SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.12 número1Efeito do exercício resistido realizado em diferentes intensidades sobre a hemodinâmica de homens normotensosEfeito das variáveis biológicas, socioculturais e motoras na prestação do lançamento em crianças pré-pubertárias índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Motricidade

versão impressa ISSN 1646-107X

Motri. vol.12 no.1 Ribeira de Pena mar. 2016

https://doi.org/10.6063/motricidade.6182 

ARTIGO ORIGINAL

 

Estudo da validade de construto das Revised Conflict Tactics Scales – Versão Irmãos

 

Construct validity study of the Revised Conflict Tactics Scales – Sibling Version

 

 

Otília Monteiro Fernandes1*; Inês Carvalho Relva1; Magda Rocha2; Madalena Alarcão3

1 Departamento de Educação e Psicologia da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, UTAD, Vila Real, Portugal
2 Centro de Investigação em Psicologia da Universidade Autónoma de Lisboa, Lisboa, Portugal
3 Universidade de Coimbra, Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal

 

 


RESUMO

A violência entre irmãos é um fenómeno que genericamente continua a ser subestimado, e Portugal não constitui exceção. Mas o seu estudo é fundamental para uma melhor compreensão do fenómeno da violência, nomeadamente em contexto familiar. A presente investigação pretendeu analisar, numa amostra de estudantes universitários portugueses, a validade de construto das CTS2-SP (versão irmãos). Trata-se de um instrumento de autorrelato que permite avaliar as táticas de conflito usadas em contexto fraterno. Os resultados confirmam o modelo multidimensional constituído pelos cinco fatores propostos pelos autores deste instrumento, bem como a sua adequabilidade para avaliar a violência fraterna.

Palavras-chave: CTS2-SP; validade; análises fatoriais confirmatórias


ABSTRACT

Sibling violence it still an underestimated phenomenon, and Portugal is no exception in this perspective. However its study is fundamental for a better understanding of the phenomenon of violence, especially in the family context. This study intended to analyze, a sample of Portuguese university students the internal structure of the CTS2-SP (sibling version), which is a self-report measure for assessing the use of conflict tactics in a fraternal context. The results confirmed the multi-dimensional model comprising five factors proposed by the authors, as well as their adequacy to assess the fraternal violence.

Keywords: CTS2-SP; validity; confirmatory factor analysis


 

 

INTRODUÇÃO

A violência familiar tem sido alvo, nos últimos anos, de diversas investigações em Portugal, e merecido algum destaque nos media. Os estudos mais relevantes foram feitos na área da violência interparental (Sani, 2006), da violência conjugal (Matos, 2006), maus tratos a crianças (Alberto, 2006; Calheiros, 2006; Martins, 2002) e a idosos (Ferreira-Alves & Sousa, 2005). Contudo, e apesar do subsistema fraterno ser dos mais duradouros (Bank & Kahn, 1997) e um dos mais importantes do sistema familiar (Fernandes, 2002, 2005), os estudos em torno da violência entre irmãos são praticamente inexistentes, e isto apesar dos poucos estudos já realizados em Portugal (Relva, 2005; Relva, Fernandes, & Mota, 2013; Relva, Fernandes, Alarcão, & Martins, 2014), bem como noutros países, revelarem que é uma forma de violência com forte prevalência e um fenómeno que tem merecido pouca atenção (Goodwin & Roscoe, 1990; Hardy, Beers, Burgess, & Taylor, 2010; Kiselica & Morrill-Richards, 2007; Phillips, Phillips, Grupp, & Trigg, 2009). Recentemente, Khan e Rogers (2015), num estudo realizado junto de jovens e adultos com idades compreendidas entre os 17 e os 59 anos, verificaram que a violência ocorrida no contexto fraterno era percebida como menos séria quando comparada com outra violência ocorrida igualmente em contexto familiar, e à vítima era atribuída maior culpa pelo sucedido. De facto, esta forma de violência é frequentemente minimizada e ignorada e vista como algo normativo durante a infância (Tucker & Finkelhor, 2015).

O estudo da violência entre os irmãos revela-se também de uma enorme importância porque permite compreender o fenómeno da violência entre pares (Duncan, 1999), bem como da ocorrência da violência em relacionamentos íntimos (Noland, Liller, McDermott, Coutler, & Seraphine, 2004; Simonelli, Mullis, Elliot, & Pierce, 2002). Além disso, parece existir uma ligação entre a violência perpetrada pelos pais aos filhos e a violência fraterna (Noland et al., 2004; Relva et al., 2013), o que indicia que a violência na família não pode ser inteiramente compreendida se descurarmos o estudo da violência na fratria.

