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Revista Lusófona de Educação

versão impressa ISSN 1645-7250

Rev. Lusófona de Educação  no.25 Lisboa dez. 2013

 

A Administração Escolar: racionalidade ou racionalidades?

School administration: rationality or rationalities?

L`Administration de l`école : la rationalité ou les rationalités?

La administración de la escuela: racionalidad o racionalidades?

 

Maria João de Carvalho*

*Professora Auxiliar da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro Investigadora do CIEd – Universidade do Minho mjcc@utad.pt

 

RESUMO

Os pressupostos a que se encontra vinculada a administração escolar, a mesma adoptada pela administração empresarial, constitui-se como factor decisivo para a situação de crise de racionalidade, de motivação e de legitimidade em que aquela se encontra.

A produtividade e a eficiência, pressupostos que a racionalidade instrumental integra, não tem permitido que os actores educativos se constituam enquanto sujeitos democráticos e, por isso, tem impedido que se convertam em sujeitos de acção. As práticas dos directores escolares e as condições a que estão sujeitos parecem não favorecer o aparecimento de uma racionalidade democrática e emancipatória.

Torna-se, por isso, necessário a emergência de uma racionalidade enformada pela crítica, pelo diálogo intersubjectivo e que reconheça, tanto a importância dos meios como dos fins na tentativa de perscrutarmos a verdade de que ambos os elementos se revestem.

Palavras-chave: administração escolar; crise; racionalidade instrumental; racionalidade democrática.

 

ABSTRACT

School administration based on a set of presupposes, also adopted by enterprising administration, and incorporates a decisive factor to the rationality crisis, motivation and legitimacy of the present day times.

Productivity and efficiency, prerequisites of instrumental rationality, hasn’t allowed education actors to constitute themselves as democratic agents and consequently action agents. The actions of school board director and the conditions to which they are submitted don’t seem to favour the rising of a democratic, emancipatory rationality.

This makes therefore necessary the emergence of rationality framed by criticism, interpersonal dialogue so that it may recognise not only the importance of the means but also the targets in an attempt to better understand the truth in which both elements are involved.

Key-words: school administration; crisis; instrumental rationality; democratic rationality.

 

RÉSUMÉ

Les hypothèses à laquelle elle est liée l`administration de l` école, la même qui estr adoptée par l`administration des affaires sont des facteurs décisifs pour la crise de la rationalité de motivation et de légitimité dans laquelle elle se trouve.

La productivité et l`efficacité , présupposés que la rationalité instrumentale intègre n`ont pas réussi au fait que les acteurs éducatifs se constituent en tant que sujets démocratiques et par conséquent ils ont empêché qu’ils deviennent sujets d`action .

Les pratiques des directeurs d`école et les conditions auxquelles ils sont soumis semblent ne pas favoriser l`émergence d`une rationalité démocratique et émancipatrice.

Il devient, donc, nécessaire l`émergence d` une rationalité développée et basée sur la critique et sur le dialogue intersubjectif et qui reconnaît tant l`importance des mass media que les finalités, en essayant , de regarder la verité dont les deux éléments sont étroitement liés.

Mots-clés: administration scolaire; les crises rationalité  instrumentale; la rationalité démocratique.

 

RESUMEN

Los fundamentos al que está vinculada la administración de la escuela, la misma adoptada por la administración de empresas, se constituye como un factor decisivo para la crisis de racionalidad, de motivación y de legitimidad en la que se encuentra.

La productividad y la eficiencia, presupuestos que la racionalidad instrumental integra, no han permitido que los actores educativos se constituyan como sujetos democráticos y, por lo tanto, les ha impedido convertirse en sujetos de acción. Las prácticas de los directores de las escuelas y las condiciones a que están sujetos, parecen no favorecer el surgimiento de una racionalidad democrática y emancipadora. Por lo tanto, es necesario la aparición de una racionalidad enformada por la crítica, por el diálogo intersubjetivo y que reconozca tanto la importancia de los medios como de los fines, en la tentativa de descubrir la verdad de que ambos elementos se revisten.

Palabras clave: administración escolar; crisis; la racionalidad instrumental; la racionalidad democrática.

 

A Administração Escolar: racionalidade ou racionalidades?

Falar de crise na administração escolar é considerar, à semelhança do que acontece em outras áreas científicas, que muitos dos seus pressupostos estão a ser questionados e postos em causa. A saída desta crise, de matriz empresarial, só pode acontecer quando ocorrer uma mudança paradigmática que seja capaz de transpor os elementos da linearidade, da fragmentação, do progresso, da eficácia e normalidade, tão caros ao conceito da racionalidade instrumental, os mesmos que têm impedindo que a administração escolar seja permeável a outras propostas de racionalidade mais conformes à ideia de participação e emancipação. Com efeito, este modo de racionalidade “tem assumido grande protagonismo ao incorporar decisões e recomendações a nível das políticas educativas desenvolvidas a partir da década de 1980, em estreita ligação com a ideologia da modernização” (Carvalho, 2009, p.142).

