SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
 número40Crime transnacional, cooperação e prosperidadeO papel da EULEX no Kosovo: os setores da segurança e da justiça índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Relações Internacionais (R:I)

versão impressa ISSN 1645-9199

Relações Internacionais  no.40 Lisboa dez. 2013

 

AS DIMENSÕES EXTERNAS DA SEGURANÇA INTERNA

 

A ação externa do Espaço de Liberdade, Segurança e Justiça da UE

The external dimension of the Area of Freedom, Security and Justice within the European Union

 

Liliana Miranda1

Licenciada em Relações Internacionais pela Universidade do Minho, pós-graduada em Direitos Humanos e Democratização pela Universidade de Coimbra, e mestre em Direito Internacional e Relações Internacionais pela Universidade de Lisboa. De 2007 a 2012 trabalhou com a política europeia «Justiça e Assuntos Internos», tendo acompanhado diversos grupos de trabalho do Conselho da UE, incluindo na área das migrações e o grupo JAI-RELEX. Em 2012 trabalhou na área de estudos em segurança no Ministério da Administração Interna.

 

RESUMO

O desenvolvimento de um espaço de liberdade, segurança e justiça na União Europeia (UE) requer uma estratégia abrangente que cubra não só os seus aspetos internos, mas, igualmente, uma dimensão externa, capaz de permitir à UE combater, na fonte, e através de parcerias estratégicas com países terceiros, eventuais ameaças securitárias. Na primeira parte deste artigo, analisaremos, de forma sucinta, como a dimensão externa da política «Justiça e Assuntos Internos» se tem desenvolvido e afirmado enquanto política determinante na agenda europeia. Ilustraremos com maior detalhe, na segunda parte, esta dimensão externa através da política europeia de migração, e como daqui podem resultar benefícios para todos os intervenientes.

Palavras-chave: Justiça e assuntos internos, dimensão externa, segurança, migração

 

ABSTRACT

The development of an Area of Freedom, Security and Justice within the European Union requires a comprehensive strategy that covers not only its internal aspects, but also an external dimension, allowing the EU to deal with threats, at its source, and through strategic partnerships with third countries. In the first part of this article, we briefly analyze how the JHA external dimension has been developed and established itself as a determining policy on the European agenda. In the second part, we demonstrate this external dimension in greater detail through the European migration policy, and how it is possible to obtain within this external action benefits for all stakeholders.

Keywords: Justice and home affairs, external dimension, security, migration

 

Introdução

A criação de um espaço de liberdade, de segurança e de justiça (ELSJ) passou a constituir uma das prioridades da União Europeia (UE) com a entrada em vigor do Tratado de Amesterdão. Cedo se reconheceu que para o ELSJ ser efetivamente desenvolvido seriam não só necessárias regras e normas internas comuns a todos os estados-membros, mas igualmente parcerias estratégicas com países terceiros. Com o Programa de Tampere (1999-2004)2 entendeu-se, então, por um lado, que todas as competências e todos os instrumentos de que a União dispunha, em particular a nível das relações externas, deveriam ser utilizados de forma integrada e coerente para que se pudesse criar um ELSJ. A política europeia «Justiça e Assuntos Internos» (JAI) deveria, por seu turno, ser integrada na definição e implementação das outras políticas e atividades da União. Com o Programa de Haia (2005-2009)3 o Conselho veio solicitar a apresentação de uma estratégia relativa a todos os aspetos externos do domínio da JAI. Estavam, assim, lançadas as sementes daquela que viria a ser uma política relevante quer para a política interna JAI, quer, cada vez mais, para a política externa da União.

A «Estratégia para a dimensão externa da JAI: liberdade, segurança e justiça à escala mundial» (Estratégia JAIEX) não tardou a ser adotada4. Estávamos em 2005 e o Conselho identificava o terrorismo, a criminalidade organizada, a corrupção, o tráfico de estupefacientes e o desafio representado pela gestão dos fluxos migratórios como as cinco principais ameaças contra a segurança da União. Questões JAI como o combate ao terrorismo no Norte de África, no Médio Oriente, nos países do Golfo e na Ásia do Sudeste; a cooperação antidroga com o Afeganistão e países vizinhos ou com a América Latina e as Caraíbas; ou ainda a migração e a proteção dos refugiados na África Subsariana e noutras regiões eram entendidas como aquelas em que a UE necessitaria de empenhar-se mais com o resto do mundo. Sem uma estratégia abrangente que cobrisse todo o leque de temas relacionados com o ELSJ, e sem uma parceria mais estreita com países terceiros nesse domínio, o direito de livre circulação em toda a União, em condições de segurança e de justiça acessíveis a todos, poderia ser perigado.

Num dossiê especial dedicado à temática da externalização da segurança interna e suas ligações com a segurança externa não poderíamos, pois, deixar de aludir ao ELSJ – onde as questões securitárias se inserem – e, em concreto, à sua dimensão externa. Assim, propomos-nos analisar como o processo de externalização daquele espaço e da segurança interna da UE têm vindo a adquirir um lugar de charneira (incluindo na política externa da União), e a demonstrar, em particular através do exemplo da cooperação no domínio da imigração, como este processo pode ser positivo, saldando-se em benefícios mútuos para todos os intervenientes.

 

O Desenvolvimento da Ação Externa do espaço de Liberdade, Segurança e Justiça da UE5

Após a adoção da Estratégia JAIEX rapidamente se assistiu a uma proliferação de documentos estratégicos e de ação com países terceiros ou com grupos de países, ora contendo objetivos exclusivamente da área JAI, ora objetivos mais abrangentes e onde se podem, igualmente, incluir referências à cooperação em diversos setores JAI. Seria impossível percorrê-los aqui em toda a sua vastidão. Veja-se, no entanto, a título ilustrativo, as relações entre a UE e a Federação Russa – com a adoção do Espaço Comum de LSJ estabeleceu-se uma agenda comum, vocacionada exclusivamente para a cooperação em assuntos de interesse comum no domínio JAI, cujos resultados positivos se têm manifestado, designadamente, em matéria de vistos, diálogo migratório, cooperação com a Europol, droga e reformas na área da justiça6 – ou a cooperação com os países da Parceria Oriental que tem vindo a adquirir consistência, em questões como o asilo, luta contra a criminalidade organizada, tráfico de seres humanos, proteção de dados e cooperação judiciária a figurar na agenda nos últimos anos7.

