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Relações Internacionais (R:I)

versão impressa ISSN 1645-9199

Relações Internacionais  no.36 Lisboa dez. 2012

 

Relações internacionais como disciplina

International relations as a discipline

 

Paulo Rigueira

Concluiu um MsEcon em Política Internacional na Universidade de Gales, Aberystwyth e um MPhil em Política e Estudos Internacionais na Universidade de Bath. Encontra-se neste momento a completar o doutoramento na Universidade de Londres, Institute of Commonwealth Studies.

 

RESUMO

Este artigo vai procurar responder à seguinte questão: como podemos pensar as relações internacionais como uma disciplina independente e autónoma do estudo da história, da demografia, do direito internacional ou de outras disciplinas? Partindo da necessidade disciplinar de perceber a evolução do sistema de estados moderno, a disciplina de relações internacionais funda-se ao criar um objeto de estudo distinto e solidificado por um conjunto de teorias e métodos que o consolidam. Este artigo vai, por isso mesmo, refletir sobre relações internacionais, seu objeto de estudo, teorias e métodos.

Palavras-chave: teoria de relações internacionais, disciplina, objecto de estudo, teoria discursiva

 

ABSTRACT

This article will provide an answer to a question: how to understand international relations as a discipline independent and autonomous from the study of history, demography, international law and other disciplines. Starting from the disciplinary need to understand the evolution of the modern state system, the discipline consolidated itself by creating a subject -matter solidified by a distinct set of theories, techniques and methods. This article will, therefore, reflect on international relations, its subject-matter, theories and methods.

Keywords: international relations theory, discipline, suject-matter, discourse theory

 

Como entender as relações internacionais (RI)1 como uma área de estudo independente? Será que é possível tal concessão? Estas inquietações guiaram gerações de investigadores de relações internacionais em diversos países – um esforço liderado por países como os estados unidos2, Grã-Bretanha3, França4, Alemanha5 ou os países nórdicos6. Este esforço tem vindo a ser expandido noutros espaços com um interesse emergente na disciplina por questões de cultura e particularidades nacionais7. Para responder a esta inquietação torna-se importante começar por perceber o que ou como se constitui um ramo de saber enquanto disciplina. Num artigo de 1948, Fredrick Dunn lucidamente traduz e sintetiza o que implica começar por responder a esta dúvida. Seguindo uma lógica que alguns caracterizariam por fundacionalista mas que serve para elucidar o problema em questão, Dunn argumenta que «um investigador de relações internacionais é aquele que pretende ter alguma capacidade em lidar com as questões que surgem nas relações entre nações. […] Quando [o investigador] se preocupa com assuntos relacionados, como a antropologia, a Demografia e a Sociologia, é na medida em que estes assuntos lancem luz sobre as questões internacionais»8.

Por outro lado, continua Dunn, torna-se importante ter técnicas e métodos específicos que elucidam e dão consistência à desejada independência disciplinar. Dunn desenvolve esta questão: «as técnicas e métodos de análise incluem os dispositivos lógicos para chegar a hipóteses e para as testar e verificar ou para as rejeitar.»9 Em suma, investigadores de RI têm-se esforçado para alcançar um grau de independência e coerência disciplinar e a disciplina em si mesma emergenos mais diferentes países desse esforço de criação de independência. No centro desta empresa estão três processos: a necessidade de perceber o estado e as relações internacionais; a necessidade de identificar um objeto de estudo particular – que diferencia as RI de outras disciplinas e que implica realçar que investigar relações internacionais não pressupõe estudar história, demografia, antropologia, direito internacional ou sociologia em si mesmas, mas apenas na medida em que o estudo destas áreas esteja implicado num qualquer assunto identificado como objeto de estudo de relações internacionais10 – e, terceiro, independência significa criar um conjuntos de «técnicas» e métodos de análise para abordar este objeto de estudo particular. Este artigo vai refletir sobre estas questões. O seu objetivo principal é fornecer uma visão geral introdutória de como a disciplina, refletindo sobre o papel do estado, conseguiu criar um objeto de estudo específico e um conjunto de ferramentas, técnicas e métodos de análise que lhe permitiram ganhar um espaço independente. O artigo vai ser dividido, deste modo, em quatro partes onde as temáticas porquê, o quê e como estudar relações internacionais vão ser debatidas.

Para consolidar esta iniciativa, teoricamente o artigo vai centrar-se numa perspetiva que pretende realçar o modo como devemos perceber as relações internacionais nas disputas conceptuais geradas na e pela disciplina11. O que resulta desta premissa é uma visão de que mais do que existirem como factos consumados, as teorias são socialmente construídas. Neste processo há que realçar o papel importante que deriva do confronto de ideias e da geração de conhecimento num trabalho desenvolvido por académicos. É nessa criação de ideias que está a base de entendimento. Mas essa criação de ideias não deve, por outro lado, ser entendida hegemonicamente. O debate é entendido deste modo como aberto e fluido, sujeito a contingências. Finalmente, esta perspetiva elucida acerca da correspondência entre questões de facto e de valor. Grande parte da trajetória histórica da disciplina tem sido dominada pela suposição de que é possível separar teoria do mundo da prática12. O que vai ser defendido aqui é que esta separação não pode ser feita. A sugestão é que ao invés de ver a teoria como um reflexo do mundo devemos compreendê-la como estando profundamente implicada na sua construção. Em suma, a criação de conhecimento está profundamente implicada na construção do sujeito político e objeto de política13.

 

PORQUÊ ESTUDAR RELAÇÕES INTERNACIONAIS? O PROBLEMA DO ESTADO

Se estudar relações internacionais deve ser considerado diferente de estudar outras disciplinas, o que caracteriza o estudo particular das relações internacionais? Por outras palavras, com o que é que académicos (ou não) de relações internacionais estão preocupados? Num ensaio que abriu um importante volume de reflexões sobre a problemática internacional no reino unido – e que em grande medida consolidou o trabalho de gerações passadas e abriu caminho a um futuro mais consistente – Martin Wight questiona-se «Porque não existe teoria internacional?»14. Nesse texto, Wight alude àquilo que lhe parece ser um problema que está na raiz dessa inexistência: a centralidade das relações internacionais na problemática do estado, por um lado, e no desejo da disciplina de viver obcecada com o progresso. A questão do porquê estudarmos relações internacionais está intrinsecamente relacionada deste modo com a questão do estado e a sua importância. A este nível parece importante discutir o assunto sobre três aspetos: analiticamente, historicamente e transcendentalmente.

Um dos elementos fundadores das relações internacionais modernas foi o processo que levou à consolidação do estado soberano. A questão da soberania está na base deste desenvolvimento ao reclamar e solidificar a ideia de que os estados são independentes uns dos outros15. Este fenómeno conduziu a um esforço de criar responsabilidades no próprio estado em relação ao resto da sua população e à obrigatoriedade de pensar o lugar desta entidade num novo quadro de relacionamento internacional.

O mais elementar problema do estado passou a ser, então, o da sua própria sobrevivência16. O poder militar é geralmente considerado uma necessidade para que os estados possam coexistir e lidar uns com os outros de modo a não serem intimidados ou subjugados. Estados desarmados são extremamente raros na história do sistema estatal. A maioria dos estados rege-se, deste modo, por um conjunto de padrões de comportamento que os levam a entrar em alianças com outros estados para aumentar a sua segurança nacional. Para garantir que nenhum grande poder consiga alcançar uma posição hegemónica de dominação global, baseado na intimidação, coerção, ou no uso imediato da força, também é necessário manter um equilíbrio de poder militar. A segurança do estado é, então, um aspeto importante nas relações internacionais. Mas o facto de estados conduzirem as suas relações na base de pensamento securitário não quer dizer que eles estejam isolados uns dos outros. Pelo contrário, os estados têm permanentemente de encontrar maneiras de coexistir e de lidar com outros estados. Isolamento completo não é geralmente uma opção.

