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versão impressa ISSN 1646-107X

Motri. vol.12  supl.1 Ribeira de Pena dez. 2016

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Aspectos psicométricos dos itens de Educação Física relacionados aos conhecimentos de Esporte e Saúde no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem)

 

Psychometric aspects of Physical Education items related to Sport and Health knowledge at National High School Exam (Enem)

 

 

José Airton F. Pontes Junior1,5,*; Ana Géssica da Silva1; Erisvan Demones Tavare1,2; Leandro Araujo Sousa3; Fernando A. Cunha Bastos4; Francisca Nimara Inácio da Cruz3; Leandro Silva Almeida5

1Centro Universitário Católica de Quixadá (UniCatólica), Ceará, Brasil.
2
Universidade Trás-os-Monte e Alto Douro (UTAD), Vila Real, Portugal.
3
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), Ceará, Brasil.
4
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará (IFPA), Pará, Brasil.
5
Universidade do Minho (Uminho), Braga, Portugal
.

 

 


RESUMO

O estudo tem o objetivo de analisar os aspectos psicométricos dos itens de Educação Física relacionados aos conhecimentos de Esporte e Saúde e o desempenho dos participantes no Enem dos anos de 2009 a 2013. O estudo é do tipo descritivo e quantitativo. Foram utilizados os microdados disponíveis no site do Inep e analisados em relação à consistência interna e percentual de acerto, sendo esse último comparado em relação ao sexo, tipo de escola e região dos candidatos. Os principais resultados foram: 1) a consistência interna dos itens na competência de Educação Física foi inadequada, mas na área de Linguagens foi suficiente; 2) O percentual de acerto foi alto em vários itens, evidenciando o nível fácil ou moderado das questões; 3) Na comparação entre sexo oscilações de melhor desempenho foram apresentadas, mas na comparação das escolas, os candidatos oriundos das particulares foram melhores em todas as análises; 4) No desempenho por região, Sul e Sudeste lideraram os melhores resultados, seguidos por Centro-Oeste, Nordeste e Norte. Consideramos que os itens de Educação Física no Enem carecem de aprimoramento técnico e que as diferenças sociais e regionais são perceptíveis nos desempenho dos candidatos.

Palavras-chaves: Avaliação Educacional, Educação Física e Treinamento, Conhecimento, Teste de Admissão Acadêmica.


ABSTRACT

The study aims to analyze the psychometrics topics and the high school 3rd year students’ performance of the five Brazilian regions in items related to Sport and Health knowledge on the Physical Education competence in Enem in the years 2009-2013. The study is a descriptive and quantitative type. Microdata available in the INEP site were used and analyzed the internal consistency and correctness rate, the latter being compared in relation to gender, type of school and region of the candidates. The main results were: 1) the items internal consistency in the physical education competence was inadequate, but in Languages area was enough; 2) The correctness rate was higher in several items, showing the easy level or moderate issues; 3) Comparing sex was better performance fluctuations, but the schools comparison, those from private schools candidates were better in all analyzes; 4) On the performance by region, South and Southeast led the best results, followed by the Midwest, Northeast and North. We believe that the items of Physical Education in Enem lack of technical improvement and social and regional differences are noticeable in the candidate’s performance.

Keywords: Educational Measurement. Physical Education and Training. Knowledge. College Admission Test


 

 

INTRODUÇÃO

A avaliação educacional tem se limitado por muito tempo a ideia de medir, ligada ao rendimento do aluno (Depresbíteres, 1989), sendo realizada por meio de testes constituídos de itens objetivos, em que a partir da década de 1960 são incorporados aos vestibulares (Vianna, 1985). A partir disso, as avaliações extrapolam o objetivo dirigido ao desempenho dos alunos, sendo utilizadas como subsídios para definição de políticas públicas voltadas para a melhoria da qualidade da educação (Vianna, 1997), dessa forma, percebe-se a importância da avaliação para um processo integrado de educação (López-Pastor et al., 2012).

Com esse contexto, surgem no Brasil, a partir da década de 1990, programas de avaliação da Educação Básica em larga escala em nível nacional como o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) para o Ensino Fundamental e Médio, nas disciplinas de Português e Matemática, e o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), avaliando os alunos desse nível de ensino em diversas disciplinas.