Paralelamente são adotadas estratégias específicas para áreas temáticas da JAI que incluem uma perspetiva externa, e de que são exemplo as medidas de combate à criminalidade organizada para o período 2011-2013; as medidas contra o tráfico de seres humanos; o documento orientado para a ação contra o crime organizado (em especial o tráfico de droga proveniente da África Ocidental); as conclusões do Conselho direcionadas exclusivamente para o reforço das ligações entre os aspetos internos e externos do contraterrorismo; ou a recém-adotada estratégia da UE para a cibersegurança. Por seu turno, a Estratégia de Segurança Interna da UE, mais abrangente, vem, igualmente, reconhecer o caráter imprescindível do fortalecimento da dimensão externa da segurança interna8.

Mais: as agências europeias também conferem dinâmica e impulso à ação externa da JAI por via dos acordos operacionais que estabelecem com as autoridades de países terceiros, no âmbito dos quais podem ser promovidas ações de formação, partilha de conhecimentos especializados, boas práticas e cooperação operacional, conduzindo a uma aproximação entre práticas europeias e não europeias. Por exemplo, a EUROPOL conta já com vinte acordos e, em junho do pretérito ano, a FRONTEX estabelecera acordos operacionais com dezassete países terceiros9.

Como solicitado pelo Conselho, tem-se verificado uma integração crescente da área JAI noutras políticas europeias – a inclusão das questões securitárias e migratórias na política de desenvolvimento representam aqui uma das suas faces visíveis10. Não escasseiam, igualmente, exemplos de inserção de cláusulas JAI em acordos com países terceiros de âmbito mais genérico, como demonstram os acordos de Estabilização e Associação da UE (aqui, a perspetiva de futura adesão à União determina, de imediato, a aproximação aos padrões europeus) ou os Acordos de Parceria e Cooperação11. Nesta senda, refira-se que os desenvolvimentos a que temos vindo a assistir vão ao encontro dos princípios que presidem à ação da UE na cena internacional – e que é seu objetivo promover no mundo – como a salvaguarda da segurança; a consolidação e apoio à democracia, ao Estado de direito e aos direitos do homem; bem como o reforço da segurança internacional12. Dito de outro modo: a ação externa do Espaço de LSJ não só complementa as medidas internas da área JAI, como também a ação externa, mais abrangente, da União.

A imposição de um princípio de condicionalidade, de acordo com o qual o apoio da UE a países terceiros e a intensidade da cooperação são determinadas pelos progressos por estes realizados – e, claro está, os parceiros mais empenhados nas reformas são os que mais beneficiam das suas relações com a União – funciona igualmente como uma força motora para os impelir a cooperar nos moldes propostos pela União (e com ela negociados). Ou seja, a lógica de «mais por mais» – ao abrigo da qual quanto mais progressos um país parceiro obtiver e quanto mais predisposto estiver a adotar o acervo da UE no domínio da JLS, mais apoio (incluindo financiamento acrescido) receberá da UE – conduzirá, de igual modo, a uma extensão do modelo JAI europeu para o exterior13.

Por outro lado, a ação da UE é acompanhada e complementada pela ação de cada Estado-membro no âmbito das suas relações bilaterais. Estes continuam a desenvolver a sua própria política de cooperação, oferecem assistência técnica, e dispõem de oficiais de ligação e de pessoal (policial, judicial e/ou outro) especializado nas temáticas JAI (procedendo, inclusivamente, ao seu destacamento para operações da União como sucede com as operações conjuntas da FRONTEX).

Em suma, o número crescente de documentos com uma orientação geral, específica ou geográfica dedicados à área JAI, de documentos de programação e planos de ação entre a UE e países terceiros, bem como de reuniões de alto nível, ministeriais ou de peritos nas diversas temáticas JAI com países terceiros, são sintomáticos da relevância que a dimensão externa do ELSJ tem na agenda da União. Segundo Longo, esta dimensão externa desempenha inclusivamente um papel fundamental na definição de um novo paradigma securitário europeu, holístico e assente na indivisibilidade de ambos os aspetos internos e externos da segurança14.

Se os programas de Tampere e A Haia colocaram a dimensão externa JAI na agenda europeia, o Programa de Estocolmo (2010-2014)15, atualmente em curso, veio consolidar, definitivamente, o seu estatuto e atribuir-lhe um lugar proeminente16. Comparativamente aos programas que o precederam17, Estocolmo desenvolve esta temática, definindo, de forma mais substancial, os princípios para uma dimensão externa mais forte, as prioridades geográficas (dos Balcãs Ocidentais à Política Europeia de Vizinhança, da União para o Mediterrâneo aos países da Ásia Central, dos Estados Unidos à Turquia, entre outros) e temáticas (e.g., intercâmbio de informações, gestão de catástrofes, combate à criminalidade grave e organizada, diálogo sobre migrações e asilo), não olvidando os direitos humanos, acordos com países terceiros ou a parceria com organizações internacionais.