Só o êxito alcançado pela racionalidade instrumental, que se foi impondo como um fim em si mesma, penetrando de modo subtil nas várias esferas da vida, quer pública, quer privada, apoderando-se da ordem social dissimulada de normalidade, o que, se por um lado explica o seu sucesso, por outro dificulta o seu exame crítico, aspecto que favorece a sua vigência, explica a sua hegemonia sobre todas as outras formas de racionalidade.

 

A Crise da Administração Escolar

A complexidade da crise em que a administração escolar se encontra mergulhada pode ser interpretada à luz das crises evidenciadas pelas sociedades capitalistas, em particular pela da racionalidade, da legitimação e da motivação (Habermas, 1999), sendo que, numa primeira fase, todas as crises começam por ser de natureza económica. Quando a razão de ser da administração escolar começa a ser posta em causa, obrigando a reflectir sobre os elementos que a configuram, está instalada a crise de racionalidade.

Não é porque a discussão em redor da administração escolar tem assentado na ideia da defesa da gestão democrática que no plano da ação se constatem práticas que a concretizem. Na verdade, a ideia de uma administração escolar autoritária só no plano teórico tem perdido adeptos. As práticas parecem corroborar a ausência do teor democrático da administração que não encontra um solo propício ao acontecer da democracia e da autonomia. A saída desta crise de legitimação só acontecerá pela alteração das relações com os atores educativos. A crise de motivação ocorre como consequência da impossibilidade desses mesmos atores se realizarem enquanto sujeitos de ação, ou seja, decorre da frustração perante a impossibilidade democrática e da frustração perante o próprio trabalho (Medeiros, 2007, p. 34).

Uma administração aliada aos interesses do capital deixa de manter um compromisso com a transformação e com a superação do sistema social de dominação e exploração. Quando o “Seu chamado conteúdo ‘geral’ e ‘universal’ não passa de uma forma ideologizada de apresentar a administração como uma prática neutra e inofensiva, escamoteando seu carácter de instrumento de controle e exploração na organização do trabalho alheio, em benefício dos interesses do capital” (Fortuna, 2000, p. 16-17) então, admite-se que a administração escolar se encontra colonizada pela mesma racionalidade da administração empresarial. Esta colonização teórica assenta na ideia de que a administração empresarial se baseia em pressupostos universais, válidos para qualquer organização, independentemente da natureza dos seus objetivos. Por isso,

A racionalidade vivenciada na e pela empresa constitui-se em espelho (reflexo) de uma possível racionalidade na escola. Nessa perspectiva de compreensão, os que fazem a escola não conseguem enxerga-la por dentro a ponto de se fazer refletir na sua própria racionalidade (Medeiros, 2007, p. 36).

Com efeito, esta colonização mantém-se, igualmente, na prática, porque os procedimentos administrativos que se desenvolvem na organização escolar são idênticos aos utilizados na empresa. A este propósito o mesmo será dizer que a racionalidade instrumental é colonizadora de todas as outras formas de racionalidade (Carvalho, 2012a). Tal facto explica a “preocupação fundamental pelos meios, pelos modos mais eficazes no alcance de determinados objectivos, relegando a questão das finalidades para um plano acessório, porque a pretensão de justificação não existe” (Carvalho, 2009, p. 120). A eficácia dos meios em prol dos fins é a única a ser contemplada, os fins enquanto tal são indiferentes na medida em que tanto podem ser bons como maus.

O império deste modo de racionalidade, que não tem em consideração o que deve ser entendido como prioritário, como preferível ao nível dos fins, na opinião de Ritzer, impele à produção de irracionalidades, motivo pelo qual afirma que os “sistemas racionalizados sirven para negar la razón humana, los sistemas racionalizados pueden llegar a ser irracionales” (1996, p. 27).

Considerar uma racionalidade que, mais do que negligenciar, marginaliza a temática da legitimação e validade dos fins, é adoptarmos uma posição de descomprometimento face a prioridades e a incompatibilidades que se estabelecem à medida que vamos impondo novas metas.

Definir o objetivo social, político e educativo da administração escolar permite a sua aproximação à sua finalidade pedagógica que integra diversos propósitos, designadamente a formação da personalidade, transmissão e apropriação de saber e cultura, que devem ser pensados de forma articulada.

Por este facto, a prática pedagógica e a sua compreensão reclama a intersubjectividade como modus operandis, condição para o estabelecimento da gestão democrática que se assume enquanto processo colectivo de decisão.

A ser assim, não devemos ter do conceito de administração uma compreensão reducionista que somente o considere enquanto processo decisório, mas que inclua “tanto princípios de organização que assegurem decisões corretas, como princípios que asseguram uma ação efetiva” (Simon, 1971, p. 1), porém, sem que a tomada de decisão seja exclusiva daqueles que se situam no nível mais alto, cabendo aos outros a mera execução do que lhes foi comunicado.

