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versão impressa ISSN 1646-107X

Motri. vol.14 no.1 Ribeira de Pena maio 2018

 

ARTIGO ORIGINAL   |   ORIGINAL ARTICLE

 

Terapia fascial permite maior rotação do ombro e flexão do cotovelo

 

Fascial therapy allows for greater shoulder rotation and elbow flexion

 

 

Diogo Duarte Carvalho1; Nuno Serra1; Fillipe Bandeira Lima1; Ricardo Jorge Fernandes1

1Universidade do Porto

Correspondência para

 

 


RESUMO

A terapia manual e a electroestimulação têm tido resultados muito positivos na melhoria da funcionalidade corporal através da alteração das características elásticas fasciais. O presente estudo teve como objetivo analisar o efeito agudo de um tratamento combinado de libertação fascial manual e electroestimulação neuromuscular na amplitude e velocidade angulares da rotação interna e externa do ombro, e flexão e extensão do cotovelo, durante um esforço máximo. Um nadador master do escalão etário 50 a 55 anos realizou duas avaliações de rotação interna e externa do ombro e de flexão e extensão do cotovelo num dinamómetro isocinético (Biodex) antes e após aplicação de técnicas manuais de libertação miofascial, fascial visceral e exercícios propriocetivos com electroestimulação neuromuscular e resistência manual. Foram observados aumentos médios na amplitude do movimento na rotação interna e externa do ombro e flexão do cotovelo ~ 6 e 5° (respetivamente) manutenção da velocidade angular máxima em todos os movimentos e diminuição da velocidade média na rotação interna do ombro e flexão e extensão do cotovelo. A terapia aplicada induziu uma melhoria na capacidade de atingir maiores amplitudes angulares, útil para um melhor aproveitamento das ações dos membros superiores durante o nado.

Palavras-chave: terapia fascial, isocinético, amplitude angular, velocidade angular, natação.


ABSTRACT

Manual therapy and electrostimulation have had very positive results in improving body functionality by altering fascial elastic characteristics. The present study aimed to analyze the acute effect of a combined treatment of manual fascial release and neuromuscular electrostimulation on the angular amplitude and velocity of internal and external rotation of the shoulder, and elbow flexion and extension, during a maximum effort. A 50- to 55-year-old master swimmer performed two evaluations of internal and external shoulder rotation and flexion and elbow extension on an isokinetic dynamometer (Biodex) before and after manual techniques of myofascial, visceral fascial and proprioceptive neuromuscular electrostimulation and manual resistance. Mean increases in the range of motion in the internal and external rotation of the shoulder and elbow flexion were observed (6) and (5) (respectively) maintenance of the maximum angular velocity in all movements and decrease of the mean speed in the internal rotation of the shoulder and flexion and extension of the elbow. The applied therapy induced an improvement in the ability to reach greater angular amplitudes, useful for a better use of the actions of the upper limbs during the swim.

Keywords: fascial therapy, isokinetic, angular amplitude, angular velocity, swimming.


 

 

INTRODUÇÃO

A natação pura desportiva (NPD) apresenta uma baixa ocorrência de lesões com origem traumática (fraturas, contusões e entorses) pois é praticada em ambiente aquático e os nadadores competem em pistas separadas. No entanto, mesmo não se tratando de um desporto de contacto, os nadadores apresentam frequentemente lesões graves que os impedem de persistirem nas rotinas diárias de treino e competição (Becker, 2011; Hill, Collins, & Posthumus, 2015; Wanivenhaus, Chaudhury, & Rodeo, 2012), sendo bastante recorrente limitações do seu treino e até o abandono da modalidade devido a patologias cronicas. Alguns nadadores precisam, inclusivamente, de intervenções cirúrgicas para eliminar a dor crónica, não sendo exclusivo de praticantes adultos ocorrendo também com nadadores jovens (Keller & Doperak, 2009).

A terapia manual tem permitido alcançar resultados muito satisfatórios relativamente à melhoria da funcionalidade corporal (principalmente pelos seus efeitos agudos) através de técnicas que podem alterar características elásticas fasciais (Ercole, Antonio, Ann, & Stecco, 2010), tendo sido usada como forma de recuperação e tratamento conservativo em NPD (Laudner, Wenig, Selkow, Williams, & Post, 2015; Leão Almeida et al., 2011;). Também a estimulação elétrica associada ao alongamento muscular demonstrou maior eficiência para aumentar o comprimento muscular, com ou sem a presença de dor, do que unicamente a técnica de alongamento muscular (Song, Seo, & Shin, 2015), podendo mesmo mimetizar a facilitação neuromuscular propriocetiva (PNF) na tarefa de ganhos de amplitude articular (Spernoga, Uhl, Arnold, & Gansneder, 2001).