Na prática, esta ação externa não é nova18, mas nunca, como agora, teve tanto fôlego e consistência19. A UE é um ator interdependente num mundo complexo e a garantia de «um elevado nível de segurança»20, de que possam beneficiar os cidadãos num espaço livre e com acesso à justiça, vai necessariamente para além do estabelecimento de regras comuns a todos os estados-membros, pressupondo o envolvimento de países terceiros na realização deste desígnio europeu. A gravidade da ameaça terrorista que grassa às portas da UE, no Sahel e no Magrebe, é ilustrativa da necessidade de suprimir eventuais ameaças logo na sua origem (o que será, igualmente, benéfico para os países terceiros). Tem-se assistido ao alargamento da base operacional dos grupos terroristas no Sahel (que se implantaram noutros países, em especial no Magrebe e no Sinai, Egito); ao aumento do número de grupos terroristas na região e de ligações entre eles; com o enfraquecimento ou desmantelamento dos serviços de segurança em alguns países no contexto da primavera árabe, os grupos terroristas passaram a dispor de mais espaço para operar; os conflitos na Síria e na Líbia estão a aliciar combatentes de outros países (inclusive da UE) e os conluios existentes entre traficantes e funcionários públicos no Mali representam uma ameaça para a segurança interna da União (uma vez que a Europa constitui um importante destino de estupefacientes). Esta «mistura tóxica de ameaças», à porta do território europeu, representa um risco securitário para toda a União, cujo cenário mais provável é um atentado com explosivos convencionais contra alvos fáceis. Neste contexto, medidas no domínio da JAI revelam-se fundamentais, a fim de atenuar os riscos imediatos e a médio prazo que tal situação comporta. A resposta JAI pressupõe, designadamente, um apoio à reforma do setor da segurança nos países da primavera árabe; o reforço da vigilância e do controlo das fronteiras terrestres, bem como da segurança aeroportuária, no Sahel; a intensificação das sinergias entre os instrumentos JAI e da PESC; a intensificação da abordagem civil na luta contra o terrorismo na região do Sahel e do Magrebe; e a disponibilização de recursos humanos na área JAI (e.g., da segurança de fronteiras a magistrados) para apoiar aquelas regiões, entre outros21.

O combate às ameaças, mesmo longe do nosso continente, determina que estas sejam abordadas através de uma cooperação crescente na área JAI com países terceiros (quer a nível multilateral, quer a nível bilateral), bem como da incorporação dos objetivos JAI em políticas gerais e na ação externa da UE. A segurança interna e externa são indissociáveis22. Com efeito, promover parcerias com países terceiros – capazes de assegurar o seu envolvimento no combate à criminalidade grave e organizada; de desenvolver as suas capacidades de prevenção e resposta a catástrofes ou de melhor gestão das fronteiras; e de garantir o seu comprometimento com o primado do direito e os direitos humanos – é uma forma de atacar, na fonte, os problemas e de capacitar os nossos parceiros a atuar nos moldes (europeus) desejados e, por esse meio, asseverar a segurança externa. Desta forma, procura-se garantir que no mundo exterior ao espaço interno de LSJ se desenvolvem e se aplicam medidas securitárias relevantes e, concomitantemente, se minimizam não só as ameaças nos países terceiros, como, também, os riscos de estas atingirem o solo europeu. Atente-se, como referiremos mais adiante, nos riscos colocados pela primavera árabe à estabilidade da União, que determinaram o lançamento de um diálogo reforçado com os vizinhos do Sul, pressupondo o seu envolvimento e comprometimento com o objetivo europeu, não só para (re)estabelecer a segurança naquela região, mas também (e previsivelmente mais relevante), para evitar que os seus efeitos negativos perigassem a estabilidade europeia.

Por conseguinte, se países relevantes – mesmo que só indiretamente – contribuem para o objetivo de desenvolvimento de um ELSJ, por força da redução das ameaças externas que o espaço europeu possa sentir, estes países adquirem igualmente ganhos por via da cooperação com a UE (precisamente porque também os seus cidadãos passam a beneficiar de um espaço mais seguro). Poder-se-á concluir que a dimensão externa JAI emerge como um instrumento de projeção e alargamento das medidas do ELSJ para o exterior, impulsionando países terceiros a aplicar princípios idênticos aos europeus23. No entanto, se este processo de envolvimento (indireto) de países terceiros na garantia de um espaço comum europeu, justo e seguro, pode trazer benefícios mútuos para a estabilidade e a segurança de ambos os lados, comporta, por outro, alguns constrangimentos, a saber: a União fica dependente da vontade de os países terceiros estabelecerem um diálogo e cooperação na área JAI, além de que – como consideram Lavenex e Wichmann24– os incentivos oferecidos pela UE e seus estados-membros podem não ser suficientemente atrativos para os países terceiros.

 

Desafios atuais

Aproximando-se o término do Programa de Estocolmo, a União enceta, agora, um processo de reflexão conducente à definição das novas prioridades do ELSJ – e, portanto, das prioridades securitárias – para o período pós-2014. Volvidos quase quinze anos de trabalhos25, a UE deverá trilhar um novo caminho, numa lógica de continuidade assente em um conjunto de medidas legislativas europeias, comuns aos estados-membros, já existentes. Consolidada a dimensão interna JAI, para aonde se direcionará, então, a União? A nosso ver, cada vez mais para a dimensão externa. Este entendimento alicerça-se na intensa atividade da UE neste domínio – atrás aludida e que não parece dar sinais de abrandar. Parece sustentar também esta posição a mudança de paradigma internacional ocorrida no pós-Guerra Fria, caracterizada pelo receio crescente de os países ocidentes enfrentarem um novo tipo de ameaças como o crime organizado, o terrorismo e a imigração ilegal26, bem como o esbatimento acentuado da distinção entre segurança interna e externa27. A este último propósito – e tal como referem28–, a UE e os seus estados-membros concluíram que, em reação às externalidades crescentes, a União teria necessariamente de atuar como ator global nas áreas JAI, de modo a (melhor) responder às ameaças ao seu ELSJ. Ao atuar como ator global na área JAI, a União pode, pois, projectar-se no exterior em outros domínios (indo, assim, para além dos tradicionais temas de cooperação internacional como a cooperação para o desenvolvimento, comércio ou política de segurança e defesa)29– novo papel que, compreensivelmente, a UE não quererá perder, mas, ao invés, aprofundar.

