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Revista de Gestão dos Países de Língua Portuguesa

versão impressa ISSN 1645-4464

Rev. Portuguesa e Brasileira de Gestão v.8 n.3 Lisboa jul. 2009

 

Componentes da gestão estratégica nas empresas do sector automóvel

 

João Cordeiro*

 

Resumo: Este artigo reflecte sobre alguns dos vectores da gestão estratégica (estratégias empresariais e dimensões do enfoque de gestão: equipamentos e tecnologias, estrutura, vantagens concorrenciais, produtos e processos) nas empresas do sector automóvel. A técnica de investigação utilizada foi o inquérito por questionário. A amostra é constituída por 72 empresas do sector português de componentes para automóvel. Os resultados indicam que a diferente conjugação das dimensões definidoras da gestão estratégica está na base de dois modelos contrastantes, a saber: um que inclui as empresas com estratégia assente na «inovação» e na «qualidade» e outro que inclui as empresas com estratégia assente nos «baixos custos». Concluímos que as empresas, ao possuírem diferentes estratégias de negócio, possuem também diferentes formas de preconizar essas mesmas estratégias, as quais sustentam e são sustentadas por diferentes enfoques de gestão, num processo de retroalimentação mútua.

Palavras-chave: Gestão Estratégica, Estratégias Empresariais, Enfoque de Gestão, Sector de Componentes para Automóvel

 

Title: Strategic management components in the automotive industry

Abstract: These paper intends to make a discussion on some strategic management components (business strategies and some management focus: equipment and technologies, structure, competing advantages, products and processes) in the Portuguese automotive industry. The research method used was the survey. The study covers 72 companies at automotive components industry. Results suggest that the different conjugation of dimensions that define strategic management originate two contrasting models: the first includes companies with a strategy build upon innovation and quality while the other one includes companies with a strategy build upon low cost. We conclude that the companies when possessing different business strategies, also possess different forms to praise these same strategies, which support and are supported by some different management focus, in a process of (backward) mutual feeding.

Key words: Strategic Management, Corporate Strategies, Management Focus, Automotive Components Industry

 

Título: Componentes de la gestión estratégica en las empresas del sector de automoción

Resumen: Este artículo reflexiona sobre algunos de los componentes de la gestión estratégica (estrategias de negocio y las dimensiones del enfoque de gestión: equipamientos y tecnología, la estructura, ventajas competitivas, productos y procesos) en las empresas de automoción. El método de investigación utilizado fue la encuesta de cuestionario. La muestra consta de 72 empresas en el sector de componentes de automóviles. Los resultados indican que la combinación de las diferentes dimensiones que definen la dirección estratégica esta en la base de dos modelos contrastantes, a saber, una que incluye a compañías con una estrategia basada en la «innovación» y «calidad» y otro que incluye a las empresas con la estrategia basada el «bajo coste». Concluimos que la comunidad empresarial por tener diferentes estrategias de negocio, también tienen diferentes maneras de abogar esas estrategias, que apoyan y son apoyados por diferentes enfoques de gestión en un proceso de retroalimentación mutua.

Palabras-clave: Gestión Estratégica, Estrategias Empresariales, Enfoque de Gestión, Sector de Componentes de Automóviles

 

A intensidade das transformações que marcam os tempos modernos, ou seja, o ritmo e o alcance das mudanças na modernidade desconhecem qualquer equivalente nos períodos históricos anteriores e têm impacto sobre a competitividade das empresas.

De forma a poder alcançar os objectivos que define, à empresa é exigido que opte, consoante o contexto em que se insere, por uma estratégia que lhe confira o sucesso da sua gestão. O estabelecimento deste modelo de gestão conduz à definição da hierarquia de prioridades que, em consonância com os valores e estratégias da empresa, constitui o enfoque da gestão, i.e., o cerne das suas preocupações. Uma (estratégia) e outra (enfoque de gestão) fazem parte da gestão estratégica.