Esta aceção de comunicação, entendida enquanto sinónimo de transmissão de informação, e a racionalidade que lhe está afecta, afasta-se da preconizada por Gadamer para quem tem que existir preocupações com a certeza e verdade do conhecimento em resultado de um constante perguntar e responder, numa atitude argumentativa que se manifesta na capacidade de refutação, disponível a outros pontos de vista. Uma comunicação com uma racionalidade que se confunde com um projeto de permanente atividade que se concretiza na capacidade que o pensamento tem de indagar, no diálogo inter-subjectivo em que é manifesta a discussão argumentativa e a crítica das convicções adquiridas. E, a ser assim, será a reflexão quem auxilia na procura das possibilidades do conhecimento e a linguagem que se assume como meio por excelência desse conhecimento. Uma racionalidade que, na peugada de Habermas, se assume pela relação intercomunicativa do sujeito com a acção, com o mundo dos factos, que é feita através da mesma linguagem assente numa moral universal liberta de constrangimentos, por isso, autêntica, livre para criticar e problematizar, mas nem por isso infalível.

Diríamos que para o autor supracitado é urgente reaver o sentido da acção e a convivência espontânea, não monopolizadora, em que o sujeito reconheça a sua acção como dirigida a um fim fundamentado libertando-nos de uma comunicação cuja racionalidade seja integradora de técnicas de controlo e de dominação. Este é o ponto de vista que tem por objetivo alcançar um entendimento mútuo entre os interlocutores no que respeita aos seus modos de ação.

Nesta linha de ideias parece-nos que definir os processos administrativos enquanto “processos decisórios, pois consistem no isolamento de certos elementos nas decisões dos membros da organização, no estabelecimento de métodos de rotina para selecionar e determinar esses elementos, e na sua comunicação àqueles por ele afectados” (Simon, 1971, p. 8), afasta-nos da possibilidade de uma administração que se pauta pela busca de consensos e de entendimentos recíprocos de âmbito pedagógico, por relações democráticas que permitiriam que todos os actores educativos se transformassem em interlocutores no espaço público validando a sua autonomia, porque libertos da privação da palavra, exemplo acabado de subjugação.

 

Que Racionalidades?

Se podemos definir a administração “como a arte de ‘conseguir realizar as coisas’ (Simon, 1971, p. 8) não parece razoável desvalorizar os métodos e os processos que visam assegurar determinada acção, mas tal não invalida que os processos decisórios que conduzam à acção, ou, nas palavras de Simon a “determinação do que se deve fazer” (Simon, 1971, p. 8) sejam descuidados. O mesmo será dizer que é a presença simultânea destes dois aspectos que permitirá desenhar uma racionalidade conciliadora das dimensões administrativa e pedagógica em contexto da organização escolar. Deste modo, a eficiência não tem, necessariamente, que anular a dimensão pedagógica. E, a ser assim, será a racionalidade substantiva que melhor serve os nossos propósitos, pois o seu mérito concretiza-se no esforço de tornar factual a presença dos meios e dos fins de modo simultâneo (Carvalho, 2011). Em virtude de exigir a presença destes dois aspetos exige a presença de uma dimensão axiológica, porque a legitimação dos fins será motivo de debate, e uma outra instrumental, pois a preocupação sobre a eficácia de um processo que levará à realização de uma qualquer finalidade estará sempre presente. Podemos dizer que este modo de racionalidade deriva da necessidade urgente que o ser humano tem em desafiar e questionar reflexivamente a sua acção de forma a determinar a sua legitimidade.

Se não podemos ignorar a importância da adequação dos meios adoptados no alcance de determinados fins, estes últimos também se revelam como um componente indispensável da racionalidade que “desde la perspectiva de los médios, refleja la preocupación pragmática por la eficiência del proceso, desde la perspectiva de la ‘adecuación de los fines’, refleja la preocupación por el produto dirigida por el valor. (sin olvidar la intervención de la aceptabilidad de los medios mismos)” (Recher, 1993, pp. 20-21).

Claro que, neste quadro de racionalidade, os fins são manifestamente avaliados para que resultem adequados. A adopção dos fins inadequados por parte do sujeito, mesmo que atingidos de forma eficiente, não é suficiente para que se caracterize o procedimento de racional. Deve existir, isso sim, uma intrincada relação entre o custo dos meios e os valores que se efetivam a partir dos fins. Ao sujeito, nem os meios nem os fins lhe devem ser indiferentes, existindo entre eles uma co-implicação indispensável. Tentar atingir objectivos sem meios adequados é uma tarefa inusitada, ao mesmo tempo que não é coerente fazermos uso de meios adequados no alcance de objetivos despropositados. Se cada um dos aspectos individualmente concebidos, meios e fins, fazem parte integrante da racionalidade tornando-a uma unidade, então não podemos abdicar de nenhum deles (Carvalho, 2011, p. 45). Se optarmos por um posicionamento que descrimine um dos elementos considerando-o condição suficiente para se falar em racionalidade, estaremos em presença de uma visão reducionista da mesma.

