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Psicologia, Saúde & Doenças

Print version ISSN 1645-0086

Psic., Saúde & Doenças vol.20 no.3 Lisboa Dec. 2019

https://doi.org/10.15309/19psd200302 

Adaptação do teste de dependência do telemóvel para adolescentes e jóvens portugueses

Adaptation of the mobile phone dependence test for portuguese adolescents and youth

Paulo Dias1, Soraia Gonçalves1, Irene Cadime1, & Mariano Chóliz2

1Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Católica Portuguesa, Braga, Portugal, pcdias@braga.ucp.pt, soraia_gdm@hotmail.com, imcadime@braga.ucp.pt

2Facultat de Psicologia Universitat de València, València, Espanha, Mariano.Choliz@uv.es


 

RESUMO

O uso dos telemóveis é um comportamento quotidiano que nos aproxima da informação e das pessoas que nos são significativas. Com o avanço da tecnologia, tornou-se uma ferramenta presente no dia-a-dia das pessoas e por utilizadores cada vez mais jovens, associada também a alguns riscos ou mesmo a um uso excessivo. No presente trabalho, pretendemos apresentar os estudos de adaptação para a população portuguesa de um instrumento que foi desenvolvido para avaliar a dependência dos telemóveis. Para isso, recorremos a uma amostra de 907 participantes - adolescentes e jovens - a quem foi aplicado um questionário sociodemográfico e o Test of Mobile Phone Dependence (TMD; Chóliz, 2012), através de um formulário online. Os resultados permitiram encontrar uma estrutura de quatro fatores com fidelidade adequada. Permitiram ainda perceber uma relação moderada ou forte entre a pontuação total com os diferentes fatores. Encontramos ainda diferenças de género, com as raparigas a apresentar pontuações médias superiores, e uma relação negativa com a idade. Explorando diferenças entre género e idade, encontramos uma diminuição significativa entre os participantes do género feminino. Os dados recomendam a utilização do instrumento no nosso contexto e permitem estudos futuros nesta temática.

Palavras-chave: Uso de telemóveis, dependência, adaptação, género, idade.


 

ABSTRACT

The use of mobile phones is a daily behavior that brings us closer to the information and the most significant people to us. With the developments of technology, mobile phones have become a daily tool for people and for each time younger users, also associated with some risks or even dependence. In the present work, we intend to present the adaptation studies for the Portuguese population of an instrument that was developed to evaluate the dependence of mobile phones. For this, we used a sample of 907 participants - adolescents and young people - to whom a sociodemographic questionnaire and the Test of Mobile Phone Dependence (TMD; Chóliz, 2012) were applied through an online form. The results allowed us to find a structure of four factors with adequate fidelity. They also allowed us to perceive a moderate or strong relationship between the total score and the different factors. We also found gender differences, with girls presenting higher mean scores, and a negative relation with age. Exploring differences between gender and age, we found a significant decrease among participants of the females. The data recommend the use of the instrument in our context and allow future studies in this issue.

Keywords: Use of mobile phones, dependency, adaptation, gender, age.


 

Nos últimos anos, com o impulso científico e a grande evolução da tecnologia, a internet e o smartphone tornaram-se nas duas ferramentas essenciais no quotidiano das pessoas, desencadeando, assim, dois dos maiores fenómenos mundiais do século XXI. Em particular, o smartphone apresentou-se na última década como o dispositivo tecnológico que ganhou maior importância dado o seu potencial de aglutinar, em si, um conjunto de outras ferramentas muito diversas. Através destes aparelhos, as pessoas acedem a informações em todos os campos, a qualquer minuto, e estão a uma distância de um “clique”, tornando assim, a vida mais fácil e prática.

