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Psicologia, Saúde & Doenças

Print version ISSN 1645-0086

Psic., Saúde & Doenças vol.21 no.2 Lisboa Aug. 2020

https://doi.org/10.15309/20psd210203 

Funcionamento sexual e consumo de tabaco numa amostra jovem

Sexual functioning and tobacco consumption in a young sample

Cheila Cardoso1 & Rui Costa2

1ISPAInstituto Universitário, Lisboa, Portugal, cheila.agc@hotmail.com

2William James Center for Research, ISPAInstituto Universitário, Lisboa, Portugal, rcosta@ispa.pt

Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence


 

RESUMO

Fumar é factor de risco dependente da dose para disfunção eréctil em amostras que incluem ou são totalmente constituídas por homens a partir dos 40 anos. Em homens jovens, os resultados são contraditórios. Não parece haver relação entre consumo de tabaco e dificuldades sexuais femininas em estudos que incluem ou são totalmente realizados com mulheres a partir dos 40 anos. Há falta de investigação em mulheres jovens. Personalidade e consumo de outras substâncias psicoactivas poderão explicar parte da associação entre consumo de tabaco e dificuldade sexuais, mas tem-lhes sido dada pouca atenção. O presente estudo visou examinar a associação entre consumo de tabaco e funcionamento sexual numa amostra jovem e explorar o papel da personalidade e do consumo de outras substâncias aqui desempenhado. O estudo foi realizado através de um questionário online e contou com a participação de 180 mulheres e 53 homens portugueses, heterossexuais, com idades entre 18 e 39. O funcionamento sexual feminino foi avaliado pelo Female Sexual Function Index e pela Female Sexual Distress Scale - Revised, e o masculino pelo Internarional Index of Erectile Function e pelo Premature Ejaculation Diagnostic Tool. Fumar não se associou a dificuldades sexuais em mulheres. Em homens associou-se a mais dificuldades erécteis, mas não depois de controlados neuroticismo, conscienciosidade, e consumo de álcool e de cannabis. Os resultados vão ao encontro de que a nicotina não põe riscos significativos para o funcionamento sexual feminino. Em homens jovens, é necessária investigação que tenha em conta a personalidade e o consumo de substâncias.

Palavras-chave: tabaco, funcionamento sexual, jovens adultos, personalidade, consumo de substâncias


 

ABSTRACT

Smoking is a dose-dependent risk factor for erectile dysfunction in samples that include or are entirely made up of men over the age of 40. In young men, the results are contradictory. Tobacco consumption and female sexual difficulties have been found to be unrelated in studies in samples that include or are entirely made up of women over 40 years old. There is lack of studies in younger women. Personality and consumption of other psychoactive substances may explain part of the association between tobacco consumption and sexual difficulties, but this has been overlooked. The present study aimed at examining the association between tobacco consumption and sexual functioning in a young sample of both sexes, and to explore the role of personality and consumption of others substances played here. The study was conducted through an online questionnaire and was attended by 180 women and 53 men heterosexual Portuguese between 18 and 39 years. Female sexual functioning was assessed by the Female Sexual Function Index and the Female Sexual Distress Scale - Revised. Male sexual functioning was measured by the International Index of Erectile Function and Premature Ejaculation Diagnostic Tool. Smoking was not associated with sexual difficulties in women. In men, it was associated with lower erectile function, but not after controlling for neuroticism, conscientiousness, and alcohol and cannabis consumption. The results show that nicotine does not appear to pose significant risks to female sexual functioning. In young men, more research is needed that takes into account personality and substance consumption.

Keywords: tobacco, sexual function, young adults, personality, substance consumption


 

Na maioria das investigações sobre a relação entre o consumo de tabaco e o funcionamento sexual em homens, verifica-se que o consumo de tabaco é um fator de risco para a disfunção erétil (Allen & Walter, 2018). Na literatura existem evidências de que há uma relação de dose-resposta entre a quantidade e a duração do consumo de tabaco e o aumento do risco de disfunção eréctil (Allen & Walter, 2018; Cao, Gan, Dong, Liu, & Lu, 2014). Segundo investigação meta-analítica, o risco de disfunção eréctil só é detectado em grupos de homens que fumam mais de 10 cigarros por dia e em grupos que fumam há mais de 10 anos (Cao et al., 2014); contudo, não é claro se esta associação entre quantidade e duração do consumo com a disfunção eréctil é independente ou se existe apenas o risco na presença das duas variáveis em simultâneo: quantidade e duração de consumo.