Um segundo aspeto importante para o funcionamento do estado em relações internacionais é a expectativa de que esta entidade se reja de forma a defender a liberdade, tanto a liberdade pessoal como a liberdade nacional ou a independência. Este tipo de aproximação que salienta o modo como o estado é levado a interagir com o que o rodeia, de forma pacífica e progressiva, é uma abordagem realçada pelo pensamento liberal em RI17. Este pensamento opera sobre o pressuposto de que as relações internacionais podem ser melhor caracterizadas como um mundo em que os estados cooperem entre si para manter a paz, a liberdade e o progresso. Um outro aspeto importante nas relações entre estados e que caracteriza esta entidade é a sua necessidade de manter a ordem internacional. Esta ideia foi mais convictamente avançada pela escola inglesa18. Em nome da estabilidade, certeza e previsibilidade, os estados devem respeitar o direito internacional de forma a manter os seus compromissos, observar regras, convenções e costumes da ordem jurídica internacional. Por outro lado, do comportamento do estado é igualmente esperado que acompanhe as práticas de diplomacia e de apoio a organizações internacionais. Direito internacional, relações diplomáticas e organizações internacionais só podem existir e operar com sucesso se essas expectativas forem geralmente cumpridas pela maioria dos estados em grande parte do tempo.

Finalmente, o Estado vive rodeado por uma comunidade económica e deve, assim, defender a riqueza socioeconómica da sua população e o seu bem-estar. Com a emergência de uma maior sensibilização para estes problemas, teorias de política económica internacional pretendem investigar o impacto que o sistema de relações económicas pode ter no interior do estado19. Proeminente nestes debates é o facto de se discutir até que ponto teorias de modernização económica, ao longo do tempo e segundo diferentes padrões morais de entendimento, podem beneficiar ou não estados particulares.

Mas se as funções do estado nas relações internacionais podem ser vistas à luz de um conjunto de visões distintas, um segundo debate importante a ter é sobre o modo como o sistema de estados evolui historicamente20. O sistema estatal é uma instituição histórica. A população do mundo nem sempre viveu em estados soberanos. Ao longo da história humana o modo de organização política que prevaleceu não foi o da autoridade soberana. Durante a idade Média, a autoridade política era caótica e dispersa. A maioria das pessoas estava dependente de um diferente número de autoridades – algumas delas políticas, outras religiosas. No estado moderno, a autoridade passou, no entanto, a ser centralizada num governo legalmente supremo, e as pessoas vivem sob uma determinada lei padrão que regula as suas atividades nas mais diferentes áreas. A consolidação do estado moderno demorou tempo mas progressivamente foram dados passos para organizar a autoridade política e o poder sob a hegemonia de orientações racionais e nacionais. Este sistema, por outro lado, demorou igualmente tempo a expandir-se. Inicialmente europeu, durante a era do imperialismo ocidental foi expandido para o resto do mundo. Dominado por europeus, tanto política como economicamente, o sistema de estados modernos alargou-se sobre um conjunto de padrões morais que ficaram conhecidos como o standard civilizacional21. No entanto, foi somente com a descolonização da ásia e da áfrica, após a ii Guerra Mundial, que o sistema estatal se tornou uma instituição global. Esta última expansão e globalização do sistema estatal aumentou a variedade dos estados-membros e, consequentemente, a sua diversidade. Mas o que é de realçar é que, contemporaneamente e alicerçado numa teoria que privilegia o aspeto de permanência territorial e da não mutação de fronteiras, muito dificilmente este mapa que parece ter sido fechado com a era da descolonização se alterará. Salvo justificadas exceções, o princípio uti possidetis juris prevalece e restringe fronteiras.

Há, finalmente, um terceiro aspeto que deve ser realçado nesta procura mais geral para responder à pergunta: porque devemos estudar relações internacionais? De facto, se a existência de estados deve ser vista como algo com que nos devermos preocupar do ponto de vista analítico e, por outro lado, se nos devemos dedicar à compreensão da sua evolução ao longo do tempo, não deixa de sobrar uma questão final: o que se pode sugerir quanto à sua transcendência? Como entidades soberanas, os estados possuem autoridade final sobre territórios delimitados e seus habitantes. Esta ideia aponta para a capacidade que esta entidade tem de gerir os seus assuntos internamente e a responsabilidade de outros estados de respeitarem o princípio da não interferência. Deste modo, dada a sua hierarquia interna, é novamente razoável tratar estados como atores unitários a interagir com outros estados hierárquicos. Um pressuposto fundamental da soberania vestefália é que a autoridade é indivisível e culmina num único vértice22. Cada estado poderá diferir sobre como agrega os interesses dos seus cidadãos: uns haverá mais autocráticos outros mais democráticos. Mas, independentemente do tipo de regime que existe, os cidadãos são obrigados pelas políticas adotadas por uma hierarquia que disciplina internamente. Ora toda esta conceção pode ser colocada em causa quando os estados perdem o controlo sobre agentes privados (não estatais), que se podem organizar e mover através das fronteiras nacionais (sejam eles corporações multinacionais, redes transnacionais ou meros movimentos globais de pessoas e processos de migração dos mais variados tipos). Na medida em que esses atores transnacionais passam a ser importantes na política mundial, a teoria estatocêntrica passa a ser gravemente questionada. Durante a década de 1970, muito do assalto ao realismo passou a ser conduzido nestes termos. O estudo destas transformações transnacionais passa a ser relevante23. Apesar de alguns atores transnacionais, como a igreja Católica, estarem presentes desde o nascimento do sistema de estados modernos, o aumento de empresas multinacionais24 e o aumento paralelo de outras redes transnacionais levou muitos a questionarem-se sobre a centralidade da autoridade soberana. Em resposta a esta agenda, alguns teóricos simplesmente reafirmaram a expectativa de que o estado mantém o seu poder explicativo em nada perdendo no que respeita à sua autonomia25. Outros houve que, apesar de reconheceram transformações, argumentaram que os estados permanecem soberanos e que portanto ao invés de ser desafiado por atores não estatais, é através do estado que estes atores existem. Deste modo, e em última análise, a política controla estes movimentos26. Com o desenrolar do debate, estas duas posturas radicais parecem ter sido suavizadas. Hoje torna-se claro que, por um lado, a disputa deve ser contextualizada – em determinadas sociedades, como as liberais, o estado está empiricamente mais vulnerável27 – e, por outro, existe uma qualificação da alegação de que os estados conseguem reafirmar o controlo sobre os agentes privados: a soberania interna passa em contextos mais específicos a ter de ser negociada entre o estado e a sociedade28.

 

O QUE ESTUDAR? ESTADOS, INTERAÇÕES, OBJETOS

Oferecer uma perceção coerente do objeto de estudo das RI envolve responder a um conjunto preliminar de questões que estão diretamente relacionadas com este tema. Os limites da disciplina são, portanto, influenciados numa primeira instância por pressupostos relativos aos atores que ocupam a política global e, por outro lado, por perceções sobre a natureza de interações entre eles. Partindo destes dois pressupostos chegaremos então à nossa desejada assunção do que se constitui como objeto de estudo específico com o qual estamos preocupados. Em si mesmas, estas três questões oferecem razões que justificam a ênfase colocada sobre o tipo de ator que consideramos mais importante nas relações internacionais e as suposições que fazemos sobre a natureza das interações que ocorrem neste nível. O modo como percebemos atores e interações terá um impacto sobre os tipos de questões de pesquisa que pretendemos investigar e, logo, sobre o objeto de estudo. Por outras palavras, na sequência da distinção facto-valor estabelecida, o modo como vemos a disciplina – quem são os atores e a natureza de suas interações – vai refletir-se numa posição de valor que determina o objeto da disciplina em si. Finalmente, esta parte do artigo não pretende desenvolver uma análise exaustiva daquilo que preocupa a disciplina de RI como um todo. Tais estudos, mais exaustivos, realçam diferentes dinâmicas entre atores, segurança, economia e identidade29. O que se pretende nesta parte é apenas identificar como o objeto de estudo das RI pode ser identificado e, deste modo, responder à primeira parte da nossa pergunta mais geral.