O Enem foi criado em 1998 com o objetivo, entre outros, de ser parâmetro de auto avaliação para alunos e egressos do Ensino Médio brasileiro (Brasil, 1998). Atualmente o exame é constituído de cinco grandes áreas do conhecimento (Brasil, 2015): Ciências da Natureza, composta pela disciplina de Biologia, Física e Química; Ciências Humanas, pela História, Geografia, Sociologia e Filosofia; Matemática, que constitui isoladamente uma área do conhecimento; e Linguagens e Códigos, que contemplam as disciplinas de Língua Portuguesa, Artes, Tecnologia da Informação e Comunicação e Educação Física, sendo esta última incluída a partir de 2009.

O ENEM, atualmente, é uma prova objetiva com itens de múltipla escolha divididos entre as áreas do conhecimento. Esse formato de provas ou testes tem sido analisado em sua validade e fidedignidade através da Psicometria. Segundo Pasquali (2009), esta é uma teoria da medida dos processos cognitivos, comumente aplicada em Psicologia e Educação em geral. A Psicometria possui duas vertentes.

A primeira é a Teoria Clássica dos Testes (TCT), em que procura explicar o escore total em uma série de itens, preocupando-se em produzir testes com qualidade (Pasquali, 2009; Sartes & Souza-Formigoni, 2013). A segunda vertente é a Teoria de Resposta ao Item (TRI), que diferente da TCT tem como foco de análise o item e não o teste como um todo, tendo assim, a preocupação em construir itens com qualidade, permitindo, com isso, a comparabilidade dos resultados entre sujeitos, mesmo que sejam submetidos a avaliações diferentes (Valle, 2000; Tavares, 2013). Segundo Andrade, Laros e Gouveia (2010) essa é uma das contribuições da TRI, sendo isso possível porque considera o item como unidade básica de análise.

Com isso, de 1998 a 2008, os dados coletados no Enem não eram comparáveis, mas a partir de 2009, mesmo ano em que os conteúdos da Educação Física foram inseridos no Exame, a metodologia de análise passou a ser utilizada foi a da Teoria da Resposta ao Item (TRI), visando relacionar as escalas de proficiência de um ano para outro. No entanto, questiona-se a possibilidade dessa comparação vista a diversidade das características dos participantes (Corti, 2013). Tal como Corti (2013), alertamos que o Enem não consiste em um instrumento de avaliação coletiva, mas individual. O problema da divulgação dos resultados e comparações desenvolvidas são realizadas equivocadamente, pois, como indica a autora, a diversidade dos participantes torna as comparações e ranqueamentos inconsistentes, mesmo com o suporte da TRI.

A necessidade de avaliação dos resultados, bem como a fidedignidade dos itens se justifica porque há, atualmente, dois grandes marcos da utilização do Enem ao acesso para o Ensino Superior: 1) a sua utilização como exame no Sistema de Seleção Unificada (Sisu), que reuniu grande parte das universidades públicas, e 2) a sua obrigatoriedade na solicitação de Financiamento ao estudante do Ensino Superior (FIES), em que as instituições privadas, além dos seus próprios vestibulares, podem adotar o Exame.

No que se refere à disciplina de Educação Física na Educação Básica, este é componente curricular obrigatório desde a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Lei nº 9.394/96 (Brasil, 1996) e por isso está presente nas avaliações em larga escala tal como os outros componentes curriculares. A avaliação do conhecimento via testes e provas, nas aulas de Educação Física escolar vem sendo mais utilizada, mas ainda carece de aperfeiçoamento técnico-científico para a elaboração e validação de instrumentos, também não se desenvolveu uma cultura discente no sentido de aceitar nessa disciplina esse tipo de procedimento avaliativo.  Progressivamente, a Educação Física vem sendo inserida no Enem, desde 2009, na área de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias. No entanto, Fensterseifer, González, Schwengber, e Silva (2011) lembram que a Educação Física não estava contemplada com descritores na matriz de referencia de 1998, apenas em 2009 isso ocorreu.