Acrescem, ainda, os progressos ocorridos no quadro da ação interna JAI – o acervo Schengen revela um vigoroso trabalho, a par de uma crescente cooperação operacional. Com uma aplicação do acervo Schengen cada vez mais sólida e com uma solidariedade intra-UE progressivamente mais intensa, a ação interna jai poderá não sofrer progressos tão intensos como os verificados desde Tampere, nada mais restando à União, portanto, do que se direcionar com maior projeção para a atividade externa JAI. A ação externa do ELSJ continuará, pois, a ser fundamental para aproximar os países terceiros aos padrões europeus nas diversas temáticas JAI e, por conseguinte, para o tornar mais credível. Nesta senda, poderá ser expectável que a ação externa da JAI vá, no pós-Estocolmo, para além de um papel complementar da dimensão interna JAI, assumindo um papel mais central. Contudo, o facto de as temáticas JLS estarem presentes em diversos domínios da ação externa da União e de pressuporem vários aspetos que se influenciam mutuamente, poderá exigir uma renovação da Estratégia JAIEX para dar resposta a vários desafios. Recorde-se, por último, que a implementação do atual Programa de Estocolmo coincidiu com uma nova fase jurídica da União, marcada pela entrada em vigor do Tratado de Lisboa, que veio oferecer novas possibilidades para uma ação mais eficaz da UE nas relações externas JAI30. Este novo quadro normativo ditou, aliás, uma reestruturação das estruturas de trabalho do Conselho e, consequentemente, a criação, em finais de 2009, do Grupo de Trabalho JAI--RELEX (JAIEX)31– sinal de que a ação externa da JAI veio, efetivamente, para ficar. Não obstante, afigura-se relevante melhorar a sua metodologia de trabalho – assente, por vezes, em meros pontos de informação, sem providenciar um real input para os grupos geográficos relevantes ou sem ter procedido a uma efetiva coordenação com todos os stakeholders – tornando-o mais estratégico e reativo32.

O novo quadro normativo em vigor também não deixa de colocar desafios à União, que carecem de resolução. Para uma melhor ação externa JAI é ainda necessário: uma maior coerência entre os instrumentos tradicionais de política externa e os instrumentos internos com importantes dimensões externas (e.g., PESC e JAI); uma integração crescente da área JAI nas políticas gerais da União; um maior alinhamento entre a ação da União e dos seus estados-membros; uma melhor cooperação entre agências; assegurar a inclusão de competências específicas neste domínio nas delegações da União em países parceiros estratégicos; e afinar a coordenação dos papéis dos diversos stakeholders (e.g., Comissão Europeia e suas diversas direções gerais, Alta Representante e Serviço de Ação Externa, Parlamento Europeu, agências europeias, coordenador para o contraterrorismo, estados-membros, e diversos grupos de trabalho do Conselho)33.

 

O caso particular da Ação Externa da Política Europeia de Migração

Como atrás referido, o desafio representado pela gestão dos fluxos migratórios foi identificado pela Estratégia JAEIX como um dos cinco principais desafios à segurança da União. Tal não significa que os imigrantes sejam associados a outras ameaças para a União (como o terrorismo e a criminalidade organizada), mas, tão-só, que os fluxos migratórios quando desregulados podem perigar a estabilidade, o consenso e a segurança do espaço europeu e, por isso mesmo, perfilar um risco acrescido para a União e seus estados-membros.

O desabrochar das revoltas no Norte de África na senda da primavera árabe e a consequente fuga massiva de tunisinos e libaneses, em 2011, em direção ao território de alguns estados-membros da União – particularmente em direção à Itália, embora tivesse como destino final outro(s) estado(s)-membro(s) –, constitui um claro exemplo desse risco. À data esteve em causa o facto de a Itália, que sofria uma forte pressão migratória, ter emitido autorizações de residência a cidadãos tunisinos, permitindo-lhes circular livremente no Espaço Schengen, o que determinou a reposição unilateral por parte da França dos controlos nas suas fronteiras internas (em incumprimento das normas estabelecidas). A forte pressão migratória pôs, pois, em risco o funcionamento de uma das pedras angulares da integração europeia – o Espaço Schengen –, tendo despoletado uma acesa polémica na União e a revisão das regras Schengen, de modo a que a UE e os estados-membros pudessem dispor de novos mecanismos (rápidos e eficazes), incluindo novos fundamentos jurídicos, para a reposição dos controlos fronteiriços34. Um fenómeno complexo como o das migrações requer uma resposta equilibrada, global e coerente, contemplando não só todos os aspetos do fenómeno migratório – incluindo a vertente securitária (e.g., de luta contra o tráfico de seres humanos ou de gestão das fronteiras), a promoção da imi gração legal e as sinergias entre migrações e desenvolvimento – como, também, uma cooperação, parceria e diálogo entre todos, os intervenientes. É, pois, com base no pressuposto firme de que uma abordagem integrada e abrangente que inclua todos os elementos das migrações, através de uma estreita parceria entre os países de origem, de trânsito e de destino – capaz de beneficiar todos os países envolvidos e os próprios migrantes –, que a União adotou, em 2005, a Abordagem Global das Migrações (designada, atualmente, de Abordagem Global das Migrações e Mobilidade, AGMM)35 – a sua dimensão externa par excellence para a área das migrações.

Inicialmente vocacionada para a África e países do Mediterrâneo, a AGMM rapidamente se alargou a diversas regiões, tendo hoje ao seu dispor diversos fóruns, diálogos e parcerias multilaterais – desde o Processo de Rabat e da Parceria UE/África sobre Migrações, Mobilidade e Emprego, até ao Processo de Praga, ao Diálogo Migratório com os Países da África, Caraíbas e Pacífico, e à participação no Diálogo de Alto Nível sobre Migrações e Desenvolvimento das Nações Unidas, entre outros – e bilaterais – e.g., grupo de trabalho UE/Marrocos sobre assuntos sociais e migração, Plataforma de Cooperação UE/EUA sobre migrações e refugiados, e diálogo migratório UE/Rússia.

