hollnagel et al., 2013, p.382, tradução livre). Relativamente à resiliência, que contribuição pode dar, por sua vez, a gestão de riscos à gestão das crises? A teoria das organizações de alta fiabilidade (high reliability organisations) colocou em evidência o papel fundamental do operador de primeira linha na deteção dos eventos precursores, graças à sua perceção direta dos acontecimentos anómalos no local e no momento exatos em que ocorrem. Converte-se assim na principal fonte de alertas precoces (Roberts, Stout & Halpern, 1994). A valorização e o reforço do seu papel na organização (dotando-o dos recursos de que necessita para o efeito) é fundamental para a antecipação dos problemas antes de estes ocorrerem (ou antes de as suas consequências se agravarem) e para que a rápida intervenção ocorra de acordo com procedimentos predefinidos e com o apoio imediato das equipas de gestão, constituídas para o efeito. Relativamente a estas últimas, Hollnagel e os seus colegas consideram que uma competência fundamental é a “imaginação necessária” que consiste em “ir mais além da experiência, esperar o inesperado e p rocurar algo mais além do simplesmente óbvio” (Hollnagel et al., 2013, p.379, tradução livre). Esta competência relaciona-se com a integração no raciocínio dos gerentes e técnicos daquilo que Perrow (2009) denomina como “complexidade interativa”, que lhes permite escapar ao reducionismo que caracteriza a racionalidade limitada. Também se relaciona com a “capacidade do sistema para se observar a si próprio”, ou seja, com a aptidão e a vontade autocrítica dos seus membros.

 

Referências bibliográficas

Cook, R.I., & Nemeth, C. (2013). “Tomando las cosas con calma. Rasgos cognitivos de dos actuaciones con resiliencia.” In E. Hollnagel, D. D. Woods, y N. Levenson (Eds.), Ingeniería de la resiliencia. Conceptos y preceptos (pp. 231-249). Valencia: Modus Laborandi.         [ Links ]

Hollnagel, E. (2009). Barreras y prevención de accidentes, Madrid: Modus Laborandi. (Obra originalmente publicada em inglês, em 1988).

Hollnagel, E., Woods, D.D., & Levenson, N. (Eds.) (2013). Ingeniería de la resiliencia. Conceptos y preceptos, Valencia: Modus Laborandi.         [ Links ] (Obra originalmente publicada em inglês, em 2006).

Perrow, C. (2009). Accidentes Normales. Convivir con las tecnologías de alto riesgo. Madrid: Ed. Modus Laborandi.         [ Links ] (Obra originalmente publicada em inglês, em 1986).

Reason, J. (2008). El Error Humano. Madrid, Ed. Modus Laborandi.         [ Links ] (Obra originalmente publicada em inglês, em 1991).

Roberts, K. H., Stout, S. K., & Halpern, J. J. (1994). Decision Dynamics in Two High Reliability Military Organizations, Management Science, vol. 40, 5, pp.614-624.

Walter, J. (2002). Tecnologías de Gestión. Revista Encrucijadas, 2, 20, pp.64-72.

 

COMO REFERENCIAR ESTE ARTIGO?

Walter, J. (2016). (Acerca da) Resiliência organizacional. Laboreal, 12 (2), 127-129. http://dx.doi.org/10.15667/laborealxii0216jwpt

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