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Relações Internacionais (R:I)

versão impressa ISSN 1645-9199

Relações Internacionais  no.36 Lisboa dez. 2012

 

Na democracia da América

 

Bernardo Pires de Lima

Investigador do IPRI–UNL. Doutorando em Relações Internacionais pela Universidade Nova de Lisboa, com uma tese sobre os EUA e a transformação da NATO no pós Guerra Fria. Colunista do Diário de Notícias. Visiting Fellow no Center for Transatlantic Relations, SAIS, Johns Hopkins University, em Washington DC. Membro da Transatlantic Studies Association e do EU Integration Forum.

 

Washington DC não é a melhor cidade para se sentir o pulso às eleições americanas, mas funciona como torre de controlo sobre uma intensa e prolongada campanha eleitoral. Não há comícios, arruadas, a vida segue o seu ritmo próprio de trabalho e respiração política, como é timbre na capital dos estados unidos. Mas há debate, divergência, as universidades e os think tanks colocam toda a sua artilharia pesada ao serviço da organização de eventos, conferências, seminários, lançamento de livros, nos quais aproveitam para mostrar a qualidade dos seus recursos humanos e do seu manancial de ideias. Esta policy community que habita em dc, em particular a dedicada à política externa, é uma autêntica indústria de argumentação, egos, narrativas mais ou menos independentes, networking e sound bites. Há quem faça uma carreira inteira entre a academia e os think tanks praticamente em volta do mesmo artigo, reescrevendo, readaptando, reorganizando, reorientando. Para já, a campanha americana.

Podemos dividi-la em três momentos. O primeiro, entre as duas convenções partidárias e o início dos debates televisivos. O Partido republicano reuniu-se em tampa, na Florida, no final de agosto. A expectativa gerada pelo anúncio de Paul Ryan para candidato a vice de Mitt Romney anunciava um evento pleno de heterogeneidade política: conservadores da velha cepa, evangélicos, libertários, adeptos do Tea Party, saudosistas da Guerra fria, moderados republicanos. A convenção é um momento apoteótico, onde o ticket recebe o aval de cada uma das delegações estaduais, apresenta-se pela primeira vez em conjunto a uma imensa audiência nacional, mostra um ou dois nomes para o futuro do partido e, acima de tudo, dá início a uma agenda focada nos dois meses finais de campanha. Mas nem tudo foram rosas no encontro do gop.

A aposta em Ryan era arriscada. Desde logo, porque a sua qualidade intelectual supera a de Romney. Esta diferença podia ter sido evidente nas semanas seguintes, não fosse a opção nítida da direção de campanha (Matt Rhoades, Beth Myers, Eric Fehrnstrom, Peter Flaherty) em selecionar a mensagem e as aparições de Ryan. Era importante não passar a ideia de que Ryan seria para Romney o que Cheney foi para Bush: muito mais que um número dois. Além disso, o radicalismo financeiro de Ryan, tendo o mérito de clarificar o debate, podia afastar muitos eleitores reformados e mais pobres. Em 2008, Obama só conseguiu 47 por cento do eleitorado acima dos 60 anos (66 por cento abaixo dos 30 anos): Ryan podia ser a «ajuda» que o Presidente precisava em estados decisivos como a Florida. Mas Paul Ryan tinha ainda duas contradições difíceis de gerir: não só beneficiou do sistema de segurança social (do qual hoje discorda) quando o pai morreu, permitindo-lhe continuar os estudos superiores, como não tinha qualquer experiência profissional fora dos corredores do Congresso. De qualquer forma, trazia também credenciais ao ticket. É um político articulado, com gosto pelo debate de ideias e telegénico, ponto importante no período dos debates. Clarifica as soluções para a economia, dando aos eleitores opções distintas e, talvez o mais importante no cálculo da escolha de Mitt Romney, encara o Midwest como o mapa a conquistar, dada a proximidade de Ryan a estados decisivos como o Wisconsin ou o Ohio.