Trata-se, conforme tem sido referido por diversos autores (cf. Relva, Fernandes, & Alarcão, 2012), de uma forma de violência que ocorre em contexto familiar, assumindo geralmente três tipos: a violência física, a psicológica e a sexual. Diversas pesquisas enfatizam as consequências emocionais, comportamentais e relacionais, a curto e a longo prazo, deste fenómeno, e salientam a necessidade de mais estudos nesta área, nomeadamente na exploração da associação entre violência e psicopatologia. Assim, verificam-se frequentemente problemas de baixa autoestima (Wiehe, 1998), ansiedade (Caffaro & Conn-Caffaro, 1998), depressão e automutilação em jovens adultos (Bowes, Wolke, Joinson, Lereya, & Lewis, 2014), comportamentos delinquentes (Button & Gealt, 2014), entre outros.

As Conflict Tactics Scales (CTS) têm sido as escalas de autorrelato mais utilizadas para avaliar a violência doméstica (Straus, 2007), sendo consideradas como um dos mais eficazes instrumentos do género. As Escalas de Táticas de Conflito permitiram apresentar importantes descobertas ao nível da violência, e possibilitaram quantificar muitos dos comportamentos que ocorrem em contexto íntimo e que eram ignorados culturalmente (Langhinrichsen-Rohling, 2005), tais como a violência em contexto fraterno. Outras razões para o uso preferencial das CTS2 (as CTS revistas) são apontadas pelos seus próprios autores (Straus, Hamby, Boney-McCoy, & Sugarman, 1996), a saber: um elevado número de itens apresentam validade e consistência interna; existe uma diferenciação entre os níveis de violência ligeira e severa nas escalas de agressão psicológica e física; e, apresentam-se como um questionário simples que facilita o autopreenchimento. Aquando da versão revista das CTS2, foram adicionadas três versões: para irmãos, para medir o comportamento violento entre irmãos; para adultos e para crianças/ jovens sobre as práticas disciplinares (Finley, 2013). As razões acima enumeradas são também as principais razões que presidiram à adaptação das CTS2-SP (versão irmãos; Straus, Hamby, Finkelhor, Boney-McCoy, & Sugarman, 1995) à população portuguesa e ainda porque não existiam estudos em Portugal e, consequentemente, instrumentos validados que permitissem abordar fidedignamente a violência entre irmãos.

O objetivo desta investigação centrou-se, então, na adaptação das Revised Conflict Tactics ScalesSibling Version (CTS2-SP; Straus et al., 1995; Straus et al., 1996) para uma amostra portuguesa. Uma primeira análise das propriedades psicométricas, já anteriormente realizada (Relva, Fernandes, & Costa, 2013), verificou a adequabilidade do instrumento no que respeita à consistência interna. O coeficiente alpha de Cronbach foi calculado relativamente a cada uma das subescalas das escalas maiores de perpetração e de vitimização. Na escala de perpetração, a consistência interna foi calculada separadamente para cada uma das suas cinco subescalas (negociação, agressão psicológica, agressão física sem e com sequelas e coerção sexual) tendo sido obtidos valores que variaram entre .65 (agressão física com sequelas) e .80 (agressão física sem sequelas). No que diz respeito à escala de vitimização os procedimentos foram idênticos, tendo sido obtidos valores de alpha de Cronbach entre .66 (agressão física com sequelas) e .84 (coerção sexual). Esta primeira análise, revelando-se promissora, constituiu a motivação para a realização de uma investigação mais aprofundada do instrumento, nomeadamente no que respeita à validade de construto, numa amostra portuguesa, através da réplica do modelo fatorial avançado pelos autores.

 

MÉTODO

Participantes

Participaram neste estudo 590 estudantes universitários portugueses que tinham irmãos. A idade dos participantes variou entre os 17 e os 52 anos (M = 20.3; DP = 4.5). Mais de metade da amostra era do sexo feminino (62.6%). A maioria dos participantes nasceu em Portugal (91.9%), 5.6% nasceu noutros países europeus e 2.5% noutros países fora da Europa. Mais de metade dos participantes tinha apenas um irmão (65.1%), 23.7% tinha dois, 7.3% tinha três, e 3.9% tinha quatro ou mais. Mais de metade dos pais (67.5%) e mães dos respondentes (63.6%) tinham como habilitações o ensino obrigatório, e 10.4% dos pais e 12% das mães possuíam habilitações ao nível do ensino superior.