Embora à proliferação de smartphones possam ser atribuídos a numerosos benefícios e recursos, estes também podem afetar negativamente o estilo de vida dos indivíduos quando o uso passa a ser excessivo/dependente, podendo levar ao aparecimento de repercussões a nível físico, psicológico e comportamental (Gezgin & Çakir, 2016). De acordo com a literatura, o problema não está no uso do aparelho, mas sim, no tempo de utilização do mesmo, bem como, a perda de controlo da sua utilização, o que provoca muitos problemas associados com o uso dos smartphones, sendo um dos mais correntes a nomofobia (Gezgin, 2017; Yildirim & Correia, 2015). Este termo, criado no Reino Unido, Inglaterra, e proveniente de uma abreviação da expressão no-mobile-phone-phobia (King, Valença, & Nardi, 2010), surgiu para indicar a angústia ou o desconforto causado pelo medo de ficar offline, ou seja, o medo de ficar incomunicável na internet através do smartphone (King, 2013). Em termos gerais, a nomofobia é considerada uma perturbação da sociedade digital, virtual e contemporânea, referindo-se ao desconforto, ao nervosismo, à ansiedade e à angústia causados pela falta de contacto com o smartphone. Assim sendo, características como baixa autoestima, comportamentos sociais inapropriados, medo de se relacionar, ansiedade social, pouca confiança em si, timidez, baixa proatividade, isolamento social, baixa capacidade de enfrentamento, baixo sentido de autoeficácia, além de relacionamentos afetivos e sociais empobrecidos, parecem estar ligados a esta perturbação (e.x.: Argumosa-Villar, Boada-Grau, & Vigil-Colet, 2017; King, Valença, Silva, Sancassiani, Machado, & Nardi, 2014; Olivencia-Carrión, Ferri-García, Rueda, Jiménez-Torres, & López-Torrecillas, 2018; Sales, Silva, & Lima, 2018).

Sendo a dependência um estado em que a pessoa tem uma necessidade compulsiva em relação a algum elemento/alguma substância, e caso não tenha uso daquela atividade, essa pessoa passará por stress e mal-estar por não estar a satisfazer o seu vício. Autores como Echeburúa, Corral, e Love (2005), entendem a dependência como um problema caracterizado pela dificuldade de controlar o desejo de realizar um comportamento, cuja repetição ou abuso provoca graves problemas pessoais e de adaptação. A dependência define-se, então, como a relação de uma pessoa com uma atividade que traz danos biológicos ou sociais (Arab & Diez, 2014). Neste caso, a dependência manifesta-se através de sintomas e alterações emocionais e comportamentais quando os indivíduos ficam sem o smartphone. Os sintomas observados mais frequentemente nestas situações, os chamados sintomas nomofóbicos (King, 2013), são: angústia, ansiedade, nervosismo, tremores, suor, entre outros, que possam estar relacionados à impossibilidade do uso imediato do smartphone.

O termos dependência, sem substâncias, aplicados a aspetos comportamentais, tem gerado bastante discussão (Carbonell, 2018). Contudo, a investigação tem mostrado que estas dependências, nomeadamente do smartphone, tem aspetos em comum com a dependência de substâncias psicoativas. Ambas são marcadas pela existência de sintomas físicos desconfortáveis e desconforto psicológico significativo, podendo ocorrer explosões de forte emoção, sentimento de perda, separação, frustração, intranquilidade, sentimento de que falta alguma coisa, ou até mesmo expressões físicas de raiva e manipulação, coação ou chantagem (Griffiths, 2010). Autores como Lin, Chang, Lee, Tseng, Kuo, e Chen (2014) referem que a dependência do smartphone tem manifestações idênticas à dependência de internet, e partilham alguns critérios de diagnóstico que são comuns e que constam no Manual de Diagnóstico e Estatístico das Perturbações Mentais (American Psychiatric Association, 2013), sendo esses critérios os seguintes: uso excessivo, abstinência, comportamento compulsivo, funcionamento comprometido, tolerância, e alterações no quotidiano. O uso excessivo continua apesar de o indivíduo saber que pode ter algum problema físico ou psicológico persistente ou recorrente, e que tende a ser exacerbado por ela ou, neste caso, pelo smartphone. A abstinência é manifestada por dois aspetos: síndrome de abstinência característica para a substância; e a mesma substância (ou substância estreitamente relacionada) é consumida para aliviar ou evitar sintomas de abstinência. No comportamento compulsivo a pessoa tem um forte desejo ou necessidade de usar a substância. No funcionamento comprometido pode ocorrer problemas de comportamento, interpessoais e físicos. A tolerância é definida segundo duas condições: uma necessidade de quantidades progressivamente maiores da substância para atingir o efeito desejado; e ocorre uma acentuada redução do efeito com o uso continuado da mesma quantidade/tempo da mesma substância. Por último, as alterações no quotidiano refletem-se no abandono de importantes atividades sociais e ocupacionais quotidianas ou antes consideradas satisfatórias em virtude do uso da substância (Kwon, Kim, Cho, & Yang, 2013; Lin et al., 2014).