A par da diversidade geográfica (de sul a leste) para abordar, a nível externo, a temática das migrações, a União dispõe de um conjunto diversificado de instrumentos, incluindo missões migratórias e plataformas de cooperação sobre migrações e desenvolvimento. Notórias pela sua natureza são, todavia, as Parcerias para a Mobilidade36 (PM) – instrumento através do qual os países terceiros se comprometem a colaborar com a União na gestão das migrações (nomeadamente na luta contra a imigração ilegal, readmitindo os seus nacionais e melhor gerindo as suas fronteiras) em troca de benefícios acrescidos (e.g., por via de tratamento preferencial relativamente ao acesso dos seus nacionais ao território da União, celebração de acordos de facilitação de vistos, e assistência financeira e técnica). Por conseguinte, os compromissos e responsabilidades, numa lógica de negociação e aceitação comum, são partilhados entre a União e países terceiros em nome de benefícios mútuos. Note-se que a AGMM assenta em quatro pilares, com igual importância, e através dos quais os interesses de todas as partes são equilibrados em benefício de todos, a saber: i) melhor imigração legal e boa gestão da mobilidade; ii) prevenção e combate à imigração ilegal e ao tráfico de seres humanos; iii) maximização do impacto da imigração e da mobilidade sobre o desenvolvimento; e iv) promoção da proteção internacional e reforço da dimensão externa da política de asilo37.

Entendida, no entanto, por alguns autores38 como uma estratégia europeia para tão-só transferir as suas responsabilidades neste domínio para o exterior (aliviando o fardo da imigração na ue e minimizando qualquer ameaça à sua segurança), não se trata, a nosso ver, de uma perspetiva exclusivamente unilateral da UE, usada para satisfazer só os seus próprios interesses39. Mas, pelo contrário, do reconhecimento de que só em conjunto, através de uma aliança estreita com países que partilham com a UE interesses e preocupações comuns, objetivos são melhor alcançados e ganhos acrescidos são obtidos.

Tomemos como referência a ação externa no domínio das migrações na região afetada pela primavera árabe: como parte da oferta de uma «Parceria para a Democracia e a Prosperidade Partilhada», e no contexto de uma Política Europeia de Vizinhança reforçada face aos vizinhos do Sul e às suas novas aspirações democráticas, a UE propôs um diálogo sobre migração, mobilidade e segurança. Este novo diálogo (ainda em curso e que pressupõe, também, o lançamento de PM) visa encorajar as reformas – para melhorar a segurança – que os países parceiros podem realizar, oferecendo aos seus cidadãos a possibilidade de uma maior mobilidade para os estados-membros da UE e abordando, concomitantemente, as causas profundas dos fluxos migratórios. Com efeito, assegura-se um benefício para ambas as partes. Exemplificando: a mobilidade é assegurada em condições mais seguras para os próprios imigrantes e o lançamento dessas parcerias – ao incentivar contactos interpessoais e a compreensão mútua, bem como a atividade empresarial e o emprego – promove o desenvolvimento social e económico de toda a região mediterrânica e a integração de migrantes na União.

Além disso, procura-se que as PM sejam instituídas com base nos compromissos e nos méritos próprios de cada país, de modo a que «os países parceiros que estejam dispostos a trabalhar com a UE em matéria de asilo, migração e gestão das fronteiras, bem como sobre uma maior eficácia da aplicação do Estado de direito, beneficiarão de apoio para reforçar as suas capacidades para esse efeito. Esta cooperação contribuirá, também, para criar as condições para a estabilidade, o respeito pelos direitos humanos, a democracia e a boa governação. Irá ainda permitir que a UE possa oferecer outras iniciativas que facilitem a mobilidade»40. Acresce que as PM incluiriam, na perspetiva da União, um pacote de medidas de reforço das capacidades a implementar nos países parceiros e a ser identificado, nomeadamente, com base nas propostas e pedidos apresentados por estes últimos41. Em suma, na implementação dos diálogos sobre migrações, assiste-se a uma abordagem diferenciada, no âmbito da qual os países que envidam mais esforços – e que se revertem de forma positiva para o desenvolvimento dos seus povos – recebem maior apoio de uma UE totalmente empenhada em asseverar, conforme a bandeira do Programa de Estocolmo, uma Europa aberta, mas segura, que sirva e proteja os cidadãos.

Neste quadro, também a gestão integrada das fronteiras e a política de vistos – intimamente ligadas à política europeia de migrações – servem esse objetivo da União. Por um lado, mantém-se um elevado nível de segurança – ao mesmo tempo que se simplifica a passagem das fronteiras para os que devem legitimamente entrar na UE –, no pleno respeito dos seus direitos fundamentais, e se evitam abusos capazes de fragilizar a confiança entre estados. Por outro lado, garante-se que a mobilidade ocorre de uma forma célere e segura, redundando, uma vez mais, em benefícios para todos os intervenientes no processo de migração.

A imigração ilegal conduz, no limite, a um risco para as vidas dos imigrantes. Mais do que um problema para a União, é um problema para os próprios indivíduos que encontram as suas vidas perigadas e são envolvidos em redes criminosas complexas, dedicadas à exploração de imigrantes e ao tráfico de seres humanos. Assim, este fenómeno não poderia deixar de requerer, igualmente, uma abordagem securitária e um maior controlo fronteiriço – é por isso mesmo que os países terceiros são convidados a participar neste processo, incluindo por via de acordos de cooperação celebrados com a Frontex ou de projetos de apoio à sua capacitação.

