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Motricidade

versão impressa ISSN 1646-107X

Motri. vol.11 no.2 Ribeira de Pena jun. 2015

https://doi.org/10.6063/motricidade.3663 

ARTIGO ORIGINAL

 

O efeito do estabelecimento de metas específicas no desempenho e comprometimento de indivíduos experientes no lançamento do basquetebol

 

The effect of specific goal setting on performance and goal adherence in experienced individuals in the basketball shot.

 

 

Natália Fontes Alves Ambrósio1,*; Matheus Maia Pacheco2; Fernando Garbeloto Santos1; Leandro Ribeiro Palhares3; Alessandro Teodoro Bruzi4

1 Escola de Educação Física e Esporte, Universidade de São Paulo, São Paulo, Brasil
2 Pennsylvania State University, Estados Unidos da América
3 Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Diamantina, Brasil
4 Universidade Federal de Lavras, Lavras, Brasil

 

 


RESUMO

Este estudo investigou os efeitos da meta estabelecida no desempenho e aderência de indivíduos experientes. Foram realizadas três fases: pré-teste, prática e pós-teste. Treze atletas universitários (24.3±4.8 anos de idade) foram divididos em dois grupos onde realizaram arremessos de três metros do basquetebol: G10% - no qual 10% do desempenho do pré-teste foram acrescidos para o estabelecimento da meta, e G30%, no qual 30% foi acrescido para estabelecimento da meta. Após a última fase, os indivíduos responderam a um questionário de avaliação do comprometimento a meta. A expectativa era que o grupo com maior percentagem no estabelecimento da meta iria demonstrar piores resultados e menor comprometimento com a meta estabelecida devido a dificuldade imposta. As análises mostraram que apesar da melhora significativa de ambos os grupos, os diferentes percentuais no estabelecimento de metas foram similares na mudança do desempenho. Entretanto, o acréscimo de 10% ao desempenho no pré teste permitiu maior comprometimento com a meta.

Palavras-chaves: estabelecimento de metas, desempenho motor, meta específica, indivíduos experientes.


ABSTRACT

The present study investigated the effects of goal setting in the performance and adherence to the goal in experienced individuals. The study design was composed of a pretest, practice and a posttest. Thirteen collegiate-athletes (24.3±4.8 years old) was divided into two groups to perform three-meter-shots of basketball: G10% – which 10% of the performance in the pretest was added for the goal setting – and G30%, which 30% was added for the goal setting. After the last trial in the posttest, the participants answered a questionnaire of goal adherence. The expectation was that the higher percentage group would have worse performance and fewer adherences to the goal because the set goal was too difficult to achieve. Although we observed an improvement in the performance of both groups, no differences were found between them in the pre and posttest. However, G10% group showed higher frequency of adherence to the set goal.

Keywords: goal setting, motor development, specific goal, experienced subjects.


 

 

INTRODUÇÃO

O estabelecimento de metas é definido como uma estratégia para direcionar o comportamento, orientando as ações atuais para alcançar a condição futura (Locke & Latham, 1985; Ugrinowitsch & Dantas, 2002). De acordo com Locke e colegas (Locke & Latham, 1985; Locke, Shaw, Saari, & Latham, 1981), a aquisição de habilidades motoras por meio do estabelecimento de metas se daria pela motivação, direcionamento da atenção, mobilização do esforço, aumento da persistência e desenvolvimento de estratégias.

Metas podem ser caracterizadas de diversas formas (de acordo com a especificidade – específica/genérica; distância – curto/longo prazo; desafio imposto – desafiadora/fácil; e etc). Entretanto, as características da meta a ser estabelecida que favoreceriam a melhora no desempenho não estão claras (Kyllo & Landers, 1995; Ugrinowitsch & Coca Ugrinowitsch, 2003).

