SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
 número14O acolhimento familiar numa perspectiva ecológico-socialSeminário: A educação em diálogos transculturais índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Revista Lusófona de Educação

versão impressa ISSN 1645-7250

Rev. Lusófona de Educação  n.14 Lisboa  2009

 

Setephen R. Stoer & António Magalhães (2005).

A diferença somos nós – A gestão da mudança social e as políticas educativas e sociais.

Desde o século XIX que o modelo científico dominava a investigação nas várias áreas do conhecimento. Tentando explicar e compreender o funcionamento do mundo, da vida e das sociedades, sempre ligado às conjunturas políticas e às decisões governamentais em vigor.

Actualmente estamos perante uma nova situação descrita por Stoer e Magalhães (2005) como uma “encruzilhada em que se parece encontrar o pensamento e a acção sobre as diferenças”(p. 10).

Os autores apresentam uma nova perspectiva de pensar a diferença da seguinte forma:

O acto de devolução de voz pode não escapar à delimitação de outro como objecto, desta feita através da nossa generosidade política. É neste sentido que nos colocamos sob a afirmação “ a diferença somos nós” a diferença, nesta perspectiva, é o produto de um jogo relacional no qual deixou de haver um centro privilegiado a partir do qual se pode determinar quem são os outros, quem são os diferentes. (p. 10)

Será difícil neste momento falar em inclusão numa fase onde as pessoas já deveriam estar plenamente incluídas na sociedade. Ao criar projectos de inclusão está-se a criar uma diferença, a partir de “um olhar marcado pela diferença” ou será ainda que este olhar não irá excluir? Deste modo, as relações existentes nestas duas posições e como os autores definem “os diferentes em relação ao Nós”

Além disso, no mercado e numa perspectiva de inclusão social, parece existir um contra-senso em falar em inclusão, uma vez que passado tanto tempo já deveríamos estar a pensar em temos de sociedade inclusiva. Curiosamente em termos de mercado “foi criado um espaço global onde todos os indivíduos, independentemente das suas diferenças, parecem ser incluídos como consumidores” (p. 11). Nesta lógica, o ser incluído é essencialmente um potencial consumidor, onde a identificação das pessoas se realiza em termos de necessidade de consumo. Esta ideologia é denominada pelos autores de “concepção medieval” que segundo estes assemelha-se bastante à moderna e onde este tipo de inclusão nega qualquer diferença. Assim, esta pretende redefinir a inclusão social negando a sua identidade própria. Levanta ainda várias questões nomeadamente em termos de globalização e opõe-se à ideia “segundo a qual a inclusão se deve desenvolver com base na lógica de que quem não é consumidor é excluído” (p. 13). Defende também que a “ justiça redistributiva esteja ligada ao reconhecimento das diferenças” (p. 13).

As decisões no campo da sociologia da educação numa época de globalização mostram as implicações das decisões políticas nos processos de mudança e propõem um “dispositivo hermenêutico que nos permita simultaneamente escapar ao anything goes (vale tudo) pós- modernista e localizar as acções políticas na nova geografia social dos processos de decisão” (p.19)

Em primeiro lugar surge a perspectiva de que os projectos políticos são projectos de mudança social, com vista a sua legitimação política sustentada por uma narrativa fundadora, que segundo os autores, baseados em Cood (1988) defendia que as palavras proferidas pelos políticos não vão de encontro aos reais interesses do povo e sobretudo, não representa “ a real heterogeneidade da sociedade e a diversidade dos interesses” (p.20).

Os autores referem igualmente Dale (1986) que estudou a política educativa dividindo-a em três projectos: o de administração social, o de análise das políticas e o da ciência social, salientando que no resultado obtido verifica-se uma divisão nítida entre o trabalho dos políticos e dos administradores e o trabalho dos cientistas sociais. Independentemente da natureza do projecto “a decisão política é um texto dentro de um (con)texto, sua determinação directa entre um e outro” (p. 22). Acrescentam que na língua inglesa existem duas palavras que diferenciam bem estas duas situações a política: politics e policies, que é a concretização directa das decisões, mas na nossa língua não existe essa nuance.