Mas a política europeia é, como referido, mais abrangente. Os instrumentos ao dispor da implementação da AGMM, muito em particular as PM (que cobrem um vasto leque de questões) e a integração da temática das migrações noutras políticas europeias (e.g., na política de desenvolvimento, emprego e assuntos sociais), conduzem ao desenvolvimento e capacitação de países terceiros. E, claro está, à mitigação das suas deficiências em diversos setores como a pobreza; falta de condições de vida e de oportunidades de emprego; desrespeito pelos direitos humanos; prevenção de conflitos e consolidação de estados democráticos. Assim se verifica, uma vez mais, que a AGMM se edifica como uma mais-valia quer para a União, quer para os países terceiros e seus povos. Também, a análise de Freyburg demonstra que a cooperação UE/Marrocos redundou na aproximação da legislação nacional marroquina ao acervo europeu. Ainda que na aplicação da legislação os resultados possam ser mais restritos42, sem esta cooperação os ganhos para ambos os parceiros seriam efetivamente menores (senão mesmo inexistentes).

De Tampere a Estocolmo, a ação externa da União em matéria de migrações consolidou-se; porém, ainda tem diversos desafios a enfrentar. A associação desta política a um instrumento de externalização (negativa) para manter a porta fechada à entrada de novos imigrantes poderá ser um deles. A UE sabe que precisa de uma migração bem gerida, em colaboração com países terceiros, virada para o futuro e global, baseada na solidariedade e na responsabilidade. No pós-Estocolmo, o desenvolvimento de uma abordagem ainda mais global, abrangente e integrada para as migrações continuará, seguramente, a ser um objetivo político essencial da União, não só pelos benefícios que traz para a UE – em termos económicos, demográficos e securitários –, mas, igualmente, pelo impacto positivo que tem em países terceiros.

 

Considerações Finais

Do que ficou dito, conclui-se pela importância crescente da dimensão externa do ELSJ. Por um lado, esta não só complementa a política (interna) da JAI, como é decisiva para o seu êxito. Sem ela, as regras e normas comuns a todos os estados-membros, assim como a cooperação e a solidariedade no seio da União seriam, por si só, insuficientes para responder a todas as ameaças existentes na cena internacional, e que rapidamente poderiam atingir o espaço europeu. A União tem, necessariamente, de estabelecer parcerias abrangentes com países relevantes, que cubram o grande leque de temas JAI – e onde as questões securitárias têm uma posição de charneira. Sem estas, o ELSJ seria uma miragem.

Por outro lado, ao gizar a aproximação dos padrões securitários (e de justiça) de países terceiros aos da União – por via de parcerias e de uma cooperação reforçada neste domínio –, a dimensão externa pode trazer benefícios mútuos. A ação externa da União em matéria de migrações é ilustrativa desta importância. Uma gestão eficaz das migrações só é possível graças ao envolvimento e ao compromisso de países terceiros. Este processo salda-se em ganhos não só para a União (por força da minimização de eventuais riscos para o ELSJ), como para aqueles últimos (por força de parcerias que abordam os seus problemas estruturais).

Mais: a dimensão externa JAI afirma-se na ação externa, mais abrangente, da União; fruto do seu peso para os objetivos que a União quer promover no mundo. Por isso mesmo, somos de concluir pelos benefícios advindos, para todos, do alargamento dos aspetos relevantes da área JAI a países terceiros. E, quiçá, pela emergência de (mais) um modelo europeu – um modelo europeu de segurança assente nas regras de liberdade, segurança e justiça acessíveis a todos.

 

Data de receção: 28 de agosto de 2013 | Data de aprovação: 13 de novembro de 2013

 

Notas

1As opiniões expressas no artigo são da responsabilidade da autora podendo não coincidir com as da instituição que representa. Todos os erros e omissões são da sua responsabilidade.

2Primeiro programa plurianual da área jai. [Consultado em: 26 de agosto de 2013]. Disponível em: http://www.consilium.europa.eu/uedocs/cms_data/docs/pressdata/en/ec/00200-r1.en9.htm

3Segundo programa plurianual da área jai. [Consultado em: 26 de agosto de 2013]. Disponível em: http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2005:053:0001:0014:PT:PDF

4Estratégia JAIEX. [Consultado em: 26 de agosto de 2013]. Disponível em: http://register.consilium.europa.eu/pdf/en/05/st14/st14366-re03.en05.pdf

5Para mais informação sobre a forma como a ação externa jai se tem materializado, veja-se, por exemplo, Monar, Jorg – «The external dimension of the eus’ area of freedom, security and justice. Progress, potential and limitations after the Treaty of Lisbon». In Swedish Institute for European Policy Studies, 2012, pp. 50 -67.         [ Links ]

6Espaço Comum de LSJ adotado em 2003, na Cimeira de Sampetersburgo. [Consultado em: 26 de agosto de 2013]. Disponível em: http://eeas.europa.eu/russia/docs/commonspaces_prog_report_2012_en.pdf

7Doc. da Comissão COM (2011) 564 final de 26.9.2011 e doc. do Conselho 17596/11 de 28.11.2011.

8Doc. do Conselho 11050/11 de 6.6.2011, 11450/5/09 de 19.11.2009, 13661/3/12 de 3.12.2012 e 11780/12 de 25.6.2012, 5069/3/10 de 25.3.2010, 11075/11 de 6.6.2011; doc. JOIN (2013) 1 final de 7.2.2013; doc. do Conselho 7120/10 de 8.3.2010.

9[Consultado em: 26 de agosto de 2013]. Disponível em: https://www.europol.europa.eu/content/page/external-cooperation31 e https://www.frontex.europa.eu/partners/third-countries

10Leia-se: Coerência das Políticas para o Desenvolvimento que, desde 2009, se tem centrado em cinco prioridades, entre as quais os assuntos securitários e migratórios. [Consultado em: 26 de agosto de 2013]. Disponível em: http://ec.europa.eu/europeaid/what/development-policies/policy-coherence/index_en.htm . A articulação entre jaie pesc, numa fase mais embrionária, parece requerer maiores esforços. Doc. do Conselho 11678/11 de 4.07.2011.