Considerando o aumento da dependência dos smartphones e a voracidade com que são publicitados, como as suas ferramentas, é importante verificar qual o impacto dessa utilização na qualidade de vida das pessoas, nomeadamente no que diz respeito a problemas sociais/interpessoais, de saúde, tanto a nível físico como psicológico, entre outras consequências (Kyung, 2016). Vários estudos tem já mostrado como, os sujeitos que usam mais intensamente os smartphones apresentam prejuízos nos relacionamentos interpessoais familiares e entre pares, uma vez que se isolam-se para estarem no smartphone, fazendo com que os seus relacionamentos interpessoais se tornem mais limitados, conflituosos e menos gratificantes para as pessoas do seu meio envolvente (Kwon et al., 2013). Analogamente aspetos físicos relacionados com a postura que os sujeitos adotam por muito tempo, principalmente com a cabeça inclinada para puderem visualizarem o ecrã do smartphone, o desconforto corporal que esta causa e o aparecimento de dores nos ombros, nos braços, nas mãos, problemas de visão, alteração da fisiologia natural do corpo, e dores de cabeça que estão ligadas a tensões na nuca e no pescoço, quem podem desencadear cefaleias cervicogénicas (Gold, 2012; Kim, 2013, 2015). No que concerne aos aspetos psicológicos Vega, Correa, e Sánchez (2015) afirmam que em função da dependência do smartphone, os sujeitos têm-se descuidado, deixando muitas vezes, de realizar atividades quotidianas, dentro das quais se destacam as seguintes: estudar, trabalhar, dormir, comer, e não se concentrarem enquanto estão a caminhar ou a dirigir. Lemola (2015) também menciona que quando os indivíduos deixam de dormir, pode provocar dois graves danos, que são: o enfraquecimento da perda do tecido cerebral, que por sua vez aumentam os problemas de concentração e memória que levam à incapacidade de reter novas informações, bem como, aprenderem coisas novas; e depressão. Em resumo as pessoas que padecem usam excessivamente os smartphones manifestam condutas negativas por razões psicológicas e biológicas como stress (Lee, Chang, Lin, & Cheng 2014), ansiedade, agressividade, perturbações de sono e sintomas de depressão quando não podem estar a usar o smartphone (Thomée, Harenstam, & Hagberg, 2011) ou mesmo, apresentar problemas de comportamento, atenção, ou problemas físicos decorrentes da dependência (Rosen, Lim, Felt, Carrier, Cheever, & Lara-Ruiz, 2014).

A crescente atenção sobre este tema tem levado a um aumento de estudos e ao aparecimento de instrumentos de avaliação para avaliar o grau de dependência, bem como, as características comuns que conduzam a um padrão problemático para se poder intervir da maneira mais adequada (Montanes & Silvestre 2011). Na revisão da literatura, são quatro os instrumentos mais citados para avaliar esta dependência, sendo eles: o Test of Mobile Phone Dependence (TMD; Chóliz & Villannueva, 2011), o Smartphone Addiction Scale (SAS; Know, Min, & Kim, 2013), o Smartphone Addiction Inventory (SPAI; Lin, Chang, Lee, Tseng, Kuo, & Chen, 2014), e o Nomophobia Questionnaire (NMP-Q; Yildirim & Correia, 2015).