Como exemplo significativo desta situação, Stoer e Magalhães (2005) referem a criação de turmas de currículo alternativo, no sentido de combaterem o insucesso escolar e abandono que se confrontam com a política global e a gestão flexível do currículo. Aliás, na prática estas turmas tornam-se um depósito de alunos com problemas de comportamento, que são rotulados na própria escola pelos colegas, pelos próprios professores e que originam a sua exclusão no seio da sociedade. No contexto escolar estes alunos são postos de parte e rotulados negativamente ou como os autores referem proporcionam “a gestão controlada da exclusão” (p. 23).

Relativamente às mudanças sociais enquanto consequências de decisões políticas nem sempre são directas ou até nem chegam a obter qualquer mudança. Assim, citando os autores: “aquilo que é desejável em termos políticos, geralmente cristalizado em torno das utopias tem sido de algum modo heterogeneizado, dando lugar a heterotopias mais ou menos incomensuráveis entre si”(p. 25). Estes autores referem também vários exemplos: projectos ecologistas, feministas, movimentos homossexuais entre outros que normalmente não chegam a concretizar nenhuma mudança social. Pelo contrário, estas poderão ser possíveis através da acção dos próprios actores “a própria relação entre os actores que é susceptível de ser localizada como emancipação, como dominação, como alienação, etc..., e não a acção política aparentemente dimanada da substância de cada um dos actores” (p. 26).

A “Nova Classe Média” e a reconfiguração do mandato endereçado ao sistema educativo

Neste capítulo, os autores realizam uma retrospectiva da educação face às exigências do mercado de trabalho ou seja, a escolarização aparece como uma possível resposta necessária à sociedade e “ao mesmo tempo como um instrumento a utilizar para escapar às origens sociais e familiares como consequência dessas mesmas origens”(p.41). Surge então uma nova classe social “a nova classe média”, que no campo da educação faz novas exigências e reivindica os seus direitos. Em termos económicos, as regras são normalmente impostas pelo capital e transforma hábitos, costumes e a cultura dos povos de uma forma global, “fenómenos que vão desde a transformação da intimidade à reinvenção das tradições e o culto do efémero” (p.41).

Deste modo, surgem novos modos de vida ligados directamente ao consumo que transforma a sociedade. Assim sendo, convém reflectir sobre esta situação a um nível planetário, porque compromete igualmente toda a existência humana, já não se trata de problemas isolados de um só país, mas que dizem respeito ao ser humano em geral. Os autores advertem que na sociedade surgem novas circunstâncias e onde “efectivamente, as implicações destas mudanças de teor cultural conduzem-nos a uma análise não só de estilos de vida, como também do surgimento de novas formas de cidadania” (p. 41).

Educação, sociedade em rede e redefinição do conhecimento

O capítulo três é essencialmente baseado no mandato para o sistema educativo de Dale (1996) que “sofreu transformações que não se limitam à formação da cidadania e à preparação para o trabalho, implicando também mudanças no âmbito da dimensão referente ao desenvolvimento de capacidades individuais” (p. 43).

Ultimamente a comunidade em geral tem exigido da escola os resultados obtido e as contas do que gasta ou seja a prestar contas do dinheiro investido pelo estado. Por outro lado exige que esta responda às suas necessidades, como é o exemplo do preenchimento de horário com actividades extra-curriculares, onde as crianças estão ocupadas até ao momento em que os pais as possam ir buscar. De igual modo é solicitada uma resposta educativa que propicie a socialização escolar e a formação de trabalhadores. Nesse aspecto é curioso que estas exigências se contradizem: por um lado pede-se à escola que fomente a socialização e a emancipação dos indivíduos, por outro lado é-lhe também solicitada a formação de trabalhadores disciplinados e com competências adequadas ao mundo laboral. Uma das críticas realizada ao sistema escolar é a de não conseguir preparar os alunos para a realidade laboral.