Uma limitação presente nestes e na maior parte dos estudos que associam o consumo de tabaco à disfunção eréctil é o facto de terem amostras exclusivamente com idades a partir dos 40 anos ou que incluem um grande número de homens nesta faixa etária. Ora, se o risco do tabaco para a função eréctil só aparecer com uma longa duração de consumo (Cao et al., 2014), então poderá ser menos provável que fumar esteja associado a disfunção eréctil em homens jovens. Tal confirma-se, os estudos com homens jovens têm apresentado resultados contraditórios, sendo a ausência de relação entre consumo de tabaco e disfunção eréctil em homens jovens (menos de 40 anos) confirmada por vários estudos (Huang et al., 2019; Martins & Abdo, 2010; Özmen et a., 2016; Pozzi et al., 2018; Song et al., 2019; Tsao et al., 2009). Todavia, alguns mostram que há um maior risco em homens jovens (Mykoniatis et al., 2018; Elbendary, El-Gamal, & Salem, 2009; Natali, Mondaini, Lombuardi, Del Popolo, & Rizzo, 2005). Uma dependência da dose em termos de quantidade é possível, pois um dos estudos verificou que fumar mais de 20 cigarros por dia é factor de risco em homens jovens (Natali et al., 2005).

O presente estudo visa contribuir para esclarecer esta questão examinado, numa amostra jovem não clínica, se há associação entre ser fumador e dificuldades na função eréctil.

Talvez pelo facto de o consumo de tabaco estar associado à disfunção eréctil, é comum pensar que o tabaco é um factor de risco para dificuldades sexuais femininas, o que é verificado em alguns estudos (e. g., Choi, Shin, Lee, Jeon, Kim, Cho, & Lee, 2015; Polland, Davis, Zeymo, & Iglesias, 2018; Smith et al., 2012), por vezes de forma dependente da dose (Choi et al., 2015). Contudo, e talvez surpreendentemente, a grande maioria da investigação empírica aponta para a inexistência desta associação (e. g., Allen & Walter, 2018; Avis et al., 2009; Çayan et al., 2016; Costa & Peres, 2015; Esposito et al., 2007; Lutfey, Link, Rosen, Wiegel, & McKinlay, 2009; Ponholzer, Roehlich, Racz, Temml, & Madersbacher, 2005; Safarinejad, 2006; Wallwiener et al., 2010; West et al., 2008). A ausência de associação entre consumo de tabaco e dificuldades sexuais femininas é confirmada em investigação meta-analítica (Allen & Walter, 2018) e em amostras representativas de vários países (Çayan et al., 2016; Luftey et al., 2009; Safarinejad, 2006; Wallwiener et al., 2010; West et al., 2008). Para uma revisão ver Costa e Peres (2015).

Tal como no caso dos homens, a investigação em mulheres é maioritariamente baseada em amostras exclusivamente de mulheres acima dos 40 anos ou que incluem um grande número de participantes nesta faixa etária. Assim, o presente estudo examina a relação entre consumo de tabaco e funcionamento sexual feminino numa amostra jovem não clínica.

Uma razão para o padrão de resultados diferentes entre sexos e, pelo menos nos homens, entre faixas etárias, prende-se com os efeitos vasoconstritivos da nicotina. A nicotina aumenta os níveis de ADMA, um inibidor de óxido nítrico (Biebel, Burnett, & Sadeghi-Najed, 2016) responsável pela dilatação arterial que permite a excitação genital. O óxido nítrico tem um papel importante em ambos os sexos: no sexo feminino é responsável pelo aumento do fluxo sanguíneo vaginal e do clitóris durante a excitação sexual (Giuliano, 2002) e no sexo masculino permite a manutenção da resposta erétil e é o principal estimulador da ereção peniana (Bivalacqua et al., 2005; Burnett, 2006). Assim, a nicotina pode prejudicar a acção do óxido nítrico levando a problemas de excitação genital. O estradiol é uma hormona que existe em maiores quantidades nas mulheres antes da menopausa e desempenha um papel protetor da excitação genital, uma vez que estimula a produção de óxido nítrico, contrariando o efeito vasoconstritor da nicotina (Giuliano, 2002). Como as mulheres têm níveis de estradiol mais elevados, poderão ter a sua função sexual mais protegida dos efeitos da nicotina. Mesmo em idades após a menopausa, quando os níveis de estradiol estão mais baixos, não se tem verificado associação entre fumar e dificuldades sexuais. Tal poder-se-á dever, pelo menos em parte, ao facto de o estradiol ter dado às mulheres uma protecção prolongada durante os anos anteriores à menopausa e provavelmente as terapias hormonais de substituição à base de estrogénios poderão continuar a proporcionar um efeito protector.