11E.g., Acordo de Estabilização e de Associação com a República da Albânia (2009). [Consultado em: 26 de agosto de 2013]. Disponível em: http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2009:107:0166:0502:PT:PDF; ou o Acordo de Parceria e Cooperação com a República do Tajiquistão (2009), [Consultado em: 26 de agosto de 2013]. Disponív el em http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2009:350:0003:0051:PT:PDF

12Artigo 21.º do Tratado da ue. Note-se, a este propósito, o n.º 3, ao abrigo do qual o tratado confirma que, no contexto da elaboração e execução da sua ação externa, a União atende aos diferentes domínios abrangidos pelo título v do Tratado sobre o Funcionamento da UE, i.e., o título dedicado ao elsj.

13Veja-se, nesta senda, as conclusões do Conselho sobre a cooperação no domínio da jai com os países da Parceria Oriental, onde se determina que «a abordagem “mais por mais” deverá ser plenamente aplicada […] Deverá prestar-se particular atenção aos países parceiros que estejam dispostos a adotar o acervo da ueno domínio da jls, o que se deverá também refletir na distribuição da ajuda financeira.» Doc. 17596/11 de 28.11.2011. Lavenex e Wichmann entendem, por contraposição, que a «transferência» de medidas jai para o exterior através da imposição de condicionalidades encontra sérias limitações, designadamente, devido aos insuficientes incentivos que a União pode oferecer aos países terceiros de forma a compensá-los pelos seus custos de adaptação a novas regras e práticas. Lavenex, Sandra, e Wichmann, Nicole – «The external governance of euinternal security». In European Integration. Vol. 31, N.º 1, janeiro de 2009, p. 83.

14Longo, Francesca – «Justice and home affairs as a new dimension of the European security concept». In European Foreign Affairs Review. Vol. 18, N.º 1, fevereiro de 2013, pp. 19, 20, 34, 38 e seguin-tes.         [ Links ]

15Doc. do Conselho 5731/10 de 3.3.2010.

16Wessel, Marin e Matera consideram que a ambição de Estocolmo era transformar a ação externa jai numa «política quadro organizada», cada vez mais integrada nas políticas do elsj, sem perder de vista a complementaridade entre os seus elementos internos e externos. Wessel, A. Ramses, Marin, Luisa, e Matera, Claudio – «The external dimension of the eu’s area of freedom, security and justice», 2010, p. 286. [Consultado em: 26 de agosto de 2013]. Disponível em: http://www.utwente.nl/mb/pa/research/wessel/wessel76.pdf

17O Programa de Tampere aborda, em termos genéricos, «uma ação externa mais determinada» e o Programa de A Haia, igualmente em termos genéricos, o «desenvolvimento de uma dimensão externa coerente da política da União em matéria de lsj».

18Veja-se, a título ilustrativo, que o Conselho adotou, em 1987, uma decisão em matéria de drogas, na qual aludiu à necessidade de a luta contra este fenómeno ser integrada nas relações externas. Referido em Wolff, Sar ah, Wichmann, Nicole, e Mounier, Gregory – «The external dimension of justice and home affairs: a different security agenda for the eu?». In European Integration. Vol, 31, N.º 1, janeiro de 2009, p. 12.         [ Links ]

19De acordo com Longo, foi no início da última década que esta abordagem se começou a intensificar e, com ela, a definição de um novo conceito de segurança da ue, de forma a proteger os seus cidadãos de um vasto conjunto de ameaças internas e externas. Cf. Longo, Francesca – «Justice and home affairs as a new dimension of the European security concept». In European Foreign Affairs Review. Vol. 18, N.º 1, fevereiro de 2013, p. 46.         [ Links ]

20Desígnio a que se propõe no tfue, artigo 67.º, n.º 3.

21Veja-se a discussão política que teve lugar na sessão do Conselho JAI da ue, de março passado, sobre a situação de segurança no Sahel/Magrebe e as suas implicações para a segurança interna da ue. Doc. do Conselho 6752 /13 de 26.02.2013.

22Daí que Francesca Longo aponte para uma nova abordagem securitária europeia intitulada de «holistic security». Cf. Longo, Francesca – «Justice and home affairs as a new dimension of the European security concept», p. 46.

23Para Pess, trata-se de um processo de externalização das políticas securitárias internas da ue, ao abrigo do qual a ueencoraja países terceiros a adotarem medidas baseadas no seu modelo de segurança interna. Para Mounier, desde que a ameaça à segurança interna da União se origine no exterior, a projeção dos instrumentos securitários internos da ueencontra-se legitimada. Referido em Wessel, A. Ramses, Marin, Luisa, e Matera, Claudio – «The external dimension of the eu’s area of freedom, security and justice», pp. 15 e 18, respetivamente. Há autores que defendem, aliás, que os progressos neste domínio são, primeiramente, determinados pelos desenvolvimentos que, a priori, ocorrem dentro do elsj. Cf. Wessel, A. Ramses, Marin, Luisa, e Matera, Claudio – «The external dimension of the eu’s area of freedom, security and justice», p. 285; Lavenex, Sandra, e Wichmann, Nicole – «The external governance of eu internal security». In European Integration. Vol, 31, N.º 1, janeiro de 2009, p. 89.         [ Links ]

24Para Sandra Lavenex e Nicole Wichmann, a capacidade da uepara oferecer incentivos a países terceiros de forma a adotarem as suas normas é limitada. A par, a «condicionalidade» imposta pela União é negativa, sendo, raras vezes, bem-sucedida. Cf. Lavenex, Sandra, e Wichmann, Nicole – «The external governance of eu internal security», pp. 83-98.

25O primeiro programa de trabalho plurianual remonta, como inicialmente referido, a 1999.

