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Revista Portuguesa de Ortopedia e Traumatologia

versão impressa ISSN 1646-2122

Rev. Port. Ortop. Traum. vol.23 no.2 Lisboa jun. 2015

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Complicações associadas a extension block pinning no tratamento de ?mallet finger?

 

Tiago Pinheiro TorresI; Guido DuarteI; Miguel FriasI; Ricardo Santos PereiraI; Daniel SaraivaI; José MarinhasI; Filipe Lima SantosI

I. Serviço de Ortopedia do Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia. Espinho.

 

Endereço para correspondência

 

RESUMO

Introdução: O “mallet finger” é uma deformidade comum. O tratamento é geralmente conservador. No entanto, em casos de situações agudas com fractura-arrancamento superior a 1/3 das superfície articular e subluxação da falange distal preconiza-se o tratamento cirúrgico.
Uma das técnicas actualmente mais utilizada foi descrita por Ishigura e consiste num bloqueio percutâneo em extensão com utilização de dois fios de kirshner (extension block pinning).

O objectivo deste trabalho foi avaliar as complicações de uma série de doentes operados entre 2009 e 2014. O Ponto de partida para este trabalho é uma noção de inconsistência nos resultados obtidos e consequente procura dos motivos que podiam justificar essa inconsistência de resultados. Não faz parte do objectivo discutir indicações cirúrgicas ou fazer comparações com outras técnicas.

Material e Métodos: Estudo retrospectivo de uma série de 15 doentes sumetidos a tratamento cirúrgico na nossa instituição, pela técnica já referida.
Resultados: Todos os doentes foram operados no serviço de urgência. O tempo médio de espera foi de 8 horas. 9 doentes eram do sexo masculino. Os erros técnicos encontrados foram: fios de kirshner com diâmetro maior do que suposto; flexo da IFD; falência da redução; falência do encavilhamento trans-articular. Houve necessidade de reintervenção em 2 doentes com conversão em cirurgia aberta e fixação do tendão com uma âncora.

Discussão/Conclusão: O tratamento deste tipo de deformidade mantém-se controverso. Não há nenhum método (aberto ou fechado) em que haja excelentes resultados de forma consistente. O método descrito neste trabalho tem em teoria bons resultados, desde que utilizado em doentes com boa indicação, por cirurgiões com experiência e conhecedores da técnica. As pequenas deformidades residuais são bem toleradas pelo doente, pelo que pode justificar-se maior ponderação na colocação da indicação cirúrgica.

Palavras chave: mallet finger, extension block pinning, mão.

 

ABSTRACT

Introduction: Mallet finger is a common deformity. Treatment is usually conservative.

However, in cases of acute situations with a fracture with an avulsion greater than 1/3 of the articular surface and subluxation of the distal phalanx surgical treatment is mandatory. One of the most common techniques used today was described by Ishigura and consists of an extension block pinning with the use of two K wires. The purpose of this study was to evaluate the complications of a series of patients operated between 2009 and 2014. The starting point for this work is notion of an inconsistency of the results and consequent demand for reasons that could justify this inconsistency results. It is not the aim to discuss surgical indications or make comparisons with other techniques.

Material and Methods: Retrospective study of a series of 15 patients undergoing surgical treatment in our institution with the technique referred previously. Results: All patients were operated in the emergency room. The average waiting time was 8 hours. 9 patients were male. Technical errors were: Kirshner wires with a diameter greater than assumed; flexion of DIF; failure of reduction; failure of the trans-articular nailing. There was need for reintervention in 2 patients with conversion to an open surgery and fixation of the tendon with an anchor.

Discussion / Conclusion: The treatment of this type of deformity remains controversial. There is no method (open or closed) where there is excellent results consistently. The method described in this paper has theoretically good results, provided it is used in patients with good indication, by surgeons experienced and skilled in the art. Small residual deformities are well tolerated by the patient, so you can justify a higher prudence in the placement of surgical indication.

Key words: mallet finger, extension block pinning, hand.

 

INTRODUÇÃO

A deformidade em flexo da IFD de um dedo da mão (“mallet finger”) resulta de uma avulsão do tendão extensor da base da falange distal, com ou sem fragmento ósseo1. (Figura 1 e 2) O mecanismo de lesão é por carga axial ao nível da falange distal. O tratamento é geralmente conservador.