Este artigo tem por base uma investigação inserida no Doutoramento em Sociologia sobre as estratégias empresariais e a gestão de recursos humanos no sector de componentes para automóvel. Apresentamos aqui alguns dados sobre os vectores da gestão estratégica no sector, ou seja, sobre as estratégias empresariais e enfoque de gestão.

Este trabalho pretende contribuir para o conhecimento nesta área temática nos seguintes aspectos: analisar o sector de componentes para automóvel; analisar os vectores da gestão estratégica no sector; compreender as relações entre estratégias e enfoque de gestão; e auxiliar a formulação de sistemas de gestão integrados com as estratégias.

Estruturalmente, começamos por traçar o quadro teórico que sustenta a análise, segue-se uma referência à metodologia utilizada, às características principais do sector que balizam o estudo e à apresentação e discussão dos resultados mais relevantes.

 

Conceito, componentes e tipologias da gestão estratégica

Dependendo do contexto onde é empregue, e na tentativa de identificar os conceitos necessários para defini-la, a estratégia pode ter o significado de políticas, objectivos, tácticas, metas e programas (Quinn, Mintzberg e James, 1991).

Trata-se de um conceito, utilizado no meio académico e empresarial, dotado de grande amplitude e diversidade. A estratégia é inimiga das abordagens deterministas e mecanicistas, não é apenas a ideia de como lidar com o inimigo num ambiente de concorrência, não se resume a um indicativo de caminhos e soluções, mas tem uma abrangência maior que engloba conceitos como «eficácia operacional», «diversificação» ou «planeamento estratégico» (Porter, 1999).

Dos significados do conceito estratégia, os mais utilizados são o de Chrisman (1988), Wright (2000) e Thompson e Strickland (2000).

Chrisman e Wright definem estratégia como planos de gestão para alcançar resultados consistentes com a missão e os objectivos da organização. Para Chrisman, estratégia «descreve as características fundamentais que as organizações definem, tendo por base as suas competências, os seus recursos e as oportunidades relativamente à envolvente externa, que lhes permitem traçar metas e alcançar os seus objectivos» (Chrisman, 1988, p. 414). Estratégia é, assim, a mobilização dos recursos da empresa visando atingir os seus objectivos, decidindo sobre quais os recursos a utilizar para aproveitar as oportunidades e minimizar os factores que ameaçam o alcance dos resultados (Wright, 2000).

Por seu lado, para Thompson e Strickland, estratégia é um «conjunto de mudanças competitivas e de abordagens comerciais que os gestores executam para atingir o melhor desempenho da empresa (…) para reforçar a posição da organização no mercado, promover a satisfação dos clientes e atingir os objectivos de desempenho» (Thompson e Strickland, 2000, p. 10).

O conceito de estratégia evoluiu, tendo sido suportado por dois processos principais: o primeiro reporta aos componentes, aos vectores, da gestão estratégica; o segundo reporta às suas tipologias. Ambos permitem que as empresas formulem o rumo dos seus negócios, a sua cadeia de valor, a sua flexibilidade, as suas competências, as regulamentações impostas pelo ambiente e algumas estratégias de posicionamento do negócio, da competitividade e da inovação (Porter, 1999).

O primeiro processo – componentes da gestão estratégica – é a chave para desenvolver um negócio de forma eficaz e eficiente. Isso pode ocorrer através de produtos diferentes, serviços e mercados, de equipamentos de ponta, vantagens concorrênciais, ou mesmo através da mudança da natureza do negócio. A gestão estratégica ensina a empresa a fixar a direcção do negócio, através do envolvimento de todos os intervenientes da organização, assegurando que a empresa está em harmonia na prossecução do objectivo empresarial – obter vantagem competitiva e melhorar o seu desempenho (Reading, 2002). O processo de gestão estratégica não pode ser separado da estrutura, da cultura organizacional e das relações com a envolvente externa (Mintzberg, 1994).