Sobre a inserção de itens (questões) de Educação Física no Enem é apresentado nos descritores relacionados aos conteúdos desse componente curricular na área de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias (Brasil, 2015), mas o seu poder de seletividade como critério para o acesso ao Ensino Superior, tanto pelo Sisu quando para a concessão de bolsas para o Prouni (Programa Universidade para Todos) tem sido objeto de discussão sobre as competências indicadas na Matriz e avaliadas no Exame (Corti, 2013; Fernandes, Rodrigues & Nardon, 2013).

A Matriz de Referência do Enem pode ser uma das possibilidades de ação didática e na prática avaliativa em Educação Física, mas não a única, dada a própria diversidade de temas que estão relacionados ao contexto de análise das práticas corporais na escola (Fensterseifer, González, Schwengber & Silva, 2011). Também se questiona se apenas 3 descritores específicos da Educação Física no ENEM são capazes de abranger toda a diversidade de conhecimentos que a área propõe a tematizar nas aulas (Pontes Jr, Almeida & Trompieri Filho, 2014; Fensterseifer, González, Schwengber & Silva, 2011). Fernandes, Rodrigues e Nardon (2013) ainda discutem as oportunidades de condições para a participação no Enem, pois, segundo os autores, como a Educação Física no Ensino Noturno ainda é facultativa, há grande perda de possibilidade de ensino e aprendizagem dos conteúdos desse componente curricular para esses discentes que também irão concorrer com outros candidatos de outros turnos e, em relação a isso, Corti (2013) informa que os concluintes do Ensino Médio noturno têm crescente participação no Exame.

Os resultados desse exame têm sido pouco explorados em pesquisas. Encontram-se estudos que analisam os resultados dos candidatos do Enem/2010 em todas as áreas do conhecimento enfocadas no exame (Viggiano & Mattos, 2013), que avaliam o desempenho dos candidatos nos itens de Física da prova (Gonçalves Jr & Barroso, 2014), que enfocam o desempenho dos candidatos com necessidades especiais (Silva & Meletti, 2014) que avaliam as circunstâncias sociais que influenciam o desempenho educacional dos alunos que prestam o exame (Figueirêdo; Nogueiray & Santanaz, 2014). No entanto, não se tem registro de pesquisas que se delimitem a avaliar o desempenho nos itens de Educação Física no Enem.

A partir disso, o presente estudo tem o objetivo de analisar os aspectos psicométricos dos itens de Educação Física relacionados aos conhecimentos de Esporte e Saúde e o desempenho dos participantes no Enem dos anos de 2009 a 2013.

 

MÉTODO

O estudo é do tipo descritivo e de natureza quantitativa.

Amostra

A amostra foi constituída de 172286 candidatos em 2009, 215622 em 2010, 247873 em 2011, 258550 em 2012 e 280848 candidatos em 2013. As características da amostra estão dispostas na Tabela 1. Foram incluídos todos os candidatos do Enem dos anos de 2009 a 2013 desde que satisfizessem os seguintes critérios: a) Ter respondido o sexo; b) Ter resolvido as provas das quatro áreas avaliadas e redação; c) Ter resolvido o caderno de prova azul; d) Não ter zerado na redação; e) Ter respondido todos os itens de Linguagens e Códigos; f) Estar cursando o último ano do Ensino Médio no ano de realização do exame; g) Cursando o ensino regular; h) Não apresentar deficiência ou necessidade especial; i) Não ter solicitado atendimento especial, em unidade prisional ou hospitalar;  j) Ter entre 15 e 25 anos de idade.

A partir de 2010 o exame passa a elaborar quatro gabaritos diferentes com as mesmas questões, sendo diferenciadas pela cor do caderno. Para fins de organização na análise, optou-se por apenas um gabarito, o do caderno de provas azul da área de Linguagens e Códigos. Os dados são disponibilizados em tabelas do SPSS no portal do Inep na internet. Os candidatos não estão identificados pelos respectivos nomes, sendo atribuído um código (número de inscrição), o que garante o anonimato e confidencialidade dos participantes.

Instrumentos

As provas do Enem são constituídas de 180 itens objetivos (45 itens para cada área) e uma redação, contemplando quatro áreas do conhecimento: Ciências Humanas, Ciêcias da Natureza, Matemática e Linguagens e Códigos. Segundo o Inep, os itens são elaborados de acordo com as normas técnicas por professores credenciados e avaliados em sua qualidade por técnicos a partir de um instrumental (Ficha de revisão de Itens) disponibilizado pela instituição e aplicados em uma amostra de alunos para a pré-calibração a partir da TRI, sendo aceitos os que apresentam níveis satisfatórios.

