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Cadernos de Estudos Africanos

versão impressa ISSN 1645-3794

Cadernos de Estudos Africanos  no.26 Lisboa jul./dez. 2013

 

As corridas de cavalos na colônia alemã do sudoeste africano (1884-1914)

The horse racing in South West Africa’s German colony (1884-1914)

 

Sílvio Marcus de Souza Correa*

*Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Departamento de História, Centro de Filosofia e Ciências Humanas 88040-9000 Trindade, Florianópolis, Brasil

silvio.correa@pq.cnp.br

 

RESUMO

Para a formação do campo desportivo na colônia alemã do sudoeste africano (atual Namíbia) tiveram papel importante várias associações desportivas. Entre elas, pode-se mencionar as sociedades de corrida de cavalos (Rennvereine), especialmente as de Swakopmund, Windhoek, Keetmanshoop e da Baía de Lüderitz. As corridas de cavalos constituíram parte da cultura desportiva na Alemanha do Segundo Império. Essas socie-dades desportivas serviram para o treinamento da população masculina (militar e civil) num contexto colonial, ou seja, num contexto beligerante. Com base em jornais, o presente artigo examina o protagonismo das sociedades de corridas de cavalos para a formação do campo desportivo, para a manutenção e expansão do germanismo e para a estruturação de um calendário desportivo no qual os eventos desportivos eram momentos de celebração do colonialismo.

Palavras-chave: corridas de cavalos, colonialismo, sudoeste africano

 

ABSTRACT

During the German colonial rule in South West Africa (now Namibia), several associations were important for the building of a culture of sport. Among these were the Horse Racing Societies (Rennvereine), especially those of Swakopmund, Windhoek, Keetmanshoop and Lüderitzbucht. Horse racing was a main part of the sporting culture of the German Second Reich. In Namibia these sports societies served as training ground for the development of a ”masculine” population (military and civilian) in a colonial context, or in other words, a belligerent context. Based on newspaper archives, this article examines the protagonist role of the Horse Racing Societies in the building of a culture of sport, for the maintenance and spread of “Germanness” and for the structuring of a calendar in which the sporting events were also moments to celebrate colonialism.

Keywords: horse racings, colonialism, Southwest Africa

 

As corridas de cavalos foram os maiores eventos desportivos e de maior popularidade na colônia alemã do sudoeste africano (atual Namíbia). Desde o final do século XIX, alguns criadores buscaram melhorar as raças equinas no sudoeste africano por meio de “métodos científicos”, dos quais fizeram parte as corridas[1]. Para isso, contou-se com o auxílio da ciência veterinária e importou-se, inclusive, reprodutores “puro sangue”, notadamente da Europa e África do Sul.

No início do século XX, a colônia alemã do sudoeste africano já tinha a maior concentração de população branca entre as colônias alemãs na África[2]. Chegava o número a quase 15.000 pessoas, entre alemães, na sua maioria, bôeres e outros de origem europeia (Wesseling, 2004, p. 364). As sociedades de corrida (Rennvereine) foram fundadas em localidades como Swakopmund, Windhoek, Lüderitzbucht e Keetmanshoop. Essas sociedades passaram a organizar corridas durante feriados religiosos (Páscoa, Pentecostes, Natal), feiras ou exposições agropecuárias e mesmo por ocasião de comemorações cívicas como, por exemplo, em homenagem ao aniversário do Kaiser. Tal calendário de corridas forjou um novo tempo para o incipiente campo desportivo da colônia alemã do sudoeste africano e também estruturou o calendário social das comunidades locais.

Por meio de uma história do desporto e do lazer e com base em fontes hemerográficas como Windhoeker Anzeiger, de Winduk, Deutsch-Südwestafrikanische Zeitung, de Swakopmund, e Lüderitzbuchter Zeitung, da Baía de Lüderitz, busca-se neste artigo atentar para aspectos pouco tratados pela historiografia no que tange ao período colonial na Namíbia. Assim, as corridas de cavalos servem também ao historiador como claves interpretativas das relações étnicas, sociais e políticas, pois as formas restritivas de participação dos africanos nas corridas e nas festas de premiação permitem inferir uma transposição da hierarquia do campo social e político para o campo do desporto e do lazer. Em termos inter-culturais, a história do desporto permite inferir a influência sul-africana ou inglesa no colonialismo alemão, notadamente no sudoeste africano. A história do desporto e do lazer em contexto africano sugere ainda novas abordagens sobre a dominação colonial e a circulação de modalidades desportivas pelas fronteiras dos impérios coloniais.

A criação de cavalos no sudoeste africano

Desde 1884, o sudoeste africano foi incorporado ao domínio colonial do II Reich. Mas os contatos pré-coloniais, principalmente com comerciantes holandeses e ingleses, missionários dinamarqueses e alemães e fazendeiros bôeres, foram responsáveis pela introdução de animais domésticos, muitos dos quais foram adotados pelos grupos de pastores Herero e Nama, entre outros. Alguns animais foram imprescindíveis para certas práticas da cultura colonial como, por exemplo, os cães para a caça e o cavalo para montaria e para as corridas.

Desde o final do século XIX, os primeiros criadores de cavalos no sudoeste africano sob domínio alemão vislumbraram as potencialidades do mercado interno, pois fazendeiros, comerciantes e soldados necessitavam de cavalos para diversas lidas. Em anúncios de venda ou compra de cavalos, pode-se perceber a formação de um incipiente mercado e para o qual se destacou a fazenda Voigtland, que chegou a disponibilizar 100 cavalos para venda em 1898 (Windhoeker Anzeiger, 27.10.1899). Cabe ressaltar que o seu proprietário foi responsável pela importação de gado vacum da Argentina. Também houve importação de cavalos da Argentina durante a guerra colonial (1904-1908), quando milhares de soldados foram enviados da Alemanha para combater no deserto. Escusado lembrar que a cavalaria foi extremamente importante no contexto bélico do sudoeste africano.

A importação de cavalos para fins militares foi uma necessidade excepcional, pois havia uma previsão de que a criação de cavalos na colônia poderia abastecer o mercado interno em poucos anos. Em matéria publicada no Windhoeker Anzeiger, os leitores foram informados sobre feiras de cavalos que se realizariam em cada distrito da colônia, similarmente às que ocorriam na Alemanha. Uma comissão governamental seria responsável pela compra de cavalos para a cavalaria da Schutztruppe. Os criadores de cavalos de cada distrito poderiam agendar as visitas da comissão governamental, sobretudo quando o plantel para venda fosse expressivo (Windhoeker Anzeiger, 30.03.1899).