Poderíamos começar por afirmar que o estudo das relações internacionais se pode reduzir a relações entre estados, entre nações ou povos, entre as culturas, ou entre instituições internacionais como a União Europeia (UE) ou as Nações Unidas. Podemos desejar incluir igualmente empresas e organizações humanitárias nesta lista como outros elementos que estão envolvidos em interações globais. Mas mesmo por mais vasta que possa ser essa lista, o que vemos como os atores ou unidades de investigação enforma muito e distingue as diferentes perspetivas que dominam a disciplina.

Uma conceção realista realçaria, deste modo, a necessidade de limitar as nossas investigações a relações entre estados30. Uma tal perspetiva nega (ou resume a muito pouca) a influência de atores não estatais, como a amnistia internacional, e de instituições supranacionais, como a UE. Podemos concluir, por outro lado, como muitos na disciplina têm feito, que a amnistia internacional pode muito bem-estar envolvida em questões relativas a direitos humanos, ou que a Comissão europeia pode muito bem pronunciar-se sobre questões relativas a orçamentos da UE, mas o que importa em última análise, para os realistas, é a assunção de que as decisões e deliberações são, em última análise, tomadas por estados soberanos e são estes, por outro lado, os atores com maior influência, com a maior capacidade de fazer a diferença31. Esta tradição teórica realça que uma das competências da disciplina deve ser o estudo das relações externas do estado, e o estado em si mesmo, numa conceção contestada por alguns32, é visto como uma unidade estanque interagindo com outras entidades sendo todas elas delimitadas territorialmente, definidas como «soberanas» e independentes de qualquer autoridade externa. Finalmente, como corolário desta linha teórica de reflexão, para os realistas a disciplina deve centrar-se na perceção (e prevenção) da conflitualidade. O estudo da guerra emerge assim como o principal objeto de estudo de uma disciplina centrada em estados e em poder soberano33.

Mas se reconhecemos que a nossa experiência internacional é influenciada por empresas globais ou instituições internacionais, ou se estamos envolvidos como ativistas de grupos como a amnistia internacional ou uma qualquer outra organização não-governamental, poderemos verificar que existem mais atores com influência nas relações internacionais e outras formas de interação diferentes das que parecem ser descritas por visões anteriormente realçadas34. Liberais tendem a minar ou desfragmentar o poder do estado e pretendem igualmente salientar a importância de grupos de pressão e movimentos sociais. A crítica, no entanto, não se restringe apenas à desfragmentação do ator principal mas igualmente à visão das interações entre diferentes atores. Neste sentido, a maior parte do pensamento liberal promove uma perspetiva que nega a importância das fronteiras do estado, ou filiações e lealdades prescritas pelo estado e de quadros jurídicos internacionais35. Originalmente, David Mitrany abriu o caminho para uma agenda de pesquisa ampla que tentou perceber o fenómeno único da «integração». O fenómeno que se vivia na europa com a formação da Comunidade europeia do Carvão e do aço e, mais tarde, com a constituição da Comunidade económica europeia, deu o ímpeto para numerosos estudos que tentaram localizar as fontes desta nova maneira de interação ao descrever como formas de interagir em termos económicos poderiam levar a um processo total de integração política36. Ao perceber estas dimensões de interação, este trabalho liderou igualmente um processo de reconfiguração do objeto de estudo da disciplina: solidificou o lugar da dimensão cooperativa da política internacional. Comércio, institucionalização e «cultura», todas essas questões contribuíram para a afirmação de que as ri podem ser, portanto, mais do que o estudo da guerra e dos conflitos: fenómenos de cooperação internacional são possíveis de investigar37. Para os liberais estudar relações internacionais pressupõe igualmente perceber fenómenos de cooperação, benefício mútuo e oportunidade de bem-estar económico.

Mas a resposta à pergunta «o que estudar?» não se ficou apenas por um debate entre uma visão realista e liberal. Para a teoria da dependência – centrada numa tradição marxista – a resposta foi encontrada com a necessidade de investigar as fontes de subdesenvolvimento e as condições que o perpetuam. Adotando uma perspetiva estatocêntrica, ambas as variáveis foram desenvolvidas devido à necessidade de perceber o sistema capitalista global e as suas dinâmicas38. Para esta teoria, o desenvolvimento das sociedades ocidentais deveu-se à exploração do Sul subdesenvolvido e às estruturas económicas construídas durante as eras de colonialismo e imperialismo. As interações neste sistema privilegiam uma visão centrada em estruturas de dominação e exploração, apoiadas por ajuda externa, assistência militar, publicidade e imperialismo cultural. Deste modo, acompanhando o pensamento liberal, o estado não é uma entidade estanque que controla tudo o que se passa à sua volta. Pode internacionalizar as suas funções fundamentais e perder competências39. Mas esta tradição teórica pretendeu ir para além da perceção de meras orgânicas de cooperação. Desenvolveu um claro exercício de diagnóstico motivado por preocupações normativas de equidade e justiça. Esse diagnóstico levou a sério prescrições que desafiaram a perceções liberais sobre os benefícios recíprocos do comércio, da interdependência e das relações transnacionais. Deste modo, a prescrição pretendeu mover o objeto de estudo da disciplina, para além da cooperação para se focar na centralidade de questões de justiça40.

O debate em RI, desde a sua criação após a Grande Guerra, foi deste modo estruturado por afirmações relativas ao tema central sobre quem se constitui como ator em parceria com questões relacionadas com o que constitui a política, se podemos legitimamente supor uma separação do doméstico e do internacional e de realmente confiar em conceitos como poder e soberania para delimitar as fronteiras de um estado. O debate é muitas vezes enquadrado por dualismos que se opõem, do domínio público ao privado, do doméstico ao internacional. Estes debates, por seu turno, irão enformar preocupações empíricas na disciplina. O campo das relações internacionais parece, portanto, ser caracterizado por três conjuntos distintos de perspetivas: conflito, segurança e guerra; cooperação e condições para a paz; equidade, justiça e fontes de desigualdade internacional. Elaborando esta última ideia, segundo a primeira visão o sistema interestatal é uma «comunidade de insegurança» em que a possibilidade de guerra está sempre presente. Se esta premissa não se aplica universalmente tal é devido à existência de um núcleo de práticas que produzem um mínimo de ordem internacional: o direito internacional, o equilíbrio de poder, o medo da guerra em si, o exercício da liderança responsável por potências hegemónicas. No geral, no entanto, o resultado é um sistema internacional que opera de acordo com uma hierarquia de poder e em que há uma tensão permanente entre as preocupações e atividades de cada estado e as exigências securitárias do sistema como um todo41 .

Pensar as relações internacionais por um outro prisma, levar-nos-ia a pensar o «sistema» de maneira diferente: este é composto por um conjunto de «atores mistos» caracterizados por um conjunto de coligações e contrapesos. Este fenómeno conduz à ausência de uma hierarquia clara ou global unificada. A condição resultante desta interdependência – entre atores e estados – aumenta a vulnerabilidade mútua destas novas forças. A resposta a este cenário é a necessidade que se ergue nas relações internacionais por apoiar mecanismos de gestão e cooperação internacional e a construção de sistemas de comportamento baseados em regras e normas. Deste modo, enquanto na primeira visão a hierarquia e os imperativos de segurança nacional formam uma restrição perpétua, nesta segunda ótica esses imperativos são substituídos por um conjunto de crenças baseadas em práticas administrativas42. Finalmente, uma última perspetiva realça a forma como os padrões sistémicos e estruturais de domínio e dependência no sistema internacional definem o modo como as relações internacionais funcionam. Dos processos pelos quais a estrutura é sustentada resulta um desequilíbrio fundamental entre os elementos do sistema em que é possível discernir a continuidade do domínio do centro em detrimento da periferia. Um processo deste tipo, em casos específicos, é sustentado por uma série de mecanismos: exploração, capacidade de penetração e fragmentação. Nesta visão os ricos ficam mais ricos e os pobres, em termos relativos, só podem ficar mais pobres quando as estruturas de dominação e dependência são consolidadas. Modelos de cooperação, ao contrário de uma visão mais benigna, neste caso só servem para consolidar dependência. Em última análise, a contradição e conflitos de interesse produzida pela estrutura dominante só pode ser resolvida pelo seu colapso e sua substituição por um sistema global mais justo. Isto dá origem a ideias e práticas de resistência sob a forma de movimentos transnacionais e cosmopolitismo internacional43.