Para esta racionalidade a validade dos fins será sempre uma questão oportuna porque, explica Recher, “es contrario a la razón (…) preferir el bien menor com respecto al mayor, o el mayor mal com respcto al menor, o subordinar las necesidades reales a inútiles deseos” (Recher, 1993, p. 113). A simples adopção de determinados objetivos não é condição para que se transformem em válidos, mas, ao serem merecedores de todo o esforço levado a cabo pelo sujeito tornam indispensável uma avaliação objetiva, que os legitima ou não. Constrangidos a uma avaliação, a suspeita que sobre eles poderia recair, a possibilidade de estarem revestidos de uma importância que não possuem que só servem para interferir e impedir a satisfação das nossas reais necessidades, dilui-se. O problema essencial reside no que são os nossos interesses, numa desocultação imparcial e bem informada, obrigando a uma hermenêutica com vista a perscrutar a verdade em detrimento dos interesses que só aparentemente são benéficos.

Uma racionalidade deste tipo apresenta-se tendo como núcleo central a tríade formada pela dimensão cognoscitiva, prática e valorativa. A primeira produz opiniões sobre os factos com os quais nos deparamos, a segunda produz directivas sobre que actos realizar e a última produz avaliações sobre os factos. Ao existirem de modo totalitário, como se de uma só dimensão se tratasse, de resto a presença de uma qualquer dimensão implica de forma efectiva as restantes, fica evidente o todo a que a tríade dá forma, e que Rescher bem explicita quando se refere à racionalidade dizendo que

Su requisito típico es el de las buenas razones: buenas razones para lo que uno cree, para lo que hace y para lo que evalúa. Si nuestros actos están basados en creencias inapropiadas, no tiene justificación racional, si nuestras creencias no admiten cumplimiento en la práctica, adolecen también de un defecto de racionalidad, si nuestros valores van en contra de la razón (Recher, 1993, p. 145).

Estaríamos, aqui, em presença dos elementos necessários que, provavelmente, retirariam toda a força, quer ao pensamento, quer à ação.

Uma abordagem consistente desta conjuntura torna indispensável a criação de uma hierarquia que contemple as nossas reais necessidades mostrando, de forma inequívoca, quais os interesses que nos orientam na ação. O mesmo será dizer que toda a ação é intrinsecamente axiológica, ou seja, toda a tomada de decisão tem como linha orientadora um valor que vale de modo diferente de outro valor. Opção que retira todo o carácter de neutralidade à ação.

A ausência de consenso será, definitivamente, uma certeza, facto que não invalida a existência de um espaço comum aos interlocutores, um espaço de partilha que, quanto mais extenso, mais evidencia o acordo alcançado. Parece que devemos ser consensuais em assuntos que digam respeito a deveres naturais que, por se identificarem com o que denominamos de obrigações prioritárias, devem ser tidos em conta na realização de qualquer ação.

Resulta desta conceção de racionalidade uma reflexão importante, que o indivíduo racional deve ponderar sempre os fins que pretende alcançar para que não desenvolva aversão pelas consequências do projeto que adotou o que, inevitavelmente, o levaria à censura do seu próprio agir. Lamentarmos uma escolha é fazermos um julgamento ao nosso agir, é acreditarmos que o princípio orientador pelo qual agimos deveria ter sido outro. Otimizar o que se pensa, o que se faz e o que se avalia será a essência da racionalidade, muito embora, diríamos nós, conscientes da volubilidade deste ótimo.

A pergunta objetiva sobre o que é preferível deve impor-se como um imperativo categórico. Só assim nos permitimos, enquanto sujeitos racionais, gerir convenientemente a satisfação de um qualquer interesse. O valor de algo reflete-se não no que queremos mas no que deveríamos querer, porque são estes últimos desejos os representativos dos nossos melhores interesses. A questão sobre as nossas preferências deve ser permanente, pois só deste modo seremos capazes de fazer uma escolha imparcial e bem intencionada. Só assim teremos garantias quanto aos valores que se realizam através dos fins por nós alcançados.

Assim, é importante refletirmos sobre os objetivos que defendemos para a organização escolar, ou seja, que cidadãos quer formar, e quais as condições pedagógicas que permitem a concretização desse propósito. Neste quadro de racionalidade, a organização escolar, melhor dito, os seus atores educativos, vivem numa conjuntura de irracionalidade pedagógica quando deixa de formar esse cidadão e quando “adota mecanismos de coordenação e de ação docente e administrativa que inibem e impedem essa formação” (Medeiros, 2007, p.41).

 

A Escola Pública Portuguesa

Ao analisarmos as relações Escola /Estado somos tentados a referir o caráter marcante que apresentam, provavelmente, resultado do entrecruzamento de forças díspares e antagónicas do ser humano, do qual se destacam o desejo de mandar e de dominar. Excetuando a excessiva generalização a que a afirmação, de que todos somos provocados pelo desejo de sermos importantes e de nele termos o nosso mais poderoso móbil, pode aludir, estamos em crer que todos já experimentámos, mesmo que distintamente, a sensação de poder ou de querer ter poder.