26O que permite, como notam Trauner e Carrapiço, uma extensão da governança europeia para o exterior em áreas tradicionalmente consideradas de índole doméstica. Trauner, Florian, e Carrapiço, Helena – «The external dimension of eujustice and home affairs after the Lisbon Treaty: analysing the dynamics of expansion and diversification». In European Foreign Affairs Review. Vol. 17, Special Issue, abril de 2012, p. 2;         [ Links ] Wolff, Sarah, Wichmann, Nicole, e Mounier, Gregory – «The external dimension of justice and home affairs: a different security agenda for the eu?». In European Integration. Vol. 31, N.º 1, janeiro de 2009, p. 12;         [ Links ] Longo, Francesca – «Justice and home affairs as a new dimension of the European security concept», p. 36.

27Lavenex, Sandra, e Wichmann, Nicole – «The external governance of euinternal security», p. 83; Wolff, Sarah, Wichmann, Nicole, e Mounier, Gregory – «The external dimension of justice and home affairs: a different security agenda for the eu?», p. 12.

28Wessel, A. Ramses, Marin, Luisa, e Matera, Claudio – «The external dimension of the eu’s area of freedom, security and justice», p. 277.

29Wessel, A. Ramses, Marin, Luisa, e Matera, Claudio – «The external dimension of the eu’s area of freedom, security and justice», p. 272.

30O facto de se ter posto termo à estrutura de pilares em que a área jaiestava dividida; de se alargar o procedimento de decisão ordinário a mais temáticas jai; de a União estar dotada de personalidade jurídica (permitindo-lhe agir com maior peso nas organizações internacionais); ou de haver uma nova base jurídica para a celebração de acordos internacionais (que garante à União uma negociação mais eficaz com parceiros essenciais) são garantes de uma melhor ação da ue.

31Doc. do Conselho 17653/09 de 16.12.2009. Fora criado previamente, em 2008, um grupo jai-relexad hoc, temporário – documento 14431/08 de 28.10.2008 –, transformado então, por força da decisão adotada em sede do Comité dos Representantes Permanentes (coreper), em grupo permanente.

32Doc. do Conselho 11678/11 de 4.7.2011.

33Wolff, Sarah, Wichmann, Nicole, e Mounier, Gregor y – «The external dimension of justice and home affairs: a different security agenda for the eu?», p. 11, recordam três desafios em termos de coerência e consistência: aos níveis horizontal (i.e., áreas políticas diferentes), vertical (i.e., ação da uee dos estados-membros) e institucional (i.e., quadro institucional europeu). Para uma leitura mais aprofundada sobre como alcançar uma melhor coordenação e coerência entre as dimensões interna e externa da jaie, assim, ultrapassar os desafios existentes, veja-se, por exemplo, Trauner, Florian – «The internal--ex te r na l s e c u rit y nex us: m or e coherence under Lisbon?». Ocassional Paper N.º 89, março de 2011. In EU Institute for Security Studies. [Consultado em: 26 de agosto de 2013]. Disponível em: http://www.iss.europa.eu/uploads/media/op89_The_internal-external_security_nexus.pdf

34O debate relativo à governança Schengen culminou, recentemente, num acordo que permitirá a reintrodução temporária de controlo em determinadas fronteiras internas, em circunstâncias excecionais e como medida de último recurso, quando esteja em perigo o funcionamento global do Espaço Schengen devido a deficiências graves e persistentes relacionadas com o controlo das fronteiras externas – fundamento anteriormente não previsto –, desde que tenham sido identificadas no contexto de um rigoroso processo de avaliação, e caso essas circunstâncias possam constituir uma ameaça grave à ordem pública ou à segurança interna desse espaço. Press release do Conselho de Justiça e Assuntos Internos de junho de 2013, p. 20. [Consultado em: 26 de agosto de 2013]. Disponível em: http://www.consilium.europa.eu/uedocs/cms_data/docs/pressdata/en/jha/137407.pdf; documento do Conselho 9604/13 de 21.05.2013.

35Doc. 15914/1/05 de 30.01.2005.

36Doc. 15811/09 de 12.11.2009.

37Doc. do Conselho 9417/12 de 3.5.2012.

38Boswell defende a existência de um processo de externalização das ferramentas europeias de controlo migratório. Boswell, Christina – «The “external dimension” of eu immigration and asylum policy». In International Affairs. N.º 79, março de 2003, pp. 622-624.         [ Links ] Lavenex aponta para: uma ênfase crescente no controlo extraterritorial, uma abordagem de externalização (através da cooperação transgovernamental e do processo de alargamento), e uma estratégia de extraterritorialização. Zolberg, referido em Lavenex, fala em «controlo remote». Lavenex, Sandra – «Shifting up and out: the foreign policy of European immigration control». In West European Politics. Vol. 29, N.º 2, março de 2006, pp. 330, 334-335, 337-338. Gammeltoft-Hansnen invoca que «extraterritorialization of asylum and migration policies presents a strategic move of Member States to relieve themselves of international legal obligations and to institutionalize a new ethos of protection light». Referido em Trauner, Florian, e Carrapiço, Helena – «The external dimension of eujustice and home affairs after the Lisbon Treaty: analysing the dynamics of expansion and diversification», p. 15.

39O mesmo entendimento parecem ter Trauner e Carrapiço, ao apontarem não só para o controlo da imigração irregular, mas, também, para uma política europeia que procura igualmente abordar os fatores push da imigração (como a pobreza e a falta de oportunidades) e intensificar a cooperação em matéria de imigração legal. Cf. Trauner, Florian, e Carrapiço, Helena – «The external dimension of eujustice and home affairs after the Lisbon Treaty: analysing the dynamics of expansion and diversification», p. 15.

40Doc. COM (2011) 248 final, página 17, de 4.5.2011.

41Doc. COM (2011) 200 final de 8.3.2011; COM (2011) 248 final de 4.5.2011; e COM (2011) 292 de 25.05.2011.

42Freyburg, Tina – «The Janus face of eumigration governance: impairing democratic governance at home – improving it abroad?». In European Foreign Affairs Review. Vol. 17, Special Issue, abril de 2012, pp. 125-126, 141.         [ Links ]