Em 1899, uma série de matérias sobre a criação de cavalos informava sobre o plantel de equinos na colônia, originariamente composto da raça nativa e de híbridos devido à importação de alguns reprodutores (Windhoeker Anzeiger, 03.08. 1899). Mas esses cavalos não eram para corridas. Aliás, uma das matérias insistiu na necessidade de um cavalo de montaria, um cavalo para soldados. Para isso, o cruzamento deveria ter por objetivo a criação de cavalos com características para certas funções, mormente para o exército, cavalos de que poderia eventualmente haver um déficit na colônia. Garanhões de origem prussiana, húngara ou inglesa “meio puros” (Halbblut), assim como árabes e ingleses “puro sangue” seriam ideais. Em outro artigo, o autor ressaltou a importância de uma associação dos criadores de cavalos (Windhoeker Anzeiger, 23.11.1899). Nota-se, portanto, a incipiente organização de uma atividade econômica com interface à emergência de atividades desportivas e de lazer, como as corridas e as cavalgadas.

Marco importante para a organização de uma sociedade composta por criadores de cavalos e demais interessados por atividades equestres foi a primeira exposição agropecuária de Windhoek, em 1899, onde foram expostos 43 cavalos de 7 proprietários. Estava excluída a participação de expositores africanos[3]. Em anúncio do jornal local era informado que, além de brancos (ingleses, bôeres e alemães), os criadores “bastardos” poderiam também expor seus animais. Mas os animais dos “bastardos” deveriam ser expostos sob a responsabilidade de um branco (Windhoeker Anzeiger, 11.05.1899).

Os alemães designavam por “bastardos“ um grupo de várias gerações de origem mestiça, geralmente com ascendência materna africana e paterna bóer ou alemã. Na localidade de Rehoboth, por exemplo, havia uma importante comunidade de “bastardos” já desde o final do século XIX. Essa comunidade tinha em torno de 2.500 pessoas na primeira década do século XX[4].

Impossível saber o quanto essas restrições impediram a participação de criadores africanos Nama ou Herero ou de mestiços, notadamente os “bastardos” de Rehoboth. No entanto, apesar das restrições para participar da exposição, um garanhão e uma égua do criador “bastardo” Dirk van Wijk ganharam o primeiro prêmio em suas respectivas categorias (Windhoeker Anzeiger, 08.06.1899).

Na exposição rural do sudoeste africano, realizada em Windhoek entre 29 e 31 de maio de 1909, apresentou-se um bom número de equinos (cavalos, éguas, potros, asnos) com diferentes proveniências. Boa parte tinha origem africana, éguas em maior parte. Entre os animais exibidos, um garanhão e duas éguas eram propriedade do “bastardo” N. Olivier. Outro “bastardo”, Karolus Zwart, era também expositor. Além de ser proprietário de um touro, duas vacas, e dois terneiros da mesma raça, ele era dono de um potro que, inclusive, foi premiado na exposição de 1909 (Führer durch die Südwestafrikanischen Landes-Ausstellung zu Windhoek, 1909, pp. 13-16).

Os africanos podiam visitar a exposição. Sua visitação foi restrita, todavia, ao segundo dia da exposição, das 9 às 12 horas (ibid., p. 12). Para eles, a entrada custava um marco, sendo que a tarifa normal custava o dobro. As censuras e restrições à participação de negros e mestiços em exposições também encontram paralelo nas corridas de cavalos. Nas primeiras corridas de cavalos de Windhoek houve apenas uma modalidade na qual os cavalos eram propriedade de Hereros. Em Keetmanshoop realizou-se outra corrida cujos cavalos eram propriedade de africanos. Conforme a programação das corridas na imprensa local da Baía de Lüderitz, os africanos só podiam participar como jóqueis ou na modalidade de corridas de mulas. Essas particularidades locais podem ser indícios de uma si-tuação ainda muito incipiente do campo desportivo. A tendência apontava para a uniformização do mesmo, inclusive com o reforço da segregação racial. Todavia, as fontes hemerográficas se mostraram insuficientes para uma análise de filigrana sobre o processo de exclusão de negros e mestiços das corridas de cavalos.

As corridas de cavalos em contexto colonial

Na África austral do final do século XIX, as corridas de cavalos já eram muito difundidas entre a população branca, notadamente composta por bôeres, ingleses e alemães. A popularidade das corridas era tanta que o malogrado plano de Starr Jameson para sua incursão militar no Transvaal teve de esperar que as corridas de cavalos se realizassem. Os próprios líderes dos “uitlanders” avisaram Jameson que o raid deveria ficar para depois das corridas de cavalos do período natalino de 1895 (Wesseling, 1991, p. 577).

Apesar da presença de cavalos no sudoeste africano durante o período pré-colonial, a formalização das corridas, inclusive com um calendário anual, ocorreu durante o colonialismo, quando os alemães fundaram suas associações, construindo um campo institucional de sociabilidades tanto em termos desportivos quanto de lazer.

Na imprensa de língua alemã da colônia, uma das primeiras referências às corridas de cavalos foi a notícia publicada no semanário de Swakopmund, em 17 de julho de 1902. O evento desportivo foi realizado em Keetmanshoop, promissor “local de corrida do futuro” na colônia, segundo o jornal local (Deutsch-Südwestafrikanische Zeitung, 17.07.1902). A projeção feita pelo jornal acusa uma atividade ainda incipiente, mas com potencial econômico, isto é, a criação de cavalos para corridas.

Para o referido evento, o comitê de organização era composto pelo magistrado Tecklenburg, o barão von Schönau e o comerciante Adolf Busch. Deste último, foram roubados dois cavalos de corrida às vésperas da competição. O ladrão (um branco) conseguiu passar a fronteira. Favoritos nas competições, os dois cavalos já estavam em baias no local do evento havia duas semanas, provavelmente em treinamento (ibid.). Aliás, instalações adequadas para os cavalos, abastecimento de aveia e outros cuidados com os animais às vésperas e durante as corridas seriam itens importantes na organização das corridas.

 

 

As diferentes modalidades de corrida de cavalos foram realizadas numa única tarde. Também participaram africanos, mas numa categoria exclusiva: corrida de asnos (Esel-Rennen). Para as corridas, houve uma grande e entusiasmada assistência, sendo a tribuna montada insuficiente para tanta gente. Ao evento desportivo, sucedeu-se a entrega de prêmios na Casa da Firma Seidel & Busch, onde Tecklenburg fez um discurso, no qual ressaltou a importância das corridas de cavalos para a colônia e, em particular, para a criação de equinos.

Para as corridas do ano seguinte, aventou-se a possibilidade de realizá-las em dois dias. Também aventou-se a possibilidade de dobrar o valor dos prêmios. O maior prêmio poderia assim chegar a um valor entre 500 e 600 marcos. A duração das corridas de cavalos, o valor dos prêmios, o grande público, a participação de africanos e os trabalhos do comitê local para o evento realizado em Keetmanshoop em meados de 1902 permitem inferir uma organização já formalizada, mesmo que nenhuma associação tenha sido mencionada na matéria do jornal. A organização coube a criadores e proprietários de cavalos e outros amadores do desporto.

Tanto na exposição agropecuária quanto nas corridas de cavalos, a hierarquia étnica e social do colonialismo se expressava em pequenos detalhes como os anúncios ou notícias sobre os resultados dos páreos, premiações, etc. Nos jornais, quando proprietário, expositor ou cavaleiro era branco, usava-se o pronome de tratamento “senhor” antes do nome e sobrenome. Quando se aludia a mestiços, apareciam apenas nome e sobrenome. Em caso de jóqueis africanos surgiam somente os nomes.