Procedimentos

Após obtenção das autorizações institucionais, os questionários, anónimos, foram autoadministrados em turmas de diferentes universidades portuguesas. O seu preenchimento foi voluntário e sem recurso a qualquer tipo de incentivo externo. O horário de administração foi previamente acordado com os professores responsáveis pelas turmas, acontecendo geralmente antes ou depois do período de lecionação. A todos os participantes foram explicitados os objetivos da investigação no momento anterior ao preenchimento do protocolo. Para evitar a homogeneidade amostral, os participantes foram recrutados em cursos de diferentes áreas de conhecimento, nomeadamente, na área das ciências humanas e sociais, ciências da vida e do ambiente e tecnologias.

Instrumentos

As Revised Conflict Tactics Scales – Sibling Version (CTS2-SP; Straus et al., 1995; Straus et al., 1996) é um questionário de autorrelato de 39 itens, já anteriormente adaptado a uma amostra portuguesa e com alguns estudos de validação já efetuados (Relva et al., 2013). As CTS2-SP permitem avaliar as táticas de conflito preferencialmente utilizadas no relacionamento entre irmãos. Conceptualmente, este instrumento cinge-se à conflitualidade em díades fraternas, pelo que, quando o sujeito respondente tem mais do que um irmão é convidado a responder relativamente ao irmão que lhe é mais próximo em idade. Este instrumento é composto por cinco escalas: negociação (6 itens), agressão psicológica (7 itens; embora no original esta escala tenha 8 itens, optou-se pela exclusão de um deles – a saber, “acusei o meu companheiro de ser um mau amante” – , já que na adaptação e validação portuguesa das CTS2-SP todos os itens apresentavam um valor de correlação item-total da escala acima de .30, à exceção do item retirado, sendo que esta eliminação foi feita também por sugestão dos autores da escala), agressão física sem sequelas (12 itens), coerção sexual (7 itens) e agressão física com sequelas (6 itens). Cada item é representado por duas questões, a primeira referindo um determinado comportamento emitido pelo sujeito em relação ao irmão/irmã, e a segunda referindo o mesmo comportamento em sentido inverso (do irmão/irmã em relação ao sujeito). O questionário principia por avaliar táticas de conflito convencionais (ex., negociação), passando gradualmente para comportamentos mais coercivos e desaprovados socialmente. A escala de resposta em formato likert traduz a frequência de cada comportamento num determinado período de tempo, nomeadamente de 0 (“nunca aconteceu”) a 7 (“não naquele ano, mas já aconteceu”).

Análise estatística

O estudo da validade de construto das CTS2 (versão irmãos) foi efetuado com recurso à Análise Fatorial Confirmatória (AFC) de primeira ordem (método da Máxima Verosimilhança) recorrendo ao programa EQS 6.1. para Windows (Bentler, 2006). A opção por esta metodologia teve em conta a natureza do estudo, isto é, pretendeu-se uma abordagem da teoria já existente no que respeita à estrutura fatorial das Revised Conflict Tactics Scales e não uma abordagem aos dados que supõem a construção de teoria (Bollen, 1989; Rocha & Matos, 2008). A metodologia foi utilizada supondo um modelo de não correlação entre erros e um outro observando os indicadores do teste de Lagrange para a correlação entre erros (Brown, 2006). Esta opção tem em conta a assunção da possível existência de covariância entre os indicadores com causas que não apenas a existência do fator latente. Tal é justificado pelos efeitos de recolha de dados, especificamente no caso de questionários, onde a probabilidade da existência de similaridade entre a construção frásica de itens, a desejabilidade social, entre outros, é maior (Brown, 2006, p.46). Posteriormente foram efetuados os respetivos testes de comparação de Qui-quadrado (Brown, 2006).

Para efeitos da realização das AFC, foram construídas parcelas de itens aleatórias, quer na escala perpetrador, que na escala vítima. Trata-se de um procedimento que visa estabilizar os parâmetros a estimar e melhorar a relação entre os parâmetros e o tamanho da amostra (para uma revisão consulte-se Rocha & Matos, 2008). Foram ainda acautelados os pressupostos de unidimensionalidade de cada uma das subescalas (através da realização de comparações de modelos entre cada duas subescalas, em que um dos modelos constrange à igualdade a correlação entre fatores e o remanescente deixa liberta a estimativa do parâmetro), e ainda da significância de cada um dos itens para o seu fator (p ≤ .05), ou procedimentos de ajustamento local. Deste modo, e para ambas as escalas, na construção dos três indicadores das subescalas negociação e agressão física sem sequelas foram utilizados dois itens por parcela, quanto às subescalas agressão psicológica e coerção sexual construíram-se duas parcelas de dois itens e uma de três. Finalmente, para a subescala agressão física sem sequelas foram construídas três parcelas de quatro itens.