Os estudos na área da Psicologia Organizacional, onde este fator foi inicialmente discutido, apontam que metas específicas e desafiadoras seriam melhores para o desempenho em relação a metas postas como genéricas (Locke & Latham, 1985). Ainda, é descrito que os indivíduos devem ter habilidade suficiente para lidar com a meta imposta, que é necessário feedback e que as metas sejam aceitas pelo indivíduo (Locke et al., 1981). Estes estudos tem guiado grande parte das hipóteses na área de aprendizagem motora. Entretanto, em muitos, somente as afirmações acerca da especificidade, desafio e aceitação pelo indivíduo são consideradas. O argumento do presente estudo é que a interação entre os fatores apresentados por Locke e colegas seriam maiores preditores da eficácia do estabelecimento de metas do que simplesmente os fatores previamente considerados na literatura (de forma separada).

Especificamente, quando considera-se uma meta específica, se estabelece uma meta direta e, usualmente, quantitativa (ex: “faça 7 pontos em 10 possíveis”) (Dutra, 2007; Ugrinowitsch & Coca Ugrinowitsch, 2003). Uma das formas de implementação da meta específica se dá a partir de cálculos de acordo com características da tarefa e do sujeito realizado a partir do desempenho inicial em determinada tarefa (pré-teste). Uma das formas mais comuns de estabelecimento da meta se dá pelo acréscimo de um percentual a este valor inicial. Entretanto, o percentual acrescido não pode tornar a meta irrealista e desmotivante.

Usualmente, os valores percentuais empregados variam entre 10 e 30 por cento do desempenho inicial do sujeito (Dutra, 2007; Marinho et al., 2009; Marinho, Gomes, Fialho, Benda, & Ugrinowitsch, 2006). Entretanto, o valor percentual da meta estabelecida deveria, assumindo as ideias de Locke et al. (1981), ser baseado em mais do que na comparação entre mais e menos: deveria levar em conta o nível de experiência do indivíduo na tarefa. Garantindo a relação entre experiência e desempenho, indivíduos com maior desempenho (mais experientes), no geral, tendem a mostrar menores ganhos com a prática. Com maiores desempenhos, a percentagem estabelecida irá requerer maior ganho absoluto – sendo mais difícil uma melhora significativa após anos de prática. Desta forma, a comparação entre 10% e 30% no estabelecimento da meta com indivíduos experientes não se dá entre menos ou mais desafiante, mas talvez entre muito desafiante e inatingível. Uma meta inatingível, se seguida pelo participante, pode influenciar negativamente em aspetos motivacionais do sujeito dada a continua comparação do que é realizado com a meta requerida (Gauggel, Leinberger, & Richardt, 2001).

Adicionalmente, o auto-estabelecimento de metas tem sido apontado como fator primordial para os resultados inconsistentes na literatura de estabelecimento de metas. Em princípio, o argumento era de que a presença de feedback seria um fator primordial no auto-estabelecimento de metas espontâneo (Locke & Latham, 1985) e que o efeito estaria relacionado ao grupo sem meta definida (usualmente o grupo controle). Entretanto, os estudos atualmente tem apontado que mesmo indivíduos que recebem a meta específica tendem a alterar sua meta (Marinho et al., 2009). Uma das explicações tem sido justamente o quanto o indivíduo encara a meta estabelecida como alcançável (Locke et al., 1981). Alguns estudos que relacionaram a autoeficácia dos indivíduos com o a meta estabelecida encontraram resultados favoráveis a ideia de que indivíduos que visualizam a meta como alcançável tendem a se comprometer mais (Gauggel et al., 2001) e quando auto-estabelecem o fazem com metas mais desafiadoras (Boyce & Bingham, 1997).

Desta forma, a hipótese apresentada no presente estudo é de que em indivíduos experientes, a meta estabelecida a partir do acréscimo da maior percentagem será menos eficiente na melhora do desempenho dos aprendizes quando comparada à adição da menor percentagem, dado que o maior nível de experiência na tarefa torna um acréscimo mais desafiante e inalcançável para os aprendizes. Em adição, devido a incompatibilidade do percentual acrescido à possibilidade de melhora de desempenho, os participantes que tiveram uma meta acrescida de maior valor percentual apresentarão menor comprometimento à meta estabelecida em comparação aos indivíduos com uma meta, vista aqui como, compatível.