Para além disto, é possível que quando se verificam associações entre consumo de tabaco e disfunções sexuais, tal seja, pelo menos em parte, explicado por factores que não o efeito da nicotina. Entre estes contam-se factores de personalidade e consumo de outras substâncias. Menos conscienciosidade e mais neuroticismo têm sido associados ora a consumo de tabaco (Millad & Bogg, 2020), ora a mais dificuldades sexuais (Kurpisz et al., 2017). Ademais, o consumo de tabaco pode estar associado ao consumo de outras substâncias e os efeitos destas substâncias ou factores associados poderão levar a dificuldades sexuais.

Para sumarizar, o presente estudo teve como objetivo investigar, numa amostra jovem e não clínica, a relação entre o consumo de tabaco e o funcionamento sexual feminino e masculino, controlando o neuroticismo, a conscienciosidade e o consumo de álcool e cannabis.

Método

Participantes

O estudo contou com a participação de 233 indivíduos heterossexuais com menos de 40 anos e com actividade sexual com parceiro/a nas últimas quatro semanas (180 mulheres e 53 homens). A descrição da amostra é apresentada no quadro 1.

 

 

Procedimento

Os questionários foram disponibilizados online pela plataforma do Google Forms e divulgados a partir de redes sociais através de dois links, cada um destinado para o respetivo sexo (feminino e masculino). O método de amostragem foi por conveniência e através de um processo de bola de neve. Ambos os questionários apresentavam uma breve introdução sobre a investigação e o seu objetivo. Foi garantido aos participantes a confidencialidade e anonimato dos dados e a liberdade de não responder a alguma questão em que não se sentissem confortável dado o tema abordar a sexualidade.

Materiais

Previamente às escalas de funcionamento sexual foi questionada a ocorrência de relações sexuais com o sexo oposto nas últimas quatro semanas. Sendo a resposta facultada “Sim”, o participante era encaminhado para os questionários de funcionamento sexual.

No sexo feminino o funcionamento sexual foi avaliado através do Female Sexual Function Index (FSFI) e do Female Sexual Distress Scale Revised (FSDS-R). O FSFI tem 19 itens que avaliam as dimensões principais do funcionamento sexual feminino nas últimas quatro semanas, sendo as mesmas o desejo, a excitação subjetiva, a lubrificação, o orgasmo a satisfação e a dor (Pechorro, Diniz, Almeida, & Vieira, 2009; Rosen et al., 2000). Valores mais elevados representam um melhor funcionamento sexual. Também foi avaliado o distress sexual através do FSDS-R, que é composto por 13 itens. Valores mais elevados indicam mais distress em resposta ao que está a acontecer com a vida sexual (DeRogatis, Clayton, LewisD'Agostino, & Wunderlich, 2008). Berenguer, Rebôlo e Costa (2019) traduziram FSDR-R para português. A versão obteve adequada consistência interna e validade de critério. Tal foi replicado e expandido no presente estudo: o alfa de Cronbach obtido foi de .93 e relativamente à validade de critério, o FSDR-R correlacionou-se inversamente com todas as dimensões do FSFI: -0,59 < r < -0,33, p < 0,001, directamente com neuroticismo (r = 0,31, p < 0,001) e inversamente com extroversão (r = -0,24, p = 0,001).

Para avaliar o funcionamento sexual masculino foram utlizados o International Index of Erectile Function (IIEF) e o Premature Ejaculation Diagnostic Tool (PEDT). A versão validada para português do IIEF (Gomes & Nobre, 2012), é composta por 14 itens, menos um que a original, distribuídos por cinco dimensões: função eréctil, desejo sexual, satisfação com a relação sexual, satisfação sexual no geral e funcionamento orgástico. Valores mais elevados são indicadores de uma melhor função sexual. Os sintomas de ejaculação precoce foram avaliados através de uma versão traduzida para português europeu do Premature Ejaculation Diagnostic Tool (PEDT; Symonds et al., 2007) composto por cinco itens. Os valores mais elevados indicam maior gravidade de sintomas de ejaculação precoce. Na presente investigação, a consistência interna revelou-se adequada, com um alfa de Cronbach de .75, e verificou-se a existência de validade de critério com correlações inversas e significativas com as dimensões de satisfação com a relação sexual (rho = -0,28; p = 0,045) e satisfação sexual geral (r = -0,31; p = 0,025).