Esta combinação da racionalidade moderna com a lógica do capitalismo e com a da organização estatal teve amplas consequências nos mandatos dirigidos à socialização escolar, não só visível na já mencionada formação de bons operários, mas também na própria concepção do papel do conhecimento no desenvolvimento individual. (Stoer e Magalhães, 2005, p. 45)

Consequentemente, será sempre difícil corresponder às exigências do capitalismo feroz onde o conhecimento aparece como formação e ao serviço do mesmo. Cria-se então um fosso entre a pedagogia e a performance, ou seja, é necessário clarificar o conceito que é aproveitado enquanto instrumento ao serviço do mercado do trabalho e do poder político:

como se o conhecimento veiculado na relação ensino/aprendizagem fosse uma extensão das exigências da globalização económica, por um lado, e função das novas necessidades emergentes da reconfiguração científica e tecnológica dos processos de produção e distribuição por outro. (Stoer e Magalhães, 2005, p. 47)

Pelo exposto as exigências da sociedade realizadas à escola aumentam cada vez mais tornando-se dificilmente exequíveis.

O conhecimento como meio de formação estrutura-se basicamente em dois pontos: “como competências essenciais”, necessárias ao funcionamento autónomo de qualquer indivíduo e como formação integral que está longe ou afastada de qualquer relação com o trabalho. Estes dois pontos parecem cruzar-se com “o surgimento da sociedade em rede”. Os autores referem que “ao tornar-se capital informacional comunicacional, o conhecimento parece mudar de natureza” (p.52). Alertam e interrogam-se sobre o facto da rede se ter transformado e ser conivente com o sistema, ou seja, estar ao serviço da nova economia global. Será que é possível ficar fora desta ou fora deste sistema de informação?

Este último tipo de reconfiguração do conhecimento é condicionado pelo facto de ele ser simultaneamente local e global, isto é, o conhecimento produzido localmente, dado que não existe independentemente da estrutura capitalista globalizada, tem uma dimensão global. (Stoer e Magalhães, 2005, p.57)

No seguimento deste tema, surge uma preocupação com a inclusão e a “emancipação humana”, que segundo os autores, importar resolver, no sentido de saber se a sociedade pretende desenvolver nos indivíduos capacidades que respondam ao mercado de trabalho ou se quer um cidadão capaz de decidir o que pretende para si próprio, para a sua espécie e para o planeta. Na opinião de Pernoud (2001), citado pelos autores, “a competência é uma mais valia acrescentada aos saberes: a capacidade de a utilizar para resolver problemas, construir estratégias, tomar decisões, actuar no sentido mais vasto da expressão” (p. 55).

Cinco lugares do impacto de exclusão social

A questão central apresentada pelos autores, neste ponto, não se refere à diferenciação de terminologias como “informação” e “conhecimento”, mas sim à “sua relação nos contextos de agência social”(p.58), em que questões como a Inclusão/Exclusão social implicam, necessariamente transformações da sociedade em si, quer no contexto europeu quer a um nívelmais global.

De um modo geral as exigências da economia internacional esquecem as necessidades individuais ou seja cada indivíduo é encarado como um potencial consumidor caso não corresponda aos padrões impostos pelas exigências do capital, o mesmo acabará por ser excluído da sociedade e até marginalizado.

Stoer e Magalhães, neste capítulo realizam uma análise detalhada e com diferentes perspectivas em vários contextos nomeadamente em “ cinco lugares – o corpo, o trabalho, a cidadania, a identidade e o território – onde a inclusão/exclusão social produz o seu impacto” (p. 61). Os autores utilizam como referência três paradigmas socioculturais que englobam as sociedades tradicionais, as sociedades modernas e as emergentes, sociedades pós-modernas.

Nas sociedades pré-modernas, o território era definido pela comunidade local. A exclusão social resulta do facto de não se pertencer a essa comunidade. Assim, o que provém de fora da comunidade e do seu território é encarado como uma ameaça.