Em relação aos itens de Educação Física, estes estão assim distribuídos durante os anos analisados: 2009, dois itens; 2010, três itens; 2011, quatro itens; 2012, três itens; 2013, três itens. Um total de 15 itens.

Procedimentos

Todo o planejamento, organização e aplicação dos procedimentos foram realizadas pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Realizamos a coleta dos microdados na página disponível na internet do próprio Inep (http://portal.inep.gov.br/basica-levantamentos-acessar), pois são de livre acesso e análise para pesquisadores, gestores, instituições e demais interessados.

Análise estatística

Para análise dos dados utilizou-se de técnicas estatísticas descritivas (frequência relativa e absoluta, média e desvio padrão). Em relação ao desempenho nas provas, considerou-se o percentual de acerto nos itens e a comparação em relação ao sexo, tipo de escola e região do país. A confiabilidade dos itens foi obtida através do coeficiente Alfa de Cronbach e análise da existência de efeito halo pelo T² de Hotteling.

Análise de normalidade Kolmogorov-Smirnov foi significativo para p ≤ 0,001 em todos os itens e bancos dos anos analisados. Com isso, prosseguiu-se com técnicas de análises para dados não-paramétricos. Utilizou-se o U de Mann-Whitney na comparação de grupos em relação ao tipo de escola (pública e particular) e sexo (masculino e feminino). Correlação de Sperman para os itens de Educação Física, nota geral para os itens, idade, e notas da área de Linguagens e Códigos. O teste Kruskal Walis foi utilizado para a diferença dos resultados nas cinco regiões do país. Para esses valores foi considerado nível de significância de p ≤ 0.05. Foi utilizado o SPSS (versão 22.0) para aplicação das técnicas estatísticas.

 

RESULTADOS

Na análise de consistência interna (Alfa de Cronbach) dos itens de Educação Física separadamente obtivemos os seguintes valores para cada ano: 2009, α = 0.14, com valores Ritc (Relação item-total corrigida) de 0.77 para ambos os itens; 2010, α = 0.24, valores Ritc de variando de 0.10 a 0.17 e; 2011, α = 0.29, valores Ritc variando de 0.10 a 0.16; 2012, α = 0.25, valores Ritc variando de 0,10 a 0,15; e 2013, α = 0.24, valores Ritc variando de 0.78 a 0.16. Em todos os anos se obteve T² de Hotteling significativo (p ≤ 0.001).

No entanto, quando os itens da disciplina foram analisados em conjunto com os demais itens da área de Linguagens e Códigos os resultados mostraram-se bastantes diferenciados: 2009, α = 0,80, com valores Ritc variando de -0,15 a 0,43; 2010, α = 0,84, valores Ritc de variando de -0,01 a 0,51 e; 2011, α = 0,85, valores Ritc variando de 0,03 a 0,47; 2012, α = 0,80, valores Ritc variando de 0,04 a 0,42; e 2013, α = 0,83, valores Ritc variando de 0,07 a 0,45. Também em todos os anos se obteve T² de Hotteling significativo (p ≤ 0,001).

Os resultados de porcentagem de acerto estão detalhados na Tabela 2. Em relação à comparação entre os grupos, obteve-se diferença significativa (p ≤ 0,001) em todos os itens dos anos avaliados, tanto no que se refere ao sexo (masculino e feminino) como ao tipo de escola (pública e privada). Em relação ao sexo, houve uma oscilação nos resultados em que os participantes do sexo feminino tiverem melhores desempenhos em alguns momentos e em outros foram os do sexo masculino. No entanto, em relação ao tipo de escola, em todos os resultados os candidatos das escolas particulares foram melhores do que os oriundos da escola pública.

No que se refere aos resultados dos candidatos de cada região do Brasil podem ser verificados na Tabela 3. O teste Kruskal Walis mostrou diferença significativa entre os grupos (p ≤ 0.001).

 

DISCUSSÃO

Os resultados da confiabilidade dos itens de Educação Física, tanto em relação à competência quanto em relação à área de Linguagens e Códigos, deveriam, segundo Maroco (2011), apresentar qualidade psicométrica do Alfa de Cronbach acima de 0,70. O que nos leva a questionar a qualidade dos itens de Educação Física do Enem entre si na competência, e não apenas na área.

