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Revista de Gestão dos Países de Língua Portuguesa

versão impressa ISSN 1645-4464

Rev. Portuguesa e Brasileira de Gestão v.10 n.1-2 Lisboa jan. 2011

 

Fatores demográficos na percepção do risco de compra pela Internet

O caso de um site brasileiro de venda de ingressos

Mauro Maceira*, Frederico Carvalho** e Vânia Lima***

 

* Bacharel em Administração (UERJ), Bacharel em Informática (PUC-RJ), Mestre em Administração (IBMEC-RJ). Diretor da Ingresso.com Ltda., Rio de Janeiro, Brasil. mauromaceira@gmail.com

** Bacharel em Economia (UFRJ), Doutor em Economia (UCL-Louvain). Professor Associado da UFRJ, Rio de Janeiro, Brasil. fdecarv@gmail.com

*** Bacharel em Comunicação (FACHA-RJ), Mestre em Administração (IBMEC-RJ). Analista Consultora da QUALIMETRICA, Rio de Janeiro, Brasil. vaniamardeli@gmail.com

 

Resumo

O trabalho analisa o comportamento de compra de ingressos em um site brasileiro de comércio eletrônico, examinando aspectos relacionados ao risco percebido pelo comprador. O objetivo é testar a influência de indicadores demográficos selecionados sobre a percepção de risco. Foi realizada uma pesquisa eletrônica junto aos cadastrados no site, obtendo-se 3235 questionários válidos. Os testes estatísticos indicaram que compradores com maior grau de instrução percebem mais o risco de comprar na Internet e que e-compradores têm menos preocupação em fornecer o número do cartão de crédito do que não-compradores. A experiência na utilização da Internet influencia positivamente o volume de compras e negativamente o risco percebido. Pode-se concluir que as empresas que atuam no e-comércio devem não apenas divulgar as medidas de segurança que adotam, mas também facilitar e acelerar o processo de adoção do comércio eletrônico, familiarizando cada vez mais os internautas com a compra online.

Palavras-chave : Comércio Eletrônico, Compras pela Internet, Risco Percebido, Venda Eletrônica de Ingressos

 

Demographic factors and perceived risk of buying on the Internet: the case of a Brazilian website

Abstract

The paper investigates whether demographic variables can be associated to the risk of buying via the Internet as perceived by a convenience sample of users registered in a site selling entertainment tickets. The main purpose was to search for significant associations between demographics and perceived risk. An online survey comprising 3235 respondents has been conducted and all responses have been considered valid. Findings indicate that more educated buyers more frequently perceive the risk of buying, irrespective of how risk has been represented in the questionnaire. In addition to implementing more effective security initiatives, firms selling online should also segment their communication regarding them, so that required credit card and other personal data become either minimally employed or increasingly secured.

Key words : Electronic Commerce, Internet Buying, Perceived Risk, Ticket e-Sales

 

Los factores demográficos en la percepción del riesgo en las compras por Internet: El caso de un site brasileño de venta de entradas

Resumen

El trabajo analiza el comportamiento de compra de entradas en un sitio de comercio electrónico en Brasil, analizando las cuestiones relacionadas con el riesgo percibido por el comprador. El objetivo es poner a prueba la influencia de algunos indicadores demográficos sobre la percepción del riesgo. Se realizó una encuesta electrónica a los usuarios registrados en el sitio, y se obtuvieran 3.235 cuestionarios válidos. Las pruebas estadísticas indican que los compradores con niveles más altos de educación perciben más riesgo de comprar en Internet y los e-.compradores tienen menos problemas de proporcionar el número de tarjeta de crédito que los no compradores. La experiencia en el uso de Internet influye positivamente en el volumen de compra y negativamente el riesgo percibido. Se puede concluir que las empresas que operan en el comercio electrónico no sólo deben explicar las medidas de seguridad que adoptan, sino también facilitar y acelerar la adopción del comercio electrónico, haciendo cada vez más familiar a los usuarios la compra en línea.

Palabras-clave: Comercio Electrónico, Compras por Internet, el Riesgo Percibido, Venta Electrónica de Billetes

 

O crescimento do comércio eletrônico continua em curva ascendente, tanto em termos de faturamento, quanto em número de usuários. Um exemplo expressivo diz respeito aos resultados do e-commerce nos Estados Unidos, referentes aos feriados de fim de ano em 2008: excluindo e-leilões e despesas com viagens, o volume total de transações alcançou U$29,2 bilhões (€21,6 mil milhões, ao cambio da altura), com aumento de cerca de 85% em relação a 2005 (Comscore Network, 2009).