A tabela abaixo apresenta a estrutura e a organização das corridas efectuadas em 2 de junho de 1903 em Keetmanshoop. De modo geral, as corridas na colônia seguiam um mesmo padrão de evento, isto é, cinco ou seis modalidades, com distâncias entre 1500 a 3000 metros (rasos ou com barreiras), para participantes sócios ou não-sócios (desde que brancos) e com prêmios variados conforme as modalidades.

 

 

O anúncio informava ainda sobre as modalidades (com exceção da última, os cavalos deveriam ser montados somente por brancos) e condições (a corrida seria realizada com o mínimo de 3 cavalos inscritos). Informava ainda que os prêmios para a última modalidade (corrida para africanos) seriam anunciados no dia da corrida (Deutsche-Südwestafrikanische Zeitung, 17.04.1903).

Durante as feiras ocorriam, eventualmente, corridas de cavalos, como se deu em Karibib em 1903. No anúncio do jornal de Swakopmund informava-se ainda que o comando das tropas compraria 17 cavalos, 13 bois de canga, 8 bois para tração, 5 bois de montaria e 20 mulas (Deutsche-Südwestafrikanische Zeitung, 28.07.1903).

Após as guerras coloniais (1904-1908), as corridas de cavalos se tornaram mais frequentes. O surgimento de associações de corridas em Keetmanshoop, Swakopmund, Lüderitzbucht e Windhoek foi decisivo para isso. A importância da cavalaria da Schutztruppe para a defesa da colônia também pode ter influenciado as corridas [5] . Aliás, oficiais e soldados da Schutztruppe também participavam de corridas em suas horas de folga. Mas tal participação era, geralmente, em modalidades sem prêmios em dinheiro.

 

 

A realização das corridas era uma forma de celebração do colonialismo. O hasteamento de bandeiras do império alemão, a presença de oficiais e soldados e de representantes civis da administração colonial, bem como de mulheres e crianças alemãs faziam parte da pompa e circunstância do evento desportivo. Apesar da participação de oficiais com seus uniformes, os trajes desportivos coloridos para melhor identificação dos jóqueis e, por conseguinte, dos cavalos de um páreo foram se tornando mais frequentes na década de 1910.

Durante o colonialismo alemão, as corridas de cavalos se tornaram o principal desporto no sudoeste africano. Conforme um jornal local, “nenhum desporto tem tanta preferência na colônia quanto as corridas de cavalos” (Lüderitzbuchter Zeitung, 17.04.1909). Vale lembrar que desporto e turfe eram quase sinônimos na Europa fin de siècle (Weber, 1988, p. 264; Vigarello, 1995, p. 194). Na maioria da imprensa europeia a rubrica desportiva se resumia ao turfe (Weber, 1988, p. 264). Ademais, o interesse jornalístico pelas corridas de cavalos não deixa de ser um indicativo da popularização de uma antiga prática aristocrática, de um recreio que se tornou desporto. Mas se as corridas se popularizavam, os cavalos de corrida continuavam a ser objetos de luxo. Mais que uma mercadoria valiosa, o cavalo de corrida estava associado a certo prestígio. A propósito, numa notícia do jornal local chegou-se a pleitear uma taxação para certos objetos de luxo, como os cavalos de corrida (Lüderitzbuchter Zeitung, 09.10.1909).

Mas a matéria não deixa claro se os mais visados pela taxação seriam os cavalos “puro sangue” e “meio puro sangue” (Halbblut). Em geral, esses cavalos teriam proprietários brancos. Mesmo que fossem para corridas, os cavalos nativos de proprietários africanos ou mestiços, provavelmente, não tinham o mesmo valor de um “puro sangue” ou de um “meio puro sangue” da Prússia ou da África do Sul. Embora os alemães não tenham monopolizado a criação de cavalos, ela foi se tornando cada vez mais um negócio de brancos, notadamente dos cavalos para corridas.

O elevado valor de certos cavalos podia fazer parte do capital econômico e simbólico de seus proprietários, mas também do seu capital social. Um exemplo disso foi a doação feita pelo comerciante Hermann da metade do valor da venda de seu cavalo para a associação de corridas da Baía de Lüderitz. O dinheiro seria destinado para melhoria da pista de corrida. O senhor Hermann retornava para a Alemanha para tratar da saúde, depois de seis anos na Baía de Lüderitz (1904) (Lüderitzbuchter Zeitung, 24.12.1910).

Além de donativos, os reparos ou melhoramentos eram feitos também com recursos obtidos através de loteria. A associação de corridas da Baía de Lüderitz, por exemplo, conseguiu um benefício de 2.800 marcos em loteria realizada em 1910. O lucro foi destinado para reparo da pista de corridas. Uma outra loteria estava ainda prevista para aquele ano, segundo o jornal local (Lüderitzbuchter Zeitung, 19.03.1910).

A participação da população nas atividades organizadas pelas associações locais (reuniões, bailes, jantares, loterias, cavalgadas, corridas) era variada. Algumas atividades eram exclusivas para os sócios ou para sócios e familiares, outras já eram abertas a convidados e a maioria delas era exclusiva para brancos.

O campo desportivo tinha também relação com o campo político. Mesmo na Europa, ambos (desporto e política) foram inicialmente apanágio de uma elite (Weber, 1988, p. 278). No sudoeste africano sob domínio alemão, as corridas de cavalos serviam também para demarcar o lugar e o espaço subalterno dos africanos tanto em termos desportivos quanto políticos. As corridas de cavalos tinham ainda um apelo aristocrático. Criadores e proprietários de cavalos valorizavam a genealogia dos cavalos. Não raro, importava-se um garanhão “puro sangue”.

Na medida que as corridas no sudoeste africano favoreciam a celebração de determinadas raças, outras eram desvalorizadas, como os cavalos nativos. Construía-se assim uma hierarquia das raças de cavalos que encontrava correspondência com a diferenciação social de europeus e africanos na ordem colonial.

Apesar de uma hierarquização das raças de cavalos com base em pressupostos científicos da veterinária em voga à época, as corridas no sudoeste africano não fizeram distinção entre garanhões, éguas e cavalos castrados para os páreos. Cavalos “puro sangue” eram excluídos de algumas modalidades, pois acreditava-se que a pureza racial era determinante para a superioridade do animal. Já o gênero do animal (macho ou fêmea) não determinava a sua performance.

A participação de cavalos “puro sangue”, o número de corridas, as diferentes modalidades, com ou sem jóqueis africanos ou mesmo com cavalos de proprietários africanos, e o valor dos prêmios variaram de um lugar para outro, de ano para ano. Conforme o anúncio das corridas em Keetmanshoop, realizadas dias 8 e 9 de maio de 1909, pode-se perceber algumas mudanças na estrutura e organização.