Weinberg, Fowler, Jackson, Bagnall, e Bruya (1991) buscaram verificar a relação entre metas inalcançáveis e o desempenho de crianças e universitários em diferentes tarefas e não encontraram diferenças, o que vão contra nossa hipótese do presente estudo. Entretanto, o nível dos indivíduos nas tarefas são variados e desta forma o estudo não considerou o fato de que indivíduos mais experientes compreendem o quanto a meta é ou não alcançável. Isto é favorecido pelos resultados mostrando que os indivíduos pareciam não compreender a dificuldade da tarefa e se mantinham adeptos à meta estabelecida no início.

Devemos salientar que, apesar do ganho teórico atribuído a pesquisas laboratoriais, o estabelecimento de metas pode ser utilizado diretamente como uma estratégia de técnicos para auxiliar a melhora do desempenho dos atletas. O ganho em estágios iniciais da aprendizagem são maiores – usualmente descrito em uma curva de aceleração negativa até um certo plateau de desempenho (curvas de aprendizagem). Em atletas com maior nível de desempenho e mais experientes, a utilização de estratégias extras por parte do treinador/técnico tem grande influência no ganho de desempenho. Desta forma, o presente estudo acrescenta nesta direção ao utilizar-se de uma tarefa do contexto esportivo (o lançamento de três metros no basquete) com atletas de nível universitário. Ainda é escasso o número de trabalhos que comparam diferentes percentuais para esse tipo de tarefa (Dutra, 2007).

Portanto, o objetivo do presente estudo foi investigar o efeito da meta específica no desempenho do lançamento de três pontos do basquetebol e no comprometimento com a meta estabelecida em indivíduos experientes. A escolha da tarefa se deu em pela necessidade de grande prática para obtenção de alto desempenho – garantindo a relação desempenho e experiência; pela possível generalização para contextos esportivos – discutido no parágrafo anterior; e por produção anterior que auxilia na quantificação do desempenho (Palhares et al., 2007 veja a seção Método).

 

MÉTODO

Participantes

Participaram do estudo 13 voluntários experientes, universitários do sexo masculino atletas de uma equipe de basquetebol universitário (24.3 ± 4.8 anos de idade). Foram considerados experientes na tarefa aqueles que tinham participação em programa de treinamento sistematizado e regular no basquetebol e que completavam aproximadamente 10 anos de prática na modalidade. O nível de desempenho dos indivíduos foi assumido dado à condição de atletas do time principal da universidade – garantindo a relação experiência e desempenho. Os participantes foram previamente informados do objetivo do estudo, de sua participação voluntária, que teriam sua identidade mantida em sigilo e que a divulgação dos resultados seria apenas para fins científicos. Todos aqueles que concordaram em participar do estudo foram convidados a assinar um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para que pudessem ser incluídos no mesmo.

Instrumentos

A coleta de dados foi realizada em quadra poliesportiva com marcações e uma tabela oficial de basquetebol. Os arremessos foram realizados com três bolas de basquetebol.

Para avaliar o comprometimento dos indivíduos com a meta estabelecida pelo experimentador ou com uma meta estabelecida pelos próprios indivíduos ao longo do experimento, foi utilizado um Questionário de Avaliação do Comprometimento à Meta – QuAC, proposto por Palhares et al. (2007).

Procedimentos

A tarefa realizada foi arremessar uma bola de basquetebol perpendicular à cesta na posição de três pontos. Os participantes permaneceram com os pés fixos ao solo e com a bola à altura da cabeça. A execução se deu com a mão dominante e exatamente à frente da cesta, cabendo ao indivíduo saltar para arremessar a bola (“lançamento tipo jump”).

Os indivíduos foram distribuídos aleatoriamente em dois grupos: G10% (n=7) e G30% (n=6). Durante a fase de aquisição os indivíduos dos dois grupos tiveram as metas específicas estabelecidas acrescentando 10% e 30%, respetivamente, ao desempenho do pré teste.