No Brasil, o comércio eletrônico cresceu 30% no ano de 2009, comparado a 2008, atingindo faturamento de R$10,6 bilhões (€4,2 mil milhões, ao cambio da altura). Um dos fatores que mais contribuíram para o crescimento foi o aumento da quantidade de adeptos. Ao final de 2009, o Brasil possuía cerca de 17,6 milhões de e-consumidores, representando crescimento de 30% em relação ao ano anterior. Para 2010, a expectativa de crescimento do faturamento é para cerca de R$14 bilhões (€6,3 mil milhões, ao cambio da altura) ( Webshoppers, 2010).

Outro marco referente ao caso brasileiro aponta que, em 2009, o país contava com 64,8 milhões de usuários de Internet com mais de 16 anos. Nesse cálculo consideram-se não somente os acessos privados e residenciais, mas também os acessos públicos realizados em escolas, lan houses e bibliotecas, entre outros (Ibope, 2010).

Apesar de prever um faturamento de 215 bilhões de dólares em 2012 para as vendas online (excluindo viagens) nos EUA, pesquisa recente (Acessogratis.net, 2010) sugere que os varejistas online continuam a enfrentar diversos desafios. Por exemplo, a maioria dos consumidores ainda prefere lojas físicas e passa pouco tempo buscando itens em lojas virtuais. Assim, as lojas eletrônicas ainda têm muito a fazer para aumentar o volume dos negócios pela rede. Espera-se que os esforços de marketing sigam duas direções: transformar não-usuários em usuários e aumentar o volume de uso dos compradores atuais. Para alcançar estes objetivos os profissionais envolvidos devem conhecer o comportamento de compra dos internautas e suas atitudes em relação ao novo canal de compras.

O objetivo do trabalho é investigar a influência de fatores demográficos selecionados sobre a percepção do risco de compra na Internet, utilizando dados levantados em uma pesquisa online junto a uma amostra de usuários cadastrados em um site de venda de ingressos. O texto está organizado em quatro seções, que se seguem a esta introdução. Na primeira são apresentadas as fontes bibliográficas que fundamentam o estudo. Nas duas seções seguintes expõem-se a metodologia e os resultados. As conclusões aparecem na quarta seção.

 

Revisão da literatura

Nesta seção serão brevemente resenhadas as principais fontes bibliográficas da pesquisa, começando com referências de caráter genérico sobre risco percebido, seguidas pelas referências sobre risco percebido na Internet.

· Generalidades sobre risco de compra

Partindo da idéia de que qualquer atividade de compra envolve riscos, Cordeiro, Silveira e Benevides (2004) oferecem uma revisão abrangente sobre diversos aspectos do risco percebido, cobrindo mais de quarenta anos. As autoras relembram que qualquer ação de um decisor tem conseqüências mais ou menos desagradáveis que ele não pode prever com certeza, de modo que é útil basear-se precisamente na natureza ou no custo de tais conseqüências para classificar os riscos em atividades de compra.

Por exemplo, para Hawkins, Best e Coney (1995), toda compra envolve o risco de que o produto ou serviço adquirido não corresponda à expectativa do comprador. A falha em atender esta expectativa pode resultar em diferentes tipos de custo, por exemplo:

· Custo social: um terno que não seja apreciado pelos colegas de trabalho;

· Custo financeiro: uma viagem cara durante a qual choveu o tempo todo;

· Custo de tempo: um conserto de carro em que o cliente é quem leva e busca o carro na oficina;

· Custo de esforço: um computador em que foi totalmente refeita a configuração conforme desejado pelo usuário e passa a apresentar problemas no disco rígido;

· Custo físico: um novo medicamento que produz efeitos colaterais dolorosos.

De acordo com esses autores, as lojas não tradicionais necessitam minimizar o risco percebido se vendem produtos que ofereçam risco social ou financeiro. Assim, o risco percebido é uma característica tanto do consumidor, quanto do produto ou serviço. Para os consumidores, não apenas os produtos comprados, mas também os serviços de varejo prestados nas lojas apresentam vários níveis de risco. As lojas tradicionais são tidas como de baixo risco, enquanto novas formas de varejo apresentariam alto risco.