Estas disputas sobre qual o objeto de estudo da disciplina devem, por sua vez, ser justapostas a questões filosóficas que colocam estas visões sob escrutínio. Questões que, para o propósito deste artigo, realçam uma segunda dimensão fundamental necessária para a criação de uma disciplina: técnicas de investigação que solidifiquem conceções distintas do que é um objeto de estudo. A procura de criação destas técnicas distintas foi conquistada – e reinventada – com o tempo. No resto deste artigo estas disputas vão ser destacadas com uma leitura da trajetória da história da disciplina e dos seus «grandes debates».

 

DEBATES DISCIPLINARES

Se na parte anterior o artigo pretendeu refletir sobre o modo como podemos pensar o objeto de estudo da disciplina localizando esse objeto numa lógica que visou igualmente debater o papel do estado e as suas interações, na presente vamos um pouco além dessa narrativa e analisaremos o modo como debates particulares caracterizaram momentos específicos da disciplina. Qualquer teoria de relações internacionais sempre se preocupou com as bases filosóficas nas quais pode alicerçar um conjunto de visões sobre o mundo; sobre questões relativas à regulamentação das relações interestaduais ou com problemas relativos à manutenção da ordem no sistema internacional44. O objetivo desta parte é ilustrar como estas ferramentas podem mudar ao longo do tempo e como a disciplina é entendida enquanto tal quando diferentes quadros teóricos são elaborados e vêm a dominar uma qualquer fase da sua evolução. São estas estruturas que fornecem os termos de referência para a disciplina e são essas que funcionam como guardiões para o que é considerado como o seu objeto legítimo45. O esforço desta parte vai ser o de traçar a transição até à contemporaneidade e como este debate colocou como nunca questões epistemológicas e filosóficas no centro da discussão. Teoricamente, mais do que nunca, nesta parte tentaremos ser claros quanto ao modo como a criação de conhecimento está profundamente implicada na construção do sujeito político e objeto de política.

 

DO PRIMEIRO DEBATE À INCOMENSURABILIDADE INTERPARADIGMÁTICA

Nos primeiros anos, de 1919 a 1930, a disciplina foi dominada pelo que é convencionalmente conhecido como internacionalismo liberal. Esta abordagem pretendeu responder aos dilemas que derivaram da eclosão da I Guerra Mundial e do desejo de que tal confrontação não voltasse a acontecer. A força motriz para esta perspetiva reside, portanto, na orientação normativa e no pressuposto subjacente de que o estudo académico de relações internacionais tem o potencial de contribuir para a prevenção da guerra e o estabelecimento da paz. Centrando-se no problema da guerra, e com bases no iluminismo do século xviii, o internacionalismo liberal, como Scott Burchill destacou, sugeriu que «as perspetivas para a eliminação da guerra estava com uma preferência entre a democracia sobre a aristocracia, do comércio livre sobre a autarquia, e da segurança coletiva sobre o balanço de sistema de poder»46.

A primeira ideia fundamental reside, então, na visão de que a democracia em diferentes estados contribui para o estabelecimento da paz entre os estados. Esta ideia, cujo principal expoente é Immanuel Kant, aparece pela primeira vez expressa no seu «paz perpétua». Neste texto sobre as relações internacionais do século xviii, Kant expressou a opinião de que as estruturas internas do governo de um estado produzem efeitos profundos sobre a forma como este conduz as suas relações com outros estados. O estabelecimento de uma «paz perpétua» está, contudo, dependente de uma série de pré-requisitos que devem ser cumpridos para que as condições que darão origem à guerra perpétua se verifiquem. Kant sugere que enquanto a guerra pode beneficiar os governantes, não pode ser do interesse de cidadãos livres de uma república, uma vez que esta população teria «grande hesitação em iniciar um empreendimento tão perigoso»47. Assim como a razão é a base de uma «constituição perfeita civil», que garante a liberdade, assim também a razão, «como o mais alto do poder legislativo moral, condena absolutamente a guerra como um teste dos direitos e estabelece a paz como um dever imediato»48. A ordem democrática num Estado fornece uma cidadania livre com capacidade para condenar a guerra conduzida no interesse de governantes e estabelece a opinião pública como uma restrição primária na condução das relações com outros estados. Para que a paz seja segura, no entanto, uma «federação pacífica» teria que ser criada para garantir os direitos e deveres das partes contratantes. Fundamentando-se em razões republicanas, comerciais, institucionais e culturais, Kant abre caminho para um pensamento que viria a caracterizar as relações internacionais desde então49.

Após 1914, esta forma de pensamento encontrou a sua aplicação prática na ordem «wilsoniana» que se seguiu50. As duas ideias que emergem a partir de reflexões de Kant sobre uma paz perpétua e que formaram os fundamentos básicos para o internacionalismo liberal que dominou a disciplina de RI nos seus primeiros dias de formação centraram-se, deste modo, na sugestão de uma governação democrática e institucionalizada/legal para governar relações de cooperação entre os estados. Estas são em si sustentadas pelas ideias gémeas de formação do iluminismo, ou seja, a racionalidade humana e uma ordem cosmopolita moral que vê a humanidade como um todo, como o domínio de um sistema de direitos e obrigações51. Assim, os dois pilares de formação do internacionalismo liberal, a democracia e o livre comércio, exigiram o estabelecimento de instituições internacionais que promovem a aspiração coletivista no lugar das relações conflituosas de forma a evitar a base do equilíbrio de poder que esteve na origem da Guerra Mundial de 1914. O consenso intelectual na altura era precisamente baseado na premissa de que as relações entre estados são determinadas exclusivamente pela busca do poder, o que levou a violações do direito internacional e, finalmente, ao início da guerra em 1914. Um sistema de «segurança coletiva» foi defendido para substituir sistemas de alianças antagónicas com uma ordem internacional baseada no estado de direito e responsabilidade coletiva. A analogia doméstica de um contrato social foi, deste modo, considerada transferível para o nível internacional.

Estas premissas liberais internacionalistas são, no entanto, lidas como estando na base daquilo que levou, mais tarde, à eclosão da II Guerra Mundial. Ataques à utopia do idealismo conduzem a afronta. Assim foi que o estudo de relações internacionais aparece transformado numa agenda intelectual que colocou o poder e autointeresse na vanguarda da preocupação52. O «idealismo» do período entre guerras foi substituído pela nova realidade que, por si própria, exige mais realismo. O livro Twenty Years Crisis, de E. H. Carr, publicado em 1939, aparece como o panfleto deste novo estado de arte que reflete e transmite noções de valor sobre a realidade. A realidade passa a ser lida, neste caso, à luz de uma oposição entre utopismo e realismo53. O apelo de Carr é para uma «ciência» das relações internacionais, uma que se afaste do que ele via como o pensamento normativo do internacionalismo liberal. Ao apresentar em termos dicotómicos a distinção facto-valor, e ao separar «o que é» daquilo «que deveria ser», o texto de Carr promoveu um afastamento da doutrina utópica que, segundo ele, foi baseada numa negação irrealista de poder e do seu impacto sobre a política internacional. Como Carr afirma: «O excelente desempenho do realismo moderno tem sido o de revelar não apenas os aspetos deterministas do processo histórico, mas o caráter relativo e pragmático do próprio pensamento. Nos últimos 50 anos... os princípios da escola histórica foram aplicados à análise do pensamento, e as bases de uma nova ciência foram estabelecidas, principalmente pelos pensadores alemães, sob o nome da “sociologia do conhecimento”. O realista permite assim demonstrar que as teorias intelectuais e padrões éticos da utopia, longe de serem a expressão de absoluto e de princípios a priori, são historicamente condicionados, sendo ambos produtos das circunstâncias e interesses e armas emolduradas pela promoção de interesses.»54

Este ponto leva à visão de que os valores são contexto-dependentes, que a moralidade é determinada pelo interesse, e que as condições do presente são determinadas por processos históricos. Em suma, onde o «idealismo» procurou uma doutrina universalmente aplicável, Carr apela a uma análise histórica do quadro contingente que determina a política.