O segundo – tipologias de análise – remete para a análise dos padrões de concorrência empresarial e das estratégias adoptadas pelas empresas para actuarem no mercado e para obterem vantagem competitiva. A este nível atente-se à tipologia de Porter (1980, 1985) de Schuller e Jackson (1987) e de Treacy e Wiersema (1995).

A teoria da vantagem competitiva (Porter, 1980, 1985) descreve o modo como a empresa escolhe e implementa uma estratégia genérica a fim de obter uma posição de privilégio. O objectivo base de qualquer estratégia é a obtenção de posição de privilégio. Os privilégios que advêm da estratégia adoptada não eliminam a concorrência, mas representam vantagens competitivas para a empresa. Segundo Porter, apenas são desejáveis as estratégias que possam ser defendidas contra os concorrentes, no sentido em que elas não devem procurar apenas gerar vantagem competitiva, mas garantir que esta vantagem seja sustentável.

De acordo com o modelo de Porter, as empresas podem ganhar vantagens competitivas baseadas em três tipos de estratégias: custos, diferenciação e foco/nicho (Porter, 1985).

A estratégia baseada nos custos assenta na procura de vantagem competitiva através da redução de custos. A empresa procura ser o produtor com menores custos no sector. O seu âmbito de actuação é alargado, procurando chegar a diversos segmentos em simultâneo, geralmente com um produto standard a baixo custo para os clientes que são sensíveis ao preço e sem grande aposta nos serviços de embalagem, design e publicidade.

A estratégia de diferenciação assenta na procura de vantagem competitiva através da identificação das características valorizadas pelos clientes. Optando por esta estratégia, a empresa procura ser única no seu sector em algumas áreas do produto/serviço mais valorizadas pelos consumidores, agrupados em diferentes segmentos. Dependendo do sector da empresa, estas áreas poderão ser as características do próprio produto, o design, os prazos de entrega, as garantias, as condições de pagamento, a imagem, a qualidade, a inovação, ou a proximidade em relação aos clientes.

A estratégia de foco/nicho assenta na procura de vantagem competitiva num só segmento ou num grupo de segmentos de mercado/industriais pelos quais a empresa optou. A estratégia de foco pode ser dividida em foco no custo (a empresa procura vantagem de custo no seu segmento) e em foco na diferenciação (a empresa procura a diferenciação no seu segmento).

Partindo das premissas de Porter, Schuller e Jackson desenvolvem três arquétipos da estratégia competitiva, procurando estabelecer relações entre esta e a gestão de recursos humanos. Existem três estratégias para ganhar vantagem competitiva: inovação, qualidade e redução dos custos (Schuler e Jackson, 1987).

A estratégia de inovação é utilizada para desenvolver produtos e serviços diferentes dos seus concorrentes. O focus principal nesta estratégia está na oferta de algo novo e diferente pelo que o imperativo para uma empresa que prossiga uma estratégia de inovação é o de ser o único produtor. A estratégia de qualidade é utilizada para a melhoria de produtos, serviços e processos face aos seus concorrentes. O focus principal nesta estratégia está, pois, no incremento da qualidade e não na oferta de algo novo e diferente. Esta estratégia pressupõe que os trabalhadores estejam «engajados» com a qualidade e com a melhoria contínua. Na estratégia de redução dos custos as empresas alcançam vantagens competitivas por produzirem ao mais baixo custo. Uma posição de baixo custo traz às empresas retornos elevados na sua indústria apesar da presença de outras forças competitivas – a posição de custo dá à empresa uma defesa contra os concorrentes. Baixo custo em relação aos concorrentes torna-se o centro desta estratégia, apesar da qualidade, da assistência e outras áreas não poderem ser descuradas.

Desenvolvimentos sobre a estratégia foram também feitos por Treacy e Wiersema. Para eles, qualquer estratégia, independentemente das suas características mais específicas, pode ser classificada em uma de três categorias: excelência operacional, inovação no produto e relação com o cliente (Treacy e Wiersema, 1995).