Embora os consumidores percebam risco na maior parte das compras que fazem, compras fora de loja tendem a despertar maior percepção de risco (Doolin et al., 2005, p. 68). As percepções sobre risco nas compras via Internet estão presentes na maioria dos estudos sobre o comportamento do consumidor que utiliza essa nova mídia.

A compra pela web por ser realizada de forma remota, tem características semelhantes a diversas formas de compra domiciliar, tais como a compra por catálogo, por telefone ou por televisão. Em conseqüência, todas compartilham de alguns tipos de risco em comum, por exemplo, o fato de o consumidor não poder tocar o produto antes da aquisição.

Além desses riscos em comum, a navegação e a compra pela Internet envolvem outros tipos de riscos, inerentes à tecnologia utilizada, tais como a apropriação por terceiros (por exemplo, hackers) dos números de cartões de crédito ou de informações pessoais dos compradores.

· Risco percebido na Internet

Ao pesquisarem as motivações e preocupações dos usuários quanto à utilização da Internet, Korgaonkar e Wolin (1999, p. 56) encontraram dois tipos de percepção de risco: preocupações quanto a segurança e privacidade ao transacionar na web, e preocupações com privacidade ao navegar na web, que diferem das anteriores por não dependerem da realização de transações. Em outro estudo, Joines, Scherer e Scheufel (2003) pesquisaram a influência desses motivos e preocupações sobre o comércio eletrônico, descobrindo que as preocupações com segurança e privacidade têm papel preponderante na compra online.

Bhatnagar, Misra e Rao (2000, p. 103) descobriram que a influência da variável sexo depende da categoria de produto estudada. Para produtos com os quais os homens, em geral, têm grande experiência (por exemplo, hardware, software e eletrônicos), o fato de ser do sexo masculino significa maior probabilidade de comprar; para produtos tais como roupas ou comida, esse fato significa ter menor propensão à compra.

Trabalhando com preocupações relativas a privacidade, segurança do sistema, fraude e inconveniências, Miyazaki e Fernandez (2001, p. 32) concluíram que a segurança das informações pessoais e financeiras é o fator que mais influencia a percepção de risco e o volume de compras online. Interessante notar que, em seu estudo, os autores descobriram que a privacidade é uma grande preocupação dos consumidores com maior experiência na Internet, contrariando suposições anteriores de que mais experiência leva a um menor grau de preocupação com privacidade.

Também Liebermann e Stashevsky (2002) focalizaram sua pesquisa no risco percebido pelos internautas, pesquisando a influência de nove componentes de risco (entre os quais o Roubo do Número do Cartão de Crédito e o Fornecimento de Informações Pessoais) sobre usuários e não usuários de Internet.

Analisando a percepção de risco em termos demográficos, segundo o fato de o usuário já ter ou não comprado via Internet e segundo o volume de uso da Internet, descobriram que light users percebem mais risco que heavy users, e que os usuários que já compraram produtos pela rede percebem menos risco do que os não compradores. Em termos demográficos, as mulheres consideram mais risco na maioria dos componentes; as pessoas mais velhas percebem mais risco do que as mais jovens, o mesmo acontecendo com as pessoas casadas. A variável educação influencia a percepção de risco, pois pessoas com menor nível de educação percebem mais risco.

Merece menção o fato de que Miyazaki e Fernandez (2001) e Lieberman e Stashevsky (2002) encontraram a mesma relação inversa entre o nível de risco e a experiência na Internet. No entanto, no que se refere ao elemento de risco privacidade, os resultados foram diferentes. No estudo de Miyazaki e Fernandez (2001), quanto maior a experiência, maior a percepção de risco em relação à privacidade. Em contraste, Lieberman e Stashevsky (2002) verificaram que quanto maior a experiência, menos será considerado o risco de perda de privacidade.

Estudando os efeitos de diferentes tipos de risco e de atenuantes do risco em dois cenários de compra, Cordeiro, Silveira e Benevides (2004) descobriram que os mesmos tipos de riscos e atenuantes foram percebidos nos dois cenários, embora o grau dessa percepção tenha-se apresentado de forma dissimilar. Enquanto a percepção dos tipos de risco foi mais intensa na compra virtual, o grau de percepção dos métodos atenuantes foi semelhante entre os dois cenários. Segundo as autoras, os dois fatores de risco que têm uma percepção muito elevada na compra virtual, quando comparada a compra em lojas tradicionais, são o risco de desempenho do produto e o risco financeiro, retratado na segurança dos dados.