Os traços de personalidade do modelo dos cinco factores foram avaliadas através do Neo-FFI20, desenvolvido e validado para a população portuguesa por Bertoquini e Pais-Ribeiro (2006). É uma versão reduzida do NEO-PI-R. Tem 20 itens, cinco para cada factor: neuroticismo; conscienciosidade; amabilidade, abertura à experiência, e extroversão.

Os participantes relataram se eram fumadores regulares, fumadores ocasionais ou não fumadores. Os não fumadores e fumadores ocasionais foram agregados no grupo dos não fumadores. Os fumadores relataram o número de cigarros fumados com as seguintes opções de resposta: 10 ou menos, 11-20, 21-30, 31 ou mais. Adicionalmente, perguntou-se aos participantes se costumam beber álcool e se no ano passado consumiram cannabis.

Resultados

A amostra apresenta valores médios de funcionamento sexual normativos em ambos os sexos. No caso da subamostra feminina, a média da pontuação total do FSFI foi de 30,52 (DP = 3,63), havendo 28 participantes (15,6%) com valores no FSFI abaixo de 26.55, sugestivos de disfunção sexual (Wiegel, Meston, & Rosen, 2005). Na subamostra masculina, a média da escala de função eréctil do IIEF foi de 29,06 (DP = 1,56) havendo três participantes (5,7%) com valores abaixo de 26, entre 24 e 25, sugestivos de disfunção eréctil ligeira (Rosen, Capelleri, & Gendrano III, 2002). O controlo ejaculatório também apresentou valores médios normativos com a pontuação média do PEDT sendo 4,98 (DP = 3,44) havendo quatro participantes (7,5%) com valores superiores a 10 sugestivos de ejaculação precoce.

Conforme apresentado no quadro 2, não se obtiveram diferenças estatisticamente significativas entre não fumadoras e fumadoras quanto às dimensões do seu funcionamento sexual. Quando se compararam fumadoras e não fumadoras relativamente à proporção de participantes com pontuações no FSFI sugestivas de disfunção sexual feminina, não se verificaram diferenças significativas (13,6% no grupo das fumadoras e 20,4 % no grupo das não fumadoras; χ2 = 0,67, p = 0,414).

 

 

Como se mostra no quadro 3, os não fumadores relataram ter melhor função eréctil do que os fumadores, quando são assumidas variâncias diferentes (t = 2,08, p = 0,054). Quando se assumem variâncias iguais, os fumadores continuam a relatar erecções menos rígidas que os não fumadores (t = 2,89, p < 0,006). Como se observa na Tabela 3, não houve diferenças entre fumadores e não fumadores relativamente às outras dimensões do funcionamento sexual.

 

 

Quando se compararam fumadores e não fumadores relativamente à proporção de participantes com pontuações no IIEF sugestivas de disfunção eréctil, o grupo de fumadores apresentou mais casos de possível disfunção eréctil (20,0 %) do que o grupo dos não fumadores (0,0 %); χ2 = 8,07, p = 0,005.

Os quadros 4 e 5 mostram correlações dos traços de personalidade com o funcionamento sexual e o consumo de tabaco em mulheres e homens. Melhor funcionamento sexual associa-se a menos neuroticismo, mais extroversão e mais conscienciosidade.

 

 

 

Na subamostra feminina, ser fumadora associou-se a consumo de álcool (χ2 = 13,23, p < 0,001) e de cannabis (χ2 = 16,79, p < 0,001). Consumo de álcool e cannabis não se associaram (χ2 = 2,55, p = 0,111). Consumo de álcool e cannabis não se relacionaram com nenhuma dimensão do funcionamento sexual feminino à excepção de o consumo de álcool se associar a mais dificuldades a atingir o orgasmo (r = -0,21, p = 0,005).