A estratégia de excelência operacional é utilizada pelas empresas que competem em mercados onde a relação qualidade/preço é a maior determinante da competitividade de produtos/serviços. Esta estratégia implica desenvolver e colocar no mercado produtos/serviços que optimizem a relação qualidade/preço. A rentabilidade da empresa é função directa da margem de lucro por produto e da escala de produção. Corresponde, grosso modo, à estratégia baseada nos custos de Porter.

As empresas que utilizam a estratégia de inovação no produto estão continuamente a investir para criar conceitos de produto radicalmente novos para clientes e segmentos de mercado definidos. O ponto de diferenciação para estas empresas é a rápida concepção de novos produtos e de novos processos de produção.

As empresas que utilizam a estratégia orientada para o cliente estão voltadas para as necessidades de clientes específicos e procuram especializar-se no desenvolvimento de produtos, sistemas e soluções que correspondam aos seus desejos. A aposta na melhoria da qualidade é factor diferenciador nesta estratégia.

 

Metodologia e caracterização do sector

· Técnicas de investigação e amostra

Para este estudo, recorreu-se a um conjunto diversificado de técnicas de investigação. Apresentamos aqui os dados relativos ao inquérito por questionário aplicado às empresas do sector de componentes para automóvel. Com o inquérito procurou-se caracterizar duas componentes da gestão estratégica do sector (estratégia e enfoque de gestão). Antes da sua aplicação foi feito um pré-teste (cinco empresas do sector) para validar as questões.

A amostra é constituída por 72 empresas. De cerca de 170 empresas do sector de componentes automóvel, obteve-se uma taxa de resposta de 42%. O critério de definição da amostra foi a sua adequação aos objectivos – várias actividades, dimensões e localizações.

· Caracterização do sector de componentes para automóvel

O desenvolvimento do sector automóvel em Portugal foi condicionado pelo investimento estrangeiro dedicado à instalação de unidades de montagem – impulsionadores da indústria de componentes. O projecto de investimento da Renault e o da Autoeuropa foram os mais importantes realizados na indústria.

O primeiro foi estratégico para a indústria nacional de componentes, já que permitiu o desenvolvimento de empresas que forneceram componentes em condições de competitividade internacional, bem como a formação de profissionais que desempenharam um importante papel no desenvolvimento da indústria (Reis, 2001). O segundo vem contrariar o «incipiente» crescimento do sector registado até inícios da década de 1990. Como resultado, a indústria automóvel (em geral) e o sector dos componentes (em particular) evoluiu de forma muito positiva. A indústria de componentes ocupa hoje um lugar cimeiro na balança comercial portuguesa – é dos sectores mais exportadores e com um elevado crescimento das vendas para o mercado interno.

O sector português de componentes para automóvel é constituído por cerca de 170 empresas (AFIA), de diversos sectores de actividade – desde o têxtil à metalomecânica – lidando com uma multiplicidade de tecnologias, competências e processos organizacionais para a produção de componentes, módulos e sistemas numa lógica de produto complexo e global. É um sector de média-alta intensidade tecnológica, indutor de novas dinâmicas de produtividade e competitividade (Hatzichronoglou, 1997). Relativamente às tecnologias, predomina a estampagem, injecção de plásticos, fundição e as tecnologias de suporte (corte e soldadura).

Estruturalmente, o sector apresenta como característica base o regime de subcontratação, com capacidade de montagem complementar e com capacidades pouco desenvolvidas de desenvolvimento. As opções estratégicas das empresas são, assim, em grande medida, definidas pelos clientes (Selada e Felizardo, 2003).

O sector é constituído por:

  • integradores de sistemas (multinacionais que fornecem sub-sistemas às unidades de montagem);
  • especialistas de módulos e sistemas (empresas com capacidade para desenvolver soluções «customizadas» e para gerir uma cadeia de valor complexa a montante);
  • especialistas em componentes (empresas com capacidade de montagem complementar e com capacidades pouco desenvolvidas de projecto);
  • fornecedores de ferramentas especializadas (empresas fornecedoras da área dos moldes e ferramentas).

