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Relações Internacionais (R:I)

versão impressa ISSN 1645-9199

Relações Internacionais  n.28 Lisboa dez. 2010

 

Timor Leste

 

Sónia Rodrigues

Investigadora do IPRI – UNL. Licenciada em Ciência Política e Relações Internacionais (FSCH – UNL), mestre em História das Relações Internacionais (ISCTE) e doutoranda em  Relações Internacionais (FSCH – UNL).

 

 

Irena Cristalis, East Timor: A Nation’s Bitter Dawn

Londres e Nova York, Zed Books Lda, 2009, 340 pp.

East Timor: A Nation’s Bitter Dawn conta a história do povo timorense na procura incessante por uma madrugada livre e independente, pela mão holandesa de uma jornalista de investigação sediada na Ásia na década de 1990.

Concertados entre os governos da Indonésia e de Portugal na sede das Nações Unidas, os acordos de 5 de Maio de 1999 eram claros: a UNAMET prepararia o referendo e a Indonésia garantiria a segurança no território antes, durante e após a consulta popular.

Apesar do clima de intimidação que marcou o período que antecedeu o dia do referendo e após o processo de registo de eleitores – conduzido pela UNAMET – optou-se pelo dia 30 de Agosto para a votação, que decorreu pacificamente e com uma afluência às urnas de 98,6 por cento. Com o anúncio dos resultados da consulta popular, a 4 de Setembro – com 78,5 por cento a favor da independência –, iniciou-se mais um capítulo negro da história recente do povo timorense e que se saldou em mais de mil e quinhentos mortos e na deslocação de mais de metade da população timorense.

Um dos três jornalistas que ficaram sitiados na sede da UNAMET, em Setembro de 1999, Irena Cristalis narrou aqueles nove dias de cerco ao mundo, tornando-se um dos testemunhos essenciais à história recente de Timor Leste.

O terror mortífero que se espalhou pelo território, com a acção destrutiva das milícias pró-integração indonésias, viria mais tarde a ser considerado «crime contra a Humanidade» por três comissões distintas, uma das quais com origem na Indonésia. Contudo, os crimes contra o povo timorense, cometidos no território entre 1975 e 1999, não chegaram à justiça dos tribunais. Irena Cristalis refere a forma como os líderes independentes, eleitos pelos timorenses, optaram por um processo de reconciliação com o passado em vez de apoiarem a criação de um tribunal internacional, ideia que a autora destaca no capítulo «Reconciliation, but where is the justice?».

Considerada como uma das histórias de sucesso do intervencionismo das Nações Unidas na década de 1990, os (in)sucessos das missões em Timor Leste viriam, mais tarde, a inspirar a aprovação da doutrina «responsabilidade de proteger» pela Assembleia Geral em 2005.

A madrugada livre e independente que os timorenses aspiraram durante a ocupação indonésia chegaria, enfim, a 20 de Maio de 2002 e foi apenas possível após os vinte e quatro anos de audaz resistência do povo timorense.

 

Geoffrey Robinson, «If you leave us here, we will die»: How Genocide Was Stopped in East Timor

Nova York, Princeton University Press, 2010, 344 pp.

«If you leave us here, we will die»… uma súplica feita por uma jovem mulher timorense ao chefe da missão do Conselho de Segurança das Nações Unidas a Jacarta e a Díli, que contribuiu para autorizar a força internacional (INTERFET) a restabelecer a paz e a segurança em Timor Leste, no período pós-consulta popular, revela a obra.

Geoffrey Robinson, um funcionário do Departamento de Assuntos Políticos das Nações Unidas, que esteve sitiado no edifício da UNAMET em Díli, entre 5 e 14 de Setembro, com mais de mil e quinhentos timorenses que procuraram refúgio junto das forças internacionais após o anúncio dos resultados do referendo, foi um dos membros da missão que recusou ser evacuado para Darwin. Deixar Timor Leste naquele momento significaria a morte do povo timorense que considerava estar, finalmente, protegido pela desarmada bandeira azul e branca das Nações Unidas. Mais precisamente, deixar Timor Leste mergulhado no terror mortífero das milícias indonésias significaria a morte daqueles mais de mil e quinhentos timorenses, com quem tinham partilhado as paredes da sede da UNAMET durante nove dias.