Salienta-se ainda que previamente a todos estes procedimentos preparatórios das AFC foram verificados os requisitos básicos do número de respondentes da análise (cinco respondentes por item) e da normalidade da distribuição das respostas (com recurso à inspeção de Q-Q plots) (Tabacknick & Fidel, 2007).

Os procedimentos da construção aleatória dos itens, da observação da normalidade da distribuição dos itens e os dados descritivos foram efetuados com recurso ao programa estatístico SPSS para Windows (versão 17).

 

RESULTADOS

Análises preliminares

A distribuição dos itens das CTS2-SP resultante da construção dos Q-Q plots para cada item apresentou uma contiguidade bastante razoável entre os dados observados e os dados expectáveis para uma distribuição normal. Estando a normalidade dos dados testada, efetuaram-se os procedimentos de testagem da unidimensionalidade das escalas. O teste da diferença de Qui-quadrado na comparação entre os 10 modelos de cada uma das escalas foi sempre significativo (p = .00), o que leva a considerar que os modelos sem restrições seriam os mais adequados. Assim sendo, cada uma das subescalas mede facetas diversas do construto conflito entre irmãos: vítima e perpetrador, estando o pressuposto da unidimensionalidade das escalas assegurado.

Quanto à avaliação do ajustamento local (análises fatoriais confirmatórias para cada subescala, no intuito de verificar a significância dos itens para o fator latente), todas as análises revelaram a significância (a 95%) dos itens com valores p ≤. 05.

Construídas as parcelas aleatoriamente, foi dado início à avaliação da validade de construto das CTS2-SP (perpetração e vitimização).

A figura 1 corresponde à estrutura fatorial indicada pelos autores, testada para as CTS2-SP (perpetração e vitimização).

 

 

Análise fatorial confirmatória de primeira ordem das Revised Conflict Tactics Scales – SP (Perpetração).

Modelo 1: Escala Perpetração supondo a não correlação entre erros

O teste da análise em cinco fatores apresenta valores de ajustamento adequados, nomeadamente (χ2 = 316.59, gl = 80, p = .00), Comparative Fit Index (CFI) = .94, Standardized Root Mean-Squared Residual (SRMR) = .06, Root Mean-Square Error of Approximation (RMSEA) = .07, e o Intervalo de Confiança do RMSEA a 90% (I.C.90% RMSEA) = [.06, .08].

A análise das equações de medida verificou da significância de todos os indicadores para os respetivos fatores latentes (p≤ .05), conjuntamente com um equilíbrio dos valores beta estandardizados. A tabela 1 apresenta os resultados.

 

 

Modelo 2: Escala Perpetração com correlação entre erros

Tal como já referido, foram requisitados nas análises efetuadas os índices de modificação através do teste de Lagrange, sendo esta escolha justificada através da natureza dos dados recolhidos (instrumento de autorrelato). Os resultados indicaram a existência de uma correlação entre os erros do primeiro e do terceiro indicadores do fator coerção sexual. De facto, quando analisados semanticamente, os itens que compõem estas parcelas apresentam uma contiguidade semântica que justifica esta associação. Procedeu-se então à testagem do modelo correlacionando os parâmetros indicados. Os resultados indicaram de novo valores de ajustamento adequados, similares aliás aos anteriormente obtidos (χ2 = 301.61, gl = 79, p = .00), CFI= .94, SRMR = .06, RMSEA = . 07, I.C. 90% RMSEA = [.06, .08].

A análise das equações de medida verificou a significância de todos os indicadores para os respetivos fatores latentes (p ≤ .05), conjuntamente com um equilíbrio dos valores beta estandardizados. Dada a existência de duas alternativas viáveis para um mesmo modelo, os modelos foram sujeitos a um teste de diferença de Qui-quadrado (χ2 = 14.98, gl = 1, p = .00), indiciando que o modelo com a integração da correlação entre erros é o mais adequado. A figura 2 apresenta os resultados estandardizados para o modelo final.