Muito embora a escola seja considerada, por excelência, como o espaço privilegiado na constituição de sujeitos democráticos e autónomos, paradoxalmente, tem-se assistido a reiteradas práticas que se têm, exatamente, caracterizado por promoverem valores opostos, que persistentemente insistem na sua realização à margem de políticas educativas comprometidas com esses objetivos. Com efeito, “na utilização do termo democracia, seja quando o seu sentido salienta uma forma de organização de vida em sociedade ou quando salienta uma forma de governo, está presente uma conceção de direito de participação” (Carvalho, 2012b, p.104).

Embora o intuito não seja menosprezar os progressos realizados ao longo da história da escola, no sentido de se verem concretizados esses desígnios, estamos certos de estar longe de alcançar os propósitos de uma educação para a democracia, para uma maior liberdade e autonomia dos cidadãos. Desafios que têm gerado um sentimento de receio pela alteração que acarretam em termos organizacionais, desde logo prevendo-se como indispensável que a escola promova condições nesse sentido, exigindo que atores educativos vivam a escola, em vez de se manterem sobrevalorizados os conteúdos em forma de normativos que têm conduzido a uma perceção de alguma imutabilidade no que concerne às grandes linhas orientadoras da organização escolar. Este é um dos motivos pelo qual as críticas que são endereçadas à escola têm uma referência explícita ao Ministério da Educação e Ciência que tem materializado o controlo político-administrativo da escola que a centralização política e administrativa fomentam.

Acusada de servir os interesses de uma minoria de burocratas contraria a pretensa neutralidade de que a burocracia se arroga, e adquire uma concepção que traduz uma efetiva carga negativa que os conceitos de ineficaz, inflexível e ineficiente transportam quando a administração centralizada do ensino é apelidada de burocrata.

Sob o rótulo da democracia e da participação as reformas que foram ocorrendo a partir do início da década de oitenta até aos nossos dias foram decretadas por instância superiores que, por vezes, afastadas da realidade produziram soluções dela distanciada, provando, mais uma vez, que as expetativas alheias, paralelas às dos atores que vivenciam a realidade educativa nas suas práticas, não resultam, apenas servem para confirmar o paradigma da centralização política e administrativa e permitem uma desresponsabilização na tomada de decisões. Os princípios de uma política de controlo asseguram um tipo de racionalidade cujo objetivo é assegurar a preservação de um sujeito conformado segundo os interesses de quem detém o poder.

A crença, apesar de ingénua, sobre a ideologia democrática que rege as escolas, faz passar os interesses democráticos no âmbito da lógica interpretada pelo próprio Estado, o que acaba por contrariar a essência da verdadeira democracia garantindo a regulamentação da gestão democrática das escolas à custa de normativos e decretos que mantêm a ordem educativa subordinando o particular ao geral, o que faz da uniformização um conceito de utilização frequente e recorrente.

A criação de parcerias revela a tentativa de transferir responsabilidades do Estado para a família e, em particular, para a Escola mas, também, evidencia uma lógica de Estado mínimo que, no limite, fragiliza a própria escola pelo quase abandono. Facto que tem implicações materiais mas, igualmente, implicações de cariz mais subjetivo quando em causa está o modo como os próprios atores educativos se sentem em termos de valorização, o que justifica que a desmotivação e o descontentamento se tornem visíveis (Fortuna, 2000).

Quando o discurso democrático veiculado pelas políticas educativas não se estabelece e se concretiza na prática fica clara a crise de legitimidade a que a sociedade assiste. A afirmação de que “Há políticas que não se materializam na prática e há práticas (…) que não conseguem ser instituídas a partir das políticas” (Medeiros, 2007, p. 48), encontra expressão na escola pública portuguesa pelo paradoxo que muitas vezes parece que se estabelece entre as políticas educativas e as práticas, o que tem ajudado ao divórcio entre os objetivos educativos e o exercício democrático e participativo entre os diferentes atores educativos.

É fácil duvidar de grandes empreendimentos que têm por objetivo mudar o sistema a partir de cima, por admitir que esse novo sistema se imporá de um modo autoritário e porque, também, duvidamos do valor de um movimento de cima para baixo que se baseia no pressuposto de uma relação de causalidade unívoca, crítica que encontra suporte em Canário quando diz que “As reformas impostas ‘de cima’ produzem mudanças formais, mas raramente, transformações profundas, duráveis e conformes com as expectativas e os objectivos dos reformadores” (1991, p. 6), por não se privilegiar o envolvimento da comunidade educativa. Parece óbvio que não será a administração central a romper com o paradigma da administração centralizada; esse seria um exercício de puro paradoxo, como categoriza Lima (2005, s/p.). Na realidade é que existe sempre relutância em abandonar o poder, pois a vontade de o exercer é grande, e é em grau idêntico à fraca vontade de aceitar a aplicação desse poder, levando a que a própria administração central se recentralize num claro exercício de sedimentação, por vezes complicando o já de si complicado sistema educativo, mudando rótulos mas mantendo as mesmas funções. Estas práticas podem evidenciar modos de reforma que não permitem que o aparelho educativo avance, antes que recue em todos os planos perante a aceleração da realidade construindo um desfasamento entre ambos.