O estudo foi composto em uma primeira fase, pré teste, sem meta determinada e em 10 tentativas com a finalidade de definir a meta específica para a fase seguinte. A meta foi calculada a partir de diferentes percentuais: 10% e 30%. A fase de aquisição foi composta por 100 tentativas divididas em 10 blocos com 10 tentativas cada, com meta específica individual calculada a partir do pré teste. Além disso, foi fornecido conhecimento de resultados (CR) após cada bloco de tentativas, para efetividade da meta (Ugrinowitsch & Coca Ugrinowitsch, 2003). O pós teste foi realizado 2 minutos após a fase de aquisição com 10 tentativas sem meta determinada. Após o pós teste os indivíduos responderam ao QuAC para análise do comprometimento em relação a meta estabelecida.

O desempenho foi avaliado de duas diferentes formas: a partir de acertos e erros e utilizando um escore referente a qualidade de execução do lançamento (Tabela 1). O escore varia de 1 ponto, lançamento que não toca no aro e na tabela, a 6 pontos, arremessos convertidos sem a bola tocar previamente no aro e/ou na tabela (Palhares et al., 2007).

Análise estatística

Para análise do desempenho do escore realizamos uma ANOVA de dois fatores (tempo: pré/pós-testes × grupos: 10%/30%) e para análise do desempenho de acertos e erros utilizamos testes não paramétricos de Wilcoxon (para medidas repetidas: pré/pós-testes) e U de Mann-Whitney (para análise entre grupos). A análise de Wilcoxon foi realizada com ambos os grupos e com os grupos separados para melhor compreensão dos dados. Para análise do efeito da meta estabelecida no comprometimento a meta utilizamos a taxa de razão entre as porcentagens apresentadas. O nível de significância adotado foi de p < 0.05. Devido o menor número de sujeitos, utilizamos a estatística r de X como descrito por Field (2009) para relatar o poder de efeito. Na análise do comprometimento à meta, utilizamos o V de Cramer como tamanho de efeito já que este teste consegue apontar um valor entre 0 e 1 e nos oferece o valor de p da análise.

 

RESULTADOS

Análise do desempenho na tarefa

As Figuras 1 e 2 apresentam as médias do desempenho de acertos e do escore de cada grupo, separadas em blocos de dez tentativas durante as três fases do estudo:  pré-teste (PRÉ), aquisição (A1-A10) e pós-teste (PÓS).

O teste de Wilcoxon para o desempenho de todos os indivíduos em termos dos acertos apresentou uma melhora não significativa com moderado poder de efeito (p=0.07; r=0.49), assim como na análise com grupos separados (G10%: p=0.28; r=0.4; G30%: p=0.16; r=0.56). O teste de Mann-Whitney não apontou diferenças entre os grupos no pré e pós-teste (Pré: p=0.88; r=0.04; Pós: p=0.88; r=0.04).

Os testes para Anova de dois fatores apontou resultados similares no desempenho avaliado pelo escore. A análise apontou efeito significativo somente para tempo (F(1.11)=8.60; p=0.01; r=0,66). Não houve diferenças entre grupos (F(1.11)=0.15; p=0.70; r=0.11) e efeito de interação tempo x grupos (p=0.36).

Análise do Comprometimento à Meta (QuAC)

Os resultados da análise do comprometimento à meta estabelecida são apresentados na Tabela 2.

 

 

Como é observado, o grupo G30% apresenta uma porcentagem muito abaixo do grupo G10% no comprometimento com a meta durante a fase de aquisição. O comportamento se torna similar no comprometimento a meta no pós teste. As análises realizadas apontam na mesma direção. O grupo 30% apresenta cinco vezes mais chance de auto-estabelecer a meta em relação ao grupo G10% durante a fase de aquisição – apesar do efeito moderado, o resultado não é significativo (V=0.38; p=0.17). O comprometimento no pós teste foi similar entre os grupos com o grupo G30% apresentando 1,5 vezes mais chance de auto-estabelecer a meta em relação ao grupo G10% – resultado não significativo com efeito pequeno (V=0.09; p=0.72).