Em contribuição recente, Doolin et al. (2005) indicaram que tanto o risco percebido, quanto os benefícios percebidos ao comprar na Internet estão significativamente associados ao volume e à freqüência das compras, ao passo que a perda de interação social que ocorre na compra virtual está associada a uma diminuição do gasto online. Os autores concluem que sites de venda na web deveriam incluir características e atributos capazes de reduzir o risco percebido.

 

Metodologia

Nesta seção são sucessivamente descritos a hipótese de pesquisa, o universo e a amostra, e os procedimentos de coleta e tratamento dos dados.

· Hipótese de pesquisa

Inspirado nas fontes resenhadas, este caso propôs-se a verificar se existe relação entre, de um lado, a percepção de risco de compra e, de outro, alguns indicadores demográficos selecionados. Mais especificamente, a hipótese de pesquisa a ser investigada pode ser expressa como: a percepção de risco ao comprar na Internet está associada a indicadores demográficos, tais como sexo, idade, estado civil, grau de instrução, renda, ocupação e número de filhos até 12 anos.

Do ponto de vista estatístico, a esta hipótese de pesquisa está associada a seguinte hipótese nula: a percepção de risco ao comprar na Internet não está relacionada a indicadores demográficos, tais como sexo, idade, estado civil, grau de instrução, renda, ocupação e número de filhos até 12 anos.

Os resultados dos testes (sintetizados na Tabela) se referem a esta hipótese nula.

 

Tabela

Resumo dos testes da hipótese nula

 

· População, amostra e coleta de dados

Escolhido pela facilidade de acesso, o universo de estudo foi constituído pelos cadastrados de um site de vendas de ingresso que opera desde 2000, contendo hoje mais de 300 mil registros. Ao amostrar usuários efetivos é possível focalizar aspectos diretamente relevantes à compra online per se (Doolin et al., 2005, p. 67). Uma vez que o questionário foi auto-aplicado, a amostra efetiva resultante será do tipo «conveniência». Devido ao escopo negocial, os dados precisaram ficar protegidos durante determinado período.

A coleta baseou-se em questionário auto-aplicável, disponível em meio eletrônico, que ficou hospedado no site entre janeiro e abril de 2004. Segundo Cooper e Schindler (2003, p. 318), as principais vantagens do questionário aplicado via Internet são a possibilidade de realizar follow up com não respondentes e o custo mais baixo. Esses autores afirmam que, para uma amostra de 100, o custo da pesquisa na Internet seria seis vezes menor que o custo de uma pesquisa que utilizasse entrevistas por telefone. Pode-se acrescentar outras vantagens, tais como controlar a consistência das respostas através de críticas automáticas; garantir que um participante responda o questionário uma única vez; e tratar com facilidade os dados obtidos.

O questionário foi programado por uma equipe técnica com o propósito de garantir o correto preenchimento das questões e um layout agradável e de boa visualização. As críticas de consistência interna garantiram que todas as perguntas fossem respondidas e também o correto preenchimento de questões específicas, tais como as que permitiam somente uma alternativa como resposta ou aquelas que solicitavam uma escolha dentre alternativas. Em caso de erro no preenchimento, o respondente recebia uma mensagem na tela, identificando a pergunta em que houvesse erro.

Um e-mail foi enviado aos cadastrados no site, fazendo a chamada para a pesquisa e o questionário. Para estimular a resposta, foram sorteados brindes entre os respondentes. Na página de acesso ao questionário se explicavam os objetivos da pesquisa e a natureza das questões, além de informar sobre o sorteio de ingressos para aqueles que respondessem todas as questões.

A versão final do questionário consistiu de 48 questões envolvendo variáveis nominais, ordinais e intervalares e cobrindo aspectos demográficos, perfil de uso da Internet e percepção do risco de compra, entre outros.