O horário das corridas e as diferentes distâncias das modalidades demonstram a valorização da métrica do tempo. Embora os comentários das corridas na rubrica desportiva dos jornais locais não mencionassem o tempo percorrido em cada páreo, a medida do tempo foi algo inovador no campo desportivo, notadamente no turfe[6].

O valor de inscrição para as corridas número 1, 2, 3, 4 e 5 do sábado (8 de maio) e para as corridas número 1 e 2 de domingo (9 de maio) era de 20 marcos para sócios e 30 marcos para não sócios. Para as corridas de número 3 e 4 de domingo, respectivamente 5 e 10 marcos. Com exceção da última corrida de domingo, as corridas seriam exclusivamente para cavaleiros brancos.

 

 

A entrada ao público custava 2 marcos e a tribuna 3 marcos. Na véspera da corrida, houve um encontro dos membros da associação de corridas de Keetmanshoop na Schützenhause. Depois da corrida, no domingo à noite, teve lugar a entrega de prêmios e um baile no mesmo local, eventos apenas para os participantes brancos. Os africanos vencedores em sua modalidade, geralmente, recebiam seus prêmios no local.

Assim como nas corridas de Keetmanshoop nos dias 8 e 9 de maio de 1909, a primeira corrida organizada pela Rennverein da Baía de Lüderitz, em meados do mesmo ano, contou com a presença de africanos. Conforme matéria do complemento do jornal local, “atrás da tribuna, havia uma multidão reunida para assistir as corridas”. Entre os curiosos que não tinham acesso à privilegiada tribuna, pode-se imaginar um composto multiétnico. Já na tribuna estava representada a elite local, “la crème de la crème” da Baía de Lüderitz, como noticiou o jornal (Lüderitzbuchter Zeitung, 05.06.1909). Digno de nota foi a presença de mulheres em seus elegantes vestidos de domingo. O jornal informou ainda que “toda a cidade” afluiu para o Campo dos Bôeres, local onde eram realizadas as corridas na Baía de Lüderitz. Cabe lembrar que a primeira corrida organizada pela Lüderitzbuchter Rennverein fez parte de um processo de formalização de práticas desportivas e de sociabilidades locais, inclusive com a “institucionalização” de um espaço local de corridas.

Na Baía de Lüderitz, as corridas de cavalos ocorriam, geralmente, no chamado Campo dos Bôeres (Burenkamp), local de outras práticas desportivas, bem como de festas para um grande público. No entanto, em meados de 1909, foi noticiada no jornal local a previsão de fazer passar os trilhos do trem pelo campo desportivo. O assunto foi um dos temas de discussão na reunião mensal de outra associação (Bürgerverein) (Lüderitzbuchter Zeitung, 19.06.1909).

Apesar da polêmica, corridas de cavalos continuaram a ser realizadas no Campo dos Bôeres até o final do ano (Lüderitzbuchter Zeitung, 16.10.1909). Em janeiro de 1910, as corridas de cavalos já ocorreram em outro lugar (Lüderitzbuchter Zeitung, 15.01.1910).

Com base na imprensa local, pode-se inferir o quanto as corridas de cavalos eram ocasiões especiais para a vida social, inclusive das mulheres brancas. A participação feminina pareceu ser uma constante durante as corridas de cavalos. Com certa constância, as matérias se referiam à presença do público feminino, que, geralmente, exibia sua beleza “como nunca se vê nas ruas da Baía de Lüderitz” (Lüderitzbuchter Zeitung, 31.07.1909). A tribuna das corridas de cavalos era como uma vitrine, onde se podia ver “o que há de novo e chique na moda feminina” (Lüderitzbuchter Zeitung, 19.11.1910). Pode-se perceber o quanto as roupas e acessórios das damas confirmavam a importância daquelas reuniões sociais em torno das corridas de cavalos.

 

 

Além da presença feminina, os artigos faziam também referência à maior ou menor participação do público em geral. A presença, ou não, de um grande público dependia, entre outros fatores, das condições do tempo. Em termos meteorológicos, de abril a agosto era o melhor período para as corridas de cavalos. Às vezes, no entanto, o público não atendia as expectativas, ainda mais quando havia bom tempo. No jornal local, lavrou-se uma reclamação contra a baixa participação popular nas corridas em pleno mês de julho (Lüderitzbuchter Zeitung, 16.07.1910). Como os meses de dezembro, janeiro e fevereiro eram muito ventosos, as corridas ficavam dependendo sempre do clima.

Em algumas matérias, pode-se observar a relação entre intempéries (vento forte) e um baixo número de público ou mesmo a anulação das corridas. Para ficar em dois exemplos, o Lüderitzbuchter Zeitung, de 20 de novembro de 1909, informava que não era fácil “ficar na tribuna do Campo dos Bôeres com o vento sudoeste soprando”; o mesmo jornal, de 26 de março de 1910, comunicava que a corrida, prevista para o domingo de páscoa, seria protelada para segunda-feira “por causa do vento do sudoeste”.

Além disso, as corridas eram um desporto caro e se as associações não aumentassem o número de participantes ou não angariassem fundos suficientes para organizar as corridas, os prêmios também se reduziriam. Assim, os proprietários também não comprariam novos cavalos. Para as corridas, o número de cavalos ficaria, então, reduzido. Aumentaria assim o favoritismo de um ou de outro cavalo e as corridas perderiam o interesse do público. Por isso, o jornal pedia a “adesão popular” porque a apatia do público poderia comprometer o turfe na colônia. Evidentemente, o público-alvo, cuja participação se conclamava, era a população branca. As práticas desportivas, como o turfe ou a ginástica, não foram fatores de integração social e multiétnica durante o colonialismo alemão.

As condições meteorológicas mais favoráveis a partir do mês de abril explicam, portanto, porque é que o calendário desportivo se ajustou aos feriados religiosos da Páscoa e de Pentecostes. Embora houvesse corridas no final de ano, o feriado natalino nunca foi tão importante no calendário das corridas de cavalos quanto os feriados religiosos de abril e maio. Ao menos durante o colonialismo alemão, o tempo profano do desporto não constituiu um calendário próprio de eventos. Além de ficar, em parte, atrelado ao calendário religioso, o turfe não logrou constituir um campeonato integrando as associações locais numa federação desportiva, como foi o caso em vários países da Europa desde o final do século XIX, quando as associações desportivas regionais lograram organizar os primeiros campeonatos nacionais.

Se o tempo profano do desporto não era algo totalmente separado do tempo religioso no sudoeste africano, ao menos, ele favoreceu uma nova perspectiva em relação ao tempo de outrora. Como na Europa, o desporto introduziu um tempo separado da vida cotidiana, com ritmo (quase) autônomo e manifestações próprias; um tempo de ruptura com o mundo do trabalho; e um tempo de atividades intensas, geralmente, concentradas num dia ou dois (Vigarello, 1995, p. 215).