Os principais produtos fabricados pelo sector são dominados pelo segmento A (componentes para motores, transmissão e travões), segmento C (interiores) e segmento D (componentes eléctricos e electrónicos). Face ao volume de negócios do sector, os segmentos mais representativos são o segmento B (22%), o segmento C (18%) e o segmento D (18%).

Relativamente à estrutura da cadeia de fornecimento, perto de 68% das empresas do sector realizam fornecimentos em 2.ª linha; cerca de 55% das empresas realizam fornecimentos directamente a um construtor numa unidade de montagem (1.ª linha); e cerca de 40% das empresas fabricam para o mercado de reposição (INTELI, 2005).

A evolução do sector é visível na evolução das exportações e do volume de facturação. Em 1990, as exportações directas atingiram o montante de € 750 milhões e o crescimento médio anual foi de 12,5%, atingindo em 1994 um volume da ordem dos € 1750 milhões e de € 2600 milhões em 2002. A facturação viu a sua dimensão triplicar ao longo da década de 1990 até 2002. Sofre um aumento do volume de facturação de € 1100 milhões em 1990 para € 2200 milhões em 1994, ascendendo a € 4153 milhões em 2002 (INTELI, 2005).

Nesta indústria privilegia-se, sobretudo, os aspectos associados à produção e ao processo, em detrimento das áreas da concepção e do produto. Como resultado, as empresas têm demonstrado genericamente fracas competências e capacidades ao nível da engenharia e desenvolvimento do produto. De acordo com o estudo do INTELI (2000), apenas cerca de um terço das empresas analisadas são capazes de realizar actividades de desenvolvimento de produto de raiz, sendo a capacidade das restantes reduzida à «introdução de pequenas alterações no produto e no desenvolvimento do processo nomeadamente no que diz respeito a ferramentas de produção» (Selada e Felizardo, 2003, p. 29).

 

Resultados dos estudo empírico

· Componentes da gestão estratégica: estratégias e enfoque de gestão

No âmbito das estratégias empresariais seguimos a tipologia de Porter (1980, 1985) e seus desenvolvimentos (Schuler e Jackson, 1987; Treacy e Wiersema, 1995). Considerámos três tipos de estratégias: baixo custo, qualidade e inovação. A opção por esta tipologia foi validada quer pela aplicação do pré-teste do questionário às empresas do sector, quer por ser uma das tipologias mais utilizadas pelas escolas de gestão.

Os resultados do inquérito apontam para uma significativa percentagem de empresas que apostam na diferenciação pela qualidade. Do conjunto das empresas do sector de componentes para automóvel, 54,2% centram a sua estratégia na «qualidade», 23,6% no «baixo custo» e 22,2% na «inovação».

Decorrente das estratégias empresariais surge o enfoque de gestão, ou seja, as «acções»/«ferramentas» que as empresas utilizam para lhes dar seguimento. Considerámos quatro indicadores: equipamentos/tecnologias; estrutura; vantagens concorrenciais; produtos/processos. É o sentido da relação entre estes indicadores e estratégia empresarial que a seguir apresentamos.

Equipamentos /tecnologias e estratégia

Os resultados da relação entre «estratégias empresariais» e «equipamentos/tecnologias» revelam existir algumas diferenciações (ver Gráfico 1).

 

Gráfico 1

Equipamentos por estratégia empresarial

 

As empresas apresentam similitudes quanto aos equipamentos/tecnologias possuídas. A maioria das empresas, independentemente da estratégia adoptada, possui «computador de médio/grande porte». É, aliás, o item mais referenciado.