O Test of Mobile Phone Dependence (TMD) foi desenvolvido por Chóliz e Villannueva em 2011 e Chóliz em 2012, com o objetivo de avaliar as principais dimensões da dependência do smartphone, através dos critérios de dependência da American Psychiatric Association (2000), servindo assim, como apoio no tratamento deste tipo de dependência. Composto por vinte e dois itens, o instrumento é organizado em quatro dimensões: 1) abstinência - refere-se aos sintomas de abstinência que aparecem quando uma pessoa que é dependente, não pode usar o smartphone; 2) tolerância - é a necessidade de aumentar o uso para obter os mesmos benefícios de antes; 3) controle - incapacidade do indivíduo de interromper o comportamento aditivo; 4) abuso e interferência com outras atividades - uso excessivo do smartphone, mesmo em situações em que esse uso é perigoso ou inconveniente, mas também, quando esse excesso interfere com as atividades diárias do indivíduo. As opções de resposta para os primeiros 10 itens variam numa escala tipo Likert entre 0 (“Nunca”) e 4 (“Frequentemente”), para os restantes 12 itens estes variam de 0 (discordo completamente) a 4 (totalmente de acordo). Nos estudos de adaptação revelou apresentar globalmente uma elevada consistência interna, com um alfa de Cronbach de .94, bem como boa consistência interna para cada uma das subescalas: .81, .75, .64 e .70, respetivamente (Chóliz, 2012). O instrumento tem vindo a ser adaptado para outros países, com boas propriedades psicométricas (e.x.: Fırat & Çelik, 2017; Gamero, Flores, Arias, Ceballos, Román, & Marquina, 2016; Mohammadi et al., 2015) e tem servido de base para o desenvolvimento de outros instrumentos, como o Nomophobia Questionnaire (NMP-Q; Yildirim & Correia, 2015). Paralelamente, os autores têm vindo a desenvolver uma versão mais curta (TMDbrief; Chóliz, Pinto, Phansalkar, Corr, Mujjahid, Flores, & Barrientos & 2016) com o objetivo de ser uma versão multicultural para perceber se existem diferenças ao nível da dependência do smartphone em diferentes culturas entre os jovens, pois o uso dos smartphones não é um fenómeno local ou regional, mas sim mundial. Para isso este instrumento estendeu-se a seis países dentro os quais são: Índia, Paquistão, Irlanda, Espanha, Guatemala e Peru, que por sua vez, são representantes de três continentes, sendo eles a América, Ásia e Europa.

O Smartphone Addiction Scale (SAS) foi desenvolvido por Kwon, Kim, Cho, e Yang, em 2013, com o objetivo de diferenciar o uso da dependência do smartphone. Este instrumento é composto por trinta e três itens, e subdividido em seis dimensões: 1) distúrbio da vida diária - o indivíduo apresentar as seguintes características: falta de trabalho, dificuldade na concentração, tonturas, visão embaçada, dor nos punhos e/ou na nuca, e distúrbios no sono; 2) antecipação positiva - o indivíduo livrar-se do stress através do uso continuado do smartphone e sentir um vazio quando não tem o smartphone consigo; 3) abstinência - quando o sujeito não tem o smartphone e começa a ficar impaciente, indeciso, intolerável e irritado; 4) relação orientada para o ciberespaço - o sujeito não consegue manter uma relação, apenas virtualmente; 5) uso excessivouso incontrolável do smartphone, e sentir desejo de usá-lo novamente após ter parado de o usar; 6) tolerância - o sujeito tenta controlar o uso do smartphone, mas acaba por deixar de o fazer. As opções de resposta para os primeiros 10 itens variam numa escala tipo Likert entre 1 (“Discordo totalmente”) a 6 (“Concordo totalmente”). Este instrumento apresenta globalmente uma elevada consistência interna, com um alfa de Cronbach total de .97, bem como boa consistência interna para cada uma das subescalas: .66; .78; .75; .73; .61; e .73, respetivamente (Kwon, Kim, Cho, & Yang, 2013).