O presente estudo teve como objetivo analisar o efeito de um tratamento de libertação fascial manual de curta duração, com aplicação de electroestimulação neuromuscular, na amplitude (Rom) e velocidades média e máxima angulares (Vméd e Vmáx, respetivamente) da rotação interna e externa do ombro, e da flexão e extensão do cotovelo, durante um esforço máximo. Foi hipotisado que a utilização concorrente da libertação miofascial e fascial visceral manual combinada com estimulação elétrica muscular dentro de uma mesma sessão terapêutica poderá ser eficaz para melhorar a funcionalidade do movimento articular do membro superior, permitindo vantagens mecânicas para o nado.

 

MÉTODO

Um nadador master recordista nacional português do escalão etário 50 a 55 anos na técnica de bruços, com 1.65 m de altura e 66.0 kg de massa corporal, realizou duas avaliações de rotação interna e externa do ombro e de flexão e extensão do cotovelo. Previamente foram realizados testes de impingement (c.f. Leão Almeida et al., 2011), verificação de tensão miofascial e fascial visceral e tendo sida apenas aplicada terapia nos grupos musculares que apresentaram testes positivos. A terapia fascial teve 10h de duração, com intervalos de 1h a cada 2h30min de terapia (de forma a permitir ao nadador que se alimentasse e tivesse descanso articular), consistindo na aplicação de técnicas de libertação miofascial e fascial visceral em simultâneo com treino propriocetivo com e sem electroestimulação neuromuscular (contrações isométricas e excêntricas, acompanhadas de resistência manual (PNF) e exercícios de alongamento muscular de duração prolongada). A terapia também focou numa reaprendizagem motora, com ênfase no trabalho interno, no domínio e controlo de cadeias cinéticas e no treino coordenativo neuromuscular aplicado à função específica que o nadador pretendia melhorar como forma de evitar o retrocesso da terapia aplicada.

Os procedimentos avaliativos foram realizados num dinamómetro isocinético (Biodex Medical Systems, Inc., NI, EUA) antes e após aplicação da uma terapia fascial, sendo definida a velocidade angular no banco isocinético para 500 graus.s-1, de forma a permitir ao nadador as acelerações e desacelerações características do movimento típico de nado, obtendo-se valores de amplitude e de velocidade angulares. O nadador foi instalado na cadeira do dinamómetro de acordo com as indicações do fabricante (Figura 1) e após um período de aquecimento, realizou o maior numero de repetições com a maior amplitude possível (sem que sentisse dor) durante 10s. Registou-se: (i) Rom; (ii) Vméd e Vmáx; (iii) diferença entre o pico máximo e mínimo da amplitude angular, da velocidade média e da velocidade máxima (ΔRom, ΔVméd e ΔVmáx, respetivamente); (iv) os respetivos coeficientes de variação (CVRom, CVVméd e CVVmáx, respetivamente), e (v) o valor da escala de esforço percebido (RPE) no final de cada avaliação (Borg, 1998).

Para análise das variáveis procedeu-se ao corte do número de repetições máximas da avaliação inicial pelo número de repetições obtidas na segunda avaliação, uma vez que o nadador diminuiu em 1 a 2 repetições em 10s. Recorreu-se ao teste T para medidas repetidas para comparar a Rom, Vméd e Vmáx antes e após do tratamento, tendo sido usado o programa SPSS 24 para o tratamento dos dados, aceitando-se um ρ≤0.05. As restantes variáveis foram analisadas individualmente e descrito o seu comportamento antes e após o tratamento.

 

RESULTADOS

Na Tabela 1 são apresentados os valores médios e desvios padrão da Rom, Vméd e Vmáx da rotação interna e externa do ombro, e flexão e extensão do cotovelo, antes e após do tratamento, assim como os respetivos valores individuais de ΔRom, ΔVméd, ΔVmáx, CVRom, CVVméd e CVVmáx. Foi observado que a Rom da rotação interna e externa do ombro aumentou após tratamento, embora com diminuição da Vméd na rotação externa do ombro. Relativamente à flexão e extensão do cotovelo, foi observado um aumento da Rom apenas na flexão e uma diminuição da Vméd tanto para a flexão como extensão do cotovelo. Apesar da diminuição da Vméd na rotação interna do ombro e flexão e extensão do cotovelo, o nadador apresentou Vmáx similares antes e após a terapia nos quatro movimentos avaliados.