 

 

Salienta-se que os valores correlacionais obtidos estão de acordo com o teoricamente previsto, à exceção da correlação entre o fator negociação e agressão física com sequelas e coerção sexual (correlações negativas e não significativas a p ≤ .05); todos os restantes fatores se associam positiva e significativamente entre si (com valores entre baixos a elevados, consulte-se a figura 2).

Os restantes valores relativos às equações de medida, bem como à variância explicada são apresentados na tabela 2.

 

 

Análise fatorial confirmatória de primeira ordem das Revised Conflict Tactics Scales – SP (vitimização).

Modelo 1a: Subescala Vitimização supondo a não correlação entre erros

Os procedimentos para a testagem da validade de construto para as CTS2-SP, versão vitimização, replicou os procedimentos da escala na sua versão perpetração. Assim, o teste da análise em cinco fatores sem correlação entre erros apresenta valores de ajustamento adequados, embora mais baixos do que os obtidos para o modelo na versão perpetração, nomeadamente (χ2 = 427.79, gl = 80, p = .00), CFI = .92, SRMR = .07, RMSEA = . 09, I.C.90% RMSEA = [.08, .09]. A análise das equações de medida verificou a significância de todos os indicadores para os respetivos fatores latentes (p≤ .05), e de novo o modelo apresentou um equilíbrio dos valores beta estandardizados. A tabela 3 abaixo apresenta estes resultados.

 

Modelo 2a: Subescala Vitimização com correlação entre erros

Do mesmo modo, também nestas análises, e pelas mesmas razões anteriormente referidas, recorreu-se aos índices de modificação do teste de Lagrange. Os resultados indicaram a existência de correlação entre os erros do primeiro e segundo indicadores do fator agressão psicológica e ainda entre os erros do segundo e terceiro indicadores do fator agressão física com sequelas. A análise semântica dos itens resultou de novo numa contiguidade entre a formulação dos itens que compõem as parcelas, pelo que, dada a natureza do instrumento e da análise optou-se por reestruturar o modelo incluindo os parâmetros acima referidos. A figura 3 apresenta os resultados estandardizados para o modelo final.

 

 

De novo e pela existência de duas alternativas viáveis para um mesmo modelo, os modelos foram sujeitos a um teste de diferença de Qui-quadrado (χ2 = 22.196, gl = 2, p = .00), indicando ser o modelo que integra a correlação de erros a solução mais indicada para os dados em estudo.

A análise das equações de medida indicou a significância de todas as parcelas para os respetivos fatores latentes (p ≤ .05), conjuntamente com um equilíbrio dos valores beta estandardizados. Os resultados mostraram de novo valores de ajustamento adequados, ligeiramente mais harmoniosos do que os do modelo anterior (χ2 = 405.59, gl = 78, p = .00), CFI = .92, SRMR = .07, RMSEA = . 08, I.C. 90% RMSEA = [.08, .09].

Mais uma vez, os valores correlacionais obtidos estão de acordo com o teoricamente previsto, à exceção da correlação entre os fatores negociação e agressão física com sequelas e coerção sexual (correlações negativas e não significativas a p ≤ .05) e da associação entre negociação e a agressão física sem sequelas (correlação positiva e não significativa).Todos os restantes fatores do modelo associam-se positiva e significativamente entre si (valores entre baixos a elevados, consulte-se a figura 3). Note-se que apesar do resultado ser ligeiramente diverso da escala de perpetração, as direções das associações, bem como a sua magnitude, são equivalentes.

A tabela 4 completa a apresentação dos resultados relativos ao modelo final.

 

 

DISCUSSÃO

Conforme já referido anteriormente, este estudo teve por objetivo avaliar a validade de construto das CTS2-SP (Straus et al., 1996) através de análises fatoriais confirmatórias. As análises realizadas permitiram verificar que os cinco fatores de ambas as subescalas são consistentes com o modelo teórico apresentado pelos autores (Straus et al., 1996). Tomando como ponto de partida a análise da consistência interna, o cálculo do alpha de Cronbach, as características das CTS2-SP, versão portuguesa, revelam ser adequadas, variando entre .65 e .80 para a subescala da vitimização e entre .66 e .84 para a subescala da perpetração. Foi a subescala da agressão física com sequelas que evidenciou os valores mais baixos de alpha de Cronbach, o que no entender de Straus (2007) pode ser justificado pela sua baixa incidência. 