Para representar a percepção de risco foram selecionadas quatro afirmativas, formuladas como escala de concordância de sete pontos:

· Não gosto de fornecer meus dados pessoais (nome, endereço, etc.) pela Internet;

· Ter de fornecer o número do cartão de crédito é uma razão muito importante para não comprar com mais freqüência na Internet;

· Tenho medo de que, depois de comprar pela Internet, comece a receber e-mails não solicitados;

· e, por último, fornecer o número do cartão de crédito pela Internet não é arriscado se o site é conhecido.

· Tratamento dos dados

Devido à natureza heterogênea das variáveis envolvidas, decidiu-se testar a hipótese utilizando t b , o coeficiente de correlação ordinal de Kendall, depois de proceder a recodificações que permitiriam interpretação numérica. De acordo com Blalock (1972, p. 421), t b deve ser preferido ao r de Spearman quando existem muitos empates nas ordenações. Neste trabalho, interessa mais analisar a existência de associação significativa entre as variáveis estudadas do que sua intensidade ou sua direção.

· Limitações

Nesta pesquisa, a amostra de conveniência foi retirada de um site de venda de ingressos, utilizado exclusivamente devido à facilidade de acesso. Seria de esperar que as características dos cadastrados nesse site configurassem um grupo de consumo diferente em relação a universos mais amplos, tais como os consumidores brasileiros em geral, ou os consumidores que compram pela Internet sem distinção de bens e serviços, ou, ainda, consumidores cadastrados em outros tipos de sites.

Mesmo utilizando esse cadastro de conveniência, poderia ter sido tentada a aplicação de amostras aleatórias, particularmente a amostragem estratificada, de modo a levar em conta características tais como idade, sexo, ocupação ou perfil de compra, entre outras. Neste caso, o processo de contato com os respondentes não seria tão facilitado quanto ocorreu com a participação voluntária dos cadastrados.

O risco percebido é aqui representado, separadamente, por quatro variáveis medidas como escala de concordância, cada uma referindo-se a um aspecto de risco tradicionalmente indicado na literatura revista. Não houve intenção de criar uma («nova») escala de risco a partir daquelas mensurações individuais, nem de modelar as relações entre as diversas variáveis, ao contrário do que é apresentado em Hernandez (2003) ou em Doolin et al. (2005). Na abordagem aqui adotada, perde-se em elegância, mas ganha-se ao impor menos estrutura aos dados.

Os dados foram coletados em 2004. Devido ao tamanho da amostra e ao caminho metodológico utilizados, esta «limitação de idade» cancela apenas a capacidade de propor ações gerenciais imediatamente válidas a partir dos resultados obtidos. Ademais, em certas áreas de conhecimento, a obtenção de dados reais no porte aqui alcançado sempre justifica a divulgação acadêmica; exemplos eloqüentes podem ser encontrados em Gamerman e Migon (1991) ou Façanha e Resende (2010).

 

Resultados

Nesta seção do artigo são descritos os resultados obtidos. A primeira subseção descreve a amostra efetivamente obtida pela aplicação do questionário, incluindo características demográficas dos informantes e suas respostas ao questionário. A segunda relata e comenta os resultados do teste da hipótese.

· Perfil da amostra efetiva

O questionário foi implantado no dia 26 de janeiro de 2004 e retirado do site no dia 5 de abril de 2004, totalizando 70 dias de coleta. No período, 3235 usuários cadastrados responderam ao questionário. Devido às críticas de consistência embutidas na programação do questionário, todos os questionários respondidos foram considerados válidos.

No que se refere à idade, os resultados mostraram grande concentração, com cerca de 52% dos informantes na faixa de idade entre 20 e 34 anos, sendo a média de idade da amostra igual a 31 anos. Na pergunta relativa ao sexo do informante, 43% foram homens contra 57% de mulheres. Apesar de a amostra efetiva diferir da literatura existente, em que os homens são a maioria na Internet, o resultado confirma que, historicamente, as mulheres são maioria nas promoções realizadas pelo site.

Quanto ao estado civil, a moda correspondeu à categoria dos solteiros, com quase 59% das respostas; considerando a distribuição das idades, é razoável que a maioria seja constituída por solteiros. Em relação ao número de filhos com menos de 12 anos, verificou-se que a grande maioria (74%) não tem filhos de quaisquer idades, o que é coerente com a maioria de solteiros.

Nas respostas sobre escolaridade, mais de 80% dos informantes já estiveram alguma vez em uma faculdade. De acordo com a literatura, as pessoas com mais educação são a maioria na Internet.