A convenção republicana foi, assim, um momento de união das famílias conservadoras, mais por quererem derrotar Obama em Novembro do que propriamente por acreditarem em Romney. Mas não produziu um efeito extra de empolgamento. Um mórmon com credenciais liberais enquanto ex-governador do Massachusetts é um cartão de visita difícil de aceitar na pureza ideológica, religiosa e moralista republicana. No final, com endorsements dos ex-presidentes Bush, de antigos adversários nas primárias (Santorum, Gingrich, Pawlenty, Huntsman), com o discurso empolgante de Condoleezza Rice ou o protagonismo dado pelo monólogo de Clint Eastwood com uma cadeira «presidencial» vazia, o pragmatismo imperou: estavam reunidas as condições mínimas para enfrentar Barack Obama.

A campanha democrata tinha uma vantagem à partida: não foi sujeita ao desgaste político e de recursos nas primárias. Pôde concentrar-se no combate ao desemprego, na recuperação económica, em travar a deslocalização de empresas, marcar a agenda pelo lado da equidade fiscal entre classe média-baixa e grandes fortunas, progredir com a justiça da lei da reforma da saúde e na defesa do sistema de segurança social. É com este quadro que Obama e Biden são confirmados em Charlotte, Carolina do Norte. O essencial passava por desmontar a agenda Romney/Ryan, como sugeria a entrevista dada por Obama à time de 30 de agosto: as promessas de criação de emprego, a transformação do Medicare num sistema de vouchers (assustando idosos e pensionistas), a defesa dos mais ricos ou o regresso ao mantra da Guerra fria pela expressão romnyana de que «a Rússia é o inimigo geopolítico número um da América». A principal dúvida do ticket democrata era, no entanto, outra: como criar uma narrativa de campanha que se assemelhasse ao processo de mobilização de 2008, com o desemprego nos oito por cento, e sem cair no erro de esgotar a estratégia assente apenas na desmontagem das propostas republicanas? Obama e Biden precisavam de definir novas metas e fazer coincidir o primeiro mandato com metade do plano de recuperação. Só assim poderiam pedir um segundo.

Ainda nesta fase, dois fatores anunciavam um equilíbrio entre as campanhas. Por um lado, o novo regime de financiamento, alterado em 2010, deu margem a que se batessem todos os recordes. À saída das duas convenções, cada uma das campanhas tinha angariado qualquer coisa como 700 milhões de dólares, praticamente o mesmo que o valor histórico obtido no final das eleições de 2008 por Obama. O que contribuiu para isto? A decisão do Supremo tribunal, de 2010, permitindo a angariação de financiamento privado ilimitado, equiparando pessoas singulares e coletivas. Daqui às super-pac (comités políticos organizados), foi um pequeno salto.

Em 2008, John McCain optara por financiamento público em detrimento da angariação de fundos privados, como fizera Obama. Isso fez toda a diferença na capacidade de cada uma das campanhas em estar permanentemente na dúzia habitual de swing states que determinam o vencedor e a margem da vitória. Romney não cometeu o mesmo erro e, embora passando por divisões na repartição de recursos inerentes a uma campanha interna, conseguiu acompanhar o ritmo de Obama. Para isso muito contribuiu a super-pac criada por Karl Rove, o «cérebro de Bush», como lhe chamaram James Moore e Wayne Slater. Só esta American Crossroads conseguiu mais de 100 milhões em contribuições individuais.

Por outro lado, é de realçar a forma como a campanha se desenrolou nos new media. Em 2008, Obama percebeu bem o seu potencial, quer na mobilização do voto jovem, quer no chamamento de mais nove milhões de novos eleitores às urnas. Quatro anos depois, ambas as campanhas jogavam nas mesmas plataformas, tinham redes de financiamento iguais, acesso permanente aos media, mensagens distintas e soluções divergentes. Este último caso foi particularmente evidente na proliferação de anúncios negativos (televisivos e online) que as super-pac e o establishment das campanhas produziram para denegrir a imagem do opositor ou para desvirtuar muitas vezes a sua mensagem. Só para termos uma noção da força dos números, durante as duas convenções tinham sido emitidos 14 milhões de tweets. Durante os três debates presidenciais atingiu-se uma média de 150 mil. Os anúncios pagos subiram 40 por cento desde 2008, tendo 450 milhões de dólares sido só investidos em três dos estados decisivos: Florida, Virgínia e Ohio. Havia uma campanha de ideias, mas muita dela profundamente polarizada, radical, suja e mentirosa. E ambos os lados foram contribuintes brutos.

