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Revista Portuguesa de Ortopedia e Traumatologia

versão impressa ISSN 1646-2122

Rev. Port. Ortop. Traum. vol.20 no.1 Lisboa mar. 2012

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Pubalgia como uma das causas de dispareunia

 

Ademir SchuroffI; Marco PedroniI; Mark DeekeI; Josieano ValérioI; Maria VargasI; Renato LocksI; Raphael BrandãoI

I. Grupo de Cirurgia do Quadril. Hospital Universitário de Cajuru e Clínica Privada. Brasil.

 

Endereço para correspondência

 

RESUMO

Objetivo: Relatar uma série de casos de mulheres portadoras de dispareunia, que não apresentavam causas ginecológicas ou emocionais e tiveram como diagnóstico diferencial a pubalgia. Métodos: Foram avaliadas 15 mulheres com idade entre 20 e 64 anos, média 33,1anos, estas apresentavam como queixa principal a dispareunia. Realizou-se história e exame físico, radiografias de pelve e ressonância nuclear magnética nos casos com radiografias normais. Após o diagnóstico foi indicado tratamento com antiinflamatório (cox 2), fisioterapia e infiltração com corticoesteróide nos casos refratários. Após 60 dias, avaliou-se as pacientes quanto a adesão ao tratamento e resultado clínico. Resultados: Na avaliação inicial constatou-se que 66,7% das pacientes eram sedentárias, 26,6% apresentavam cirurgia ginecológica prévia, 46,7% tinham história gestacional prévia e 66,7% apresentavam alterações radiográficas na sínfise púbica. Após 60 dias verificou-se que 73,3% realizaram o tratamento proposto, destas, 36,3% necessitaram infiltração com corticoesteróide. Na avaliação quanto à dispareunia, 80% se disseram curadas ou com melhora parcial. Na comparação entre os resultados obtidos após 60 dias e as variáveis em questão no estudo Fisher, verifica-se que a única variável que está significativamente associada com o resultado após 60 dias é: fisioterapia. Observa-se, para esta variável, que os pacientes Curados todos (100%) fizeram fisioterapia e os que permaneceram Igual, todos (100%) não realizaram fisioterapia (p=0,009). Conclusão: A pubalgia deve ser lembrada pelo profissional de saúde com uma das causas de dispareunia, evitando o não diagnóstico e retardo no tratamento. O tratamento conservador, apesar da amostra reduzida, apresentou resultados satisfatórios quando as pacientes aderiram ao tratamento.

Palavras chave: pubalgia, dispareunia, mulheres, osteíte púbica.

 

ABSTRACT

Objetive: To report a case series of women with dyspareunia who had no gynecological or emotional causes and had pubalgia as differential diagnosis. Methods: 15 women were evaluated with ages between 20 and 64 years, mean 33,1 years, that presented as main complain dyspareunia. Historic and physical examination were conducted, radiographs of the pelvis and magnetic resonance imaging in the cases with normal radiographs . After diagnosis, treatment given was with anti-inflammatory (cox 2), physiotherapy and corticosteroid infiltration in refractory cases. After 60 days, pacients were evaluated for treatment adherence and clinical results. Results: At baseline was found that 66,7% of the patients were sedentary, 26,6% presented previous gynecological surgery, 46,7% had previous pregnancy history and 66,7% presented radiographic changes pubic symphysis. After 60 days it was founded that 73,3% underwent the treatment, from which 36,3% required infiltration with corticosteroid. As for the evaluation of the dyspareunia, 80% reported to be cured or had a partial improvement.When comparing the results obtained after 60 days and the variables in question on Fisher's study, it appears that the only variable that is significantly associated to the result after 60 days is: Physiotherapy. For this variable it is observed that all cured patients (100%) had physiotherapy and those who remained the same, all (100%) did not undergo physiotherapy. (p=0,009). Conclusion: Pubalgia must be considered by the health professional as one of the dyspareunia's causes, avoiding lack of diagnosis and delay on treatment. Conservative treatment, dispite of the reduced sample, shows satisfatory results when there is adherence to treatment.

Key words: Pubalgia, dyspareunia, women, osteitis pubis.

 

INTRODUÇÃO

A pubalgia é uma doença inflamatória dolorosa que envolve os ossos púbicos, a sínfise púbica e as estruturas adjacentes[1]. A incidência em atletas varia de 0,5 a 7% e na população em geral não tem sido relatada[2].

A patogênese da pubalgia não é clara, microtraumas periostais na sínfise como nas inserções musculares, são um dos fatores etiológicos comuns, assim como desequilíbrios da musculatura da região adutores, retos abdominais, e dos músculos dos quadril, coxa e coluna. Alem disso fatores mecânicos como artrose de quadril e impacto femoro acetabulares, podem também estar associados a gênese dos sintomas da pubalgia[1,3].