A suposição do realismo como escola de pensamento centra-se, igualmente, na visão de que o sistema internacional é «anárquico», no sentido em que é desprovido de uma autoridade abrangente. Onde a sociedade nacional é governada por um sistema único de governo, o sistema internacional de estados não tem essa base e torna a lei internacional não vinculativa e, finalmente, ineficaz na regulação das relações entre os estados. O conflito é, portanto, uma característica inevitável e contínua das relações internacionais. Assim como o internacionalismo liberal buscou fundamentos no iluminismo e no princípio da razão, o realismo localiza as suas raízes ainda mais para trás, citando Tucídides, Maquiavel e Hobbes como vozes fundadoras55.

Com o fim da II Guerra Mundial e com a entrada numa nova era de disputas, o realismo aparece reinventado e consolidado com Hans Morgenthau. No seu Politics Among Nations56, e apontando para uma linha de descendência que vem de Tucídides, Morgenthau desenvolve a premissa fundamental de que «o realismo assume que o seu conceito-chave de interesse definido como poder é uma categoria objetiva que é universalmente válida»57. Em última análise, para Morgenthau e outros realistas «política internacional, como toda política, é uma luta pelo poder»58. Onde internacionalismo liberal tinha sido abertamente normativo e prescritivo em orientação, o realismo de Morgenthau pretende ser científico e explicativo. Teorias das relações internacionais devem, de acordo com Morgenthau, ser coerentes com os factos e são estes que devem ser o teste final da validade das declarações teóricas. Morgenthau, como outros realistas, portanto, assume uma clara separação de fato e valor, entre teoria e prática.

No final dos anos 1950 e na década de 1960, vemos uma disciplina dominada por conceções realistas das relações internacionais59. O apelo de Morgenthau para uma «ciência» das relações internacionais foi atualizado na chamada revolução behaviorista; uma mudança para um enfoque em questões metodológicas que procuravam aplicar os métodos de testes rigorosos das ciências naturais para a pesquisa em ciências sociais60. A ênfase na pesquisa quantitativa decreta que qualquer teoria que não poderia ser sujeita à «operacionalização» fosse considerada como sendo – à semelhança do idealismo da pós-i Guerra Mundial – baseada em opiniões e ideologia. Longe de contrariar pressupostos realistas, argumentos behavioristas apenas reforçam a ortodoxia fundacional realista. Foi, no entanto, a sua pretensão de supremacia metodológica que convidou a crítica mais vigorosa: a ideia de que os métodos das ciências naturais poderiam ser facilmente transpostos para as RI. Proeminente entre os críticos foi Hedley Bull, que argumentou, com outros tradicionalistas61, que as maiores descobertas em relações internacionais derivavam do pensamento clássico, de filosofia e história62. A preocupação de Bull era a de argumentar que as relações entre estados não poderiam ser reduzidas a atributos mensuráveis de poder ou de modelos de tomada de decisão. Se os recursos de «sociedade» caracterizam as relações entre os estados e se, de facto, poderíamos localizar códigos de conduta que formaram uma sociedade, poderíamos legitimamente olhar para a história e filosofia para conceituar a complexidade da política internacional.

Foi durante a década de 1960, no entanto, que outras perspetivas vieram a constituir modos alternativos de concetualização das relações internacionais. Com a descolonização, a retirada dos estados unidos do Vietname e a ascensão de uma aliança de terceiro Mundo, que se fez sentir principalmente na ONU, as relações internacionais e os seus debates foram expandidos e começaram a abranger assuntos que pareciam longe da retórica da Guerra fria. Relações económicas e financeiras, desenvolvimento, questões sociais e de integração regional pareciam desafiar a primazia do estado como única unidade de análise e poder como o determinante final de relações entre estados. Um dos principais adversários para a ortodoxia foi John Burton, cujo trabalho passou a ser fundamental na tentativa pluralista para reescrever a disciplina63. Fundamental para a argumentação de Burton era a visão de que as relações globais eram multiformes em conteúdo e envolvendo um número de diferentes tipos de atores, de indivíduos para os estados, para organizações não estatais. Outros reforçam este desafio com destaque principalmente para Robert Keohane e Joseph Nye e o seu trabalho em «relações transnacionais»64 e «interdependência complexa»65. Se o argumento do primeiro destaca como os estados não eram os atores únicos no sistema internacional, este último, articulando conceitos de poder e interdependência, vê a política global como sendo baseada numa variedade de relacionamentos, em vez de força, e como, em última análise, sendo centrada em questões que não foram hierarquicamente organizadas em torno dos interesses estratégicos do mais poderoso. Tomando como base estes pressupostos, mais tarde estas noções foram elaboradas tendo em vista a aplicação prática às novas condições da realidade e agendas internacionais e foi isso que levou/contribuiu para o surgimento da «teoria de regimes internacionais», que reconhece o lugar do poder na política em torno de uma área temática mas que reconhece outras dinâmicas, incluindo a legitimidade e regras de conduta66.

Fruto de novas vivências internacionais, estes novos estudos expandem a leitura das relações internacionais para dar valor a fenómenos institucionais. Mas o que também é verdade é que, apesar de fornecer uma perspetiva mais ampla sobre as interações globais, este pluralismo não desafiou a ortodoxia fundacionalista realista. Ao passo que a trajetória de Burton concentrou-se em conflitos, a sua resolução e o lugar do indivíduo nesta resolução, a escola de interdependência ficou concentrada sobre o funcionamento das organizações internacionais, áreas de formatação e criação de regimes. Em suma, se a identidade do pluralismo foi baseada na sua oposição à ortodoxia realista, deve-se reconhecer igualmente que os fundamentos teóricos do realismo, a sua derivação do pensamento clássico e a sua dependência fundamental sobre a racionalidade essencial e soberania do estado como ator principal não foram contestados. Mas existiu uma nova maneira de ler o percurso das relações internacionais dos anos 1980. Uma terceira teoria que emergiu como crítica do realismo e do pluralismo concentrou-se nas desigualdades que existem dentro do sistema internacional, suas desigualdades de distribuição de riqueza entre os estados ricos do «Norte» ou «Primeiro Mundo» e os pobres do «Sul», ou o «Terceiro Mundo». Inspirados pelo trabalho de Marx e Lenine, alguns académicos divulgavam aquilo que veio a ficar conhecido como o paradigma estruturalista67. Este paradigma tinha como fundamento um enfoque central em questões de dependência, exploração e salientar a divisão internacional do trabalho que relegou a grande maioria da população mundial, seguindo o argumento, para a pobreza, muitas vezes com a cumplicidade de grupos de elites dentro dessas sociedades. Para esta visão, a base da desigualdade manifestada na estrutura capitalista do sistema internacional acumulou benefícios para alguns, causando, por meio de relações de troca desiguais, o empobrecimento da grande maioria restante. O sistema de classes que predominou internamente dentro das sociedades capitalistas teve igualmente uma repercussão no mundo, produzindo as relações centro-periferia que permearam todos os aspetos social, internacional, a vida económica e política nacional. Assim, onde o pluralismo e as suas associações liberais tinham visto redes de interdependência económica como base de uma maior cooperação internacional fundada sobre o comércio e interações financeiras, teóricos neomarxistas estruturalistas veem estes processos como a base da desigualdade, o peso da dívida, a violência e a instabilidade68.