Ao novo tempo introduzido pelas corridas se orientavam não apenas os proprietários de cavalos, mas também as pessoas que assistiam as corridas cada vez mais como espetáculos. Afinal, as corridas eram inicialmente realizadas pelos oficiais da Schutztruppe e pelos soldados da cavalaria, além de um ou outro civil possuidor de um cavalo. Mas o prazer do desporto, inicialmente compartilhado apenas entre os donos de cavalos de corrida, passou a ser também uma experiência pública, inclusive feminina, de esposas e filhas dos participantes[7].

Como as corridas não faziam parte da vida cotidiana, elas eram da ordem do extraordinário, como não faziam parte também do mundo do trabalho, elas se inscreviam no mundo do entretenimento, e como demandavam preparativos e se estendiam por mais de um turno, geralmente seguidas por baile à noite, as corridas de cavalos eram ocasiões excepcionais para muitos homens, adultos ou jovens, casados ou solteiros. Para muitas mulheres, as corridas de cavalos eram, igualmente, ocasiões únicas para sair da rotina, parar por um tempo com as lidas domésticas e viver intensamente um ou dois dias.

Se corridas de cavalos e jogos desportivos eram realizados durante os feriados religiosos, como Páscoa e Natal, ou durante as comemorações como o aniversário do Kaiser, cabe ressaltar que outros eventos desportivos ocorriam durante o ano. Lutas de boxe eram realizadas no Kapps Hotel e jogos de futebol e de cricket eram organizados pelo Clube Desportivo (Lüderitzbuchter Zeitung, 19.03.1910, p. 9, e 26.03.1910, p. 4). Também o tênis começava a ser praticado na colônia alemã do sudoeste africano. Contava-se ainda com várias sociedades de ginástica, algumas delas fundadas no final do século XIX (Correa, 2012). Cada modalidade desportiva e o seu calendário de competições contribuíram para a diversificação do campo desportivo. Alguns desportos, como o futebol, o basebol e o rúgbi iriam se desenvolver na Namíbia, sobretudo a partir das primeiras décadas do século XX. Mas o domínio branco (primeiramente alemão, depois sul-africano) também prevaleceu no campo desportivo.

Embora outras modalidades desportivas pudessem também despertar o interesse de certos grupos (mulheres, jovens, africanos...), as corridas de cavalos lograram – antes de qualquer outra modalidade – a preferência de um grupo de amadores com capacidade e recursos para fundar associações, organizar eventos e um calendário. Uma vez consolidado o calendário anual das corridas, criadores de cavalos e amadores do desporto poderiam se programar para participar de várias delas. Aliás, as corridas de cavalos em outras localidades como Keetmanshoop ou Swakopmund também eram anunciadas no jornal da Baía de Lüderitz[8]. Nas festividades de Pentecostes em Keetmanshoop, por exemplo, participaram dezenas de senhores e damas da Baía de Lüderitz (Lüderitzbuchter Zeitung, 21.05.1910), sendo as corridas de cavalos muito apreciadas. As corridas contaram com quatro cavalos de Lüderitzbucht, de nome Bani, Susie White, Bube, Bluelight. Com exceção de Bani, os três outros foram vencedores em suas categorias. Dois anos depois, o mesmo jornal informou que Bluelight ganhou o primeiro prêmio na corrida de Windhoek (Lüderitzbuchter Zeitung, 06.07.1912).

A análise da imprensa colonial permite inferir que um número pequeno de cavalos e de proprietários participava das corridas, notadamente da Baía de Lüderitz e Keetmanshoop. Em alguns casos, tem-se a informação sobre eventuais compras e vendas. Comprava-se cavalos e éguas de criadores locais, mas também de criadores da África do Sul. Numa ocasião, o prefeito e membro da associação de corridas da Baía de Lüderitz comprou duas éguas (Lüderitzbuchter Zeitung, 21.05.1910). Uma delas, Gala Girl, ganhara o grande prêmio da primeira corrida do ano naquela localidade (Lüderitzbuchter Zeitung, 07.01.1910).

Pode-se supor que a compra de novos cavalos aumentasse o interesse popular pelas corridas. A presença de novos animais garantia o inusitado, desfazia o favoritismo de animais já conhecidos do público, notadamente dos apostadores. Aliás, público numeroso acorreu às corridas do início do ano de 1910 na Baía de Lüderitz. Segundo o jornal local, isso se deu pela “qualidade do material” que “não deixa nada a desejar em relação as corridas de Johannesburg ou da Cidade do Cabo” (Lüderitzbuchter Zeitung, 19.02.1910).

Se alguns membros da associação de corridas de Lüderitzbucht compravam novos cavalos, outros parecem ter comprado mulas. Nas corridas do final de 1913, quatro mulas, montadas por africanos, eram dos seguintes proprietários alemães: Dr. Lübbert, Laupenmühlen e Vollhabers. Os prêmios foram de 25 marcos para o primeiro lugar, 15 marcos para o segundo e 10 marcos para o terceiro (Lüderitzbuchter Zeitung, 09.01.1914).

Por um lado, o valor dos prêmios para a corrida de mulas permite supor uma desvalorização da modalidade. Por outro, o predomínio de cavalos de corrida de origem europeia ou sul-africana tornava cada vez mais difícil a participação de cavalos nativos e, por conseguinte, de eventuais proprietários africanos. Afinal, os cavalos de corrida eram caros e a criação de cavalos uma atividade bastante onerosa.

Mas o interesse popular pelas corridas, os investimentos dos criadores (mormente na renovação do plantel) e as atividades das associações de corridas nem sempre correspondiam às expectativas. Como mencionado anteriormente, encontram-se nos jornais algumas queixas em relação à presença diminuta de público durante algumas corridas. Se a presença de um público menor do que o esperado era, às vezes, devida às condições meteorológicas, outras notícias permitem supor uma relação entre a pequena assistência na tribuna e o favoritismo de um ou outro cavalo. Por exemplo, uma matéria do jornal local da Baía de Lüderitz sugeriu que novos cavalos nas corridas poderiam atrair um maior público (Lüderitzbuchter Zeitung, 02.04.1910).

Provavelmente, o número reduzido de cavalos, criadores, cavaleiros e jóqueis tornava o resultado de certas corridas bastante previsível. Uma vez conhecido do público local, um cavalo poderia ser favorito, ou não, em comparação aos demais concorrentes de um páreo. Essa previsibilidade tinha, provavelmente, impacto tanto nas apostas quanto na participação popular às corridas.

Sobre as corridas no feriado de páscoa de 1911, o jornal da Baía de Lüderitz, por exemplo, informou que, com exceção do resultado da segunda modalidade, os demais já eram esperados (Lüderitzbuchter Zeitung, 22.04.1911). O favoritismo de um ou outro animal deve ter sido uma constante em muitas modalidades, como sucedeu nas corridas de meados de 1911. Na corrida de pôneis, por exemplo, o favorito era Bluelight, do proprietário Bodenstein, e isso se confirmou desde a largada até o final (Lüderitzbuchter Zeitung, 10.06.1911).