Os sintomas incluem dor localizada na sínfise púbica ou irradiada para baixo ventre, costas, períneo ou parte interna da coxa ao caminhar, correr, subir escadas, espirrar ou durante o ato sexual (Dispareunia) [4,5].

A Dispareunia é um sintoma com amplo diagnóstico diferencial e exige anamnese e exame físico detalhados. Do ponto de vista musculoesquelético, a pubalgia, miopatias do assoalho pélvico e a fibromialgia, tem recebido relatos como causa deste sintoma[5].

Os exames de imagem que auxiliam no diagnóstico de modo complementar são radiografias anteroposterior da bacia com apoio bi-podálico ou monopodálico, radiografias em incidência Inlet e Outlet, ultrassonografia, cintilografia óssea e ressonância magnética[6].

O objetivo deste estudo é relatar uma série de casos de mulheres portadoras de dispareunia, que não apresentavam causas ginecológicas ou emocionais, diagnosticadas pelo medico ginecologista, mas que foram avaliadas pelo ortopedista, tiveram como diagnóstico diferencial a pubalgia.

 

MÉTODOS

Foram incluídas no estudo inicialmente 18 mulheres, destas, três perderam segmento e foram excluídas. Faixa etária do grupo ficou distribuída entre 20 e 64 anos, média 33,1 (DP 12,2), as mesmas procuraram atendimento em consultório especializado em ginecologia com queixa de dispareunia.

Durante o exame, realizado pelo médico ginecologista, notou-se que as pacientes apresentavam exame ginecológico e emocional normal. Queixavam dor à palpação, durante o exame de toque vaginal, da sínfise púbica e estruturas circundantes. Todas as pacientes foram examinadas pela mesma profissional, que subsequentemente encaminhou-as à avaliação ortopédica no período de dezembro de 2005 à julho de 2010.

A avaliação ortopédica também foi realizada pelo mesmo profissional em sua totalidade, as pacientes eram questionadas quanto a idade, profissão, prática de atividade física, presença de dor durante a atividade física nas praticantes, história patológica pregressa e gestacional (parto normal ou cesário) .

No exame físico realizou-se a palpação superficial do púbis e estruturas circundantes, manobra de adução contra resistência de membros inferiores e flexão abdominal com adução simultânea de membros inferiores (Manobra de Grava)[7] e manobras clássicas de exame físico do quadril.

Todas as pacientes foram submetidas a exame radiológico de pelve na incidência antero-posterior sem apoio e inlet e outlet. Algumas pacientes com dores mais exacerbadas ao exame clinico, foram solicitadas exame de Ressonância Nuclear Magnética (RNM) da Pelve nas pacientes com radiografias sem alterações.

Realizada o diagnóstico de pubalgia através dos achados clínicos e de imagem, as mesmas receberam prescrição de antiinflamatório não esteroide (Cox 2) durante 10 dias e fisioterapia (10 sessões, inicialmente) com ênfase na correção dos desequilíbrios de partes moles e reeducação do equilíbrio propriocetivo muscular e postural de coluna/ quadril. As pacientes que após o término das 10 primeiras sessões, não apresentavam melhora dos sintomas eram submetidas a infiltração com corticoesteróide na sínfise púbica e reencaminhadas a fisioterapia.

Após 60 dias da primeira consulta, as pacientes foram reavaliadas e questionadas quanto a adesão ao tratamento fisioterápico, postural proposto e quanto a evolução do quadro clínico em relação ao inicio do tratamento, dividido da seguinte forma:
- Pior ( Aumento da intensidade da dispareunia)
- Igual (mesma intensidade)
- Melhora parcial (Dispareunia eventual)
- Cura

Análise Estatística

Os dados foram analisados através de tabelas, gráficos, estatísticas descritivas. O seguinte teste estatístico foi realizado:

- Teste Exato de Fisher para a verificação de associação entre as variáveis qualitativas;

Para o teste acima citado o nível de significância máximo assumido foi de 5% (p<=0,05) e o software utilizado para a análise estatística foi o SPSS versão 10.0.

 

RESULTADOS

As pacientes foram divididas em 2 faixas etárias, abaixo e acima de 30 anos, onde foi  observada uma distribuição quase simétrica da amostra. Com relação as atividades  profissionais foi observada uma distribuição heterogênea entre as mais variadas profissões (Quadro I).

 

 

Na avaliação das variáveis relacionadas ao estudo, 26,6% possuíam cirurgia ginecológica prévia, 66,7% não praticavam nenhum tipo de atividade física e entre as praticantes somente uma apresentava dor durante o exercício. Na avaliação radiológica 66,7% apresentavam algum tipo de alteração (Figura 1), cinco pacientes que apresentavam radiografias sem alterações realizaram RNM, em três, o exame era normal e duas apresentavam edema ósseo. A história gestacional foi positiva em 46,7% (sete) das mulheres (quatro tiveram partos cesários e três normais). 73,3% (11) realizaram a fisioterapia prescrita e 36,3% (quatro) destas necessitaram infiltração com corticoesteróide. Obteve-se um número médio de 20 (10-40) sessões de fisioterapia realizadas (Quadro II).