Também os índices de ajustamento apresentam valores adequados, quer para o primeiro modelo (vitimização) (χ2 = 427.79, gl = 80, p = .00), CFI = .92, SRMR = .07, RMSEA = . 09, I.C.90% RMSEA = [.08, .09], quer para o segundo modelo (perpetração) (χ2 = 405.59, gl = 78, p = .00), CFI = .92, SRMR = .07, RMSEA = . 08, I.C. 90% RMSEA = [.08, .09].

Em suma, os resultados das análises fatoriais confirmatórias parecem revelar que a validade de construto das CTS2-SP é satisfatória, pelo que o seu uso na avaliação das táticas de conflito entre díades de irmãos é recomendado sempre que se considere útil fazê-lo. Este estudo contribui, assim, para o alargamento do conhecimento acerca do fenómeno da violência entre irmãos, não só pela réplica do modelo original numa cultura completamente diversa da testada originalmente, mas também pela possibilidade de realizar mais estudos nesta área. Se, por um lado, se confirma a qualidade de avaliação das CTS2-SP, por outro lado, abre-se uma janela de investigação para um construto até agora desconhecido no panorama científico português.

Limitações e pistas para futuros estudos

À semelhança da maioria dos instrumentos do tipo das CTS2-SP, e apesar das boas qualidades psicométricas que acabamos de relatar, as escalas de autorrelato não são isentas de limitações. Uma das primeiras está relacionada com o facto de as questões remeterem os sujeitos para um tempo passado, e embora o método retrospetivo seja bastante utilizado (e.g., Wiehe, 1997), sabe-se bem como o recurso à memória de acontecimentos que ocorreram há vários anos (sete anos, para a maioria dos participantes deste estudo) pode criar um enviesamento relativamente ao que efetivamente ocorreu. Uma segunda limitação prende-se com a dificuldade em acedermos a assuntos íntimos, nomeadamente as do foro sexual. Finalmente, uma terceira limitação tem a ver com o facto de ter sido tomada em consideração apenas a perspetiva de um dos elementos da díade (um irmão questionado sobre apenas um irmão), como tem sido usual na maioria dos estudos (Worling, 1995), o que impossibilita realizar uma mais completa avaliação da dinâmica das díades, mas também da complexa teia relacional de toda a fratria, quando esta tem mais do que dois membros.

Apesar das limitações, e dada a inexistência de instrumentos no nosso país que permitam avaliar a conflitualidade nas relações fraternas, o uso das CTS2-SP pode contribuir para uma melhor compreensão deste fenómeno. Futuras investigações devem ser conduzidas no sentido de aprofundar esta problemática, inclusivamente nas “novas” formas de família (e.g., famílias recasadas, monoparentais), e recorrendo a estudos longitudinais, que permitam avaliar a estabilidade das relações fraternas e, eventualmente, clarificar a direção da associação entre o relacionamento entre irmãos e o ajustamento psicológico individual (Noller, 2005), bem como examinar a influência do meio (como, por exemplo, os estilos parentais e a influência da televisão) (Goodwin & Roscoe, 1990). Dever-se-á ainda perspetivar, sempre que possível, uma análise de resposta por parte de ambos os elementos da díade (e também a perspetiva dos pais), bem como as possíveis testemunhas, como por exemplo os outros irmãos, que não sendo vítimas ou agressores assistem à violência, e serão certamente afetados por ela. E, finalmente, estudos futuros deverão abranger não só a população em geral, mas também populações clínicas, nomeadamente fratrias institucionalizadas e sujeitos com irmãos identificados pelo sistema judicial, perpetradores e vítimas de violência.

 

REFERÊNCIAS

Alberto, I. M. (2006). Maltrato e trauma na infância. Coimbra: Edições Almedina, S. A.         [ Links ]

Bank, S. P., & Kahn, M. D. (1997). The sibling bond (15th anniversary Ed.). New York: Basic Books. (Obra original publicada em 1982).         [ Links ]

Bentler, P. M. (2006). EQS 6.1: Structural equations program manual. Encino, CA: Multivariate Software Inc.         [ Links ]

Bollen, K. A. (1989). Structural equations with latent variables. New York: John Wiley & Sons, Inc.         [ Links ]

Bowes, L., Wolke, D., Joinson, C., Lereya, S., & Lewis, G. (2014). Sibling bullying and risk of depression, anxiety, and self-harm: A prospective cohort study. Pediatrics, 134(4). doi: 10.1542/peds.214-0832        [ Links ]

Brown, T. A. (2006). Confirmatory factor analysis for applied research. New York: Guilford Press.         [ Links ]