O Smartphone Addiction Inventory (SPAI) foi desenvolvido por Lin, Chang, Lee, Tseng, Kuo e Chen em 2014, e trata-se também de um questionário de autoavaliação baseado nas características particulares dos smartphones. Este instrumento é composto por vinte e seis itens organizados em quatro dimensões: 1) comportamento compulsivo - é considerado como o núcleo do vício; 2) limitação funcional - inclui problemas derivados do tempo dedicado ao smartphone; 3) abstinência - sintomas físicos/corporais resultantes da dependência; 4) tolerância - refere-se ao uso continuado do smartphone. As opções de resposta a variar numa escala tipo Likert entre 1 (“Não se aplica mesmo nada a mim”) e 4 (“Aplica-se muito a mim”). Este instrumento revelou apresentar globalmente uma elevada consistência interna, com um alfa de Cronbach de .92, bem como boa consistência interna para cada uma das subescalas: .81; .84; .77; e .63, respetivamente (Silva, Teixeira, & Soliz, 2017).

O Nomophobia Questionnaire (NMP-Q) foi desenvolvido por Correia, Gilbert, Shelley e Yildirim em 2014 com o objetivo de medir e avaliar os níveis de nomofobia. Este instrumento é composto por vinte itens e subdivide-se em quatro dimensões: 1) Não conseguir comunicar - sentimentos dedicados à perda de comunicação imediata e não poder utilizar os serviços disponíveis para esse fim; 2) Perda de conexão - emoções ligadas à perda de omnipresença depois de perder a conectividade, e também está relacionado à desconexão com sua própria identidade online, especialmente com as redes sociais; 3) Não conseguir aceder às informações - o aborrecimento de perder acesso imediato às informações através do smartphone e a possibilidade de procurar o que é desejado no momento; 4) Abandono do conforto - sentimentos inerentes ao conforto e tranquilidade psicológica que dá controle sobre o smartphone, principalmente em relação à bateria, cobertura e equilíbrio. As subescalas apresentam uma elevada consistência interna: Não ser capaz de comunicar α = .939; Perder conexão α = .874; Não conseguir ter acesso às informações α = .827; e o Abandono do conforto α = .819 (Yildirim & Correia, 2015). O formato de resposta é através de uma escala tipo Likert de sete pontos, que varia de 1 (“Discordo totalmente”) a 7 (“Concordo totalmente”).

Não sendo esta revisão de instrumentos o objectivo central do estudo, permite perceber a crescente atenção dada a este tópico. Dada a escassez de estudos neste âmbito no nosso contexto, o presente trabalho pretende apresentar as propriedades psicométricas do Test of Mobile Phone Dependence (TMD; traduzido para português como Teste de Dependência do Telemóvel), na população portuguesa, explorando diferenças de género e idade.

Método

Amostra

A amostra do estudo foi constituída por 907 estudantes ao ensino básico ao superior, a maioria do sexo feminino (n= 560, 61,7%), com idades entre os 12 e os 25 anos (M= 17,16, DP= 3,181).

 

 

Instrumentos

Para a recolha dos dados, foram utilizados um questionário sociodemográfico e o Teste de Dependência ao Telemóvel. O questionário sociodemográfico foi utilizado para recolher dados da amostra, sexo e idade. O Teste de Dependência ao Telemóvel (Choliz, 2012), é um instrumento constituído por 22 itens que avaliam quatro dimensões: abstinência, falta de controlo pelo uso do telemóvel; tolerância e interferência em outras atividades. Os primeiros 10 itens são respondidos numa escala Likert com resposta desde 0 - nunca - a 4 - frequentemente e os restantes 12 numa escala desde 0 - discordo totalmente - a 5 - concordo totalmente.