Robinson compreendeu esta situação mas, mais importante, Ian Martin – o responsável pela UNAMET – compartilhava a mesma percepção e adiou a ordem do Secretariado das Nações Unidas para evacuar os funcionários internacionais. Esta decisão pode não ter salvo todos os timorenses que arriscaram as suas vidas para votar pela independência de Timor Leste, mas foi, certamente, uma opção que deu outro destino àqueles mais de mil e quinhentos timorenses – que seriam evacuados para Darwin juntamente com os funcionários das Nações Unidas – dias antes da chegada da INTERFET a Díli.

O autor, professor de História na Universidade da Califórnia e antigo funcionário da Amnistia Internacional em Londres, argumenta que as milícias não agiram espontaneamente e mostra como os líderes políticos e as forças militares indonésias fizeram planos de contenção à independência do território. Sustentado por provas documentais e relatos na primeira pessoa, o historiador faz uma análise académica sobre as origens da violência e apesar de reconhecer os padrões culturais indonésios em «ficar amok» – reforçado pela violência sistemática fomentada pelo Estado indonésio desde a invasão de 1975 –, o autor conclui, que «as milícias pró-Indonésia foram mobilizadas, armadas, treinadas, fornecidas e financiadas pelos líderes civis e militares indonésios» e foram responsáveis pelos crimes contra a Humanidade cometidos em Timor Leste no período pós-referendo.

 

Damien Kingsbury, East Timor: The Price of Liberty

Nova York, Palgrave Macmillan, 2009, 246 pp.

East Timor: The Price of Liberty relata-nos o percurso conturbado do povo timorense. Partindo de considerações históricas sobre o colonialismo em Timor Leste e a consequente invasão indonésia do território – em Dezembro de 1975 –, o autor australiano destaca a luta de resistência timorense que conduziu, em última instância, o povo de Timor Leste à escolha pela independência.

Damien Kingsbury, que coordenou a maior missão de observadores eleitorais à consulta popular de 1999 e às eleições gerais de 2007, rotula a presença das Nações Unidas no período pós-consulta popular//UNAMET e pós-intervenção militar/INTERFET como uma forma de «colonialismo benigno». O autor salienta o desempenho da Missão de Administração de Transição – sob a liderança do representante especial Sérgio Vieira de Mello – como crucial na fundação dos alicerces democráticos do Estado timorense.

No que respeita à forma de justiça transicional adoptada, Kingsbury realça a opção das elites políticas timorenses pela reconciliação com o Estado vizinho indonésio, manifesta com criação da Comissão de Verdade e Amizade, em 2005.

Investigador na Universidade de Deakin, em Melbourne, o autor destaca a crise política de 2006 como um episódio que expôs as fragilidades institucionais do jovem Estado timorense. A volubilidade da comunidade política, característica inerente a um recém-criado regime democrático, aliada à necessidade de reformas estruturais no sector da segurança, culminaram na renúncia do primeiro-ministro Mari Alkatiri e na tomada de posse interina de José Ramos-Horta. O ambiente de violência e de intimidação que marcou as consequentes eleições de 2007 e os ataques perpetrados, em Fevereiro de 2008, contra o Presidente José Ramos-Horta e o primeiro-ministro Xanana Gusmão, revelam a necessidade de consolidação das rotinas democráticas no Estado, nas elites políticas e no povo timorense.

Damien Kingsbury oscila entre as concepções de «democracia consolidada» e de «Estado falhado» para caracterizar a realidade do Estado timorense mas, certamente, Timor Leste situa-se num patamar democrático intermédio e bem afastado dos pólos conceptuais adiantados pelo autor.

Pedro Unamet Rodrigues nasceu no complexo das Nações Unidas a 8 de Setembro de 1999 e o Estado independente de Timor Leste nasceu a 20 de Maio de 2002. Ambos os nascimentos ocorreram sob a bandeira das Nações Unidas mas ambos os futuros dependem agora das opções dos líderes e do povo de Timor Leste independente.