Suspeitamos, igualmente, de reformas que se façam só a partir de baixo, fazê-lo seria contrário ao que afirmávamos acerca das relações de causalidade unívoca e que as palavras de Lima confirmam quando escreve que “Se a mudança da cara da escola não pode, por definição, ser realizada sem (e muito menos contra) a escola, dispensando os actores escolares mais imediatamente centrais à acção pedagógica, fica claro que ela é igualmente inatingível exclusivamente a partir da sua iniciativa” (2000, pp. 40-41). Naturalmente que essa dificuldade tem forte ligação aos interesses, às racionalidades e às relações de poder que se estabelecem entre os professores que estão longe de serem convertíveis a projectos singulares ou a programas de acção homogéneos e consensuais (Lima, 2000).

Uma perspectiva que considerasse o equilíbrio destas duas forças, centro e local, permitiria a complementaridade, implicando-as no processo reinventando o poder, obrigando a considerar os dois lados sem prejuízo de qualquer um, numa atitude de compromisso, porque ambos são precisos. Estaríamos de acordo com a ideia de pareceria, por um lado escolas mais “autónomas e mais decisoras dos seus ramos educativos, apoiadas e não abandonadas pela administração, em pareceria e não em posição de subordinação hierárquica” (Lima, 2000, p. 57). Neste caso, não estaríamos a considerar a simples delegação de poder que pode resultar num artifício de poderes apenas por empréstimo, e, assim sendo, a qualquer momento é possível de retirar, mas o verdadeiro poder de iniciativa e de facto assente no princípio de subsidiaridade. Princípio que se concretiza numa maior liberdade para os atores educativos, porque são quem está em melhores condições de fazer e prontamente decidir no âmbito da sua própria realidade, sem terem necessidade de competir com a administração desconcentrada. Diríamos que o Estado não deve fazer aquilo que os professores fazem melhor. Ou seja,

Se considerarmos que a atividade do professor encontra a sua razão de ser no enquadramento do binómio ensino/aprendizagem, então é porque B se encontra desprovido de certos conhecimentos que A se justifica enquanto profissional. Nesse sentido, este último estará mais apto e mais capaz para deliberar relativamente aos demais” (Carvalho, 2012b, p.107).

Como resultado desta prática decisória, de não participação ao nível das políticas educativas, os atores evidenciam comportamentos de resistência. A verdade é que elas traduzem a imposição e a prepotência do Ministério da Educação e Ciência porque não chegam como possibilidade de discussão, ou mesmo de negociação, para chegar a um consenso, abrindo a possibilidade a novos futuros, por isso, resta à escola cumprir o já deliberado. Por este facto, não é possível categorizar a racionalidade da administração pública portuguesa como democrática e emancipatória pois não se fundamenta nas relações de intercomunicação dos sujeitos, que tem no objectivo de encontrar consensos a sua orientação. Estamos longe de uma racionalidade crítica, assente na disposição de corrigir as próprias convicções.

 

Diretores Escolares

O desenvolvimento da racionalidade democrática e emancipatória na administração pública portuguesa parece encontrar, também, algumas dificuldades nas práticas dos diretores, pois enredados nas teias da burocracia, quando estes têm como preocupação primeira cumprir as diretrizes do Ministério da Educação e Ciência, não encontram as condições que propiciem relações assentes no exercício democrático e crítico no interior da própria escola. Algumas das práticas dos diretores escolares são reveladoras de uma liderança autocrática de contornos fiscalizadores, o que parece estar em coerência com uma ideia de profissional ao serviço do Estado. A figura do diretor que o Decreto-Lei 75/2008 determina parece encontrar justificação “no quadro de uma ideologia de feição tecnocrática e gerencialista, ficando por demonstrar por que razão uma liderança individual é superior a uma liderança colegial” (Lima, 2008, p. 2), como se “boa liderança” e “liderança forte” fossem termos coincidentes (Lima, 2008, p. 2), ou ainda, como se os “órgãos colectivos” impedissem que as lideranças individuais surgissem (Barroso, 2008, p. 6).

Há que admitir que o director escolar não tem a sua vida escolar facilitada se considerarmos que são vários os conflitos de interesse em presença, por um lado, os do Ministério, por outro, os dos professores e restante comunidade educativa, o que o obriga a transformar-se em mediador destas diferentes lógicas

tendo em vista a obtenção de um acordo ou compromisso quanto à natureza e organização do ‘bem comum’ educativo que a escola deve garantir aos seus alunos. Isto significa que ele deve possuir, não só competências no domínio da educação, da pedagogia e da gestão, mas também capacidade de liderança e sentido de serviço público, necessárias ao exercício da dimensão político-social da sua função (Barroso, 2008, p. 2).