Foi também observada uma menor ΔRom após o tratamento para a rotação interna e externa do ombro, acompanhada de um CVRom menor, resultado inverso ao observado para a flexão e extensão do cotovelo. A ΔVméd apresentou menor valor apenas na extensão do cotovelo e o CVVméd apresentou maior valor para a rotação interna e flexão do cotovelo, e menor valor para rotação externa e extensão do cotovelo. O valor da ΔVmáx diminuiu em três dos quatro movimentos, aumentando apenas na rotação externa do ombro, enquanto o CVVmáx apresentou um valor menor para a rotação interna e maior para a rotação externa do ombro e flexão e extensão do cotovelo. Foi ainda observado um menor esforço percebido após o tratamento tanto para rotação interna e externa do ombro como para a flexão e extensão do cotovelo.

 

DISCUSSÃO e CONCLUSÕES

Os principais resultados obtidos neste estudo evidenciaram uma maior Rom na rotação interna e externa do ombro, e na flexão do cotovelo, uma diminuição da Vméd na rotação interna do ombro e na flexão e extensão do cotovelo e uma manutenção da Vmáx nos movimentos analisados. Os aumentos da Rom estão em concordância com estudos anteriores em que terapias manuais com e sem electroestimulação permitiram alcançar maiores alongamentos musculares (Hernandez-Reif, Field, Krasnegor, & Theakston, 2001; Song et al., 2015). A diminuição da Vméd verificada pode ser justificada pelo facto da maior amplitude alcançada durante o movimento obrigar os grupos musculares a trabalharem com alongamentos para os quais não estão adaptados (necessitando de um maior controlo neuromuscular; Behm, Blazevich, Kay, & McHugh, 2016). A manutenção das Vmáx vem reforçar a ideia anteriormente apresentada e a diminuição do esforço pós tratamento vem de encontro aos resultados de aplicação de autolibertação miofascial usando foam role (Cheatham, Kolber, Cain, & Lee, 2015).

O aumento da Rom observada irá permitir ao nadador atingir uma maior distância por ciclo dos membros superiores durante o nado, aspeto importante em NPD pois a velocidade de nado depende do seu produto pela frequência gestual (Craig & Pendergast, 1979). De facto, os nadadores de maior nível de rendimento desportivo diferenciam-se dos nadadores de níveis de rendimento inferiores pela capacidade de obtenção de maiores distâncias por ciclo para as mesmas frequências gestuais, resultando numa velocidade de nado superior (Craig, Skehan, Pawelczyk, & Boomer, 1985).

O presente estudo dá-nos informação que a aplicação concorrente de curta duração de terapia fascial e electroestimulação permitiu induzir num nadador, de uma forma aguda, uma melhoria na capacidade de atingir maiores amplitudes angulares com consequente diminuição da velocidade média do movimento. Apresentando velocidades máximas similares, e um esforço percebido menor, esta terapia parece potenciar o rendimento desportivo através do melhor aproveitamento de cada ação do membro superior. Ou seja, não tendo sido perdida a explosividade do movimento, assim que as novas amplitudes articulares sejam consolidadas através do treino, estas não serão impeditivas de obtenção das velocidades médias antes da terapia.

Como o equipamento isocinético utilizado só regista valores de força válidos assim que a velocidade pré-definida é atingida, não foi possível identificar o efeito da terapia em causa na produção força porque o nadador nunca atingiu os 500 graus.s-1. Esta revelou-se a maior limitação do estudo, propondo-se que no futuro sejam realizadas avaliações a diferentes velocidades (e.g. 90, 180 e 300 graus.s-1) permitindo analisar também a influência desta terapia nos valores de força muscular alcançados.

 

REFERÊNCIAS

Becker, T. J. (2011). Overuse Shoulder Injuries in Swimmers. Journal of Swimming Research, 18, 181-186.         [ Links ]

Behm, D. G., Blazevich, A. J., Kay, A. D., & McHugh, M. (2016). Acute effects of muscle stretching on physical performance, range of motion, and injury incidence in healthy active individuals: a systematic review. Applied Physiology, Nutrition, and Metabolism, 41(1), 1-11.         [ Links ]

Borg, G. (1998). Borg's perceived exertion and pain scales. Human Kinetics, Champaign.

Cheatham, S. W., Kolber, M. J., Cain, M., & Lee, M. (2015). The effects of self‐myofascial release using a foam roll or roller massager on joint range of motion, muscle recovery, and performance: a systematic review. International journal of sports physical therapy, 10(6), 827-838.         [ Links ]

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Agradecimentos:
Nada a declarar
Conflito de Interesses:

Nada a declarar.
Financiamento:
Nada a declarar

 

 

Correspondência para: Centro de Investigação, Formação, Inovação e Intervenção em Desporto, Faculdade de Desporto, Universidade do Porto, Portugal. E-mail: diogoadc3@gmail.com

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