Outro aspecto psicométrico que chama a atenção são os percentuais de acerto e os níveis de Ritc, visto que os itens de Educação Física estão classificados como fáceis e moderados, bem como apresentam valores de discriminação, com frequência, abaixo de 0,3, o que é insuficiente (Field, 2009). O Enem é um instrumento de seleção e que apresenta questões de diferentes níveis, no entanto, percebe-se que os relacionados aos conhecimentos de Esporte e Saúde da Educação Física ainda carecem de aprimoramento dos instrumentos.  

No ENEM de 2009, por exemplo, foi inserida uma questão (Figura 1) sobre a “Habilidade 10 – Reconhecer a necessidade de transformação de hábitos corporais em função das necessidades cinestésicas”, e os resultados da qualidade psicométrica do item indica que foi um item de baixa dificuldade (parâmetro 330.4). Percebe-se em outros estudos que os alunos têm conhecimento sobre os conteúdos da área, mas questiona-se o nível de dificuldade, validade e fidedignidade dos itens e dos testes, ainda que os resultados podem sofrer interferência de diferentes contextos (Tavitzki & Boto, 2014)

O estudo de Balbinotti et al. (2011) aponta que o conteúdo saúde foi o principal motivo para a prática de atividade física entre os participantes do estudo (13 a 18 anos), pois afirmam que os adolescentes parecem perceber a necessidade da prática regular de atividade física no combate a obesidade. E outro estudo, mais de 60% dos participantes acertaram sobre o papel da atividade física na prevenção de doenças crônicas (Silveira & Silva, 2011), assim como mais de 50% dos participantes do estudo de Barros e Silva (2013) que ocorreu com dos adolescentes de zona rural.

A intervenção realizada na pesquisa de Spohr et al. (2014) conduziu a uma importante experiência: após um ano de ação didática de ensino e prática de atividade física, percebe-se que o nível de conhecimento sobre atividade física e saúde aumentou significativamente, mas não o nível de atividade física. Esse resultado nos leva a questionar: será que o conhecimento sobre atividade física não contribui na motivação para a prática? A resposta para essa pergunta pode está na análise da relação entre nível de conhecimento, motivação para a prática de atividade física e o envolvimento com a prática de atividade física. Dificilmente a variável conhecimento irá modificar sozinha as atitudes de um grupo apenas pela reflexão da importância de algo, visto que há vários movimentos de esclarecimento do efeito do fumo, de alimentos gordurosos e da importância da atividade física, mas uma parte da população que sabe desses alertas não modificam seus hábitos devido a outros valores preditores tais como variáveis psicológicas (motivação, autopercepção física baixa, etc.) e socioeconômicas (acesso a espaço de lazer, etc.). Nessa visão, apesar da relação de atividade física e saúde já está bem fundamentada, a inatividade física é um dos principais fatores de mortalidade, sobretudo em países mais desenvolvidos (OMS, 2015; UNESCO, 2015).

Visto que um dos objetivos da Educação Física é a propagação de qualidade de vida (European Commission, 2013), a exigência desses conteúdos no ENEM é apenas um passo na motivação para o ensino-aprendizagem desses conhecimentos no âmbito escolar e que possam ser significativos na adoção de hábitos saudáveis durante toda a vida.

O Enem vem sendo debatido no âmbito da pesquisa científica, e são variadas as concepções para esse método avaliativo. Para Freitas, Sordi, Malavasi e Freitas (2012) os alunos de escolas privadas são melhor preparados para o Enem, e as principais dificuldades dos educandos de escola pública é a interdisciplinaridade e extensão dos itens do exame. Podemos perceber que a interdisciplinaridade está presente no Enem como cita os autores acima, e há estudos que comprovam que esse trabalho conjunto entre as disciplinas é eficiente.