Todavia, as empresas apresentam também algumas diferenciações. Por um lado, em média são as empresas que adoptam uma estratégia de inovação e de qualidade que possuem mais equipamentos/tecnologias, comparativamente com as empresas que assentam a sua estratégia na redução de custos. Por outro lado, realce para a grande importância dada à «automação e controlo informático» e aos «centros de maquinagem», sendo o segundo e terceiro itens mais referidos pelas empresas com estratégia de inovação e de qualidade. Por outro lado ainda, destaque para as «máquinas de inserção automática» e os «equipamentos CNC/CAD/CAM», itens importantes nas empresas com estratégia de inovação.

O teste de Kruskal-Wallis para identificação de valores medianos diferentes entre as três estratégias (baixo custo, qualidade, inovação) revelou existirem algumas diferenças. Apresenta valores significativos nos «centros de maquinagem», «automação/controlo informático», «máquinas inserção automática» e «soldadura/laser/robô».

A análise comparada da ordenação das medianas mostra que as diferenças se devem aos valores apresentados pelas empresas com estratégia de «inovação» e «qualidade» (ver Tabela I).

 

Tabela I

Ordenação das medianas

 

Os resultados permitem ver que a estratégia de inovação, primeiro, e a estratégia de qualidade, depois, são também alimentadas pela modernização dos equipamentos/tecnologias, indiciando uma associação entre estes dois tipos de estratégia e a inovação de produtos e de processos.

 

Estrutura e estratégia

Ao nível da estrutura, identificámos factores que remetem para a análise de características de organizações mecânicas versus orgânicas (MECOR) na terminologia de Burns e Stalker (1995). A escolha dos factores decorreu da revisão da literatura e procurou abranger a amplitude de dimensões de análise: fluxo de comunicação, centralização da decisão/poder, atribuição da responsabilidade, flexibilidade da estrutura organizacional, recompensa colectiva versus individual, estratificação hierárquica (distância ao poder), formalização, especialização do trabalho, relacionamento hierárquico versus pessoal e liderança .

Os resultados da análise de componentes principais indicam que o grau de correlações entre os itens é aceitável (KMO=.850), identificando um só factor com bons níveis de consistência interna (KMO=.877). Este factor sugere que os itens escolhidos encontram uma mesma lógica de resposta, indicando que a escala mede um mesmo constructo. De acordo com a validade expressa, a escala reflecte uma ideia geral associada à rigidez das estruturas organizacionais (distribuição do poder, organização do trabalho, regulação das relações) que identifica as características mecânicas versus orgânicas. A análise de fiabilidade revela um Alfa de Cronbach elevado (.918) que expressa boa consistência interna (Pestana e Gageiro, 2005) . Os pesos no factor foram os referidos na Tabela II.

 

Tabela II

Análise de componentes principais (a)

 

Concluímos que a escala construída pode ser considerada válida e fiável permitindo verificar em que posição da escala mecânico-orgânica (MECOR) se situam as empresas.

O posicionamento no continuum da escala mecânico versus orgânico das empresas diferenciadas por estratégia revela uma associação com valor informativo (ver Gráfico 2). Os resultados confirmam que as «organizações orgânicas» são as mais apropriadas para estratégias de inovação – em condições de mudança e inovação (Burns e Stalker, 1995).

 

Gráfico 2

Escala mecânico-orgânico por estratégia empresarial

 

Há diferentes valores na escala MECOR entre as três estratégias [F(2, 69)=16.207, p=.000] e os testes Post Hoc (Bonferroni, Scheffe e Tukey) revelam existir diferenças estatisticamente significativas entre as empresas. As que adoptam uma estratégia de baixo custo apresentam-se mais perto do pólo «mecânico».

Vantagens concorrenciais e estratégia

Relacionado com o enfoque de gestão, procuramos ainda identificar e caracterizar as empresas quanto às vantagens concorrenciais. Os resultados da relação entre «estratégias empresariais» e «vantagens concorrenciais» revelam algumas regularidades e algumas especificidades (ver Gráfico 3).