Nas sociedades tradicionais o indivíduo incluído experimenta um forte sentimento de pertença, uma vez que partilha os valores culturais da comunidade, apropriando-se dos seus símbolos sociais, costumes “rituais” próprios. A sociedade da antiga Grécia é disso um bom exemplo, na medida em que quem nascesse fora da cidade (designadamente os escravos) tinha um estatuto inferior e era pura e simplesmente excluído.

Nas sociedades pós-modernas “o território torna-se nacional em escala global”, exercendo uma cultura planetária. Dale (2000), citado pelos autores definiu esta situação como uma “cultura mundial comum” (p. 116). O exemplo mais flagrante é a Internet que conseguiu criar uma “sociedade em rede”, onde quem está na rede está incluído, mas quem não está ou não faz parte da rede é excluído.

Numa sociedade de consumo, quem comanda é o capital e o fluxo de dinheiro que, segundo os autores, acaba por deshumanizar:

O capitalismo desteritorializa radicalmente, por um lado, a produção, a distribuição e o consumo e, por outro, identidades, o que significa que vão sendo criadas condições para que as identidades já não sejam potencialmente baseadas num local, mas antes cada vez mais fundadas nos estilos de vida e nas crenças partilhadas. (p.117)

Giddens (1999) definiu como “reinvenção da tradição”, uma filiação em princípios e estilos de vida que se agrupam, como é caso dos verdes, entre outros. Pelo exposto “a definição de território é determinada pelo paradigma do qual ele faz parte e a partir do qual é interpretado” (p.117).

Nos contextos descritos pelos autores que expõem esta nova realidade assim, “ novas formas de identidade, novas formas de cidadania, novas formas de posicionamento no mundo do trabalho, novas formas de pensar e de viver o território e novas formas de assunção do corpo por parte dos indivíduos e dos grupos” (Stoer e Magalhães, 2005, p. 118). Por sua vez, Giddens (1999) definiu esta nova realidade como sendo uma “sociedade sociológica”.

Em forma de conclusão e parafraseando os autores:

Com alguma frequência, o mundo que generosamente queremos construir para os outros é precisamente o mesmo em que nós próprios queremos ser incluídos. Assim, lutar pela inclusão é lutar pela afirmação da diferença própria e não para um mundo próprio. (p. 123)

Daí “A diferença somos nós”, onde somos nós próprios que criamos as diferenças e dentro das nossas próprias diferenças somos “desiguais”.

A incomensurabilidade da diferença e o anti-antietnocentrismo

Neste capítulo, os autores tentam encontrar um quadro de referências quanto ao relativismo e ao etnocentrismo. Como autores de referência, evocam Clifford Geertz (1984) que escreveu sobre o relativismo e Richard Rorty (1991) que definiu a incomensurabilidade da diferença da seguinte forma: “trata-se, “para nós” (sic), de uma tentativa de comunicação entre “nós” e “pessoas” que não podem ser consideradas como possíveis parceiros de conversas” (p. 126).

Ainda segundo Stoer e Magalhães (2005), neste caso estes, são considerados como etnocentristas. Como exemplo, é relatado o caso de um índio americano que tinha problemas de rins e precisava de fazer tratamentos de hemodiálise; tendo ignorado as orientações dos médicos no sentido de deixar de beber álcool, acabou por morrer. Neste relato é explicado que a recusa em deixar de beber é condenada pela classe médica, no entanto, o índio foi sujeito aos tratamentos como qualquer outra pessoa.

O índio americano, cidadão americano, precisava de tratamento, foi inscrito na lista de espera dos cidadãos que aguardavam o mesmo tipo de tratamento e, quando chegou a sua vez, foi tratado como todos os outros...Isto é, os médicos tinham que actuar em nome da justiça para todos, justiça essa crucial para que a sociedade funcione. Se tivessem assumido o quadro cultural do índio teriam postos em causa os direitos dos cidadãos, a maior parte dos quais pertencente a quadros culturais diferentes. (p. 128)

Rorty diferenciando “agentes do amor e agentes da justiça”, refere que em todas as sociedades democráticas deveriam existir estas duas vertentes, em primeiro lugar como “connaisseurs da diversidade” que têm como objectivo principal a “inclusão com base na diferença e como também “guardiões da universalidade” em que defende a promoção da cidadania fundada no princípio da igualdade de oportunidades” (cf. Rorty, 1991, citado por Stoer e Magalhães, p. 128).