 

 

 

No entanto, em casos de situações agudas em que há fractura-avulsão superior a 1/3 das superfície articular e subluxação da falange distal – tipos IVb e IVc segundo a classificação de Doyle e tipo III de Wehbe-Schneider - preconiza-se o tratamento cirúrgico2,3,4,5. A redução aberta está associada a uma série de complicacões amplamente descritas: cicatriz, infecção, perda de redução, rigidez articular e deformidade6. Nesse sentido cada vez mais se opta pelo tratamento percutâneo. Uma das técnicas fechadas actualmente mais utilizada foi descrita por Ishigura e consiste num bloqueio percutâneo em extensão com utilização de dois fios de kirshner (extension block pinning)5. No entanto, esta técnica é susceptível a incorrecções e erros, os resultados são fortemente penalizado pelas imprecisões e a curva de aprendizagem é exigente. O Ponto de partida para este trabalho é uma noção de inconsistência nos resultados obtidos e consequente procura dos motivos que podiam justificar essa inconsistência de resultados. Não faz parte do objectivo discutir indicações cirúrgicas ou fazer comparações com outras técnicas

Extension block pinning ? técnica cirurgica

A técnica descrita inicialmente por Ishigura em 1988, tem vindo a sofrer algumas modificações7,8,9.

O procedimento está indicado em deformidades em martelo com fragmento ósseo desviado e que envolva mais de 1/3 da superfície articular, com ou sem subluxação da falange distal e naqueles doentes em que a redução fechada com imobilização com tala não tenha sido eficaz. Originalmente a técnica foi descrita para ser realizada sob anestesia com bloqueio digital, embora na nossa instituição se realize na maioria das vezes sob anestesia geral / sedação com o apoio imagiologico. Devemos colocar as articulações IFP e IFD sob máxima flexão. Com o apoio imagiológico, um fio de kirshner (0,9 – 1,4 mm) deverá ser inserido percutaneamente através do tendão extensor e fixado na cabeça da falange intermédia, em inclinação distal e num ângulo de cerca de 45º ao eixo do dedo. De seguida, deve-se fazer extensão a 0º da falange distal no sentido de reduzir a fractura, e fixar a articulaçao IFD com um segundo fio de kirshner que deverá atravessar a articulação. Os fios devem ser retirados às 4-6 semanas assim que haja evidência radiológica de consolidação. (Figura 3)

 

 

 

MATERIAL E MÉTODOS

Avaliou-se uma série contínua de 15 doentes operados entre 2010 e 2014 na nossa instituição, a fracturas que envolviam 1/3 ou mais da superfície articular pelo método anteriormente descrito. Este estudo retrospectivo focou-se nas complicações obtidas e na tentativa de caracterizar incorrecções e erros cometidos e relacioná-los com os resultados obtidos. Todos os doentes foram operados no serviço de urgência. O tempo médio de espera foi de 8 horas.

Nove doentes eram do sexo masculino. A idade média dos doentes foi 34. Os dedos comprometidos foram: em 5 casos, o 5º dedo; em 4 casos, o 3º dedo, em 4 casos o 2º dedo e em 1 caso o 4º dedo. Num caso a deformidade foi do 4º e 5º dedos. Em 9 casos a lesão foi na mão dominante. Nenhuma fractura foi exposta.

Dez doentes foram seguidos em consulta externa na nossa instituição. Os restantes foram para outras instituições após a cirurgia, ou devido a área de referenciação distinta ou por se tratar de acidentes laborais.

A avaliação dos resultados incidiu sobre as complicações e erros técnicos cometidos pela visualização dos RXs pós-operatórios imediatos, RXs após extracção dos fios de kirshner, RXs actuais, entrevistas telefónicas, entrevistas presenciais. O follow-up médio foi de 12 meses.

