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Revista Portuguesa de Ciências do Desporto

versão impressa ISSN 1645-0523

Rev. Port. Cien. Desp. v.9 n.2 Porto nov. 2009

 

Políticas públicas desportivas: avaliação do nível de execução e eficácia nos municípios da Área Metropolitana do Porto

 Carlos Januário

Pedro Sarmento

Maria José Carvalho

 Faculdade de Desporto, Universidade do Porto, Portugal

 

RESUMO

O interesse político das autarquias locais em torno do desporto não é recente. Todavia, a sua imposição como um “direito de todos” tanto a nível dos textos e documentos internacionais como nacionais rondará as quatro décadas. Ignorar a sua importância é, pois, contradizer os interesses, necessidades e expectativas das populações, assim como, o interesse público que lhe está subjacente. É nosso propósito investigar o interesse, a promoção e a operacionalização das políticas públicas, os programas e as medidas de acção por parte do poder local no desporto. A amostra contemplará os municípios da Área Metropolitana do Porto. Metodologicamente, recorreremos a entrevistas e análise documental de fontes diversas. Os resultados terão por base a análise de conteúdo, a estatística descritiva e a interpretação jurídica e, na sua discussão, atenderemos a dissertações na área, à doutrina e à jurisprudência. Por fim, apontaremos as principais conclusões e recomendações.

Palavras-chave: políticas públicas desportivas, autarquias, actividade física e desportiva

 

ABSTRACT

Public sportive policies: assessment of the performance and effectiveness in the municipalities belonging to the Metropolitan Area of Porto

The political interest of local autarchies around sports isn’t recent. Nevertheless, it’s imposition as a “right to everyone” either in the international subjects or in a national level, goes round four decades. Ignoring its importance it’s to contradict the population’s interests, needs and expectations, as well as its underlying public interest. It’s our purpose to investigate the interest, promotion and operative skills of public policies, the programs and the action measures of local power concerning sports.  The sample will contemplate the municipalities of the Metropolitan area of Porto. Methodologically speaking, we will use interviews and documental analysis of several sources. The result will have as basis the content’s analysis, the descriptive statistics and the legal interpretation and, in its discussion, we will attend the dissertations in the area, the principles and the jurisprudence. At last we will point out our main conclusions and recommendations.

Key-words :  public sportive policies, autarchies, physical and sportive activity

 

INTRODUÇÃO

O papel das autarquias no capítulo desportivo tem vindo a ser reforçado. No entanto, ao mesmo tempo que se verifica uma uniformidade legislativa, as práticas parecem demonstrar a existência de alguma diversidade na intervenção. Importa assim, analisar as razões dessa diversidade de modo a aquilatar da existência, ou não, de um desempenho específico e/ou comum por parte dos Municípios da Área Metropolitana do Porto, na estruturação e desenvolvimento de uma política pública desportiva.

Atendendo ao objecto de estudo, situado no interesse político das autarquias locais no âmbito desportivo, os grandes propósitos desta pesquisa são os seguintes:

1. Conhecer as propostas de fomento e apoio à actividade física e desportiva de âmbito municipal;

2. Identificar e classificar as ofertas desportivas municipais;

3. Avaliar o cumprimento das atribuições e competências legais das autarquias locais.

Com este trabalho pretendemos dar ênfase a uma área de estudo pouco discutida e desenvolvida em Portugal. Deste modo, parece-nos relevante o impacto da nossa pesquisa ao propugnar:

1. Avaliar o nível de execução e eficácia das medidas “políticas” dos municípios da Área Metropolitana do Porto.

2. Apurar, se os resultados se enquadram entre os princípios orientadores plasmados nos textos internacionais e na legislação europeia, assim como, nos principais textos normativos e políticos nacionais: Constituição da República Portuguesa, Programas de Governo Constitucionais, Lei de Bases da Actividade Física e do Desporto e Lei das Atribuições e Competências das Autarquias Locais.

3. Identificar a importância atribuída às actividades físicas e desportivas como factor de promoção da saúde, bem-estar e qualidade de vida das populações.

A amostra enquadra os municípios da Área Metropolitana do Porto que agrupa 14 concelhos (Póvoa de Varzim; Vila do Conde; Trofa; Santo Tirso; Maia; Valongo; Matosinhos; Porto; Gondomar; Vila Nova de Gaia; Espinho; Santa Maria da Feira; S. João da Madeira; Arouca).