Procedimento

Para o presente estudo, foi contactado o autor do instrumento original para a autorização da utilização do instrumento e sua adaptação para o contexto português. De acordo com as boas práticas, a prova foi traduzida para Português e sujeita a um processo de retroversão para Castelhano para avaliação pelo autor da versão original. A versão final da prova foi depois administrada junto da amostra não probabilística, por motivos de conveniência, nomeadamente proximidade geográfica. A recolha foi efetuada em suporte digital, depois de obtidos os consentimentos dos estudantes menores de idade e dos próprios, garantindo o carácter voluntário, anónimo e confidencial dos dados recolhidos.

Os dados foram posteriormente codificados e analisados no programa Statistical Package for Social Sciences, versão 23, para Windows. Para avaliação da validade, foi utilizada uma análise fatorial exploratória de componentes principais, com normalização promax com valor de Kappa 4, uma vez que se assume que os fatores estão correlacionados e as dimensões não são independentes. Na avaliação da fidelidade foi utilizado o Alfa de Cronbach. Foram ainda comparadas diferenças de género, com o recurso ao teste t de student, e exorada a relação com a idade com o teste de associação de Pearson.

Resultados

Com um valor de 0,949 no teste Kaiser-Meyer-Olkin e 9934,23 na prova de esfericidade de Bartlett (p< ,001), a amostra foi considerada adequada para a análise fatorial exploratória de componentes principais. Os resultados permitiram encontrar quatro fatores, com valor próprio superior a um que explicam, no conjunto 60,496% da variância total. No primeiro fator, com uma variância explicada de 42,162 tiveram maior saturação os itens da dimensão Abstinência (itens 11, 13, 15, 18, 20, 21 e 22). No segundo fator, com uma variância de 7,876, gruparam os itens da dimensão Uso excessivo ou problemático (itens 1, 4, 5, 6, 8 e 9). No terceiro fator, agruparam-se os itens da dimensão Problemas (económicos) causados pelo uso do telemóvel (itens 3, 7, 10 e 19), com uma variância explicada de 5,677. E no quatro fator, agruparam os itens da dimensão Tolerância e ausência de controlo (itens 2, 12, 14, 16 e 17) com uma variância explicada de 4,780.

Em termos de fiabilidade da medida, o valor do alfa de Cronbach total de ,933, variando entre ,754 na dimensão Problemas causadas pelo uso do telemóvel e ,888 na dimensão Abstinência asseguram boa consistência interna da medida.

 

 

Como se percebe no quadro abaixo (Quadro 3), encontramos correlações moderadas a elevadas entre as dimensões, sendo particularmente forte a correlação entre a abstinência e pontuação total da escala (r = ,903, p < ,001), Tolerância e ausência de controlo (r = ,883, p<,001) e uso excessivo ou problemático e o total da escala (r= ,853, p< ,001)

 

 

Analisando as pontuações do instrumento em função do género (Quadro 4), encontramos diferenças significativas na dimensão abstinência [t (900) = -7,333, p < ,001], uso excessivo ou problemático [t (903) = -4,477, p < ,001], tolerância e ausência de controlo [t (900) = -4,059, p < ,001] e no total da escala [t (900) = -5,596, p < ,001] com pontuações médias superiores entre as raparigas. Em função da idade encontramos uma relação estatisticamente significativa, negativa e muito fraca com a dimensão Problemas (económicos) causados pelo uso do telemóvel (r = -,093, p = ,005) e Tolerância e ausência de controlo (r = -113, p = ,001).

 

 

Como se percebe no gráfico em baixo, recorrendo a uma Anova de dois fatores, encontramos diferenças estatisticamente significativas (F= 11,821, p< ,001), com uma diminuição das pontuações médias das raparigas com a idade, enquanto os rapazes registam uma ligeira subida entre o grupo de adolescentes e jovens.