Os respondentes da pesquisa têm bom nível de renda se comparados à população em geral, de vez que mais de 45% dos informantes declararam mais de R$3000,00 mensais. O resultado está de acordo com a literatura específica, em que as pessoas com mais renda ainda são maioria na Internet. Quanto à ocupação, a maioria dos respondentes (50,4%) é constituída de assalariados. Chama atenção o fato de que quase 18% dos respondentes sejam estudantes, talvez pelo fato de que se trata de um site voltado para entretenimento.

Quanto às compras na rede, os resultados mostraram que cerca de 38% utilizam a Internet para compras todos os meses. Ao mesmo tempo, 90% nunca ou raramente utilizam outras formas de compra a domicílio, indicando que, pelo menos no Brasil, a Internet está se tornando o principal veículo para a realização de compra domiciliar.

Perguntados sobre as principais razões que os levam a não utilizar a Internet para comprar produtos e serviços, em sua grande maioria (64%) os respondentes escolheram a alternativa «não gosto de comprar sem ver e sentir o produto», juntamente com as alternativas «não confio nas ferramentas de segurança» (50%), «prefiro comprar em lojas de verdade» (41%) e «falta de confiança nas empresas atuantes no comércio eletrônico» (40%). Apesar de não ser objeto do estudo, não há como ignorar os desafios negociais implícitos nessas respostas.

Nas respostas às perguntas sobre risco e privacidade, formuladas como escala de concordância, destacam-se os fatos de que, conforme esperado, 58% dos respondentes não gostam de fornecer seus dados pessoais pela Internet e 54% concordam que ter de fornecer o número do cartão de crédito é uma razão muito importante para não comprar com mais freqüência na Internet. Ademais, consistente com a literatura, 63% dos respondentes não gostam de ter de informar o número do cartão de crédito pela Internet.

Grande parte dos informantes (72%) afirma recear receber e-mails não solicitados após uma compra, indicando que as empresas devem adotar a prática de somente enviar e-mails se autorizadas pelo cliente. Aliás, o papel da empresa fornecedora dos produtos ou serviços se reforça com o resultado de que a confiança na empresa prestadora do serviço ameniza o risco de fornecer o número do cartão de crédito para cerca de 51% dos informantes.

· Resultados do teste da hipótese

A Tabela sintetiza os testes realizados e dá uma idéia do tipo de resultado aqui obtido. Os resultados são apresentados e discutidos segundo o respectivo indicador demográfico.

A variável instrução mostrou-se como indicador mais significativo para a influência da percepção de risco. No entanto, diferentemente de Liebermann e Stashevsky (2002), ocorreu que, quanto maior o nível educacional, mais forte a percepção de risco. Em três das quatro formas de representar a percepção de risco, os respondentes com mais instrução percebem mais risco.

A variável idade apresentou resultados significativos para duas das quatro representantes da percepção. As pessoas mais velhas não gostam de fornecer seus dados pessoais e concordam mais intensamente que fornecer o número do cartão para sites conhecidos é menos arriscado. As variáveis sexo e estado civil não se mostraram significativamente associadas à percepção de risco. A variável ocupação apresentou resultados significativos somente para o risco financeiro. Quanto à variável renda, pessoas com mais renda percebem menos o risco financeiro e mais o risco de privacidade. O número de filhos com menos de 12 anos não mostrou associação significativa à percepção de risco.

 

Conclusões

Nos dias de hoje, as pessoas se voltam à rede em busca de informação, entretenimento, comunicação e também para suas compras. A satisfação alcançada quando se navega na Internet utilizando uma conexão rápida torna a Internet definitivamente parte da vida dos internautas. Estar conectado passa a ser cada vez mais importante. Bellman, Lohse e Johnson (1999) afirmaram que a melhor forma para prever a utilização da Internet em compras é o estilo de vida «plugado».

Para uma utilização eficaz do site na estratégia de marketing, o conteúdo do web site, o meio físico e as interfaces de conteúdo influenciam o envolvimento e, consequentemente, a resposta do consumidor-internauta. Neste artigo, essa resposta foi analisada à luz do risco percebido pelo comprador potencial, visto que a presença na rede com objetivos de compra ainda se defronta com certa hesitação e mesmo recusa, especialmente causadas pela desconfiança quanto a questões de segurança e privacidade.