 

 

 

O resultado clínico obtido após 60 dias do início do tratamento é exposto na Figura 2. Realizou-se comparação entre os resultados obtidos após 60 dias e as variáveis em questão no estudo. Através dos resultados do teste Exato de Fisher verifica-se que a única variável que está significativamente associada com o resultado após 60 dias é: Fisioterapia. Observase, para esta variável, que os pacientes Curados todos (100%) fizeram fisioterapia e os que permaneceram Igual, todos (100%) não realizaram fisioterapia. (p=0,009) (Quadro III).

 

 

 

DISCUSSÃO

A dispareunia é motivo freqüente de procura por consultório ginecológico e envolve uma série de crenças e tabus em torno desta tema e afeta a qualidade de vida da mulher e do parceiro[8]. Existe um grande número de possíveis etiologias para este sintoma, dentre elas a pubalgia, não tão rotineira, dificultando a elucidação do fator causal e o tratamento, fato que leva a rotulação de muitas pacientes como portadoras de distúrbios psicológicos.

A pubalgia apresenta-se de forma mais comum em homens e mulheres com faixa etária de 30 a 40 anos[9], dado que vai de encontro ao encontrado no estudo, onde a média de idade foi de 33,1 anos. A maioria dos casos relatados na literatura ocorre em atletas, os quais referem dor durante a prática das atividades esportivas[9]. As 15 mulheres estudadas exerciam as mais diversas profissões e nenhuma exigia esforços excessivos, 66,7% eram sedentárias e entre as praticantes de atividade física somente uma referiu dor durante o exercício.

A pubalgia crônica em mulheres, frequentemente associa-se a condições patológicas obstétricas, ginecológicas e urológicas[10,11]. Dentre as mulheres estudadas, observou-se que 26,6% haviam realizado cirurgia ginecológica prévia e 46,7% possuíam história gestacional positiva, porém estes fatores não estiveram relacionados com piores resultados ao fim do tratamento.

Na avaliação radiográfica dos pacientes com distúrbios da sínfise púbica, são comuns os achados de rarefação óssea com separação da sínfise, sinais de artrose com cistos, osteófitos e esclerose, reparo ósseo a partir do periósteo e deslocamento vertical entre os ossos púbicos[6,12]. Na casuística em questão, 66,7% apresentaram alterações radiográficas, sendo a presença de osteófitos a alteração mais comum, presente em 40%, fato que pode denotar um processo de evolução mais alongado.

A ressonância nuclear magnética é o exame de escolha para o diagnóstico destas lesões. Os achados de edema ósseo na sínfise púbica, alterações degenerativas, líquido intra-articular ou lesão do músculo adutor e lesão do reto abdominal são comumente relacionados a esta patologia[13]. Em virtude do alto custo e de não ser um exame acessível a todas as pacientes, optou-se pela realização da RNM somente nos casos com apresentação radiográfica dentro da normalidade.

O tratamento não cirúrgico tem se tornado o tratamento de escolha para esta condição, envolvendo fisioterapia, antiinflamatórios não esteroidais, injeções de corticoesteróide e radioterapia[14]. Diversas técnicas de tratamento cirúrgico são relatadas, porém seu emprego fica reservado aos casos de falhas do tratamento não cirúrgico[15].

Na avaliação após 60 dias observou-se que 73,3% das pacientes realizaram as sessões de fisioterapia prescritas e os melhores resultados estiveram relacionados a esta parcela da amostra com significância estatística. Isto reforça o diagnóstico de pubalgia, visto que o mesmo é basicamente clínico e deve ser lembrado pelo profissional de saúde como uma das possíveis causas de dispareunia.

As disfunções da sínfise púbica tem sido discutidas na literatura utilizando múltiplas nomenclaturas tais como pubalgia, pubeíte, instabilidade articular pélvica, síndrome do relaxamento pélvico, artropatia pubosacroilíaca, osteíte púbica e sinfisite púbica[16]. Esta divergência de definições, a escassez de trabalhos e as amostras reduzidas, como a do presente estudo, dificultam a busca e a comparação de resultados.

 

CONCLUSÕES

A pubalgia deve ser lembrada pelo profissional de saúde como uma das possíveis causadoras de dispareunia, evitando o não diagnóstico e o retardo no tratamento. O tratamento conservador, apesar da amostra reduzida, apresentou resultados satisfatórios quando ocorre adesão ao tratamento.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Conflito de interesse:

Nada a declarar.

 

Endereço para correspondência

Renato Locks
Rua Luiz Fagundes, 245, apto 201
Praia Comprida ? São José ? SC
Cep: 88103-500
Brasil
renatolocks@yahoo.com.br

 

Data de Aceitação: 2011-09-27

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