Mas apesar desta nova condição da situação internacional e de novos retratos para a descrever, Kenneth Waltz, no seu Man, State and War69 e, mais tarde, no seu Theory of International Politics70 solidifica a aspiração racionalista a uma racionalidade do internacional. Nascido para caracterizar aquilo que por vezes é descrito como o segundo período da Guerra fria, Waltz e a sua teoria vêm igualmente consolidar a agenda fundacionalista. Waltz reforça um realismo como uma abordagem dominante em relações internacionais e que situa a sua base institucional e intelectual nos estados unidos da américa. Foi, portanto, neste contexto que o trabalho de Kenneth Waltz estabeleceu o seu domínio na disciplina71. O fim substantivo desta agenda já havia sido fixado no local por teóricos realistas como Morgenthau. Onde o realismo de Morgenthau se concentra nos atributos e comportamentos dos estados dentro do sistema internacional, Waltz incide sobre o sistema internacional em si e procura fornecer uma explicação estruturalista da sua dinâmica e as restrições que impõe sobre o comportamento do estado. O sistema internacional é, para Waltz, anárquico e, em consequência, perpetuamente ameaçador e conflituoso. O que é importante realçar, portanto, não é o conjunto de motivos que podem determinar o comportamento do estado, mas os imperativos do sistema internacional e da distribuição de recursos nele.

O debate entre as três escolas de pensamento em destaque, ou seja, o pluralismo, o estruturalismo e o realismo, foi descrito por Michael Banks, e outros, como constituindo o «debate interparadigmático» nas relações internacionais72, um debate baseado em imagens diferentes do sistema internacional, suas partes constitutivas e as relações entre eles. Um debate que, portanto, não discute tão aprofundadamente como viria a acontecer nas fundações epistemológicas da disciplina. Nele, cada paradigma formou uma perspetiva sobre a política global que era vista como mutuamente distinta e incomensurável na sua agenda de pesquisa, conceitos e linguagem73.

Como o levantamento acima indica, a disciplina passou por uma série dos chamados grandes debates, começando com o debate idealista-realista, movendo-se através das controvérsias metodológicas que lançou o designado debate entre behavioristas e «tradicionalistas» e culminando, no início de 1980, no debate interparadigmático. Este desenvolvimento faseado da disciplina estruturou o ensino das teorias das relações internacionais e formou a estrutura básica para a grande maioria dos livros sobre o assunto74.

 

REFLEXIVISMO E O RETORNO DA EPISTEMOLOGIA E FILOSOFIA

Na sua busca por uma disciplinaridade absoluta, as RI foram entendidas como uma disciplina com um mandato que é distinguível da teoria política. Martin Wight apontou para essa suposição que tornou implícita ou explicitamente generalizada a ideia de que a vida política nacional era essencialmente diferente da vida internacional75. O pilar da teoria de relações internacionais, e em especial o realismo como uma escola de pensamento dominante, passou a ser enquadrado por um legado vestefaliano que colocou a soberania do estado e do sistema anárquico interestadual no núcleo da disciplina. Embora o desafio pluralista tenha conseguido alargar o âmbito das preocupações de pesquisa e tenha contribuído para o desenvolvimento de áreas especializadas, como a economia política internacional, estudos de conflitos e análise de política externa, este desafio não questionou os fundamentos teórico-epistemológicos do realismo e especificamente a sua dependência em construções de soberania, do estado e até anarquia. A influência marxista na Escola Estruturalista começava, no entanto, a levantar questões relativas ao estado e sua relação com o sistema capitalista global76. O ressalvar da análise das relações de classe que transcendem as fronteiras do estado e determinadas relações de troca ao nível global, levaram a uma abordagem da historicidade inerente às relações internacionais e à ênfase numa análise que aborda a disseminação global, sociologicamente informada, do militarismo capitalista e do estado como formas predominantes de organização humana. O Estado como unidade de análise não poderia mais ser dado como certo, fixo e racional, nem tão-pouco o poderiam ser as relações entre estados. Críticas reflexivas centradas na história e na sociologia de que nos falava Bull e o seu tradicionalismo77, encontram assim aplicações práticas neste trabalho desenvolvido pela teoria marxista. As relações internacionais são descritas assim como práticas historicamente contingentes, situadas num determinado tempo e em determinadas relações espaciais.

Estas críticas encobertas foram, no entanto, fulcrais para o desenvolvimento de perspetivas construtivistas e críticas em relações internacionais. Questões relacionadas com as relações entre conhecimento e poder, teoria e prática ou todos os dilemas envolvidos na compreensão da função do conhecimento e da linguagem assumem-se como palco de debate e discussão78. O que estas teorias trazem de novo é a constatação de uma disciplina que já não podia assumir uma distinção simples entre o mundo e a palavra, entre os factos e as narrativas que construímos como académicos. A reflexividade inerente a este processo serviu, por outro lado, para realçar uma disciplina baseada num discurso ocidental que assume na institucionalização desse mundo ocidental algo de legítimo. De um modo geral, o que caracteriza a «mudança crítica» na teoria de relações internacionais é uma rejeição dos princípios positivistas que dominaram a disciplina, bem como o pressuposto de que a teoria internacional pode ser de alguma forma diferente do pensamento político e social79.

Uma série de perspetivas constituem esta mudança, e estas têm sido convencionalmente rotuladas como construtivismo, teoria crítica, pós-estruturalismo e feminismo. Cada uma destas teorias é por sua vez representada internamente por um número de perspetivas diferentes, principalmente em questões relacionadas com a epistemologia ou a natureza da crença justificada, a ontologia ou modos de estar no mundo e a base da nossa subjetividade. o construtivismo funda a sua base nos escritos de Weber, Durkheim ou Wittgenstein, realçando a importância de assuntos como a construção social da realidade: não tem, deste modo, um fim normativo em vista80. a teoria crítica olha para a teoria social marxista, bem como para a escola de Frankfurt de 1920 e 1930, não apenas para fornecer uma crítica do racionalismo, mas para desenvolver uma teoria social baseada na política emancipatória e da liberdade humana81. O pós-estruturalismo, por outro lado, foca-se em filósofos como Nietzsche e Heidegger, nos mais recentes filósofos franceses como Foucault e Derrida para fornecer uma crítica do pensamento do iluminismo e suas reificações da razão instrumental e contenções universalistas de verdade82.

Mais do que fornecer uma crítica pós-positivista das RI e seus discursos dominantes, estas abordagens pretendem perceber as relações de poder que determinam as suas exclusões, e as formas em que as teorias estão profundamente implicadas na construção de conceitos naturalizados como soberania, anarquia ou de segurança, economia e identidade. Em vez de considerar estes aspetos fundadores como algo dado e inquestionável, estas abordagens passam a ver todos os três como discursivamente construídos em práticas sociopolíticas que têm a sua própria contingência no tempo e no lugar. Onde na ortodoxia neorrealista a anarquia, por exemplo, era identificada como uma determinada condição do sistema internacional, um relato crítico vê a anarquia como construída e situada numa condição histórica específica83.

A crítica pós-positivista da disciplina trouxe assim para a agenda das RI reflexões sobre ética, sobre questões de direitos, e sobre a natureza da comunidade, política e da esfera pública internacional. Esta crítica ganhou uma outra dimensão com a emergência de estudos de teoria política internacional84. O debate destas teorias normativas internacionais é convencionalmente emoldurado ao dividir premissas cosmopolitas e comunitaristas. Quando a primeira perspetiva, o cosmopolitismo, defende uma única ordem moral que liga a humanidade além das fronteiras da cultura e do estado, o comunitarismo confere legitimidade moral para o estado e para a comunidade cultural da qual o indivíduo faz parte.

 

COMO ESTUDAR? QUESTÕES DE EPISTEMOLOGIA E METODOLOGIA

Não poderíamos debater a disciplina de ri sem, finalmente, nos centrarmos em questões de epistemologia e métodos de análise. Se até aqui este artigo esteve preocupado em debater porquê e o que estudar, há uma necessidade de perceber como podemos estudar relações internacionais. Esta última secção irá debruçar-se sobre estas problemáticas.