 

MATERIAL E MÉTODOS

Em conformidade, adoptaremos os seguintes procedimentos metodológicos:

1. Recurso a entrevista semi-estruturada no intuito de colher depoimentos junto dos Presidentes de Câmara Municipal e/ou Vereadores de Desporto de cada município amostrado acerca das ideias, preferências, expectativas e medidas de política pública desportiva.

2. Recurso à análise de conteúdo de documentação política oficial, como técnica amplamente utilizada em investigação qualitativa nesta área do conhecimento.

 Neste cenário, procederemos à inclusão, selecção e análise dos documentos que constituirão o "corpus" do nosso estudo, a saber:

1. Programas eleitorais sufragados.

2. Plano de actividades e Orçamento aprovados em Assembleia Municipal.

3. Relatórios de Gestão, Balanço e Demonstração de Resultados.

Da necessidade de proceder ao levantamento e tratamento de dados nas Câmaras Municipais justificamos a premência, em estabelecer quadros teóricos de suporte à decisão, em matéria de política pública desportiva.

Perseguindo tais objectivos propomo-nos:

1. Proceder ao enquadramento teórico subjacente aos conceitos/palavras-chave desta investigação (políticas públicas desportivas; autarquias; actividade física e desportiva) e que dizem respeito aos modelos, teorias e quadros conceptuais que estão na base do problema de investigação. 2. Enquadrar a nível normativo a regulamentação vertida nos textos internacionais que abriram caminho a um reconhecimento quase universal do desporto. 3. Delimitar os preceitos constitucionais plasmados na Constituição da República Portuguesa que de forma expressa ou implícita, contribuam para a análise do objecto em estudo. 4. Enquadrar os Programas de Governo Constitucionais – Iº ao XVIIº, como elementos-chave de "leitura política" da importância do desporto. 5. Analisar e interpretar a Lei de Bases da Actividade Física e do Desporto – Lei n.º 5 de 2007, de 16 de Janeiro, enquanto texto normativo mais recente no quadro legal do sistema desportivo, cujo articulado, no domínio das políticas públicas assaca "ao Estado (...) e às autarquias locais, a promoção e o desenvolvimento da actividade física e do desporto”. 6. Identificar as Atribuições e Competências das Autarquias Locais – Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro e Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, que imputam, respectivamente e de forma expressa aos municípios, atribuições no domínio dos "Tempos livres e desporto" e competências no apoio ou comparticipação a "actividades de interesse municipal, de natureza social, cultural, desportiva, recreativa ou outra”.

Da evolução das etapas anteriores propomo-nos definir a problemática do estudo e de seguida, proceder à construção do modelo de análise. Tal, assentará no conceito de Política Pública Desportiva e nas Dimensões "Desporto de elite" e "Desporto para todos". Os Indicadores recairão, respectivamente em:

1. Selecção de Talentos, Formação Desportiva e Espectáculo Desportivo.

2. Democratização do acesso à prática, Lazer e Sectores específicos da população. 

 

DISCUSSÃO

Numa perspectiva global o papel essencial e fundamental do Município é o de promover e co-promover a melhoria das condições de vida das suas populações. Atendendo à realidade nacional e ao vasto espectro de actuação dos municípios, o modelo de desenvolvimento desportivo a nível local, que defendemos, é sustentado nomeadamente em Paz(14), Pires(15), Carvalho(2, 3), Constantino(7), Carvalho(4), autores de referência no estudo desta temática. A sua tese assenta fundamentalmente na satisfação das necessidades básicas, estruturando a actividade física e desportiva numa perspectiva de saúde, bem-estar e qualidade de vida das populações. As restantes dimensões da prática desportiva serão auxiliares/complementares do referido objectivo. Perante esta concepção de desenvolvimento desportivo, não basta às autarquias locais confinar-se apenas aos domínios clássicos das infra-estruturas e equipamentos desportivos mínimos. Nesta perspectiva, não se perseguiriam as Grandes Opções do Plano 2005-2009 (Lei n.º 52/2005, de 31 de Agosto) dado, no âmbito da 3.ª opção ser expressamente referido: Mais e melhor desporto “modernizar e melhorar a qualidade do desporto português, tendo por finalidade o aumento da qualidade de vida e o contributo para a melhoria da saúde pública, articulando o desporto com as políticas de turismo, de ambiente e desenvolvimento autárquico”.