Seguidamente, nesta obra, os autores realizam uma reflexão em torno da diferença na sua incomensurabilidade e referem Shweden (1997) que apresentou formas de socialização e “enculturação”, ou seja, pessoas dentro de um mesmo grupo cultural, “dentro dos quais os indivíduos se reconhecem e são reconhecidos, como pertencentes a esse grupo, a essa sociedade” (p. 130). Assim, nas sociedades existe uma variedade de grupos culturais que possuem os mesmos valores universais e os mesmos padrões de comportamento.

Ainda neste capítulo, é abordada a questão do multiculturalismo, em que os autores propõem a criação de propostas de acção social e políticas que favoreçam esta realidade. São também referidos e citados vários autores, nomeadamente Chavez (1994) que alertou para o perigo da “naturalização das alteridades culturais”, onde a relação com a diferença poderá transformar-se em integração da cultura dominante.

Falam ainda da renovação do multiculturalismo como se fosse um “jogo de relações com a diferença cultural no jogo mais amplo que é o dos processos sociais” (p. 133) e onde a tolerância assume um papel de consciência. No entanto, os autores questionam “a própria natureza arrogante da tolerância, enquanto máximo de consciência possível daquilo que é susceptível de ser aceite” (p. 134). Referem o ocidente como um exemplo de cultura dominante que tem mantido até agora a sua supremacia.

No mundo como um bazar de Kuwait, os autores enquadram estas mudanças “numa época de globalização”, onde o mundo se parece cada vez mais com um “bazar do Kuwait, do que um clube inglês” com uma enorme diversidade de relações e onde a diferença prima em detrimento da homogeneidade e da uniformidade: “o eixo das relações sociais torna-se mais horizontal do que vertical, quer dizer, privilegia-se as relações entre culturas a partir da sua igualdade e não as relações hierarquizadas entre elas” (p. 134). Referem Rorty (1991) que definiu o bazar, não como uma “comunidade”, mas sim como uma sociedade civil.

Defendem também uma cidade mundial que teria responsabilidades, justiça e que seria baseada em ideais morais.

Na realidade, o mundo encontra-se cada vez mais desigual e esta visão de cidade mundial dificilmente se poderá concretizar ou terá permanecido somente como “uma promessa de modernidade não cumprida” (p. 135).

Contributos para a reconfiguração da educação inter/multicultural

No sexto capítulo, os autores apresentam quatro modelos de conceptualização e de legitimação da relação com a diferença, tendo em conta as políticas educativas e sociais:

- Modelo etnocêntrico: o outro é diferente devido ao seu estado de desenvolvimento (cognitivo e cultural);

Modelo da tolerância: o outro é diferente, mas a sua diferença é lida através de um padrão que reconhece essa diferença como legitima (a ser tolerada);

Modelo da generosidade: o outro é diferente e essa diferença é assumida como uma construção do próprio Ocidente;

Modelo relacional: O outro é diferente e nós também somos! A diferença está na relação entre diferentes. (p. 138)

Estes modelos, segundo os autores, têm em conta as sociedades ocidentais numa “perspectiva diacrónica e sincrónica” e as relações existentes com a diferença de uma forma interna e externa. Para tal, tentaram clarificar as intenções políticas e a sua aplicabilidade no terreno, numa perspectiva epistemológica e sociológica.

Na segunda parte deste ponto, relacionam estes modelos “assumidos como heurísticos” com o sector específico da educação inter/multiculturalidade e apontam para um necessidade de se centrar no próprio indivíduo que “pensa a diferença e não na própria diferença”, nas suas acções. Não obstante, este será aquele que percebe e se preocupa com esta questão e não como um representante da acção social. Finalmente, Stoer e Magalhães (2005) entendem que as diferenças sustentam uma postura epistemológica e política que se poderá assim, situar no modelo relacional.