 

EPISTEMOLOGIA

Um dos debates importantes que emergiu com a expansão da teoria de relações internacionais para novas correntes – mais reflexivas – de pensamento, focou-se em disputas sobre o modo como podemos perceber o mundo que nos rodeia. Neste sentido a própria noção do que pode ser entendido como teoria expandiu-se, tendo surgido uma nova visão conceptual do entendimento sobre a mesma. Se no passado era hegemonicamente assumido que a função da teoria era a de explicar eventos sociais, parece emergir uma nova abordagem: mais do que explicativas as diferentes teorias podem ser vistas como constitutivas da realidade social. Fred Halliday resume sucintamente este movimento em três ideias principais: «Primeiro, é preciso compreender quais os factos que são significativos e quais não o são. Os factos são inúmeros e não falam por si. Para qualquer um, académico ou não, tem de haver critérios de significância. Em segundo lugar, qualquer conjunto de factos, mesmo que se aceite como verdadeiro e significativo, pode produzir interpretações diferentes: o debate sobre as “lições da década de 1930” não é sobre o que aconteceu na década de 1930, mas sobre como esses eventos podem ser interpretados. O mesmo se aplica para o fim da Guerra fria, na década de 1980. Em terceiro lugar, nenhum agente humano, novamente se académico ou não, pode contentar-se com os factos só: toda a atividade social envolve questões morais, de certo e errado, e estas não podem, por definição, ser decididas por factos.»85

Na base, este debate sobre teorias explicativas e teorias constitutivas resume-se a uma diferença sobre o modo como podemos analisar o mundo social: está este mundo diretamente imbricado no modo como os cientistas o pensam, ou seja, está esse mundo fora das nossas teorias, ou, pelo contrário, será o mundo social o que fazemos dele? Tentativas existem para tentar conciliar esta tensão. Por exemplo, o realismo científico de Roy Bhaskar86 e a teoria da estruturação de Anthony Giddens87 fazem um esforço nesse sentido. Para Giddens a teoria constitutiva é capaz de abarcar os fatores estruturais e externos tratados pela teoria explicativa; já na opinião de Bhaskar, a teoria explicativa consegue integrar significados e entendimentos. Há, contudo, quem mantenha uma separação entre estas duas leituras e que, por isso, mantenha uma forte divisão entre questões de explicação e de compreensão88.

Estas disputas que decorrem no campo da filosofia e da teoria social tendem a ter repercussão na teoria de relações internacionais. Com a década de 1980 surge um movimento intelectual claro que pretendeu mover a disciplina para além do positivismo. A maioria do trabalho dos construtivistas, pós-modernos, teóricos críticos, e de algumas feministas, começava a emergir e encaixava nessa categoria ampla de teoria constitutiva89. Num artigo de 1988, Robert Keohane90 definiu em traços gerais o debate que se seguiria quando sugeriu que uma nova divisão emergia nas compreensões teóricas que podemos desenvolver sobre relações internacionais. Nesse seu esforço de sintetizar o debate e «o espírito do tempo», Keohane divide teoria em pressupostos explicativos e constitutivos. Nesse sentido contrapõe praticamente todo o trabalho contido nos três paradigmas dominantes da década de 1980 – pluralismo, realismo e neomarxismo – e converte-os numa categoria – racionalismo – a qual contrasta o trabalho que vinha a emergir em perspetivas pós-positivistas a que dá o nome de reflexivas. O que surge desta reflexão é uma última ideia: Keohane convida os académicos a um esforço de integração de esforços na análise da realidade internacional por via de síntese e de diálogo entre as duas posições.

Um outro efeito de começarmos a pensar sobre teoria de relações internacionais em termos desta divisão entre a teoria constitutiva e explicativa é que esta divisão tornou possível uma maior consciência para disputas internas no seio de teorias particulares. Por outras palavras, debates sobre o modo como podemos criar teoria não se restringem a questões mais gerais do movimento que a disciplina veio a ter em finais dos anos 1980 e com a emergência de correntes pós-positivistas. Debates acerca do modo como podemos dar explicações sobre o modo de ver o fenómeno social são transversais a teorias particulares. Por exemplo, torna-se mais claro que o realismo pode ser assumido numa perspetiva mais «prática» ou numa perspetiva mais «técnica». O movimento teórico que leva à criação do neorrealismo, neste sentido, pretende fugir àquilo que considerava ser a falta de capacidade explicativa de muita teoria do realismo neoclássico como o trabalho de Reinhold Niebuhr91 ou E. H. Carr92. Para a escola inglesa a questão é saber se os significados e interpretações da sociedade internacional são constitutivos dessa mesma sociedade93, ou se são meras cifras para forças estruturais94. Este mesmo debate pode ser conduzido dentro de diferentes leituras do que é o construtivismo. Para uns, o construtivismo oferece fundamentalmente uma nova visão ontológica do mundo e, neste sentido, o projeto deve separar claramente questões de ontologia – a natureza do que conhecemos – e questões de epistemologia – o modo como conhecemos o que conhecemos95. Outras versões existem, no entanto, que salientam como na análise de um qualquer objeto a natureza desse conhecimento não poder ser separada do modo como o conhecimento é adquirido96. Em cada caso, estas disputas internas ilustram o movimento mais geral que foi promovido na teoria de relações internacionais com a nova problemática entre teorias explicativas e teorias constitutivas a gerar debates mais particulares até então não suficientemente consolidados ou inexistentes.

 

METODOLOGIA

A emergência de teorias reflexivas também contribuiu para expandir o debate sobre o modo como as RI trabalham metodologicamente. Sintetizando este contributo de maneira coerente, Roxanne Doty realça qual a principal preocupação desta agenda. Esta pretende entender «como compreensões são produzidas e assimiladas por vários objetos e sujeitos sociais, constituindo, deste modo, disposições interpretativas particulares que criam determinadas possibilidades ou supõem outras.»97

Para tentar decifrar o conteúdo desta frase, convém partir de uma distinção mais geral que se reflete na separação entre métodos de pesquisa – que consistem em ferramentas concretas de investigação – e metodologia – um termo abrangente referindo-se a «suposições básicas sobre o mundo que estudamos, que são as técnicas específicas adotadas pela pesquisa do académico»98. Por outras palavras, enquanto os mesmos métodos podem ser partilhados por várias metodologias, uma metodologia compreende um conjunto de requisitos ontológicos e epistemológicos – um «estilo de raciocínio»99 – que formula os seus de raciocínio» que se constrói na base do racionalismo ou da escolha racional100, com uma linguagem própria (por exemplo, cálculos de custo-benefício, utilidade esperada, etc.), uma ontologia (um mundo composto de pré-dados, computadores-como-indivíduos), bem como a sua própria epistemologia (positivismo); a crítica reflexiva vem condicionar e afetar este conjunto de dados adquiridos. Diferentes posições críticas concordam com a necessidade de interpretação para compreender a natureza das instituições sociais e, deste modo, divergem radicalmente do racionalismo que assume próprios padrões científicos e condições. Na base, portanto, a crítica reflexiva da questão metodológica esteve na origem de um debate que iria abrir a discussão sobre opções metodológicas em RI. Encerrada a disciplina, sem esta discussão, num «estilo o mundo como sendo estabelecido a priori e as teorias sujeitas a um mero processo de validação/rejeição dos dados empíricos que apresentavam101. Ao invés, a nova literatura metodológica que começa a surgir principalmente na década de 1990102, aponta para a necessidade de interpretarmos e contextualizarmos as nossas posições. Assim, o mundo não deve ser dado como adquirido, porquanto resulta da nossa interação com ele. Não obstante concordarem com esta posição ontológica geral, as diferentes posições que emergem não coincidem quanto a questões epistemológicas. Uma divisão pode ser estabelecida a este nível entre posições «positivistas» e posições «pós-positivistas»103. As primeiras tendem a ver entendimentos intersubjetivos como estáveis, permanecendo inalterados pela perspetiva do intérprete. Analisam o mundo em termos multicausais, tratando componentes de estrutura e agência como variáveis a serem testadas. As segundas, em contraste, favorecem uma terminologia que capta a instabilidade dos significados. Deste modo, insistem na crítica do denominado círculo hermenêutico: menos preocupados com a generalização, evitam o objetivo de explicação causal e rejeitam assim o vocabulário de «variáveis» a favor da captura de «conjunturas históricas».