Para que tal não suceda, urge promover uma autarquia centrada no cidadão, que leve em linha de conta que as pessoas manifestam a sua actividade física e desportiva de diversas formas e por variadas razões. Muito provavelmente, as políticas públicas de desenvolvimento desportivo local não se têm desenhado em função de tais premissas mas, porventura, assentes num modelo piramidal que teima em persistir.

Lembramos que o sedentarismo é um dos comportamentos morbidogénicos que afecta a nossa sociedade e cuja prevalência em Portugal é extremamente elevada. Impõe-se por isso, procurar novos caminhos e idear uma prática acessível a toda a comunidade ainda que, a sua implementação possa ser classificada de utópica. Mais, materializam a inoperância das medidas e/ou o alheamento dos decisores políticos. Esta problemática reveste-se ainda, de uma maior importância pelo motivo de atingir indiscriminadamente crianças, jovens e adultos. Colocados perante esta realidade, impõe-se a todos os que directa ou indirectamente intervêm nesta área que não fiquem indiferentes, muito menos, se resignem porque, a cultura do conformismo e da resignação obstam à inovação. As sinergias estratégicas são, em matéria de inovação, factor fundamental e são, simultaneamente, a base de uma cultura empreendedora na comunidade local, na justa medida em que contribuem para o desenvolvimento de uma visão partilhada do futuro. A própria Direcção Geral de Saúde, publicou recentemente (21 de Maio de 2007) a circular informativa n.º 12/DIR, documento que classificamos de extrema importância por tratar-se de um problema de saúde pública e com dados alarmantes no tocante à nossa situação. Estabelece, esta circular, que a elevada prevalência da obesidade em Portugal, o aumento da sua incidência, a morbilidade e mortalidade associadas e os elevados custos que determina, explicam a necessidade da criação da Plataforma Contra a Obesidade, cuja origem está seguramente, nos reduzidos níveis de actividade física e em padrões desequilibrados de comportamento alimentar. Daí a questão que se coloca: será possível, isto é, será legítimo, manter esta situação por mais tempo? Estamos em crer que não. Neste cenário, e conforme estudo por nós realizado(12), idealizamos para o presente e a pensar no futuro uma autarquia agilizada, indutora de estilos de vida activos, com efeitos benéficos na saúde e potenciadora dentro das suas atribuições e competências de a) uma adequada promoção desportiva capaz de contemplar de forma eficaz o tempo livre da população e b) consequentemente, assegurar uma melhor qualidade de vida.

Sendo um objectivo que nunca se esgota, advertimos para a necessidade de as autarquias serem criativas e inovadoras, quer nos objectivos e na gestão, quer na definição de novas políticas e estratégias em busca de “uma mudança nas pessoas e na sociedade”(9). Como em todos os sectores da vida, também no capítulo desportivo, somos confrontados com a resistência à mudança. Independentemente do reconhecimento geral do papel do poder local, em termos de intervenção e incremento desportivo, existe como que um sentimento de impotência em termos de intervenção, porque não se sabe a todo o momento como actuar. A justificação decorre, não só, pela diversidade e multiplicidade das práticas, como também, devido à extensão permanente de fenómenos de exclusão de origem local. Além do mais, conduz com frequência, a que a responsabilização e tratamento local desses fenómenos seja aligeirada em função da sua componente nacional(16). Não obstante, e baseando-nos na nossa experiência e vivência nos últimos anos, as políticas desportivas municipais traduzem modos de relação particular entre o poder político e o desporto pelo que, advogamos, que os municípios em matéria de política pública desportiva devem, face ao futuro, erigir como prioridades segundo Lacoba(13) as seguintes funções:

- Administrar os recursos disponíveis com eficácia e eficiência controlando os gastos e reduzindo o défice (Função Administradora). Ex. Capitalizar as receitas.

- Reduzir paulatinamente o protagonismo em todos os programas, implicando cada vez mais os clubes, o movimento associativo e dando importância crescente a outras instituições intermédias (Função Coordenadora). Ex. Potenciar a utilização das infra-estruturas desportivas.

- Gerir e regulamentar o uso de instalações, espaços desportivos e a participação do cidadão (Função Reguladora). Ex. Potenciar a utilização do espaço público.