A despeito do favoritismo em relação a um animal ou outro, havia um forte apelo na imprensa para a participação popular nas corridas de cavalos. Para ficar num exemplo, vale atentar para a matéria publicada no Lüderitzbuchter Zeitung em 5 de novembro de 1911. O articulista anônimo destacou que as corridas eram mais que um desporte. As corridas eram importantes para a economia colonial. Afinal, as provas de velocidade permitiam avaliar o desempenho de cada cavalo, por vezes associado à sua aparência física e à sua origem. Por isso, as corridas eram consideradas como formas de ajudar o melhoramento das raças equestres. Aliás, na Europa, o Jockey Club e agremiações similares eram instituições fundadas com o intuito de concorrer para a melhoria das raças de cavalos[9]. No entanto, alguns discordavam disso e acreditavam que esses clubes eram simplesmente formas de recreio aristocrático ou de lazer burguês (Agulhon, 2009, p. 131). No sudoeste africano alemão, buscava-se uma criação de gado muar e cavalar não apenas para atender demandas locais de transporte, carga e tração. Também se visava abastecer a cavalaria da Schutztruppe com bom material equestre. Por último, mas não menos importante, andar a cavalo fazia parte de um habitus colonial entre os alemães[10].

Ao comentar sobre a presença constante de pessoas a cavalo nas ruas de Windhoek, Clara Brockmann (1912, p. 121) fez uma referência ao sentimento de superioridade que se tem ao montar um cavalo[11]. Sob tom irônico, informou que alguns consideravam “chique” passar o dia inteiro de botas de montaria e com o chicote na mão. Geralmente, eram os novatos na colônia que se comportavam assim, “querendo mostrar desse modo que já tinham nascido sobre uma sela”. Apesar disso, depois de anos em África, havia muita gente que sabia montar. Mas aqueles que realmente sabiam montar bem eram raros, segundo as memórias de Brockmann. Ela também comentou sobre um certo exibicionismo aliado à falta de domínio da arte de cavalgar dos iniciados que galopavam ao invés de andar a cavalo corretamente. Tal prática dos “cavaleiros de domingo” era mal vista pelos mais velhos de Windhoek, inclusive porque galopar significava, depois, gastar mais com aveia (ibid., p. 123).

No campo desportivo, as corridas reproduziam também hábitos culturais que transpassavam as fronteiras dos impérios coloniais. Como se aludiu, a influência inglesa ou sul-africana era marcante no que tange às corridas de cavalos. Era comum a imprensa local se referir à vizinha África do Sul quando se tratava de elogiar a qualidade do material em uma ou outra corrida, tal a réplica das rivalidades nacionalistas num contexto colonial e a propósito de uma atividade particular. Em 1909, por exemplo, participaram alguns cavalos nas corridas da Baía de Lüderitz “cuja qualidade é difícil se encontrar mesmo na África do Sul” (Lüderitzbuchter Zeitung, 20.11.1909).

Também o nome dos cavalos de corrida acusa uma identificação com o turfe de origem inglesa. Entre outros nomes em inglês, podem ser citados Little Billy, Mark Time, Seaman, Blackie, Slowly. Alguns nomes dos jóqueis (Johnny, James...) eram igualmente ingleses e certas modalidades de corrida também (Keetmanshooper Steeple Chase) (Lüderitzbuchter Zeitung, 02.04.1910).

As corridas de cavalos possibilitavam a reprodução parcial de um modo de vida europeu. As associações de corridas organizavam outras atividades, como as cavalgadas. Em 1909, a associação da Baía de Lüderitz realizou sua segunda corrida de caça à raposa, uma forma de entretenimento desportivo (Lüderitzbuchter Zeitung, 04.09.1909). Entre os participantes, destaque para a participação feminina, notadamente da senhorita Kranz e das duas senhoritas Wecke. Pela boa presença do público no local, essa atividade tinha um futuro promissor, sentenciava o jornal (Lüderitzbuchter Zeitung, 18.09.1909).

Além das corridas, passeios a cavalo eram também organizados pelas associações. A título de exemplo, um dos pontos da pauta da reunião da Lüderitzbuchter Rennverein no Hotel Rösemann era a preparação de um passeio a cavalo para o dia 19 de novembro de 1911 (Lüderitzbuchter Zeitung, 11.11.1911). Isso indicia o quanto as corridas e as cavalgadas favoreceram as sociabilidades tanto no campo do desporto quanto do lazer na colônia. Afinal, as corridas de cavalos se inserem num conjunto de práticas de sociabilidades, às quais os alemães já estavam acostumados em sua pátria (Correa, 2013).

Participar de associações desportivas ou recreativas já era um habitus burguês na Alemanha Guilhermina. Embora o próprio Kaiser não fosse um fã inveterado do turfe, a imprensa no sudoeste africano noticiou o fato de o imperador ser o patrono do primeiro Rennklub alemão (Deutsche Südwestafrikanische Zeitung, 20.07.1910).

Essas práticas de sociabilidades aproximavam os alemães, lhes emprestavam uma identidade social e mesmo estreitavam seus laços sociais. As sociabilidades tinham suas particularidades em contexto colonial. Ideologicamente, os alemães se viam como uma “raça de senhores” (Herrenrasse) na África colonial. Isso não significou o esmaecimento das origens sociais ou mesmo do status previsivelmente diferente de um comissário imperial ou de um colono alemão. Por isso, as sociabilidades acusam ao mesmo tempo aproximações e distanciamentos sócio-culturais tanto em relação aos membros do in-group quanto àqueles do out-group. Mesmo que as sociabilidades tenham permitido “baixar a barreira social” entre alguns – fosse por força da atividade desportiva, fosse pela transposição desta para um contexto colonial –, elas aumentaram ou reforçaram as barreiras (social, étnica, cultural, sexual) face a outros, notadamente em relação aos africanos.

No campo desportivo havia aproximações e distanciamentos de acordo com as configurações possíveis entre classe, gênero e raça. É difícil saber, por exemplo, como alemães proprietários ou criadores de cavalos de corrida se relacionavam com africanos empregados para limpar as baias e tratar dos cavalos e como se relacionavam os africanos com a assistência, notadamente com as poucas mulheres brancas que, com seus vestidos domingueiros e chapéus com penas de avestruz, ocupavam a tribuna das corridas. Proprietários e criadores, jóqueis, empregados e amadores do turfe participavam do mesmo campo desportivo. Resta saber se uma ideia de cooperação inerente ao ideal desportivo moderno aflorou entre diferentes protagonistas do “quadrilátero geográfico” das corridas de cavalos na então colônia alemã.

Em termos desportivos, as relações inter-étnicas entre alemães e africanos não se enquadraram nos moldes das sociabilidades imanentes às corridas, pois as sociabilidades pressupõem uma “espontaneidade”, uma vontade de querer estar com os outros. Em suma, uma predisposição para a convivência. Ora, os espaços públicos e privados reservados aos africanos na sociedade colonial demonstram o quanto as relações étnicas entre alemães e africanos nada tinham de espontâ-neas e o quanto faltava a vontade de conviver uns com os outros[12].