O segundo momento diz respeito aos dezoito dias entre o primeiro e o último debate televisivo. Três entre candidatos a Presidente e um entre os Veeps. A 3 de outubro, Romney e Obama enfrentaram-se na universidade de Denver, Colorado. Barack Obama tinha um problema prévio: como gerir a sensação de vitória antecipada nestas eleições? A verdade é que a noção de eleição garantida não era benéfica para o Presidente, porque desmobilizava a coligação que lhe deu a vitória em 2008: mulheres, jovens e minorias étnicas. Obama esteve irreconhecível, sombrio, desgastado, sem chama. Quem quisesse decidir o seu voto nessa noite não se sentia motivado para votar em alguém assim para aguentar um barco gigantesco e um Congresso dividido e intransigente.

Romney, a quem bastava surpreender pela metade para superar as expectativas, foi mais articulado e dinâmico. Falou de empregos, empresas, impostos (com contradições sobre classe alta) e redução do peso do governo federal. Nada de novo, é a clássica receita republicana. Obama falou de investimento público, equidade fiscal, cortes na defesa e inclusão social na saúde e no ensino. Ambos falaram para as suas bases eleitorais, tentando mobilizá-las. Romney venceu o debate sem facilitar, surpreendeu os mais desconfiados, mostrou que Obama podia não ser imbatível e sobretudo ganhou momentum para as semanas seguintes.

O primeiro debate foi absolutamente chave no equilíbrio que se sentiu até perto da reta final da campanha. A prestação segura dos candidatos nos dois debates seguintes muito contribuiu para isso. Romney pôde fazer o papel de moderado para captar votos ao centro, conseguiu desmentir uma série de propostas feitas durante as primárias; e Obama acabou por centrar o seu discurso na justiça fiscal, nos cortes na defesa, na luta contra a exclusão social e na «saúde» da economia: o desemprego baixava dos oito por cento pela primeira vez no seu mandato e o pib crescia de forma sustentada, embora a ritmo ligeiro, há treze trimestres consecutivos. Então o que desequilibrou a corrida na reta final? É exatamente este o terceiro momento. O período que vai do dia seguinte ao último debate e termina na noite de 6 de novembro. Há três fatores que ajudam a explicar a inversão do momentum Romney. O primeiro foi a gestão presidencial durante o furacão Sandy e que fustigou parte da costa leste. Em Washington, onde me encontrava, a prevenção funcionou na perfeição, os alertas foram dados a tempo, as pessoas respeitaram as normas e, felizmente para a cidade, poucos danos foram sentidos. Já em Nova Iorque e Nova Jérsia o filme foi mais complicado. Destruição e caos, desalojados, falta de energia, inundações. Quando o pico da tempestade passou, Obama suspendeu temporariamente as ações de campanha e deslocou-se a estes estados, enquanto Romney, seguindo a mesma interrupção, preferiu seguir imediatamente viagem para a decisiva florida. Em Nova Jérsia, o governador republicano Chris Christie era visto nas ruas com o Presidente, dando um golpe tremendo nas hostes republicanas quando publicamente elogiou Obama pelo seu papel na gestão desta crise. Basta recordarmos o que aconteceu em Nova Orleães, em 2005, para percebermos como a total falta de ação do Presidente pode ser fatal na avaliação do seu mandato.