Porém, temos que reconhecer que este diretor escolar à medida que se vai afastando da dimensão pedagógica fica mais próximo da sua atividade administrativa.

Não é estranho, por isso, que em Portugal a problemática em torno dos gestores escolares tivesse arrecadado grande protagonismo e visibilidade tanto pela importância conferida ao funcionamento da organização escolar como às funções que os professores porventura pudessem exercer, levando a que se tivesse instalado uma polémica de duas frentes distintas. Por um lado, uma proposta, congruente com a perspectiva apostada num técnico de gestão que se assumia pelo seu conhecimento especializado, de onde derivava que o governo da organização se reduzia a uma tarefa puramente técnica e, por isso, cientificamente sustentada, e, por outro, uma proposta que apontava no sentido de um gestor professor, o que, presumivelmente, aproximaria os decisores e destinatários das decisões. Porém, ficou convencionado que este deveria estar obrigado a uma formação nesse campo, conscientes das dificuldades que poderiam ser colmatadas ou atenuadas caso essa formação existisse, ao mesmo tempo que se dava conta de outras dificuldades que no exercício da prática educativa adquiriam relevante importância devido à dependência económica e administrativa das escolas e à falta de autonomia, como elucidaria Clímaco, com base no estudo realizado pelo Gabinete de Estudos e Planeamento e por si dirigido.

Nele defendeu que “saber gerir uma escola envolve competências específicas (…) que se aprendem (…). A formação para a direcção da escola é condição indispensável para a qualidade da gestão que pretende ir além da subsistência diária dos estabelecimentos” (1988, p. 43). Situação que em nada promovia uma atitude em vista ao exercício de cargos de gestão mas que se caracterizava pela ausência de uma liderança forte e de uma visão estratégica para o efectivo desenvolvimento da escola.

Nesta linha, considerou-se o alargamento da profissionalização dos professores, bem como a requalificação das suas competências, fatores decisivos na resolução do problema da gestão, permitindo-lhes garantir o controlo do seu trabalho de que são sintomáticos a sua interferência na gestão, na concepção, planificação, execução e avaliação do projeto educativo (Barroso, 1990).

Só uma conjuntura que possibilite a intervenção e a efetiva participação decisória dos professores na direção e gestão da escola é capaz de romper, no âmbito das suas funções, com denominações próximas do que se entende por trabalhador técnico, como se o professor tivesse que se objetivar em relação ao seu trabalho devido à ausência de preocupações relativas ao fim último do seu serviço docente, direcionando as suas preocupações para os meios, como se a função de professor se encontrasse circunscrita a uma dimensão meramente técnica. Como resposta, segundo Lima, impunha-se “a progressiva formação dos gestores escolares recrutados de entre os professores com suficiente vivência e experiência escolares e com perfil e motivação para virem a integrar uma carreira” (1988, p.157), declarando a importância de uma componente que clarifique a vertente organizacional da escola e a correspondente competência necessária nesse domínio, contudo, não permitindo que se verifique a alienação relativamente aos aspetos pedagógicos. No contexto desta problemática, como tentativa de se assegurar um maior rigor e comprometimento, a candidatura a gestor deveria ser acompanhada por um programa de ação que imputaria maiores responsabilidades ao candidato, o que por princípio seria compatível com uma política de maior autonomia da instituição a gerir e, simultaneamente, congruente com a descentralização (CRSE, 1988, p. 167) e com o esboço de um novo órgão de direção da escola. Neste sentido, os gestores, desvincular-se-iam da imagem de representantes locais da administração central, de simples funcionários do governo cuja função seria a de fiscalizar o cumprimento das normas e regulamentos, e ser-lhes-ia permitido projetar outras trajetórias para as suas escolas e, assim, diferenciar na uniformidade.

Esta conceção de gestor confere primazia à dimensão pedagógica em prejuízo da administrativa, o que resultaria numa maior ingerência na esfera decisória por parte dos professores e desfazia qualquer mal entendido sobre o objetivo que esteve na base da distinção que a Comissão de Reforma nos anos oitenta fez entre direção e gestão. O objetivo não foi distinguir entre aqueles que pensam e aqueles que executam, entre quem dirige e quem gere, pelo contrário, tal como esclarece Lima quando diz que “o que dissemos foi: a direcção deve ser democrática e participativa; a gestão pode ter variadíssimas soluções, como sucede em outros países. O que é verdade é que a gestão, sendo um acto mais ‘técnico’ deve estar subordinada à direcção política e democrática colectiva” (2005, s/p.). Razão pela qual em nada repugnaria o autor a existência de um administrador escolar ou de uma gestão unipessoal se o essencial estiver salvaguardado, e isso passa por “uma direcção que efectivamente dirija a escola de forma legítima, democrática e participativa” (2005, s/p.). Mas isso implica romper com o paradigma vigente e passar para a descentralização e consequente autonomia.