Durante o feriado pascoalino de 1909, na Baía de Lüderitz ocorreram corridas de cavalos e uma festa popular desportiva (allgemeines Volkssportfest), respectivamente nos dias 11 e 12 de abril. A entrega dos prêmios foi no hotel Kapps (Lüderitzbuchter Zeitung, 03.04.1909). No anúncio do programa das corridas de cavalos, informava-se sobre certas regras e modalidades das provas e valores dos prêmios, que podiam chegar a 500 marcos. Para a corrida de mulas, o primeiro prêmio era no valor de 100 marcos (Lüderitzbuchter Zeitung, 13.03.1909). Nas corridas de cavalos de meados de novembro de 1909, de início de janeiro e meados de julho de 1910, entre outros exemplos, algumas modalidades contaram com jóqueis africanos (Lüderitzbuchter Zeitung, 16.11.1909, p. 7; 08.01.1910, p. 5; 16.07.1910, p. 12). As fontes hemerográficas não permitem, no entanto, aventar qualquer hipótese sobre o aumento ou diminuição das barreiras étnicas no campo das corridas.

Às vésperas da corrida, o jornal informava ainda da participação de amazonas (Lüderitzbuchter Zeitung, 10.04.1909). Uma semana depois, o jornal local publicou matéria sobre o evento, salientando a presença feminina e de autoridades oficiais, além da performance da banda musical dos marinheiros do navio imperial Sperber, que animou o público durante o intervalo das corridas. Informou ainda que as próximas corridas seriam no feriado de Pentecostes (Lüderitzbuchter Zeitung, 17.04.1909).

As corridas do feriado de Pentecostes ocorreram na tarde de 31 de maio (Lüderitzbuchter Zeitung, 22.05.1909). No complemento do jornal foi publicada matéria sobre as corridas de Pentecostes. Dessa vez, a animação musical ficou por conta da banda do navio imperial Panther. O encerramento do evento foi um jantar festivo no Kapps Hotel (Beilage zur Lüderitzbuchter Zeitung, 05.06.1909). Também aí decorreu a entrega dos prêmios das corridas de cavalos de 25 de julho de 1909[13]. Porém, a entrada foi restrita aos associados e convidados (Lüderitzbuchter Zeitung, 24.07.1909, p. 3). Em setembro houve nova entrega de prêmios das corridas promovidas pela associação local, seguida de um baile no Kapps Hotel[14]. A grande corrida de cavalos realizada no final de 1910 também teve seu encerramento festivo no dito Kapps Hotel, inclusive com sorteio de prêmios (loteria) (Lüderitzbuchter Zeitung, 24.12.1910).

As centenas de anúncios e artigos sobre corridas de cavalos nos jornais de Windhoek, Swakopmund e da Baía de Lüderitz entre 1898 e 1918 permitem inferir o quanto as corridas de cavalos eram muito apreciadas na colônia alemã. Em termos de circuito social da informação, cabe ressaltar que os jornais locais noticiavam sobre o turfe porque os seus leitores eram também os amadores das corridas. Além disso, muitos desses leitores e amadores do turfe eram também representantes das “forças vivas” de uma localidade. O prefeito da Baía de Lüderitz, Emil Kreplin, era assíduo leitor do Lüderitzbuchter Zeitung, mas também era presidente da Sociedade de Corrida de Cavalos (Lüderitzbuchter Rennverein), além de proprietário de cavalos. Outro exemplo era o comerciante alemão Louis Wirth, que tinha empório na Baía de Lüderitz e também era proprietário de cavalos e membro do conselho administrativo da sociedade de corrida local.

Em 1910, o calendário desportivo já estava consolidado no que tange às corridas de cavalos, principalmente na Baía de Lüderitz e em Keetmanshoop. Nesses locais, havia mais corridas de cavalos do que em Swakopmund e Windhoek. Isso se dava, provavelmente, porque a criação de cavalos era maior no sul da colônia.

Entre 1909 e 1914, a Baía de Lüderitz foi o local de maior frequência de corridas de cavalos. Entre outros fatores, cabe ressaltar a importância da associação local. Além disso, a economia local em torno dos diamantes habilitou um grupo de pessoas a comprar cavalos de corrida e a investir no desporto. Essa elite local tinha diferentes motivações para participar das corridas de cavalos, ainda mais sendo elas uma ocasião extraordinária para o exercício das sociabilidades naquela localidade portuária em pleno deserto do sudoeste africano.

Afinal, a tribuna do Campo dos Bôeres foi um espaço de sociabilidades para homens e mulheres, adultos e crianças. Evidentemente, dela estavam excluídos os africanos, assim como dos salões dos hotéis, da praia balneária e de tantos outros espaços de sociabilidade. As exceções eram raras. Em geral, os africanos tinham uma participação marginal na vida social da pequena cidade portuária da Baía de Lüderitz. No Campo dos Bôeres, as práticas desportivas como turfe, tênis ou atletismo reservavam aos africanos o lugar de jóqueis, gandulas e carregadores, além de espectadores distantes, detrás dos alambrados.

Essa situação étnico-social entre alemães e africanos foi pouco alterada com a ocupação sul-africana durante a Primeira Guerra Mundial. Houve, no entanto, uma série de mudanças nas corridas de cavalos a partir de 1914. A participação de oficiais e soldados da cavalaria das tropas britânicas e sul-africanas, a diversificação dos animais com o aumento expressivo do número de cavalos da África do Sul, a inovação das modalidades e a introdução de outras regras trazidas pelos ocupantes sul-africanos, inclusive a adoção da língua inglesa, foram algumas mudanças de grande impacto no campo desportivo da ex-colônia alemã do sudoeste africano.[15]

 

 

Algumas associações desportivas dos alemães tiveram certas dificuldades em se manter no período post bellum. Houve, inclusive, uma fusão de algumas delas para melhor organizarem suas atividades como a ginástica e as corridas. Porém, os novos protagonistas do campo desportivo tinham outras preferências. O domínio sul-africano favoreceu um maior número de desportos no sudoeste africano. Isso não significou um abandono do turfe. Aliás, em 1920, houve a fundação do “Lüderitzbucht Sporting and Gymkhana Club”. O presidente do clube era o alemão Kreplin, aficionado por cavalos. O novo clube teria como uma das principais metas promover as corridas (Lüderitzbuchter Zeitung, 28.01.1920).

Considerações finais

Em tempos de guerra e de paz, a figura equina se revestiu de um poder simbólico ímpar na colônia alemã do sudoeste africano. Decisivo para a vitória das tropas volantes pelo deserto, o cavalo se tornou um emblema do poder colonial. Além disso, o cavalo foi um animal imprescindível para deslocações de curta e média distância.

Desde os primeiros anos da colônia, serviu o animal equestre também para momentos de desporto e lazer. A criação de cavalos na colônia e a importação de novas raças foram o suporte necessário para as corridas de cavalos, tão populares entre os alemães. Uma vez abastecidos de cavalos da Prússia, Hungria, Inglaterra, África do Sul e Argentina, os colonizadores passaram a dispensar os cavalos criados localmente, não apenas para diversas lidas, mas, principalmente, para suas corridas.