Button, D., & Gealt, R. (2014). High risk behaviors among victims of Sibling violence. In J. Spencer (Ed.), Contexts of deviance: Statuses, institutions and interactions, (pp. 306-312). Oxford: Oxford University Press.         [ Links ]

Caffaro, J. V., & Conn-Caffaro, A. (1998). Sibling abuse trauma: Assessment and intervention strategies for children, families, and adults. New York: Haworth Press.         [ Links ]

Calheiros, M. (2006). A construção social do mau trato e da negligência parental: Do senso comum ao conhecimento científico. Coimbra: Imprensa de Coimbra.         [ Links ]

Duncan, R. (1999). Peer and sibling aggression: An investigation of intra- and extra-familial bullying. Journal of Interpersonal Violence, 14(8), 871-886. doi:10.1177/088626099014008005        [ Links ]

Fernandes, O. M. (2002). Semelhanças e diferenças entre irmãos. Lisboa: Climepsi Editores.         [ Links ]

Fernandes, O. M. (2005). Ser único ou ser irmão. Cruz Quebrada: Oficina do Livro.         [ Links ]

Ferreira-Alves, J., & Sousa, M. (2005). Indicadores de maus-tratos a pessoas idosas na cidade de Braga: Estudo preliminar. Sociologia, Revista da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 25, 303-313.         [ Links ]

Finley, L. (2013). Encyclopedia of domestic violence and abuse. Santa Barbara: ABC-CLIO.         [ Links ]

Goodwin, M. P., & Roscoe, B. (1990). Sibling violence and agnostic interactions among middle adolescents. Adolescence, 25(98), 451-467.         [ Links ]

Hardy, M. S., Beers, B., Burgess, C., & Taylor, A. (2010). Personal experience and perceived acceptability of sibling aggression. Journal of Family Violence, 25(1), 65-71. doi:10.1007/s10896-009-9270-3        [ Links ]

Hurley, A. E., Scandura, T. A., Schriesheim, C. A., Brannick, M. T., Seers, A., Vandenberg, R. J., & Williams, L. J. (1997). Exploratory and confirmatory factor analysis: Guidelines, issues, and alternatives. Journal of Organizational Behavior, 18(6), 667-683.         [ Links ]

Khan, R., & Rogers, P. (2015). The normalization of sibling violence: Does gender and personal experience of violence influence perceptions of physical assault against siblings? Journal of Interpersonal Violence, 30(3), 437–458. https://doi.org/10.1177/0886260514535095        [ Links ]

Kiselica, M., & Morrill-Richards, M. (2007). Sibling maltreatment: The forgotten abuse. Journal of Counseling & Development, 85(2), 148-160. doi: 10.1002/j.1556-6678.2007.tb00457.x        [ Links ]

Kline, R. B.  (2013). Exploratory and confirmatory factor analysis. In Y. Petscher & C. Schatsschneider (Eds.), Applied quantitative analysis in the social sciences (pp. 171-207). New York: Routledge. (Chap. 6, print proof). http://psychology.concordia.ca/fac/kline/library/k13b.pdf        [ Links ]

Langhinrichsen-Rohling, J. (2005). Top 10 greatest "Hits": Important findings and future directions for intimate partner violence research. Journal of Interpersonal Violence, 20(1), 108-118. doi: 10.1177/0886260504268602         [ Links ]

Martins, P. C. (2002). Maus-tratos a crianças – O perfil de um problema. Braga: Centro de Estudos da Criança - Universidade do Minho.         [ Links ]

Matos, M. (2006). Violência nas relações de intimidade: Estudo sobre a mudança psicoterapêutica na mulher (Tese de doutoramento não publicada). Universidade do Minho: Braga.         [ Links ]

Noland, V. J., Liller, K. D., McDermott, R. J., Coulter, M. L., & Seraphine, A. E. (2004). Is adolescent sibling violence a precursor to college dating violence? American Journal of Health Behavior, 28(Suppl 1), S13-23.         [ Links ]

Noller, P. (2005). Sibling relationships in adolescence: Learning and growing together. Personal Relationships, 12(1), 1-22. doi:10.1111/j.1350-4126.2005.00099.x        [ Links ]

Phillips, D., Phillips, K. H., Grupp, K., & Trigg, L. (2009). Sibling violence silenced: Rivalry, competition, wrestling, playing, roughhousing, benign. Advances in Nursing Science, 32(2), 1-16. doi.org/10.1097/ANS.0b013e3181a3b2cb        [ Links ]