- Facilitar a prática desportiva a todos os cidadãos como instrumento potenciador de qualidade de vida (Função Integradora). Ex. Potenciar programas dirigidos a nichos de população.

- Criar redes de equipamentos públicos, facilitadoras do acesso à prática desportiva (Função Inversora). Ex. Potenciar equipamentos de proximidade, multilúdicos e desportivos.

- Definir objectivos concretos e desenhar estratégias para a sua prossecução, assim como, prever e quantificar os meios e recursos necessários para os prazos estabelecidos (Função Planificadora). Ex. Socorrer-se de um programa municipal.

Apesar da diversidade das políticas públicas desportivas(19), cada município faz incidir, em regra, a sua intervenção de forma dominante ou especificamente num dos seguintes domínios:

1. Material: centrada na infra-estruturação de equipamentos desportivos no território municipal, numa lógica de a) centralidade ou b) proximidade (bairro/quarteirão).

2. Individual: centrada na oferta de serviços e animação desportiva circunscrita aos munícipes locais e reduzida abertura ao exterior.

3. Promocional: centrada na mediatização territorial e nas relações externas explorando exponencialmente todo o potencial do desporto na vertente da a) competição, b) nos eventos e c) no turismo da região.

Vergnes(19) contrariando esta visão política de intervenção predominante num dos domínios, sustenta a tendência actual para:

1. Políticas de equilíbrio – que não privilegiem unicamente um eixo de intervenção.

2. Políticas adaptadas às especificidades do território (o nosso País tem aqui, uma enorme janela de oportunidades) valoradas em função da (i) situação geográfica (mar, montanha, …) (ii) demográfica (jovem, reformados, …) (iii) socio-económica (operários, desempregados) e (iv) escolar.

Acresce, neste particular, que as assimetrias territoriais ao não serem muito díspares, implicarão a possibilidade de uma intervenção desportiva de carácter mais específico, e tendencialmente, dirigidas a projectos emblemáticos que potenciem uma imagem de marca da localidade, podendo ser encarados como novos catalizadores do fenómeno desportivo. Isto leva-nos a falar da premente necessidade de articulação supra-municipal das políticas desportivas, facto que suscita a Laurentino Dias(8) a tese de que, “só estabilizando uma oferta desportiva, que seja genuinamente uma marca para a promoção de cada região e dos municípios que a compõem e se coadune com o seu planeamento estratégico, poderá existir um desenvolvimento sustentável para a política desportiva em Portugal”.

Por outro lado, fruto das mudanças contínuas, extremamente céleres e imprevisíveis que se registam actualmente no fenómeno desportivo, implicarão nestes territórios novas e diferentes adaptabilidades, que serão determinantes e imperativas na tomada de decisão em tempo oportuno dos decisores políticos. Este último indicador, alerta-nos assim, para uma possível “metamorfose” da política desportiva municipal (municipalização) e possível tendência, para um pendor mais abrangente de cariz metropolitano (metropolização). Desta tendência, retiramos a possibilidade de funcionamento em rede e potencialização da afirmação territorial, gerando novos públicos, promovendo a intercircularidade e intermunicipalidade desportivas e engrandecer no quadro internacional, a promoção de uma região ou do próprio país. Esta visão, decorre, igualmente, do pensamento de Clayes(6) de que o problema das políticas desportivas assenta, fundamentalmente, na possibilidade de os cidadãos terem acesso às respectivas práticas, qualquer que seja a sua localização porque, de acordo com Silvano(18) a ideia de se ser de algum sítio é estruturalmente relativa. Dito de outro modo, depende da escala a que num determinado contexto de interacção social, o sujeito (ou grupo de pessoas) se coloca e por outro lado, ao argumento de que as actividades não deverão ser destinadas apenas aos cidadãos do concelho até porque, o território municipal é “povoado” por mais cidadãos que não apenas os seus habitantes. Porém, conceber o contributo do desporto autárquico nas novas dinâmicas metropolitanas, sem desvirtuar grandemente e com impacto negativo as particularidades e especificidades de cada município e valorizar simultaneamente a sua dimensão estratégica, só está ao alcance de líderes locais esclarecidos5 dependentes, obviamente, da qualidade de cooperação que suscitarem entre si em prol dos cidadãos. Apesar de ser possível detectar a existência desta cooperação em determinadas autarquias, a tendência aponta para a sua quase inexistência, o que poderá querer sugerir duas coisas (1) que as redes intermunicipais têm vindo a ser negligenciadas ou hierarquizadas em função do protagonismo de determinados actores (2) que os políticos receiam o que não controlam.