 

DISCUSSÃO

O objetivo do presente estudo foi investigar os efeitos de diferentes percentuais para o cálculo da meta específica na aquisição do lançamento para três pontos do basquetebol, para indivíduos experientes e no comprometimento com a meta estabelecida. As hipóteses testadas aqui foram a de que o grupo G10% apresentasse resultados melhores que o grupo G30% devido a alta demanda requerida para o grupo G30% e que o grupo G30% apresentaria menor comprometimento com a meta devido a alta demanda requerida na mudança do desempenho. Nossos resultados não corroboram com nossa primeira hipótese e apresentam uma tendência em relação a segunda. Os grupos apresentaram resultados iguais no pré e pós teste e, apesar de não significativo, o grupo G30% apresentou menor comprometimento em relação ao grupo G10% com efeito moderado.

Em relação a primeira hipótese, observamos que ambos os grupos melhoraram o desempenho de forma similar não corroborando com a hipótese proposta. Esperávamos que uma meta inalcançável pudesse ter efeito negativo no desempenho dado que isto poderia influenciar em fatores motivacionais do sujeito.

Este resultado corrobora com o estudo de Weinberg et al. (1991) que não apontou diferenças entre as metas fáceis e inalcançáveis (virtualmente impossíveis). A diferença entre os estudos está na comparação realizada com um grupo experiente (presente estudo) e um grupo variado. Nos parece que a perceção dos indivíduos frente a possibilidade da meta acarretou nos resultados encontrados aqui – mesmo que tenha ocorrido de forma inversa no estudo de Weiberg et al. (1991). No estudo de Weinberg et al. (1991), os autores apontam que apesar da dificuldade em alcançar a meta, os indivíduos não pareciam perceber o quão próximo o desempenho estava do requerido na tarefa pelo fato dos indivíduos estarem observando uma melhora gradativa em seus resultados. Supomos que este seria um aspeto presente em estágios iniciais da aprendizagem onde não há perceção correta do próprio desempenho e do possível alcance em termos de mudança, ou ainda, que os indivíduos do estudo teriam alterado a meta para “faça o melhor possível” com a adição de um “e se possível, chegue no requerido” em vez de seguir de forma direta a meta estipulada. Em nosso estudo, o efeito contrário pode ter ocorrido. Os indivíduos ao notarem uma meta inalcançável prontamente auto-estabeleceram metas diferentes (mais fáceis, genéricas ou nenhuma meta) e desta forma, a meta inalcançável não deteriorou a performance dos sujeitos.

Nosso estudo corrobora também com Lane e Streeter (2003) que aponta que não houve diferença entre os indivíduos experientes nas diferentes metas estabelecidas. Apesar de não haver mensuração direta do comprometimento dos indivíduos no outro estudo, os indivíduos apontam terem percebido as metas de acordo com sua dificuldade. Desta forma, é capaz que ambos estudos tenham apresentado o mesmo efeito no comprometimento com a meta.

Em contrário, nosso estudo não corrobora com os resultados encontrados por Dutra (2007). O autor encontrou melhores desempenhos em indivíduos experientes no saque do voleibol no grupo que teve sua meta com 30% de acréscimo do desempenho no pré-teste em relação aos indivíduos que tiveram apenas 10%. Entretanto, os indivíduos do nosso estudo diferem em termos de tempo de experiência – nossos indivíduos são atletas do time universitário (24 anos em média) enquanto os indivíduos do estudo de Dutra (2007) são atletas das categorias de base (15.5 anos em média). Desta forma, é possível que no nível dos indivíduos analisados por Dutra (2007), a meta de 30% seja compatível e suficientemente desafiadora. Em nosso caso, o desempenho inicial é maior, e assim, o acréscimo de 30% no desempenho se torna impossível no período de prática da coleta de dados. Outro fator que deve ser notado, deve-se a há diferença no número de tentativas dadas em nosso estudo (100 tentativas) e em Dutra (2007) (810 tentativas).