A Europa como bazar: educação na Europa do conhecimento

Na tentativa de redefinir o conceito de igualdade, os autores em questão apresentaram a seguinte sugestão “trata-me como igual, mas deixa-me ser quem eu sou” (p. 165). Assim, esta obra “representa o nosso contributo para o repensar da igualdade num contexto em que a definição da cidadania se faz crescente a partir daquilo que, em termos individuais e grupais nos distingue dos outros concidadãos” (p. 165). Trata-se de um paradoxo que tem vindo a aparecer cada vez mais e onde deixou de haver um centro privilegiado a partir do qual as diferenças eram definidas. Essa perda de privilégio cognitivo e político levou os autores a perspectivar uma nova visão da situação de “A diferença somos nós”, o que implica que o “nós” é o produto do conflito sobre os outros e com os outros “nós”.

No modelo relacional onde “os espaços de relação em que o conflito não surge como um obstáculo à reinvenção das comunidades, mas como o próprio terreno a partir do qual o próprio contrato social é renegociado”(p. 166). Assim o principal objectivo é a emancipação da diferença.

O projecto da educação universal tal como foi concebido pelo “projecto da modernidade” e organizado de “cima para baixo” Top down pelo governo não parece ter obtido os resultados esperados porque a lógica social impõe uma organização de “baixo para cima”, ou seja, deverá ser construída a partir dos principais interessados, dos seus interesses, projectos e vontades de forma individual ou colectiva. Neste sentido a educação reclamada é:

Ao mesmo tempo um conjunto de ameaças e de oportunidades. Ameaças porque o risco é a de condenação a tornarem-se definitivamente individuais (esvaziando, assim, qualquer política educativa e / ou social enquanto projecto de responsabilidade colectiva pela satisfação das necessidades individuais: o indivíduo é responsável pelas sua educação, saúde, segurança etc...); oportunidades, porque permite colocar a educação nos projectos “globais” dos indivíduos desresponsabilização do estado e dos grupos. (Stoer e Magalhães, 2005, p.167)

Os autores, continuando com a mesma linha de pensamento, acreditam que se existe alguém que se sobrepõe ao outro, não será por ser certamente “mais sabedor e seguro acerca do que convém aos outros. Estes outros no fundo, na perspectiva que desenvolvemos surgem como um parceiro integral, cujo controlo político já não é desejável, nem possível exercer” (p. 168).

Em suma, gerir as políticas sociais é procurar, no fio da navalha, lidar com a incomensurabilidade das diferenças num mundo e particularmente na Europa, onde estamos definitivamente “condenados” a viver em conjunto” (p. 168)

Concluindo

À luz da informação e dos conceitos apresentados nesta obra, entendemos que dificilmente se poderá dar uma resposta realmente eficaz aos problemas da educação sem, ao mesmo tempo, se terem realizado transformações concretas no seio da sociedade. Será pertinente apurar que políticas educativas estão realmente associadas à filosofia da inclusão e se já deveríamos, neste momento, ter passado essa etapa e já estar plenamente incluídos, não sendo, por isso, necessário falar de inclusão!

Acreditamos, como os autores, que o modelo relacional será o mais adequado. Citando os autores, este modelo: “baseia-se numa forma de agência bastante mais modesta do que a agência da perspectiva do multiculturalismo crítico. Em vez de ser “emancipatória”, é reflexiva e, em vez de repor o domínio da mudança, propõe uma matriz tripla para lidar com a mudança” (p. 142).

Enquanto docente, pensamos que aceitar o que difere do nosso mundo é sempre uma tarefa complicada, onde a tolerância é muito mais que aceitar, vai mais além e pressupõe uma forma diferente de estar na escola. Esta postura terá que ser forçosamente diferente do comum, do que é habitual. Deverá também ser um modelo enquanto agente educativo promotor da diferença ou ainda, como Rortry (1991) definiu “agentes do amor e agentes da justiça”.

Anabela França Mota

anafranca@portugalmail.pt