 

Gráfico 3

Vantagens concorrenciais das empresas por estratégia empresarial

 

No que se refere às regularidades, independentemente da estratégia adoptada pelas empresas, entre os itens mais importantes está o «cumprimento dos prazos». Entre os itens menos importantes está o «design/marca».

No que se refere às especificidades, realce para a relevância dada, ao nível das empresas com estratégia de baixos custos, ao «preço do produto» e aos «custos salariais menores», sendo as menos referidas a «assistência pós-venda», os «novos equipamentos» e o «design/marca». Sublinhe-se, ainda, a importância dada à «qualidade» pelas empresas com estratégia de qualidade (sendo o factor mais referido). Como factores menos valorizados, para esta estratégia, temos os «custos salariais menores», o «design/marca» e os «novos equipamentos». Finalmente, no que concerne às empresas com estratégia de inovação, destaque-se a importância da «qualidade dos produtos», dos «quadros superiores qualificados» e dos «novos equipamentos» (segundo, terceiro e quarto factores mais referidos respectivamente). Como factores menos valorizados, temos os «custos salariais menores», o «design/marca» e o «preço do produto».

O teste de Kruskal-Wallis para identificação de valores medianos significativamente diferentes entre as três estratégias (baixo custo, qualidade, inovação) revelou existirem algumas diferenças. Apresenta valores significativos no «preço do produto» (X2=12.298, p<.01), «assistência pós-venda» (X2=15.531, p<.01), «qualidade dos produtos» (X2=41.328, p<.01), «quadros superiores qualificados» (X2=12.876, p<.01), «custos salariais menores» (X2=10.932, p<.01) e novos equipamentos (X2=26.227, p<.01).

Os resultados indicam que, face à estratégia empresarial, são seis as fontes de vantagem concorrencial que surgem com diferente grau de importância (ver Gráficos 4 a 9).

Vantagens concorrenciais por estratégia empresarial

 

 

Trata-se do caso da vantagem concorrencial obtida através do «preço do produto» e «custos salariais menos elevados», que é maior em empresas com estratégia de baixo custo (significa que a estratégia está em curso). Trata-se, igualmente, da vantagem concorrencial obtida através da «qualificação dos quadros superiores» e «novos equipamentos», que é maior em empresas com estratégia de inovação (significa que a qualificação dos quadros e os novos equipamentos são essenciais para a consecução dos objectivos) e, finalmente, trata-se da vantagem concorrencial obtida através dos «assistência pós-venda» e «qualidade», que é maior em empresas com estratégia de qualidade e inovação, em detrimento das empresas com estratégia de baixo custo.

Em suma, observam-se quatro vias para concretizar a estratégia de inovação, duas vias para concretizar a estratégia de qualidade e duas para concretizar a estratégia de baixo custo.

Produtos/processos e estratégia

Finalmente, procurámos ainda analisar as condições em que empresas estiveram no mercado ao nível dos produtos e dos processos utilizados (nos últimos três anos). Os resultados da relação entre «estratégias empresariais» e «condições em que as empresas permaneceram no mercado» revelaram algumas diferenciações (ver Gráfico 10).

 

Gráfico 10

Condições em que as empresas estiveram no mercado por estratégia empresarial

 

Os resultados indicam que as empresas permaneceram de forma diferente no mercado consoante a estratégia empresarial. As empresas com estratégia de redução de custos permaneceram no mercado essencialmente com os «mesmos produtos» e os «mesmos processos» (significando que a estratégia de baixo custo está em curso). As empresas com estratégia de qualidade optaram por ficar com os «mesmos produtos melhorados» e os «mesmos processos melhorados» (denota que a estratégia de qualidade está em curso). As empresas com estratégia de inovação enfrentaram o mercado com «novos produtos» e «novos processos» (preconizando processos de inovação ao nível do produto e processo).