Tecnicamente, cremos que esta cooperação supra-municipal que nós apelidaríamos de política de boa vizinhança, poderia germinar, se estruturada por um Conselho Consultivo e decidida politicamente no quadro de um Conselho Metropolitano de Vereadores do Desporto, subjacente a uma estratégia concertada com a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR-N). Percebe-se, assim, claramente, o alcance e o potencial de benefício mútuo em resultado desta cooperação, qual seja, desde logo, adquirir escala no contexto regional, nacional, europeu e/ou internacional. Numa versão minimalista importa evitar duplicações e garantir a coerência das intervenções pública e privada. Esta situação, confronta-nos ainda com a convicção de que os serviços desportivos só se podem desenvolver e hoje em dia implementar eficazmente, numa área geográfica e de densidade populacional maior que o estritamente municipal. As fronteiras devem, portanto, neste campo, ser abolidas deixando de fazer sentido, pensar numa “lógica paroquial” para idear outra “supra-municipal”.

Pretende-se com isto sublinhar que, a uma visão simplista do município como simples executor de assuntos meramente locais e hermeticamente dirigida aos habitantes do concelho, se deve contrapor a imagem de uma entidade cujo protagonismo político transcende, em larga medida, esse mesmo âmbito. De acordo com esta análise, avançamos o conceito de “poder regional” que, na óptica de Fernandes(10) pode “gerar consensos, sempre que esteja em causa a valorização da região”. Uma estratégia baseada, portanto, em valores partilhados. Desta forma, valora-se exponencialmente a importância das Áreas Metropolitanas, dada a sua capacidade aglutinadora das sinergias intermunicipais e consequente potencialização e articulação de investimentos e iniciativas indutoras, de grandes projectos estruturantes. Afinal, a sua verdadeira razão de ser.

O território metropolitano é, por conseguinte a chave para a implementação eficaz de políticas públicas desportivas locais, parecendo-nos indispensável, avançar para um novo princípio, o da “interdependência” definido por Sarmento17 como imprescindível no ajustamento das políticas desportivas autárquicas sustentado na a) proximidade geográfica e b) nas tendências demográficas. Além do mais, segundo dados do estudo “Prospectivas de urbanização do Mundo”, do Departamento dos Assuntos Económicos e Sociais das Nações Unidas, a Área Metropolitana do Porto vai ter um crescente peso na demografia portuguesa, destacando-se, em 2015 claramente, como a segunda maior área urbana do país, com 23,9% do total da população (a Grande Lisboa, atingirá segundo o mesmo estudo 45,3%). Sustentamos igualmente esta visão no entendimento de Giddens(11) ao referir que muitas questões e problemas actuais têm origem acima do nível do estado-nação e não podem ser resolvidos no âmbito das fronteiras desse mesmo estado, adoptando como filosofia política “pensar globalmente as acções que se devem promover localmente”.

Como linhas de acção, Bento(1) dita cinco medidas que poderão ser encaradas como objectivos políticos potenciadores de desenvolvimento desportivo no quadro específico da cidade e região envolvente do Porto, a saber:

1. Desenvolver projectos desportivos que, pela sua qualidade, excelência e inovação possam ombrear com a vanguarda internacional e servir até de referência e inspiração para outras cidades.

2. Manter uma relação de estima, empatia, compreensão e respeito com todas as instituições e ler nas vitórias desportivas e outras, a capacidade realizadora e empreendedora das nossas cidades.

3. Fazer algo de substancial para que os índices de participação desportiva da população atinjam um valor aceitável patrocinando, nomeadamente, programas e discriminando positivamente as instituições que se envolvam de modo exemplar, com a prática desportiva através de contratos-programa.

4. Incrementar o desporto escolar visando a aproximação e partilha de objectivos e responsabilidades entre a escola e os clubes.