A disponibilidade dos Itens e a matriz de referência do Enem no site do Inep possibilita a utilização dos resultados para pesquisas cientificas e analises dos itens, é possível identificar essa utilização em estudo de Pontes Jr, Sousa e Silva (2015) onde a Taxonomia de Bloom foi utilizada para analisar os itens de Educação Física no ENEM, e a categoria mais enfatizada é a de compreensão, sendo de baixa complexidade para níveis cognitivos. Já em um projeto temático utilizando conteúdo do ENEM foi possível observar o desenvolvimento em relação a argumentação, interpretação e raciocínio lógico dos educandos, o que é necessário para desenvolvimento da criatividade em relação as disciplinas.

As aulas de Educação Física tinham tendência Militarista, eram usados como conteúdo da disciplina movimentos ginásticos com o objetivo de formar pessoas fortes e aptas para guerra. Com o surgimento das tendências pedagógicas onde a metodologia de ensino tornou-se mais voltada para o desenvolvimento humano em todos os aspectos, analisando as características atitudinais e valorizando a aprendizagem cognitiva dos alunos (Pontes Jr, Trompieri Filho & Almeida, 2014).

Em relação à democracia do exame existe uma contradição, pois a disciplina Educação Física está presente no exame e uma parcela dos discentes não tem acesso ao conteúdo por estudar no período noturno (Fernandes, Rodrigues & Nardon, 2013). Outro problema é que em muitas escolas a Educação Física escolar não é vinculada com a pedagogia institucional, permanecendo apenas com atividades práticas.

Reconhecemos que o rendimento nessas avaliações tem caráter complexo, pois muitos fatores que não foram considerados nesse estudo podem intervir nos resultado, tais como estado emocional e psicológico no dia da prova, ambientação do local de aplicação, contexto social, experiência na escola, as práticas pedagógicas dos professores, a gestão escolar, entre outros. Essas variáveis são possibilidades a serem consideradas em pesquisas futuras.

O estudo se deteve em alguns pontos da Teoria Clássica dos Testes (TCT) e de comparação dos resultados entre os grupos pesquisados. Observamos que outros estudos podem ser desenvolvidos no âmbito da Teoria da Resposta ao Item (TRI) sobre itens de Educação Física a fim de identificar a qualidade métrica de cada questão dentro dessa Teoria.

Outro ponto que também consideramos pertinente investigar é o modelo de regressão que pode ser traçado com as características socioeconômicas dos candidatos também disponíveis nos microdados do Inep. Isso evidenciaria os fatores relacionados ao desempenho nas provas de Educação Física no Enem, bem como sua relação com as outras áreas.

 

CONCLUSÕES

Concluímos que a consistência interna dos itens na competência de Educação Física foi inadequada, mas na área de Linguagens foi suficiente. O percentual de acerto foi alto em vários itens, evidenciando o nível fácil ou moderado das questões. Na comparação entre sexo ocorreu oscilações de melhor desempenho, mas na comparação das escolas, os candidatos oriundos das escolas particulares foram melhores em todas as análises. Sobre o desempenho por região, Sul e Sudeste lideraram os melhores resultados, seguidos por Centro-Oeste, Nordeste e Norte.

Acreditamos que os resultados são indicadores de que há necessidade de ações pedagógicas, de políticas públicas para a qualificação docente, de gestão educacional, de organização da componente curricular Educação Física, pois o desempenho dos candidatos apresenta relação com o tipo de escola e com a região, que nos últimos anos estão recebendo maior investimento, mas que ainda não são suficientes nesses resultados.  

Consideramos que os itens de Educação Física no Enem carecem de aprimoramento técnico e que as diferenças sociais e regionais são perceptíveis no desempenho dos candidatos. No entanto, ressaltamos que esse instrumento apresenta dados nacionais importantes dos resultados dos candidatos sobre os conhecimentos de Esporte e Saúde na Educação Fisica, potencializando a tomada de consciência e decisões sobre ações pedagógicas e de gestão na área.

 

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Agradecimentos:
Nada a declarar
Conflito de Interesses:

Nada a declarar
Financiamento:
Auxílio para Estágio Pós-Doutoral da Faculdade Católica Rainha do Sertão (Proc. 10/2014); Programa de Iniciação Científica da Faculdade Católica Rainha do Sertão (Edital Nº 03/2014).

 

 

*Autor correspondente: Curso de Educação Física, UniCatólica, R. Juvêncio Alves, 660, Quixadá, Brasil. CEP: 63900-257, Brasil Email: japontesjr@gmail.com

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