 

 

Discussão

No presente estudo, pretendíamos adaptar o Teste de Dependência do telemóvel (Chóliz, 2012) para a população portuguesa. Trata-se de um instrumento curto e que tem sido adaptado para alguns países (e.x.: Fırat & Çelik, 2017; Gamero, Flores, Arias, Ceballos, Román, & Marquina, 2016; Mohammadi et al., 2015), permitiu o desenvolvimento de uma versão mais curta e adaptada multiculturalmente (TMDbrief; Chóliz, Pinto, Phansalkar, Corr, Mujjahid, Flores, & Barrientos & 2016), além de estar na base de outros instrumentos no mesmo domínio (Yildirim & Correia, 2015).

Com uma amostra de 412 estudantes do ensino secundário, a adaptação do instrumento para a Turquia permitiu encontrar boa validade, replicando a estrutura de factores, e valores de fidelidade de .92, para o total da escala e valores entre .77 e .87 nas dimensões específicas (Fırat & Çelik, 2017). Já a adaptação para o Perú (Gamero et al., 2016), os 22 itens agruparam em três dimensões, com valores de fidelidade entre .853 e .901. Conforme apresentado nos resultados, os estudos na população portuguesa, permitem encontrar valores de validade concordantes com a versão original, identificando quatro fatores com valores próprios superior a um, com todos os itens a apresentar saturação elevada no componente esperado. Também em termos de fidelidade, os dados estão em linha com a versão original (Chóliz, 2012), dado o valor de consistência interna de .933, permitindo até encontrar valores de consistência interna nas dimensões específicas mais elevadas que na versão original, dados os valores de .754 na dimensão Problemas causadas pelo uso do telemóvel e .888 na dimensão Abstinência. Tanto na validade como fidelidade, os dados permitem a sua adaptação na população portuguesa. Sendo um primeiro estudo, com o recurso a análise fatorial exploratória, estudos posteriores deverão confirmar estes dados com recurso a análise fatorial confirmatória. Também as correlações entre as dimensões estão em linha com a versão original (Chóliz, 2012), com a abstinência a apresentar-se como dimensão com correlação mais forte com a população total, o que sugere o papel desta dimensão na dependência do telemóvel. Resultados que estão em linha com trabalhos anteriores que salientam como abstinência até na perceção do tempo dedicado às tecnologias (Turel & Cavagnaro, 2019) e que merecem atenção clínica e preventiva.

Apesar de existirem poucos estudos, os dados encontrados parecem ir de encontro a trabalhos anteriores que registam diferenças de género, com as raparigas a apresentar uma utilização mais excessiva dos telemóveis (Andone, Błaszkiewicz, Eibes, Trendafilov, Montag, & Markowetz, 2016; Yang, Lin, Huang, & Chang, 2018). Se nas redes sociais e no uso da internet, os estudos anteriores mostraram uma utilização mais intensiva pelos rapazes (Dias, Cadime, Castillo-López, García-Castillo, & Garcia del Castillo, 2018), estes resultados merecem um estudo mais aprofundado para explicar melhor as motivações e efeitos deste uso excessivo por género. É conhecido como os telemóveis tem sido utilizado para a manutenção das redes sociais, seja com pares como com a família, mas importaria dar sequência a estes dados noutros estudos. Já ao nível da idade, parece existir maior controlo do uso do telemóvel entre os mais velhos (Andone et al., 2016), o que se revela particularmente com a diminuição do uso entre as raparigas. As tarefas desenvolvimentais e maior capacidade de autorregulatória podem ter, neste aspeto, um papel significativo.

Os resultados permitem, assim, recomendar a utilização do instrumento para a população Portuguesa. Trata-se de um instrumento curto com boa validade e fidelidade. O uso a uma amostra robusta, com mais de 900 participantes, parece suportar esses dados. Futuros estudos, com recurso a análises mais finas, de análise fatorial confirmatória, poderão contribuir para um maior conhecimento desta medida no nosso contexto. Apesar dos resultados, haverá que considerar a metodologia de recolha de dados, nomeadamente uma amostragem por bola de neve e com recurso a um questionário online, como um possível limite à generalização. Algo que próximos estudos permitirão esclarecer.

 

REFERÊNCIAS

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Recebido em 22 de Abril de 2018/ Aceite em 31 de Agosto de 2019

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