O teste de Kruskal-Wallis revelou diferenças entre as empresas com três estratégias (baixo custo, qualidade, inovação). Apresenta valores significativos em todos os itens: mesmos produtos (X2=30.049, p<.01), produtos novos (X2=34.445, p<.01), mesmos produtos melhorados (X2=36.302, p<.01), mesmos processos (X2=25.803, p<.01), processos novos (X2=33.315, p<.01), mesmos processos melhorados (X2=24.286, p<.01).

A análise comparada da ordenação das medianas mostra que as diferenças se devem aos valores apresentados pelas empresas com os três tipos de estratégia empresarial (ver Tabela III).

 

Tabela III

Ordenação das medianas

 

Principais conclusões

O objectivo principal do estudo foi analisar algumas componentes da gestão estratégica no sector português de componentes para automóvel (estratégia e enfoque de gestão). As empresas revelaram possuir estratégias e enfoques de gestão diferentes, corporizados nas dimensões consideradas (estratégias empresariais, estrutura, vantagens concorrenciais, produtos e processos e equipamentos/tecnologias).

Especificando, quanto aos equipamentos/tecnologias, a estratégia de «inovação», primeiro, e a estratégia de «qualidade», depois, são alimentadas pela modernização dos equipamentos, contrastando com as empresas de estratégia de «baixo custo». Quanto à e strutura, as « organizações orgânicas» são mais apropriadas para estratégias onde a inovação impera. As empresas que adoptam uma estratégia de «qualidade» e «inovação» apresentam-se perto do pólo «orgânico», enquanto as empresas com estratégia de «baixo custo» apresentam-se perto do pólo «mecânico».

Quanto às vantagens concorrenciais, existem diferenças consoante a estratégia empresarial. A vantagem concorrencial através do «preço do produto» e «custos salariais menos elevados» é maior em empresas com estratégia de «baixo custo»; a vantagem concorrencial através da «qualificação dos quadros superiores» e «novos equipamentos» é maior em empresas com estratégia de «inovação»; a vantagem concorrencial através do «assistência pós-venda» e «qualidade» é maior nas empresas com estratégia de «qualidade» e «inovação».

Quanto aos produtos/processos, as empresas com estratégia de ‘baixo custo’ permanecem no mercado com os «mesmos produtos»/«mesmos processos»; as empresas com estratégia de «qualidade» permanecem no mercado com os «mesmos produtos melhorados»/«mesmos processos melhorados»; e as empresas com estratégia de «inovação» enfrentam o mercado com «novos produtos»/«novos processos».

Em síntese, ao possuírem diferentes estratégias, as empresas deste sector de actividade revelaram, também, possuir diferentes formas de as preconizar. Estratégia e enfoque de gestão sustentam e são sustentados por e entre si, num processo de retroalimentação mútua.

 

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* João Pedro Pina Cordeiro

jcordeiro@esce.ips.pt

Doutor em Sociologia do Trabalho, das Organizações e do Emprego (ISCTE-IUL). Docente na Escola Superior de Ciências Empresariais do Instituto Politécnico de Setúbal, Setúbal, Portugal, leccionando diversas disciplinas das áreas da Sociologia do Trabalho e da Gestão de Recursos Humanos.

PhD in Sociology of Labor, Organizations and Employment (ISCTE-IUL - Lisbon University Institute). Teacher at School of Business Administration, Polytechnic Institute of Setúbal, Portugal, teaching various disciplines in the areas of Sociology of Labor and Human Resources Management.

Master en Políticas de Desarrollo de Recursos Humanos (ISCTE-IUL). Doctorado en Sociología del Trabajo, de las Organizaciones y del Empleo (ISCTE-IUL).

Docente en la Escola Superior de Ciências Empresariais do Instituto Politécnico de Setúbal, Setúbal, Portugal, en la enseñanza de diversas disciplinas de las áreas de Sociología del Trabajo y la Gestión de Recursos Humanos.

 

Recebido em Fevereiro de 2009 e aceite em Julho de 2009.

Received in February 2009 and accepted in July 2009.

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