Muitos autores trataram do risco percebido em compras online, procurando conhecer e explicar os fatores que afetam a percepção de risco, e indicando caminhos para superar esta barreira que inibe a evolução do comércio eletrônico. Este trabalho analisou especificamente a influência de fatores demográficos selecionados sobre aquela percepção. A despeito de obter muitas associações significativas, a instrução foi o único indicador demográfico cuja associação ao risco percebido não depende da maneira de representá-lo: quanto maior o grau de instrução, maior o risco percebido, nas quatro versões utilizadas para representar o risco. As pessoas com mais renda perceberam mais o risco de fornecer dados pessoais do que o risco financeiro de ter de fornecer o número do cartão de crédito. Os respondentes mais velhos perceberam mais significativamente o risco de fornecer dados pessoais. As mulheres perceberam mais o risco de fornecer o número do cartão do que os homens. Em termos práticos, todos estes resultados significam que as empresas que utilizam o canal eletrônico devem incluir e praticar abordagens de segmentação demográfica em sua estratégia na rede. Aliás, este tipo de segmentação é de fácil implantação em um site empresarial.

De acordo com a literatura, os fatores demográficos não estão sós ao influenciar o risco percebido. Em estudos anteriores, o motivo mais citado para a hesitação é de longe a preocupação em informar o número do cartão de crédito. Além disso, os não compradores percebem mais o risco de privacidade do que os compradores e que a experiência na utilização da mídia diminui a percepção do risco financeiro. Em termos práticos, cabe às empresas acompanhar de perto a experiência de compra de seus e-visitantes, pois diferentes experiências de navegação terão diferentes efeitos não apenas sobre o risco percebido, mas também sobre a subseqüente decisão de compra.

Dois fatores não-demográficos interessantes foram detectados em pesquisa da UCLA (2003): a freqüência de compra e o valor mensal gasto na Internet. Por exemplo, enquanto aqueles que compram mais de quatro vezes por mês parecem sentir mais o risco financeiro do que aqueles que compram com menor freqüência, os compradores que gastam mais de US$100 mensalmente, percebem o risco de fornecer o número do cartão de crédito com menos intensidade do que aqueles que gastam menos.

Em termos práticos, as empresas devem estar atentas a outras formas de segmentação para além da demográfica, estabelecendo ações efetivas para reconhecer e premiar os compradores freqüentes e, ao mesmo tempo, estimular os hesitantes.

Outro fator não-demográfico que aparece na literatura é a velocidade da conexão, sempre indicada como boa separadora entre compradores e não compradores. Embora esta característica fuja, em princípio, ao alcance gerencial das empresas que negoceiam na rede, a importância da banda larga, da fibra ótica e seus congêneres sugere que os e-dealers devem participar de iniciativas e parcerias voltadas à difusão daquelas tecnologias.

Ademais, as tendências atuais trazem ótimas perspectivas para as empresas que atuam no comércio eletrônico. A crescente experiência na utilização da Internet e a penetração da banda larga entre os internautas parecem prenunciar um aumento do número de e-consumidores, assim como o aumento do volume de compras dos clientes atuais.

Pode-se concluir que as empresas que atuam no varejo eletrônico devem não apenas implementar mais e melhores medidas de segurança, mas também segmentar sua comunicação online, procurando consolidar a utilização do comércio eletrônico, ao mesmo tempo que familiarizando e educando os internautas sobre a compra online. Uma necessidade inadiável é a expansão do escopo das práticas de segmentação nos negócios online.

Nada obstando a que os resultados do trabalho se alinhem com a literatura internacional, descortinam-se pelo menos três caminhos a seguir em futuras investigações. Primeiro, aproveitando o tamanho da amostra, caberia explorar eventuais diferenças de comportamento dentro de sub-amostras demográficas (por exemplo, por idade), de modo a realçar ou depurar certas associações aqui indicadas. Segundo, procurar outras técnicas analíticas para investigar e quantificar essas associações, levando em conta seu caráter multivariado e simultâneo. Terceiro, conhecer e analisar empiricamente o papel das inúmeras características não-demográficas que de há muito ganham relevo nas pesquisas sobre percepção de risco nas compras online (Brashear et al., 2008).

 

Referências bibliográficas

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Recebido em julho de 2010 e aceite em março de 2011.

Received in July 2010 and accepted in March 2011.

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