 

RESULTADOS

As complicações encontradas na nossa série foram as descritas na tabela em anexo (Tabela 1)

 

 

Após observação dos RXs pós-operatórios encontrámos alguns erros técnicos: fios K com diâmetro maior do que suposto; redução incompleta da deformidade e/ou da fractura; falência da redução ao longo do período de tratamento; insucesso do encavilhamento. Houve necessidade de reintervenção em 2 doentes com conversão em cirurgia aberta e fixação do tendão com uma âncora. (Figuras 4, 5 e 6)

 

 

 

 

 

DISCUSSÃO

A técnica descrita por Ishigura pretende ser um procedimento de redução indirecta da fractura5,13. Os resultados descritos pelo autor e pelos autores que publicaram modificações ao procedimento original (Hofmeister et al; Lee YH et al; Lee SK et al, Jorgsholm et al. Tetik e Gudemez) variam: perda de extensão até 20º e taxa de complicações de 5 a 60%9.

As complicações encontradas na nossa série estãode acordo com os resultados de series recentes publicadas. Orhun (2009) descreve como normal alguma perda na extensão dos doentes que também referem uma deformidade ao nível da região da IFD.A obrigatoriedade do apoio imagiológico também é referida como uma desvantagem.

Os defensores da redução aberta advogam que é importante a visualização da superfície articular para o cirurgião se assegurar da redução no sentido de evitar alterações degenerativas e perda de mobilidade articular10,11,12.

Ishiguro (1988) descreveu que o fio trans-articular deverá ser introduzido radial ou cubitalmente no sentido de evitar penetrar no foco de fractura, o que poderá levar a perda de redução e interferir com a consolidação óssea5,13. Shariatzadeh (2009) num artigo acerca desta técnica, refere que a trans-fixação da articulação, ainda que temporária, deverá ser a causa da recuperação incompleta do arco de mobilidade da IFD e da obtenção de resultados não favoráveis. As complicações descritas foram a lesão articular, a infecção dos fios e a deformidade da unha. Agarwal (2012) descreve a dificuldade técnica na abordagem da IFD por via percutânea e a inefectividade deste procedimento na abordagem de calo em deformidades subagudas ou crónicas. Kumar (2013) descreve que as complicações são inerentes às dificuldades na redução e fixação; e que as complicações associadas ao procedimento são a lesão da cartilagem aguando da fixação da IFD, infecção do local de inserção dos fios e deformidade da unha. Uzun (2012) descreve que a complicação mais comum da técnica descrita por Ishiguro é a artrose secundaria da articulação IFD especialmente quando há necessidade de várias tentativas de encavilhamento.

Como vemos, há uma série de autores a publicar artigos com complicações inerentes ao método. Há também uma série de artigos publicados com modificações da técnica original o que nos leva a concluir que os resultados apresentados são controversos, não sendo consistentes nem satisfatórios9,14,15. No entanto, em nenhum trabalho publicado há referência a erros técnicos que levam a falência do método. Os erros cometidos podem ser explicados por:ambiente de urgência; equipas diferentes e heterogéneas quanto ao grau de diferenciação; inexperiência das equipas cirúrgicas, por má qualidade do aparelho de apoio imagiológico utilizado, por inexistência de material adequado e/ou por má indicação para este tipo de cirurgia.

A técnica utilizada apresenta resultados satisfatórios, desde que utilizada por cirurgiões com experiência e conhecedores da teoria inerente à técnica, desde que utilizada em doentes com as indicações já enunciadas.

 

CONCLUSÃO

O tratamento deste tipo de deformidade mantém-se controverso. Não há nenhum método (aberto ou fechado) em que haja excelentes resultados de forma consistente. O método descrito neste trabalho tem em teoria bons resultados, desde que utilizado em doentes com boa indicação, por cirurgiões com experiência e conhecedores da técnica. As pequenas deformidades residuais são bem toleradas pelo doente, pelo que pode justificar-se maior ponderação na colocação da indicação cirúrgica.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Conflito de interesse:

Nada a declarar

 

Endereço para correspondência

Tiago Pinheiro Torres
Serviço de Ortopedia do Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia/ Espinho
R. Dr. Francisco Sá Carneiro
4400-129 Vila Nova de Gaia
Telefone: +351 22 786 5100
tiagocpt@gmail.com

 

Data de Submissão: 2015-03-07

Data de Revisão: 2015-09-06

Data de Aceitação: 2015-09-28

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