O segundo fator foi a entrada em cena de Bill Clinton. Clinton é a maior estrela do firmamento democrata. O superavit financeiro dos seus dois mandatos transforma-o na prescrição médica para atacar a maleita que hoje sente a economia americana. Ele já tinha marcado a convenção de Charlotte com o discurso do evento, marcaria também definitivamente a campanha nessa reta final. Desdobrando-se em comícios, angariação de fundos, iniciativas para Obama, discursos otimistas a lembrarem os anos do triunfalismo liberal da década de 1990. Se há alguém a quem Obama pode agradecer a reeleição é ao velho Bill. Sem voz, lá estava ele na noite fria da Virgínia. Cansado, lá ia ele a mais um comício no Ohio, ou apoiando em vídeo os candidatos ao congresso no Wisconsin. A grande dúvida que corria em Washington – a tal torre de observação – era se este apoio não olhava também para 2016 e para uma possível candidatura de Hillary Clinton à Casa Branca. Vale a pena dizer que basta a atual secretária de estado disponibilizar-se para o efeito que dificilmente alguém ousará enfrentá-la nas primárias. O casal Clinton trouxe horizonte temporal à campanha, algo que Obama necessariamente não possui: Bill, porque remete a memória da classe média e da geração mais velha para tempos de prosperidade económica e estatuto triunfal da américa no mundo; Hillary, porque sustenta o eleitorado feminino, decisivo nesta eleição e na base popular de Obama, e transmite um foco de atenção para a continuação do sucesso daqui a quatro anos. Esta amplitude política jogou a favor de Obama. Romney, não dispondo de estrelas da mesma dimensão, teve que reafirmar permanentemente a sua condição de homem de negócios, conhecedor profundo da economia real, alguém capaz de fazer pontes com um Congresso previsivelmente crispado. Não foi suficiente.

O terceiro fator é a errónea parte final da estratégia de Romney. Desde logo, por cometer um erro no último debate precisamente contra esse eleitorado feminino. O célebre binders full of women tentou parecer uma estratégia de paridade recordando o seu tempo de governador, mas resultou numa gafe interpretada pelas mulheres indecisas como uma enorme falta de respeito. Depois da pouca sensibilidade para interpretar o papel de challenger após o furacão Sandy, a campanha de Romney começou a investir em anúncios em estados fora do arco entre swing states e battlegrounds, praticamente impossíveis de vencer. Demonstrou algum desnorte, enquanto Obama se concentrou totalmente na Virgínia e no Ohio. Por fim, Romney resolveu patrocinar um polémico vídeo sobre a deslocalização da indústria automóvel do Midwest para a China, responsabilizando os efeitos do bailout decidido pela administração sobre esse negativo efeito. Ora, isto obrigou a própria direção da Chrysler, por exemplo, a vir publicamente desmentir a campanha republicana, o que não só esvaziou a sua mensagem, como reforçou a imagem de flip-flopper junto dos indecisos.

Na noite eleitoral, com o Congresso repartido nas maiorias de 2010, Obama vencia com mais de três milhões de votos populares de diferença e 126 votos no colégio eleitoral. Nos diversos estudos que detalham os resultados, importa refletir sobre o seguinte. Os estados unidos vivem um momento de extrema polarização ideológica, intransigência com a diferença e desconfiança com a política feita em Washington. Se a aprovação do Presidente anda entre os 45 por cento e os 50 por cento, a taxa referente à simpatia pelo Congresso é quatro vezes inferior. Há aqui um confesso paradoxo: a política americana tem uma profundidade localista ao mesmo tempo que desconfia cada vez mais dos seus representantes locais. Esta campanha, ao invés de acalmar o debate, promoveu o ódio político, a intolerância e gastou seis mil milhões de dólares com um traço de ataques negativos entre adversários que importa questionar.

Além disso, os resultados mostraram que mesmo uma estrela política como Obama tem as suas fragilidades e inconstâncias. Perdeu seis por cento dos eleitores entre os 18 e os 30 anos, quatro por cento entre as mulheres brancas e três por cento entre os negros. Ao invés, conquistou quatro por cento do voto hispânico, o eleitorado que demograficamente mais cresceu desde 2008 e que seria decisivo tanto no Midwest como na florida. Neste segmento, Obama bateu Romney por 71/27. Se olharmos para os números de Bush em 2004 (40 por cento) e McCain em 2008 (31 por cento), percebemos porque é que o primeiro compromisso do gop depois de 6 de novembro foi a disponibilidade para rever a lei da imigração. Ficou ainda demonstrado que o pragmatismo à direita tem os seus limites. Não é possível apagar as feridas abertas durante umas primárias tão intensas, nem confiar apenas e cegamente na imensidão do eleitorado branco (72 por cento do total). Só isso não assegura uma vitória. Mas Romney conquistou face a McCain, apesar de tudo, cinco por cento de eleitores homens brancos, três por cento das mulheres, nove por cento do voto judaico e três por cento do católico.