Considerando estudos com indivíduos inexperientes na tarefa, este resultado de similaridade entre grupos corrobora com o estudo de Marinho et al. (2009) onde nenhum dos grupos apresentou melhor performance em relação ao outro. Contudo, no estudo de Marinho et al., (2009) quase todos os indivíduos reportaram auto-estabelecer metas – o que de fato também não resultou diferenças quando as metas auto-estabelecidas foram comparadas.

Em relação a nossa segunda hipótese, nossos resultados parcialmente corroboram com a hipótese mostrando que os indivíduos com metas inalcançáveis apresentam menor comprometimento com a meta estabelecida, preferindo metas mais fáceis, genéricas ou nenhuma. Isto se daria pelo fato de que ao estabelecer uma meta inalcançável para indivíduos experientes, estes, sendo aptos para comparar o atual desempenho com o requerido, prontamente alterariam a meta autoestabelecendo-a em um nível condizente com sua experiência.

Este resultado, se considerado, não corrobora com os resultados de Weinberg et al. (1991) e de Anshel, Weinberg, e Jackson (1992). Em Weinberg et al. (1991) todos os indivíduos apresentam alto comprometimento com a meta estabelecida independente da dificuldade desta. Entretanto, como apresentado anteriormente e sendo uma das motivações para a realização do presente estudo, o estudo de Winberg et al. (1991) não seleciona um nível específico de desempenho, o que desta forma, não torna os resultados contraditórios em relação aos encontrados no presente estudo. Em relação ao estudo de Anshel et al. (1992), este evidencia maior motivação por parte dos indivíduos quando a meta estabelecida era mais difícil – ou desafiadora. A mesma situação apontada no estudo de Winberg et al. (1991) permanece aqui: os indivíduos do estudo eram inexperientes na tarefa em questão – o que, nesta situação, corrobora totalmente com as hipóteses de Locke et al. (1981).

Os resultados relativos a nossa segunda pergunta oferecem um ponto para discussão: apesar de seguirem a instrução durante a prática, os indivíduos do grupo G10% – no pós-teste – preferiram auto-estabelecer metas. Isto poderia indicar uma mudança na relação com a meta estabelecida na mudança de situação (prática para teste). Entretanto, estes resultados devem ser considerados com cuidado, dado o baixo número de indivíduos e a falta de análises inferenciais sobre este ponto. Adicionalmente, Munroe-Chandler, Hall, e Weinberg (2004) investigaram este ponto e apontaram que atletas geralmente tem metas similares no treino e em competição – estudo com 249 atletas de 18 diferentes modalidades.

As limitações do presente estudo se dão pelo tempo de prática – apesar de observarmos diferenças significativas no desempenho – e o número de participantes. Entretanto, dado que os tamanhos de efeito são apresentados, nossos resultados conseguem apresentar sugestões para estudos futuros. Desta forma, esperamos que caso novos estudos com maior número de participantes seja conduzido, estes, possam corroborar com nossos resultados.

 

CONCLUSÕES

Desta forma, nosso estudo conclui que em indivíduos experientes, metas estabelecidas a partir de um acréscimo de 10% ou 30% no desempenho inicial não apresentam efeito na melhora do desempenho. Adiante, isto pode ser relacionado ao fato de indivíduos com metas superiores terem maior tendência a não se comprometer com a meta, autoestabelecendo metas condizentes com a possibilidade de mudança.

 

REFERÊNCIAS

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Agradecimentos:
Nada a declarar
Conflito de Interesses:
Nada a declarar.
Financiamento:
CNPq número: 211487/2013-9 – Brasil.

Artigo recebido a 27.03.2014; Aceite a 12.07.2014

 

 

* Autor correspondente: Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional – Universidade Federal de Minas Geriais – Av. Presidente Antônio Carlos, 6627 - Campus Pampulha- Belo Horizonte – Minas Gerais - 31.270-901 - Brasil  - E-mail: nataliambrosio@gmail.com