Nota-se que a reprodução de hábitos culturais favorecia a coesão social do grupo dos colonos. Além disso, a realização de tais práticas desportivas e de lazer também indiciava a consolidação do projeto colonial. Poder realizar corridas de cavalos era uma forma de germanizar a colônia, fazer dela uma “pequena Alemanha”, como foi referido algumas vezes na imprensa colonial. Na literatura colonial fez-se também referência a esse processo de uma tentada germanização. Para Clara Brockmann (1912, pp. 131-132), as corridas de cavalos na colônia alemã do sudoeste africano faziam lembrar as da Alemanha, notadamente pela pompa dos uniformes dos oficiais que se perfilavam na tribuna e pela elegância de roupas e dos chapéus com penas de avestruz. Tudo daria a impressão de se estar na Alemanha, “se não fosse a paisagem agreste em seu entorno e na qual predominam as acácias”.

Além da paisagem, havia uma série de contrastes e mesmo contradições entre a realidade metropolitana e a colonial. Em termos políticos, apesar da supremacia prussiana, a Alemanha passava por um processo de democratização. Tal processo se manifestou, igualmente, no campo desportivo e ganharia um novo ímpeto durante a República de Weimar. Ainda na Alemanha do II Reich, a participação e o gosto por corridas de cavalos se prestavam à distinção social. Na colônia alemã do sudoeste africano, os alemães reforçavam seus laços sociais e sua identidade nacional por meio de atividades desportivas como as corridas de cavalos. Ao mesmo tempo, elas os diferenciavam dos demais, ou seja, dos africanos.

A valorização das raças equinas da Europa correspondeu a uma desvalorização dos cavalos nativos ou de proprietários africanos. No plano ideológico, tal desvalorização era uma forma de reforçar o valor supostamente inferior dos próprios africanos. Tal estratégia de dupla desvalorização valeu também para restringir o espaço dos africanos nas corridas. Além da modalidade exclusiva para os africanos, isto é, as corridas de burros ou mulas, a função de jóquei era uma das poucas consentidas aos africanos nas corridas de cavalos.

Através de práticas como as corridas de cavalos, a história do desporto e do lazer permite compreender a formação e a consolidação de um campo desportivo e de sociabilidades na colônia alemã do sudoeste africano e, por conseguinte, algumas formas de reprodução de estruturas coloniais. Além disso, pode-se estudar algumas mudanças sociais, econômicas e políticas em sua correlação com as mudanças no campo desportivo, pois a presença inglesa e sul-africana no sudoeste africano após 1915 teve desdobramentos importantes na Namíbia do post bellum, quando outros desportes, como o basebol, o golfe e o rúgbi, diversificaram o campo desportivo. Estas novas modalidades desportivas, inexistentes ou marginais durante o domínio colonial alemão, acabariam por reconfigurar o campo desportivo na Namíbia a partir da década de 1920, inclusive com novos protagonistas brancos (bôeres e britânicos).

 

Referências

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Recebido 9 de novembro de 2012; Aceite 25 de julho de 2013

 

NOTAS

[1]  Desde a primeira metade do século XIX foi difundida no meio acadêmico alemão a importância das corridas para o melhoramento das raças de cavalos. Ver, por exemplo, Hazzi (1826).

[2]  Atualmente, a população branca na Namíbia perfaz quase 7% da população total. A metade da população é de origem Ovambo. Entre outras minorias, Herero e Namas, respectivamente 7% e 5%, tiveram maior expressão demográfica até o início do século XX, quando a população de ambos os grupos foi dizimada durante a guerra colonial (Wallace, 2012, pp. 177-182; Correa, 2011, pp. 85-103; Zimmerer, 2004, pp. 45-63).

[3]  O termo “africanos” não era usado pela imprensa durante o colonialismo alemão. Optou-se pelo uso da palavra “africanos” para referir-se genericamente aos Nama, Herero e demais grupos étnicos em contato com os alemães na outrora colônia alemã do sudoeste africano (atual Namíbia). Doravante, o termo “africanos” designa um grupo denominado como nativos (Eingeborenen) nas fontes consultadas.

[4]  Sobre os “bastardos” da então colônia alemã do sudoeste africano, ver por exemplo: Bayer (1984); Britz, Lang e Limpricht (1999).

[5]  Sobre a cavalaria durante a guerra colonial, ver as memórias de um cavaleiro da Schutztruppe, Dincklage-Campe (1908).

[6]  Além do turfe, o cálculo do tempo foi igualmente importante para o remo e o ciclismo nos primórdios do desporto. Cf. Vigarello (1995).

[7]  Na Baía de Lüderitz, as corridas de cavalos do mês de novembro de 1911 atraíram grande público, inclusive feminino, permitindo a todos se maravilhar com a moda chique e as novidades da toilette das damas que ocupavam a tribuna (Lüderitzbuchter Zeitung, 19.11.1910, pp. 1-2). Já as corridas de cavalos do Ano Novo tiveram um público aquém do esperado (Lüderitzbuchter Zeitung, 07.01.1911, p. 11).

[8]  Ver, por ex.: Lüderitzbuchter Zeitung, 20.03.1909, p. 4; 03.04.1909, p. 8; 12.06.1909, p. 2; 11.12.1909, p. 9.

[9]  O nome oficial do Jockey Club de Paris era “Círculo de Fomento para o melhoramento das raças de cavalos em França”, cf. Agulhon, 2009, p. 114; Vigarello, 1995, p. 195.

[10] O termo habitus é um conceito-chave na sociologia de Norbert Elias e Pierre Bourdieu. Pode ser entendido grosso modo como a forma comum de agir, pensar e sentir entre membros de um grupo social. O habitus se expressa no estilo de vida, na linguagem, no gosto dos indivíduos.

[11] Natural de Lübeck, Clara Brockmann (1885-1959) viveu alguns anos na colônia alemã do sudoeste africano. Seus relatos de viagem e suas memórias e novelas fazem parte de uma literatura colonial em língua alemã, cuja autoria feminina foi muito expressiva.

[12] Sobre a sociabilidade, o historiador francês Maurice Agulhon ressaltou a importância dessa “aptidão do indivíduo de frequentar agradavelmente seus semelhantes” (l’aptitude de l’individu à fréquenter agréablement ses semblables). Ver prefácio da reedição do seu livro Pénitents et franc-maçons dans l’ancienne Provence (1968).

[13] Sobre as corridas de 25 de julho, ver Lüderitzbuchter Zeitung, 31.07.1909, pp. 5-6.

[14] Lüderitzbuchter Zeitung, 18.09.1909, p. 10. Para detalhes sobre as corridas de 19 de setembro ver matéria do Lüderitzbuchter Zeitung, 25.09.1909, pp. 5-6.

[15] No Arquivo Nacional da Namíbia, dois programas oficiais do Windhoek Military Gymkhana Club, respectivamente de um evento realizado em 20.11.1915 e de outro de 30.09 a 02.10.1916, contêm várias informações sobre os novos participantes (na maioria oficiais e soldados das tropas sul-africanas), as novas modalidades de corridas e as premiações.

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