Em Washington a sensação era compatível com os mais nobres sentimentos europeus: um imenso alívio. Se isto se justifica pelos 91 por cento de votos em Obama, já tende a ser menos evidente quando olhamos para a heterogénea foreign policy community. Talvez essa sensação seja justificada por dois fatores: as principais instituições produtoras de ideias e debates em política externa estão próximas dos democratas, o que amplifica a sua presença nesta minha avaliação; e Obama não tem sido assim tão estranho aos republicanos moderados, no que toca à sua ação internacional. Está confortável com o uso da força (Bin Laden, drones, Líbia, Afeganistão), é suficientemente prudente e retraído nos impulsos messiânicos, o que o aproxima dos kissingerianos, e tem uma visão para o Pacífico que procura condicionar a postura da China, o que aponta na mesma direção de muitos setores republicanos.

É empolgante, motivador e desafiante trabalhar nos think tanks em dc. A sua importância mede-se não só pelos robustos orçamentos anuais – Brookings (90 milhões de dólares), Center for Strategic and International Studies (30), Council on Foreign Relations (68), Carnegie Endowment for International Peace (30), American Enterprise Institute (25), German Marshall Fund (30), Center for American Progress (35) – mas sobretudo pela capacidade de gerar ideias, opções e soluções para os decisores nas mais diversas políticas públicas.

No que toca à política externa, o resultado é cativante. Há um circuito oleado de recursos humanos e ideias que parte dos institutos universitários, por exemplo, em Georgetown, sais, George Washington, progride pelos think tanks, como a Brookings, o csis, o Council on Foreign Relations, o German Marshall Fund, o Cato Institute, o Atlantic Council, o American Enterprise Institute, a Foreign Policy Initiative ou o Center for Transatlantic Relations e conduz à entrada na política através de estadas mais ou menos prolongadas em importantes cargos na administração, no Congresso, ou em departamentos de formulação de decisões, como os policy plannings do Departamento de Estado e do Pentágono ou o staff do National Security Council, este diretamente associado à Casa Branca. Esta indústria é tão competitiva como profissionalmente exigente. Mas devo dizer que assisti a algumas fraquezas. O facto de este mercado ser tão competitivo nem sempre traz qualidade associada. Muitas conferências e debates são profundamente estéreis, marcados por ideias e slogans sem a profundidade necessária. Por vezes parecem apenas testar as reações da audiência ou da imensa massa crítica que alimenta esta indústria. A partir daí, sim, o sound bite pode fazer o seu percurso: aprofundar os seus argumentos, desmontar uns quantos outros, entrar no debate público através da imprensa, gerar o interesse de algum produtor de política externa, até chegar ao topo da cadeia de decisão. Ou, simplesmente, não ter nenhum impacto, servir apenas de linha de discussão, e morrer uns tempos depois. O que quer que o destino lhe reserve, de uma coisa pode esta foreign policy community estar certa e orgulhar-se: as ideias contam, as empatias também, a network pesa. Debater, argumentar, publicar, influenciar, decidir. É isto que no final conta. Há massa crítica, há alunos e não alunos interessados, há um jornalismo que fiscaliza, ouve e critica, há democracia e, felizmente, há dinheiro. Pode sofrer muitas vezes de etnocentrismo, autoconsumir-se e transformar-se mesmo numa bolha esgotante, mas ninguém fica indiferente à efervescência política desta cidade. Ainda por cima olhando do alto da torre para uma campanha presidencial. Assim, longa vida para a democracia na américa.

Washington DC, 27 de novembro de 2012