5. Equacionar no contexto da Área Metropolitana a problemática da modernidade desportiva da cidade. 

Repensar os contornos e a materialização de uma intervenção autárquica concretizadora de projectos e acções, ganha, cada vez mais actualidade na agenda política. É indispensável, por isso, que o Município seja encarado como o campo privilegiado para o enquadramento e reorganização da prática desportiva sob todos os aspectos, assumindo maiores responsabilidades, transformando-se numa entidade mediadora de todas, ou de boa parte das acções realizadas no concelho, com vista à promoção e desenvolvimento desportivo local. Visto desta forma, a vida desportiva a “praticar” pela autarquia não é coisa de menor importância no rol das preocupações dos decisores políticos. Encontrar caminhos para enfrentar esta problemática, não é tarefa fácil e poucos se atrevem a emitir uma opinião sustentada sobre o que será o desporto municipal, nos próximos anos como fez Pires(15) ao “prognosticar” que “as Câmaras Municipais, em termos orgânicos, dão-nos a ideia de que no futuro o desenvolvimento do desporto vai, necessariamente, passar por elas”. Será que as previsões falharam? O desafio está lançado! Auguramos com os resultados da investigação gerar contributos significativos para a idealização de soluções político-desportivas na Área Metropolitana do Porto, com impacto directo na qualidade de vida de previsivelmente 23,9% da população portuguesa em 2015.

 

REFERÊNCIAS

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2. Carvalho A (1994). Desporto e Autarquias Locais: uma nova via para o desenvolvimento desportivo nacional. Porto: Campo das Letras.

3. Carvalho A (2004). Desporto e Autarquias Locais do Alentejo. Edição: Associação de Municípios do Distrito de Évora.

4. Carvalho MJ (2007). Os Elementos Estruturantes do Regime Jurídico do Desporto Profissional em Portugal. Porto: M. Carvalho. Dissertação de Doutoramento apresentada à Faculdade de Desporto da Universidade do Porto.

5. Chabobe J (2002). Le financement du sport par les collectivités locales: Des ambitions politiques aux choix budgétaires. Coordonné par Dominique Charrier et Christophe Durand. Presses Universitaires du Sport.

6. Clayes U (1987). A evolução do conceito de desporto e o fenómeno da participação/não participação. Lisboa: Colecção desporto e sociedade, antologia de textos, n.º 3, DGD.

7. Constantino J (1999). Desporto, Política e Autarquias. Lisboa: Livros Horizonte.

8. Dias L (2006). A Gestão do Desporto nos Municípios: o enquadramento do desporto municipal na estratégia nacional de desenvolvimento desportivo. Autárquica, 3: 14-18.        [ Links ]

9. Drucker P (1997). As organizações sem fins lucrativos. Lisboa: Difusão cultura

10. Fernandes A (1997). Poder Autárquico e Poder Regional. Porto: Brasília Editora.

11. Giddens A (2007). A Europa na era global. Lisboa: Editorial Presença.

12. Januário C (2001). Actividade Física, Autarquias e Políticas Desportivas: um estudo realizado na freguesia de Miragaia (Porto). Porto: C. Januário. Dissertação de Mestrado, Faculdade de Desporto da Universidade do Porto.

13. Lacoba C (2005). Las politicas deportivas en el âmbito local. Modulo I. Dirección y Gestión del deporte municipal. Barcelona 25, 26 y 27 de Mayo. Barcelona: Galeria Olímpica – Fundació  Barcelona Olímpica, FEMP/CSD.

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15. Pires G (1989). A estrutura e a política desportivas: o caso português – estudo da intervenção do aparelho estatal no sistema desportivo português. Lisboa: G. Pires. Dissertação de Doutoramento apresentada à Faculdade de Motricidade Humana.

16. Ruivo F (2002). Poder local e exclusão social. 2.ª edição. Coimbra: Quarteto Editora.

17.Sarmento P (2000). Seminário Equipamentos Desportivos: Novas Perspectivas de Gestão. Associação de Municípios do Distrito de Évora. Montemor-o-Novo, 23 e 24 Novembro 2000, pp. 92-96.

18. Silvano F (2007). Antropologia do espaço: uma introdução. 2.ª edição. Lisboa: Celta editora.

19. Vergnes J (2004). Les politiques sportives passes au crible du challange de L`equipe 2004: la ville la plus sportive. Sports et Territoires: fiches pratiques sportives.

 

CORRESPONDÊNCIA

Maria José Carvalho

Faculdade de Desporto, Universidade do Porto

Rua Dr. Plácido Costa, 91

4200-450 Porto, Portugal

E-mail: mjc@fade.up.pt

Carlos Januário

E-mail: cfjanuario@gmail.com