Não foi por acaso que a Proposta de Lei de Bases da Educação que o XV Governo Constitucional apresentou à Assembleia da República tivesse sido motivo de forte contestação no que dizia respeito a esta temática. Ao fazer constar no capítulo da Administração do sistema educativo, no artigo 44, alínea 4, que: “A direcção executiva de cada agrupamento de escolas ou de cada estabelecimento não agrupado, do ensino básico e do ensino secundário, é assegurada, nos termos da lei, por órgãos próprios, singulares ou colegiais, plenamente responsáveis, cujos titulares são escolhidos mediante um processo público que releve o mérito curricular e do projecto educativo apresentado e detenham a formação adequada ao desempenho do cargo”, fazia recear pela descentralização e autonomia, fazendo do gestor um funcionário ao serviço da administração central. Por esta transcrição fica evidente que à temática da gestão da escola não é marginal o processo utilizado na designação do seu responsável (Carvalho, 2012b), tanto quanto não o é a importância de um verdadeiro órgão de direção que se encontre dentro da escola, e não fora, como de resto acontece, o que se traduz em maior legitimidade para o centro e não para as periferias o que subentende uma rutura com as práticas democráticas.

A reforma da escola de acordo com o Decreto-Lei nº 172/91, quanto à seleção do diretor executivo, é suficientemente elucidativa da orientação seguida devido à ambiguidade que não foi capaz de ultrapassar quando se deseja salvaguardar a gestão democrática conseguida após o 25 de Abril de 1974 e se deseja um gestor que persiga a qualidade educativa. Considerações coerentes, de acordo com Lima “com as abordagens de tipo ‘neo-tayloriano’” (Lima, 1998: p. 57), em clara relação com soluções concordantes com princípios gerencialitas e tecnocráticos numa alusão inequívoca à ‘gestão racional’, considerações reiteradas com o Decreto-Lei 115-A/98. A racionalidade técnica ganha novo alento, confia-se a gestão a um órgão unipessoal e a retórica da modernização e da qualidade educativa assume excessivo protagonismo (Barroso, 1995: p. 49). Esta focalização obriga o responsável pela governação das escolas a cingir-se exclusivamente ao universo da gestão eficaz, como que descuidando a natureza plural das suas práticas e o confronto com a pluralidade não consentindo um saber atuar na complexidade, na globalidade que as práticas canalizam enquanto necessidades múltiplas, que não se compaginam com interesses particularistas que os parâmetros de uma gestão empresarial podem conter.

 

Conclusão

A emergência de uma racionalidade democrática e emancipatória para a administração da escola pública portuguesa é uma tentativa de afastar a racionalidade que tradicionalmente lhe está vinculada e que se caracteriza pelos pressupostos de produtividade e eficiência económica tão caros à administração empresarial, mas longe dos objetivos e funções sociais preconizados pela organização escolar.

Parece que a organização escolar ainda não foi capaz de romper com os simbolismos da participação transformando-se, pela lógica da descentralização, num espaço onde os vários atores educativos energicamente se possam assumir como reais participantes numa clara rejeição de ações administrativas altamente burocráticas, pois só assim as tomadas de decisão passariam a testemunhar uma liderança pela partilha do poder, sujeita a tensões mas aberta ao contexto macro-social, sem negar o diálogo reflexivo e crítico dos atores que fazem parte da escola. Só assim, a racionalidade democrática e emancipatória a que fazemos apologia, encontraria condições propícias à sua emergência e os sujeitos deixariam de estar enredados numa teia burocrática que “provoca a obstrução das relações comunicativas (…) tornando-as arbitrárias e autoritárias” (Medeiros, 2007, p. 123). A presença da racionalidade instrumental na administração escolar só se justifica no âmbito da realização de fins de caráter democrático e emancipatório dos sujeitos. Assim, é necessário que a competência do gestor não fique restrita ao campo gestionário, como componente divergente do ministério de professor e não abra caminho “a conceptualizações de práticas de meramente técnicas em oposição às educacionais, não permitindo a convergência de valores que possam determinar opções organizacionais e pedagógicas convergentes com o sentido emancipatório que a democracia encerra” (Carvalho, 2012b, p.110).

Com efeito, “Pensar numa educação, numa administração comunicativa, é o mesmo que concebê-la como processo em que os indivíduos deixam de ser manipuláveis para serem sujeitos de sua prática, porque se tornam ‘autores’ dos seus próprios sentidos” (Medeiros, 2007, p.141), é permitir a possibilidade de entendimento entre os diferentes atores educativos e reconhecer-lhes capacidade decisória, condição necessária à elevação da sua auto-estima que se encontra diminuída diante dos constantes limites que lhes são impostos por parte da administração central.

 

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LEGISLAÇÃO

Decreto-Lei nº172/91 Decreto-Lei 115-A/98 Decreto-Lei 75/2008

 

Data de recepção: Janeiro de 2013
Data de avaliação: Maio de 2013
Data de publicação: Dezembro de 2013