 

CONCLUSÃO

Este artigo começou por procurar a resposta a uma pergunta: o que pode dar às RI diferenciação disciplinar? No esforço de perceber questões relacionadas com o porquê, o quê e o como estudar relações internacionais, o artigo debruçou-se sobre o funcionamento do sistema de estados moderno, a identificação de um objeto de estudo e a criação de técnicas e métodos de investigação. Este trajeto foi lido segundo um enquadramento teórico que, por um lado, reconheceu como é das lutas conceptuais entre académicos que a realidade nasce e, por outro, como a criação de conhecimento está profundamente implicada na construção do sujeito político e objeto de política.

Tendo como finalidade encontrar-se a si mesma, a disciplina moveu-se em muitos países para além de um ensino baseado no estudo independente da história, do direito internacional, da demografia, da antropologia, etc., e começou a perguntar não o que estas disciplinas tratam em si mesmas mas como podem contribuir para problemas específicos de relações internacionais. Na medida em que o uso de outras disciplinas é feito, o argumento desenvolvido defende que esse uso terá de ser conduzido de uma forma que esclareça problemas particulares criados pelo objeto de estudo independente de relações internacionais. No caminho para encontrar esse objeto de estudo, o artigo realçou como debates sobre o papel do estado e das suas interações são caracterizados por diferentes conceções de separação do doméstico e do internacional e se podemos realmente confiar em conceitos como poder e soberania para delimitar as fronteiras de um estado. Foi igualmente realçado como estes debates irão enformar preocupações empíricas na disciplina. O campo das relações internacionais parece, portanto, ser caracterizado por três conjuntos distintos de preocupações: conflito, segurança e guerra; cooperação e condições para a paz; equidade e justiça. O artigo preocupou-se, igualmente, em traçar as transições teóricas que se verificaram nas RI. Neste sentido, traçou o modo como se verificou um movimento para além do racionalismo com o retorno de questões de ética às relações internacionais. O novo eixo do debate em RI é, deste modo, caracterizado por uma disputa sobre problemas de epistemologia e de filosofia.

Finalmente, o artigo debruçou-se sobre questões de epistemologia e metodologia. Aqui foi mais uma fez realçado o trajeto da disciplina de uma fase em que a predominância de um pensamento racional foi contrariada pelo advento de correntes reflexivas. De salientar que, no primeiro caso, esta mudança traduziu-se numa abordagem constitutiva de teoria que se refletiu num esforço mais consistente em perceber como a realidade internacional é socialmente construída e o papel da linguagem nesse processo; no segundo caso, a reconstrução metodológica da disciplina conduziu a uma maior preocupação com aspetos de interpretação que, por sua vez, levaram a debates sobre questões contextuais, indutivas e «históricas». Um desafio importante para o futuro será o de consolidar este conjunto de questões de forma a caminhar para um estudo independente sobre a natureza, objeto, técnicas e métodos da disciplina de RI.

 

NOTAS

1 Como realçado por Chris Brown, «Relações Internacionais (com maiúscula) e o estudo de relações internacionais (com minúscula)». Brown, Chris, e Ainley, Kirsten – Understanding International Relations. Nova York: Palgrave McMillan, 2009, p. 3.         [ Links ]

2 Schmidt, Brian – The Political Discourse of Anarchy: A Disciplinary History of International Relations. Nova York: State University of New York Press, 1997.         [ Links ]

3 Bull, Hedley – «International Relations as an academic pursuit». In The Australian Outlook. Vol. 26, N.º 3, 1972, pp. 251-265.         [ Links ]

4 Aron, Raymond – «qu’est-ce qu’une Theorie des Relations Internationales». In Revue Française de Science Politique. Vol. 17, N.º 5, 1967, pp. 837-861.         [ Links ]

5 Humrich, Christoph – «Germany». InKnud-Erik, Jorgensen, e Knudsen, Tonny B. (eds.) – International Relations in Europe: Traditions, Perspectives and Destination. Londres: Routledge, 2006.         [ Links ]

6 Friedrichs, Jörg – European Approaches to International Relations Theory: A House with Many Mansions. Londres: Routledge, 2004, pp. 65-84.         [ Links ]

7 Tickner, Arlene, e Wæver, Ole – International Relations Scholarship Around the World. Londres: Routledge, 009;Knud-Erik, Jorgensen, e Knudsen, Tonny B. (eds.) – International Relations in Europe: Traditions, Perspectives and Destin ation. Londres: Routledge, 2006.         [ Links ] O caso português foi explorado em Ferreira-Pereira, Laura, e Freire, Maria Raquel – «International Relations in Portugal: the state of the field and beyond». In Global Society. Vol. 23, N.º 1, pp. 79-96.         [ Links ]

8 Ibidem, p. 143.

9 Ibidem.

10 A história interessa às RI, por exemplo, na capacidade de compreender processos históricos de mudança sistémica e, particularmente, pelo contributo que traz na definição das instituições políticas, económicas e culturais que contribuem para mudanças temporais (sobre este assunto cf. Little, Richard – «International Relations and large-scale historical change». In Contemporary International Relations: A Guide to Theory. Londres: Pinter, 1994, pp. 9-26). O direito internacional interessa às RI, por exemplo, no modo como este serve para compreender ou explicar melhor a estrutura interna e a função de instituições internacionais (sobre este assunto cf. Slaughter, Anne-Marie – «International law and international rela-tions theory: a new generation of interdisciplinary research». In American Journal of International Law. Vol. 92, N.º 3, 1998, pp. 367-397). A demografia interessa às RI, por exemplo, no modo como processos de transformação de fluxos internacionais transformam processos de identificação soberana identitária (sobre este assunto cf. Shapiro, Michael, e Alker, Hayward – Challenging Boundaries: Global Flows, Territorial Identities. Minnenapolis: Minnesota University Press). A antropologia interessa às RI, por exemplo, na análise de processos de reconstrução pós-conflito e, em particular, nas lições que desta disciplina se podem tirar no modo como podemos construir comu-nidades (sobre este assunto cf. Pouligny, Béatrice – «Promoting democratic institutions in post-conflict societies: giving diversity a chance». In International Peacekeeping. Vol. 7, N.º 3, 2000, pp. 17-35). O que se torna importante realçar, por-tanto, é que em todos estes casos as disciplinas são trazidas para a investigação de problemáticas que interessam às RI e o seu estudo não é conduzido de modo individual e independente da identificação dessas mesmas problemáticas. Por outras palavras, as disciplinas não são estudadas em si mesmas mas naquilo que contribuem para problemáticas em RI.

11 Um debate emergente tem surgido sobre como teorizar teorias de relações internacionais. Para uma síntese cf. Schmidt, Brian – «On the history and historiography of International Relations». In Carlsnaes, et al.Handbook of International Relations. Londres: Sage, 2002, pp. 3-22;         [ Links ] Holden, Gerald – «Who contextualizes the contextualizers? Disciplinary history and the discourse about ir dis-course». In Review of International Studies.Vol. 28, N.º 2, 2002, pp. 253-270.         [ Links ]

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41 Sobre esta visão cf. Mearsheimer, John – The Tragedy of Great Power Politics. Nova York: W.W. Norton, 2001.         [ Links ]

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48 Ibidem,p. 104.

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54 Ibidem, pp. 67-68.

55 Boucher, David – Political Theories of International Relations: From Thucydides to the Present. Oxford: Oxford University Press, pp. 47-169.         [ Links ]

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57 Ibidem, p. 4.

58 Ibidem, p. 29.

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