Na subamostra masculina, ser fumador associou-se a consumo de álcool (χ2 = 6,04, p = 0,014) e houve uma tendência não significativa para o consumo de tabaco e cannabis se associarem (χ2 = 2,78, p = 0,095). Consumo de álcool e cannabis não se relacionaram (χ2 = 0,80, p = 0,371). O consumo de cannabis correlacionou-se significativamente com menor função eréctil (r = -0,28, p = 0,41) e marginalmente com menor desejo sexual (r = -0,26, p = 0,064) e mais dificuldades a controlar o momento da ejaculação (r = 0,26, p = 0,060). O consumo de álcool teve uma associação não significativa com mais dificuldades na erecção (r = -0,22, p = 0,114).

O quadro 6 mostra uma regressão múltipla por passos com a função eréctil como variável dependente. É possível ver que a relação estatisticamente significativa entre consumo de tabaco e mais dificuldades erécteis é em grande medida explicada conjuntamente por maior neuroticismo, menor conscienciosidade, consumo de álcool e consumo de cannabis. No último passo do modelo, verifica-se uma tendência não significativa para o consumo de tabaco se associar a mais dificuldades erécteis.

 

 

Discussão

No presente estudo com uma amostra não clínica jovem, verificámos que fumar está associado a relatos de menor função eréctil. A literatura existente é contraditória a respeito da relação entre disfunção eréctil e consumo de tabaco em homens jovens. Há estudo que verificaram esta associação (Mykoniatis et al., 2018; Elbendary, El-Gamal, & Salem, 2009; Natali, Mondaini, Lombardi, Del Popolo, & Rizzo, 2005), mas vários outros não a confirmaram (Huang et al., 2019; Martins & Abdo, 2010; Özmen et a., 2016; Pozzi et al., 2018; Song et al., 2019; Tsao et al., 2009). Devido à relação dose-resposta entre consumo de tabaco e problemas erécteis, é possível que a inconsistência na literatura se deva a menor duração de consumo e/ou a um efeito de coorte que leve as gerações mais jovens a consumir menor quantidade. Talvez em amostras mais velhas haja comorbilidades que interagem com o tabaco para aumentar o risco de disfunção eréctil, comorbilidades estas que não são frequentes na população jovem.

Verificámos que a relação significativa entre fumar e erecções menos rígidas desapareceu quando controlámos factores de personalidade (consciensiosidade e neuroticismo) e de consumo de outras substâncias. Isto mostra a importância de ter em conta estes factores. É plausível que a relação entre disfunção eréctil e consumo de tabaco seja, em parte, explicada por causas outras que não um efeito fisiológico da nicotina. Estes factores serão eventualmente mais relevantes nos homens jovens - em que o efeito directo da nicotina terá menos peso - mas também deveriam ser tidos em conta nos estudos com homens mais velhos, o que não é comum.

Para além do papel da personalidade, o presente estudo também evidenciou a importância de controlar o consumo de álcool e cannabis. Investigação meta-analítica mostra que há uma relação curvilínea entre consumo de álcool e função eréctil em que o consumo ligeiro a moderado é protector contra a disfunção eréctil, sendo que ausência de consumo e consumo excessivo não se diferenciam (Wang et al., 2018). Segundo uma meta-análise, o risco de disfunção eréctil é maior entre os consumidores de cannabis (Pizzol et al., 2019), havendo evidência de uma correlação negativa entre a satisfação nas relações sexuais e a duração do consumo de cannabis (Aldemir et al., 2017). É necessário mais investigação sobre a relação dose-resposta entre a disfunção eréctil e o consumo desta substância (Pizzol et al., 2019). Também será de notar que o abuso de substâncias poderá estar associado a factores que são em si mesmos prejudiciais ao desempenho sexual e que a presente investigação não avaliou. Em investigação futura será também relevante avaliar a frequência com que se estava sob a influência de substâncias psicoactivas durante as relações sexuais.

Na subamostra feminina, confirmámos numa amostra jovem o que o que tem vindo a ser amplamente demonstrado: que fumar não é factor de risco para dificuldades sexuais femininas.

Uma limitação do presente estudo reside na amostra de conveniência com uma amostra pequena, principalmente no caso dos homens. Para investigações futuras propõe-se avaliar o grau de dependência da nicotina, e a quantidade e duração do seu consumo em amostras de forma a avaliar possíveis relações dos-resposta.

Em conclusão, fumar não aparenta pôr riscos para a função sexual de mulheres jovens. No caso dos homens jovens, a relação entre consumo de tabaco e menor função eréctil poderá ser em grande medida explicada por variáveis de personalidade e consumo de outras substâncias.

 

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Recebido em 17 de maio de 2020/ Aceite em 16 de junho de 2020

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