Relva, I. C. (2005). Maus Tratos entre irmãos: Um estudo em alunos de Vila Real (Dissertação de mestrado não publicada). Universidade do Porto: Porto.         [ Links ]

Relva, I. C., Fernandes, O. M., & Alarcão, M. (2012). Violência entre irmãos: Uma realidade desconhecida. Interamerican Journal of Psychology, 46(3), 375-383.         [ Links ]

Relva, I. C., Fernandes, O. M., & Costa, R. (2013). Psychometric properties of Revised Conflict Tactics Scales: Portuguese sibling version (CTS2-SP). Journal of Family Violence, 26(6), 577-585. doi: 10.1007/s10896-013-9530-0        [ Links ]

Relva, I. C., Fernandes, O. M., & Mota, C. P. (2013). An exploration of sibling violence predictors. Journal of Aggression, Conflict and Peace Research, 5(1), 46-62. Doi: 10.1108/17596591311290740        [ Links ]

Relva, I. C., Fernandes, O. M., Alarcão, M., & Martins, A., (2014). Estudo exploratório da violência entre irmãos em Portugal. Psicologia: Reflexão e Crítica, 27(2), 398-408. doi: 10.1590/1678-7153.20142722108/17596591311290740        [ Links ]

Rocha, M., & Matos, P. M. (2008). Adaptação do Student Adaptation to College Questionnaire (SACQ) a uma amostra de adolescentes de escolas regulares, profissionais e pólos de aprendizagem. Psicologia, Educação e Cultura, 12(1), 171-196.         [ Links ]

Sani, A. I. (2006). Vitimação indirecta de crianças em contexto familiar. Análise Social, 41(180), 849-864.         [ Links ]

Simonelli, C. J., Mullis, T., Elliot, A. N., & Pierce, T. W. (2002). Abuse by siblings and subsequent experiences of violence within the dating relationship.  Journal of Interpersonal Violence, 17(2), 103-121. doi: 10.1177/0886260502017002001        [ Links ]

Straus, M. A. (2007). Conflict Tactics Scales. In N. A. Jackson (Ed.), Encyclopedia of domestic violence (pp. 190-197). New York: Routledge, Taylor & Francis Group.         [ Links ]

Straus, M. A., Hamby, S. L., Finkelhor, D., Boney-McCoy, S., & Sugarman, D. B. (1995). Conflict Tactics Scales form: CTS2-SP. In M. Straus (Ed.). Handbook of Conflict Tactics Scales (CTS): Including revised versions of CTS2 and CTS2PC (pp. 61-64). Durham, NH, Family Research Laboratory, University of New Hampshire.         [ Links ]

Straus, M. A., Hamby, S. L., Boney-McCoy, S., & Sugarman, D. B. (1996). The Revised Conflict Tactics Scales (CTS2): Development and preliminary psychometric data. Journal of Family Issues, 17(3), 283-316. doi: 10.1177/019251396017003001        [ Links ]

Tabacknick, B. G., & Fidel, L. S. (2007). Using multivariate statistics (5th Ed.). Boston: Allyn and Bacon.         [ Links ]

Tucker, C., & Finkelhor, D. (2015). The state of interventions for sibling conflict and aggression: A systematic review. Trauma, Violence and Abuse, 1-11. doi: 10.1177/1524838015622438        [ Links ]

Wiehe, V. R. (1997). Sibling abuse: Hidden physical, emotional and sexual trauma (2nd Ed.). Thousand Oaks. CA: Sage Publication.         [ Links ]

Wiehe, V. R. (1998). Sibling violence. In V. R. Wiehe (Ed.), Understanding family violence: Treating and preventing partner, child, sibling, and elder abuse (pp. 167-217). Kentucky: Sage Publications.         [ Links ]

Worling, J. R. (1995). Adolescent sibling-incest offenders: Differences in family and individual functioning when compared to adolescent nonsibling sex offenders. Child Abuse & Neglect, 19(5), 633-643. doi: 10.1016/0145-2134(95)00021-Y        [ Links ]

 

Agradecimentos:
Nada a declarar
Conflito de Interesses:
Nada a declarar.
Financiamento:
Nada a declarar

Artigo recebido a 19.11.2014; Aceite a 28.10.2015

 

 

*Autor correspondente: Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Departamento de Educação e Psicologia, Quinta dos Prados, 5000-801 Vila Real, Portugal. E-mail: tila@utad.pt

Creative Commons License Todo o conteúdo deste periódico, exceto onde está identificado, está licenciado sob uma Licença Creative Commons